sexta-feira, 22 de dezembro de 2023
Sol em Capricórnio: De 22 de Dezembro 2023 a 20 de Janeiro de 2024
quarta-feira, 22 de novembro de 2023
sexta-feira, 27 de outubro de 2023
Reflexões Astrológicas 2023: Eclipse Lunar Parcial (Lua Cheia Touro-Escorpião)
Reflexões Astrológicas
Eclipse Lunar Parcial
(Lua Cheia: Escorpião-Touro)
Lisboa, 21h14min, 28/10/2023
Lua
Decanato: Mercúrio
Termos: Vénus
Monomoiria: Marte
Sol
Decanato: Marte
Termos: Marte
Monomoiria: Saturno
O Eclipse Lunar Parcial de dia 28 de
Outubro ocorre com a Lua no signo de Touro e o Sol no de Escorpião, com Gémeos
a marcar a hora e menos de três horas após o pôr-do-sol (hora de Lisboa), logo
no Segmento de Luz (αἵρεσις) da Lua, estando esta acima do
horizonte, na XII, no lugar do Mau Espírito ou do Mau Destino (κάκον δαίμων), já o Sol está abaixo do horizonte,
na VI, no lugar da Má Fortuna (κάκη
τύχη). A Lua encontra-se no decanato de
Mercúrio, nos termos de Vénus e monomoiria
de Marte, enquanto o Sol encontra-se no decanato de Marte, nos termos de Marte
e monomoiria de Saturno. Após o
crepúsculo, caída a noite, o eclipse colocará a sua sombra sobre o horizonte e,
a partir da Pós-Ascensão, trará consigo o peso do destino.
Acerca do eixo de lugares (XII-VI)
onde este plenilúnio obscurecido se estende, Manílio diz o seguinte: “a porta do trabalho serão: por uma se sobe e pela outra se desce” (Astronomica II, 870: porta laboriis erit:
scandendum est atque cadendum).
O conceito fundamental que se extrai deste verso é o de labor, de trabalho, que tem aqui o sentido de dificuldade, de
esforço, de pena, mas também, inevitavelmente, de desafio. Lembremo-nos, por
exemplo, dos trabalhos de Hércules. Ora Virgílio, na Eneida, refere os eclipses solares como labores solis, os trabalhos ou labores do sol (I, 742). Esta é uma ideia preciosa, pois
diz-nos que a sombra coloca a luz, seja ela directa (Sol) ou reflectida (Lua),
sobre esforço. Desta forma, se o eixo do eclipse lunar cair sobre o eixo da
VI-XII este sentido sai reforçado, sobretudo se se conjuga com o sentido
negativo ou obscurecido dos conceito de τύχη e δαίμων. A fortuna e o destino são colocados
assim, não perante a dualidade dos acontecimentos, mas sob a potencialidade da
acção humana e o modo como esta apreende os acontecimentos. Para ascender ou
descender, como diz Manílio, a luz terá de passar por esse pórtico penoso onde
o seu espectro se sujeita à dificuldade e ao esforço. Os eclipses, face ao
estender da sombra a partir da própria luz, são necessariamente tempos de
angústia e agrura.
Nas Meditações,
Marco Aurélio diz-nos seguinte: “Abandona-te
de boa mente a Cloto; deixa-a tecer a tua vida com os acontecimentos que lhe
aprouver.” (IV, 34, trad. J. Maia. Lisboa: Relógio D’Água, 1995). No que aos
acontecimentos concerne, a acção humana é determinada pela aceitação do fio das
Meras, do destino, todavia, existe liberdade na forma como acolhemos, ou não, a
luz e a sombra. O imperador romano continua, afirmando: “Considera de contínuo que o mundo é como um ser único, contendo uma
substância única e uma única alma; e que tudo vai desaguar à mesma e única percepção
que é a sua; ele tudo realiza por força do mesmo impulso; todas as coisas ao
mesmo tempo concorrem para causar o que acontece e que trama cerrada e
complicada é o que elas produzem” (IV, 40). Esta
causalidade não só é natural como é provida de sentido, de finalidade, contudo,
a sua interiorização exige esforço. Para tudo e para cada um, existe um
trabalho que lhe é devido. As portas do trabalho são portanto os desafios desta
causalidade.
As
raízes desta ideia atravessam, na Antiguidade, o pensamento filosófico e a
astrologia. Já Platão, no Timeu,
afirmava que “Com efeito, o deus,
ao fazer girar em torno do eixo todos os círculos dos astros, como uma espiral,
fazia parecer que o movimento era duplo e em sentidos opostos e que o que se
afastava mais lentamente do que era mais rápido era o que estava mais perto.
