Reflexões Astrológicas
Eclipse Lunar Apulso
(Lua Cheia: Balança-Carneiro)
Lisboa, 07h13min, 25/03/2024
Lua
Decanato: Lua
Termos: Saturno
Monomoiria: Marte
Sol
Decanato: Marte
Termos: Júpiter
Monomoiria: Saturno
O Eclipse Lunar Apulso de dia 25 de Março
ocorre com a Lua no signo de Balança e o Sol no de Carneiro, com Carneiro a
marcar a hora e cerca de quarenta e cinco minutos após
o nascer-do-sol (hora de Lisboa), logo no Segmento de Luz (αἵρεσις) do Sol, estando este acima do horizonte, na I, no Leme do
tema (οἴαξ),
já a Lua está abaixo do horizonte, na VII, no lugar do Poente (δύσις). A Lua encontra-se no seu decanato, nos termos de Saturno
e monomoiria de Marte, enquanto o Sol
encontra-se no decanato de Marte, nos termos de Júpiter e monomoiria de Saturno. Após a aurora, com a noite terminada, o
eclipse colocará a sua sombra sobre o eixo do horizonte e, a partir da
Ascensão, trará consigo a mensagem do Dragão da Lua, aquela que une a necessidade
e o destino.
Um
eclipse lunar apulso ou penumbral acontece quando a Lua passa só pela penumbra
terreste, ou seja, pela parte menos escura da sombra da Terra. Neste tipo de
eclipse, o obscurecimento da Lua é subtil e difuso, tornando a sua observação
mais difícil. De um ponto de vista simbólico, a Terra não esconde a Lua, leva-a
sob o véu. Não é Deméter pesarosa à procura de Perséfone, oculta sob a Terra
com Hades, é sim Deméter, passeando, na Primavera e Verão, com Cora (Koré), protegida sob o manto materno. Um
eclipse lunar expressa, também por esta razão, algumas das matizes de luz e
sombra do feminino, mostrando a ponte de sentido que existe entre o mito e a
realidade. No entanto, o eclipse actual não favorece o feminino, pois a Lua, no
tema de Lisboa, afunda-se no Poente, num signo masculino e nos termos de
Saturno.
A
luz e a sombra, guardados pelo corpo do dragão primevo, revelam a forma como a
providência gere a parte e o todo, como concede cada porção de luz e sombra,
sem perder nunca a visão do todo, o olhar da montanha. Proclo, nos Elementos de Teologia, diz-nos o
seguinte: “Todo o todo-na-parte é uma parte de um todo-de-partes. Porque se é uma parte, é uma parte de
algum todo; e este deve ser ou o todo que contém, em virtude do qual é chamado
de todo-na-parte, ou então algum
outro todo. Mas, na suposição anterior, será uma parte de si mesmo, e a parte
será igual ao todo, e os dois idênticos. E se for uma parte de outro todo, ou é
a única parte, e se assim for será novamente indistinguível do todo, sendo a
única parte de uma unidade pura; ou então, uma vez que as partes de qualquer
todo são pelo menos duas, este todo incluirá um outro elemento e, sendo
composto por uma pluralidade de partes, será um todo das partes que o compõem.
Por conseguinte, o todo-na-parte é
uma parte de um todo-ou-partes.” (Prop.68, The Elements of Theology, ed. E.R.
Doods, p.65. Oxford, 1971: Clarendon Press).
Ora se ultrapassarmos sem preconceito a linguagem
filosófica, julgando que é erudição aquilo que apenas traduz a realidade,
compreendemos uma porção daquela que é relação entre a parte e o todo. Esta
relação é transcrita pelo eixo Peixes-Virgem, aquele será a próxima viagem do
ciclo nodal. No entanto, o actual ciclo de eclipses ocorre no eixo
Carneiro-Balança, ou seja, no eixo da identidade, aquele que une a unidade e a
dualidade e que estabelece a travessia da ponte da alteridade. A significação
destes dois eixos é fundamental para a compreensão, para a consciência íntima,
da luz e da sombra sobre estes binómios. A providência colocará a necessidade (Caput) e o destino (Cauda) sobre estes conceitos e sobre a forma como integramos o seu
sentido profundo. O eclipse de dia 25 de Março marca, neste ano de 2024, o
início da continuação dessa viagem. O desafio será passar, neste e
nos próximos anos, da identidade (Carneiro-Balança) à integração (Peixes-Virgem).