Para que houvesse uma medida evidente para a lentidão e para a rapidez com que
se cumprissem as oito órbitas, o deus instalou uma luz na segunda órbita a
contar da Terra, a que agora chamamos Sol, de modo a que o céu brilhasse ainda
mais para todos e que os seres-vivos aos quais isso dissesse respeito
participassem do número de modo a ficarem a conhecer a órbita do Mesmo e do
Semelhante. Deste modo e por estas razões foram gerados a noite e o dia – o
percurso circular uniforme e regular.” (39A-B,
Timeu – Crítias, trad. R. Lopes.
Coimbra, 2011: Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos).
Existe tanto uma diversidade nesta unidade como uma harmonia de opostos que conduz
a essa unicidade. Ora é neste ponto que um eclipse e, em especial, um eclipse
lunar se torna particularmente significativo.
A harmonia dos opostos funda-se,
numa perspectiva divina, na união da Mãe Divina ao Pai Divino, ou seja, por
amor o mundo se criou e por separação assim permaneceu, daí que Tábua de Esmeralda diga que “Todas as coisas provêem
de uma, por mediação de uma única, assim todas as coisas nasceram desta única
realidade por um único processo de adaptação. O seu pai é o Sol; a sua mãe é a
Lua.” (TH 30, in Hermetica II -The Excerpts of
Stobaeus, Papyrus, and Ancient Testimonies in an
English Translation with Notes and Introduction., ed. M. D. Litwa, 2018: 315. Cambridge: Cambridge University Press. A
tradução é da minha responsabilidade). Na astrologia, o Sol é o Pai Divino e a Lua a Mãe
Divina, são Osíris/Serápis e Ísis. Os antigos astrólogos conservaram sempre
esta matriz de sentido. Os eclipses são a sombra que estende junto ao casal.
Essa sombra é Set que, embora seja um inimigo, não deixa de ser seu irmão.
Existe uma afinidade
natural entre a luz e a sombra. Ora, para a significação do actual eclipse
lunar, esta harmonia dos opostos vai para além do Sol e da Lua, pois a regência
domiciliar dos signos do eixo luminar e do Dragão da Lua alimentam esta
dicotomia. De um lado, temos a Lua em Touro (Vénus) e a Caput Draconis em
Carneiro (Marte) e, do outro, temos o Sol em Escorpião (Marte) e a Cauda
Draconis em Balança (Vénus). Sob a égide da luz e da sombra, existe pois uma
força cósmica de união e separação, criando e destruindo.
A influência do eclipse
lunar de dia 28 não é das temporalmente mais longas, mas é espacialmente
expressiva. Segundo o método ptolemaico, podemos fixar a influência entre um
mês e nove dias e quatro meses e catorze dias, isto se considerarmos primeiro a
duração do manto umbral e depois a do manto penumbral. Já a técnica que
concilia a duração da escuridão do eclipse com o tempo de ascensão dos signos
coloca a influência entre um dia e meio e um mês e oito dias. É significativo
que duas técnicas com pressupostos diferentes tenham, neste caso, um período de
influência tão aproximado. Já a influência espacial coloca o centro do eclipse
ao largo do Iémen, entre a costa mais próxima da fronteira com Omã e a ilha de
Socotorá (Suqutrah), um paraíso
natural pertencente ao Iémen. No entanto, o eclipse tem um manto extenso que
cobre o continente africano, europeu e asiático.
Quanto às regências
espaciais antigas, temos de observar primeiramente as do signo de Touro, pois é
onde se encontra a Lua. Segundo Vétio
Valente (Antologia I, 2), Touro vai reger as regiões da Média
(o actual noroeste do Irão, o Azerbaijão, o Curdistão Iraniano e o Tabaristão
ou Mazandarão), da Cítia (Irão, mas também uma área que se estendeu da Bulgária
às fronteiras da Rússia, Mongólia e China), do Chipre, da Arábia, da Pérsia e
das montanhas do Cáucaso, da Samártia (junto à Média), de África, de Elymais ou
Elamais (Cuzistão, província do Irão), de Cartago, da Arménia, da Índia e da
Germânia. Para Manílio, Touro rege Cítia, a Ásia (por causa dos Montes Tauro) e
a Arábia. (Astronomica, IV, 744-817).