Seguindo
a ideia desenvolvida por Proclo, será necessário compreender-se como a parte
que nos coube participa do todo e de que tipo é esse todo, o que é, de facto,
uma integração da identidade na totalidade. Porém, essa integração ocorre
primeiro como revelação da consciência de si e depois como desagregação dessa
mesma consciência na consciência do todo, ou seja, seguindo a inspiração
estóica, a alma individual compreende que participa da Alma do Mundo. Quando um
eclipse se firma sobre o horizonte, dando luz à sombra e sombra à luz,
confirmando as suas naturezas, esse processo de integração toma a forma de
desafio ou enigma. Se excluirmos Júpiter, Úrano e Plutão, todos os outros
planetas estão presentes em signos dos eixos indicados. Na verdade, em Peixes,
existe uma forte co-presença planetária (ou Stellium
como hoje se diria). Neste signo, aquando do eclipse, estão Marte, Saturno,
Vénus e Neptuno, os maléficos e os planetas da dádiva do amor (Vénus exaltada e
Neptuno no signo por si regido).
Face
ao exposto, a influência do actual eclipse terá de conciliar a sua presença nos
ciclos nodais com a extensão temporal da sua acção concreta. A questão da influência
dos eclipses deve considerar sempre uma metodologia plural, uma que se fixe
para além das horas equatoriais descritas por Ptolomeu. A leitura das
declinações do Sol e da Lua colocariam uma influência restrita de um a dois
meses, já a duração penumbral fixaria uma influência mais ténue, de quase cinco
meses. Um outro critério que também firma a sua influência é a série Saros em
que se insere. A série Saros 113 é uma série antiga que começou a 29 de Abril
de 888 e que vai terminar a 10 de Junho de 2150. Este é o 64º eclipse de um
total de 71 eclipses, o que confere uma certa maturidade à mensagem proposta
pela série.
A
série Saros 113 é inaugurada por um eclipse em que o Dragão da Lua se estende pelo
mesmo eixo que o actual, todavia, o eixo luminar encontrava-se no eixo
Touro-Escorpião, ou seja, no eixo do ciclo nodal anterior ao que estamos a
viver. Este factor, para a questão da influência, corrobora o sentido de uma
influência abrangente, escrita num ciclo astrológico mundano mais amplo. O tema
do primeiro eclipse de uma série Saros serve de matriz para toda a série e,
seguindo este modelo interpretativo, existe uma proximidade do sentido astrológico
inicial com o actual.
No
eclipse de 29 de Abril de 888, a Lua e Úrano estavam no signo que marca a hora,
Escorpião, e no signo oposto, Touro, estavam o Sol, Mercúrio e Plutão. Em
Carneiro, estava a Caput Draconis,
Marte e Neptuno. Júpiter estava em Caranguejo e Saturno, culminando, em Leão.
Curiosamente, Vénus era o único planeta que se encontrava cadente, o mesmo que
hoje está exacerbado, mas também cadente. Porém, em 888, estava no lugar da
Deusa (III) e hoje está na XII, no Mau Destino (ou Espírito). Existe pois uma
potência por cumprir. Ora, aquando deste eclipse-matriz, ocorrem três mortes
que conduzem a mudanças em três reinos diferentes. Morre o imperador carolíngio
Carlos III, levando a mais uma cisão no Reino dos Francos. Morre Al-Mundhir,
emir de Córdoba, sendo sucedido pelo irmão Abdullah ibn Muhammad al-Umawi. Ora
Emirado de Córdoba vai anteceder o Califado de Córdoba que tanta importância
terá na história política e cultural da época. Por fim, morre o imperador Xi
Zong que também será sucedido pelo irmão, neste caso, Zhao Zong, e que dará
continuidade à dinastia Tang.
No
mesmo ano, o rei Alfredo, o Grande, funda a Abadia de Shaftesbury, mas é
sobretudo pelas efemérides militares que o período deste eclipse é lembrado. O
conde de Vannes, Alan I, e o seu rival, Judicael, unem forças para derrotar os
Vikings em Questembert. Dá-se também a Batalha de Milazo, em que os aglábidas
esmagam a armada bizantina ao largo da Sicília. Deve-se salientar igualmente as
expedições militares do rei Arnulfo da Caríntia na região dos Alpes e do norte
de Itália, confirmando o seu poder na sucessão de Carlos III. Todos estes
acontecimentos fundam um período de transformações e que, num curto período, vão
provocar várias mudanças. O trígono entre os maléficos potenciou muitos destes
momentos (Marte em Carneiro e Saturno em Leão).
A
influência espacial do eclipse de 25 de Março coloca o centro da sombra no mar,
no Oceano Pacífico, perto do Equador, entre Puerto Ayora (Ilha de Santa Cruz,
Equador) e as ilhas Marquesas, da Polinésia Francesa, estas um pouco mais a
sul. À semelhança dos últimos eclipses e do próximo, o eclipse será visível em
grande parte do continente americano. Já o manto penumbral será visível na
ascensão da Lua nas zonas orientais da Europa e de África e, no seu declínio,
no extremo ocidental da Ásia e da Oceania. Já nas regências geográficas antigas,
e de uma forma menos intensa, o Sol em Carneiro, segundo Vétio Valente (Antologia I, 2), rege as seguintes regiões: a Babilónia,
Elymais ou Elamais (Cuzistão,
província do Irão), a Pérsia, a Palestina e as regiões
circundantes, a Arménia, a Trácia, a Capadócia, Susã (cidade antiga, capital do
Elão ou Susiana, hoje sudoeste do Irão), o Mar Vermelho e o Mar Negro, o Egipto
e o Oceano Índico. Para Manílio, rege Helesponto
(Estreito de Dardanelos), Propontis (Mar de Mármara), a Síria, a Pérsia e o
Egipto (Astronomica, IV, 744-817).
De
uma forma mais intensa, a Lua em Balança, também segundo Valente (Antologia I, 2), vai ter influência sob a Báctria (região
persa do Coração que corresponde actualmente ao Afeganistão, Tajiquistão,
Uzbequistão, Paquistão e China), a China, a zona do Cáspio, Tebaida (região do
Antigo Egipto entre Abidos e Assuão), o Oásis (Oásis de Siwa ou Siuá, no
deserto da Líbia), Troglodítica (região antiga do deserto líbio, mas que se
pode estender por região que vai até ao Mar Vermelho e ao Corno de África), a
Itália, a Líbia, a Arábia, o Egipto, a Etiópia, Cartago, Esmirna (Anatólia,
Turquia), os Montes Tauro (Sul da Turquia), Cilícia (Turquia) e Sinope (Norte
de Turquia, junto ao Mar Negro). Manílio coloca a Itália e, em especial, a cidade
de Roma sob a regência de Balança, referindo, por um lado, que Roma controla as
mais variadas coisas, exaltando e precipitando as nações nos pratos da balança,
por outro lado, este é signo do imperador, de Augusto que terá nascido a 23 de
Setembro de 63 AEC (Astronomica IV,773-77).
O
tema do eclipse de dia 25 de Março tem, como já observarmos uma grande
concentração planetária nos eixos anunciados. Dos doze signos, apenas cinco tem
a presença de planetas. Em Carneiro, temos o Sol, Mercúrio (e a Caput Draconis), já em Balança está a
Lua (e a Cauda Draconis). Neste eixo
de identidade, entre a unidade e a dualidade, a luz da acção e da palavra e a
mediação criativa encontram-se obscurecidas, pendem sobre o horizonte como as
escalas desequilibradas de uma balança. A sombra do eclipse vai trazer um
obscurecimento ao sentido de identidade, à consciência daquilo que se é, tanto
pessoal como colectivamente. De uma perspectiva política, o enraizamento dos
valores democráticos encontra-se assombrado. A penumbra de um individualismo
narcísico, incapaz de integrar as ideias de solidariedade e de Estado Social,
corrompe a ponte democrática entre a igualdade e a liberdade. A Lua em Balança,
num eclipse lunar, acentua o desequilíbrio de valores. Em Portugal, a cada dia
que passa, o valor da Revolução de Abril perde-se na espuma dos dias, no
desligamento da realidade.
Mercúrio
em Carneiro, como Estrela da Tarde, abaixo do horizonte, revela uma palavra que
não faz, que tenta, mas não cria, que não promove uma verdadeira práxis. Tudo
se perde na desinformação, na ignorância, na liquidez dos tempos. O sextil de
Plutão em Aquário ao Sol, a Mercúrio e à Caput
em Carneiro e o trígono à Lua e à Cauda
em Balança, ambos em separação, trazem o sentido profundo da morte ao humano e
à humanidade, potenciando o elemento de transformação anteriormente descrito.
Existe uma desintegração de valores colectivos. Aquando da ascensão do nazismo,
Saturno estava em Aquário e Úrano em Carneiro. De uma outra forma, quando
Saturno e Neptuno passarem para Carneiro vamos encontrar elementos concordantes,
diferentes, mas comuns. De uma outra forma, na Marcha sobre Roma, que marca a
ascensão do fascismo italiano, Saturno estava em Balança e Marte em Capricórnio.
Existe muitos pontos de ligação com a actual ascensão da extrema-direita.
Júpiter
e Úrano em Touro em quadratura a Plutão em Aquário e em sextil a Marte,
Saturno, Vénus e Neptuno em Peixes servem de base conceptual e de estrutura de
sentido para o tema do eclipse lunar. Nesta configuração astrológica, a par da
que se estende no eixo Carneiro-Balança, repousa a mensagem de luz e sombra que
a providência nos concede. Evágrio do Ponto, um
monge-asceta e teólogo do século IV EC, afirma o seguinte: “O
conhecimento espiritual é ‘as asas’ da mente; o gnóstico é a mente das asas. E
se isto é assim, então as coisas carregam o signo das ‘árvores’: (elas são)
aquelas coisas em que a mente se empoleira, desfrutando das suas folhas e
deleitando-se com os seus frutos, enquanto almeja, a cada momento, a ‘árvore da
vida’.” (Kephalaia gnóstica 3.56
S2 in Evagrius of Pontus: The Gnostic
Trilogy, ed. R. Darling Young, J. Kalvesmaki, C. Stewart, C. Stang & L.
Dysinger, 284. Oxford, 2024: Oxford
University Press). A humanidade precisa de asas, de voar pelo
céu da gnose até à sabedoria. No entanto, a configuração astrológica mostra o
contrário ou, no mínimo, as dificuldades de possuir essas asas e voar.
Existe
um elemento de sentido, e que já abordamos no tema do Ano Novo Astrológico, que
pode ser designado como a estranheza do bem ou a negação da dádiva. A conjunção
dos maléficos (Marte e Saturno) em Peixes traz a experiência do mal à vontade
de totalidade. Porém, esta experiência do mal, como tal como o eclipse sugere no
eixo luminar, nodal e de ascensão, é colocada numa balança, onde de um lado
está a própria experiência do mal e do outro está a dádiva do amor. A união de
Vénus e de Neptuno em Peixes, ou seja, o lugar de exaltação e de domicílio
moderno, potencia exacerbadamente esta bênção. Contudo, esta dádiva perder-se-á
até ao momento do eclipse solar e, nesse momento, a conjunção dos maléficos
forçará o seu peso nas escalas da balança.
Seguindo
a citação de Evágrio do Ponto, Júpiter e
Úrano em Touro são hoje, no voo da gnose, as árvores do conhecimento espiritual.
Nesta posição e também pelos aspectos que se forma, nomeadamente o sextil aos
planetas no signo de Peixes. A relação destes dois posicionamentos conjuga dois
elementos, pois temos tanto o factor de estruturação ou reestruturação da
realidade como a liberdade ou o livre-arbítrio sobre a experiência do mal e a dádiva
do amor. No caso do tema de Lisboa, podemos observar como os regentes do eixo luminar
recaem ambos na XII, no lugar do Mau Destino (κακός δαίμων), revelando a degradação da mediação, do elemento de passagem,
entre o humano e a providência.
O Eclipse Lunar Apulso de dia 25 de Março é o primeiro momento alto do Dragão da Lua em 2024 e é a primeira grande luta entre a luz e a sombra. No actual ciclo, é também o penúltimo eclipse lunar no eixo nodal Carneiro-Balança, o último em que o Dragão da Lua e os luminares estão neste eixo. Por isso, a questão da luz e da sombra sobre o eixo da identidade, sobre a unidade e a dualidade, tornar-se-á mais revelante, bem como o peso da sua mensagem durante o período de influência. Como em todo o eclipse, será necessário enfrentar a sombra e seguir a luz.
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