De seguida, por a Caput Draconis se
encontrar num signo diferente, temos de considerar as regências de Carneiro. Vétio
Valente (Antologia I, 2) diz-nos que as seguintes regiões pertencem a
Carneiro: a Babilónia, Elymais ou Elamais (Cuzistão,
província do Irão), a Pérsia, a Palestina e as regiões
circundantes, a Arménia, a Trácia, a Capadócia, Susã (cidade antiga, capital do
Elão ou Susiana, hoje sudoeste do Irão), o Mar Vermelho e o Mar Negro, o Egipto
e o Oceano Índico. Para Manílio, rege o Helesponto
(Estreito de Dardanelos), Propontis (Mar de Mármara), a Síria, a Pérsia e o
Egipto (Astronomica, IV, 744-817). Embora com menor influência, o lugar
do Sol também é significativo e Valente diz-nos que Escorpião rege a Metagonitis
ou Numídia (Norte de África, Argélia e Tunísia), a Mauritânia, a Getúlia (Norte
de África, Argélia e Tunísia), a Síria, Comagena (Ásia Menor), a Capadócia,
Itália, Cartago, Líbia, Amom (Jordânia), Sicília, Espanha e Roma. Já para Manílio
Escorpião rege Cartago, a Líbia, o Egipto, Cirene, a Itália e a Sardenha (Astronomica IV, 777-82).
O eclipse lunar actual pertence à
série Saros 146 que se iniciou a 11 de Julho de 1843 e que terminará a 29 de
Agosto de 3123. É portanto uma série recente que se estende a partir do eixo
Capricórnio-Caranguejo até ao eixo Peixes-Virgem. O seu eclipse inaugural, que
serve de matriz genetlíaca de sentido, ocorreu com a Lua, a Caput Draconis e
Saturno em Capricórnio, o Sol e a Cauda Draconis em Caranguejo, Mercúrio e
Vénus em Gémeos, Marte em Sagitário, Júpiter e Neptuno em Aquário e Úrano e
Plutão em Carneiro. A conjunção da Lua e Saturno e a quadratura destes a Úrano
e Plutão em Carneiro, bem como a conjunção de Júpiter e Neptuno, levou por
exemplo à erupção do Monte Etna a 25 de Novembro.
No mesmo período, destaca-se também
o terramoto na ilha Terceira, nos Açores. Por outro lado, a posição de Mercúrio
e Vénus favoreceu, por exemplo, a publicação das obras de Charles Dickens,
Edgar Allan Poe e Ada Lovelace. Kierkegaard publicou, pouco meses após o
eclipse, a obra Temor e Tremor. Os
eclipses, face à sua tensão uterina de luz e sombra, tendem a provocar elementos
disruptivos. O pensamento e a arte são, por excelências, vectores de
transformação, pois nascem do que transcende o comum.
A relação do eclipse inicial da
série Saros 146 com o actual eclipse é particularmente significativa, sobretudo
se considerarmos a quadratura entre o eixo nodal do primeiro eclipse e a
posição actual dos luminares. Entre os dois temas, a par da quadratura
dragontina, os trígonos do Sol e da Lua tornam-se um intenso potencial de
sentido. Existe nestes dois eixos zodiacais (Capricórnio-Caranguejo e
Touro-Escorpião) uma qualidade, sob os desígnios eclipsais do destino e da
necessidade, que é tanto dinâmica como estruturante, conciliando o tempo e o
valor. Estendido entre a vida (Touro) e a morte (Escorpião), o valor encontra o
seu sentido, mas hoje, coberto pelo manto umbral, o sentido daquilo que tem
valor encontra-se difuso, obscurecido pelo peso do erro, da ilusão e do engano,
por esta prole que a ignorância humana criou.
Os tempos que vivemos com guerra,
com inflação e especulação, com interesses e corrupção, com populismos e
extremismos, ameaçando as democracias e os cidadãos, pervertem o valor da
dignidade humana. A ideia de que existem humanos de primeira e de segunda e de
que existem povos e terras eleitas são uma clara ameaça a nossa civilização e
ao futuro da humanidade. A sombra sobre a Lua, Júpiter e Úrano em Touro
pede-nos para repensar o planeta que habitamos e diz-nos que o direito à
propriedade não pode pesar mais que o direito à dignidade. O planeta não pode ser
um propriedade tem de ser um lar. É preciso repensar os valores do elemento
Terra. O grande trígono de Terra, entre os planetas em Touro, já indicados,
Plutão em Capricórnio e Vénus em Virgem, convida-nos a essa reflexão, não
apenas como exercício espiritual, mas também base de uma nova práxis.
Por outro lado, o facto de Saturno
em Peixes, conjunto a Neptuno, ser o astro mais alto adensa a gravidade do
destino sobre o momento. A concórdia conceptual e espiritual entre as ideias de
tempo e de totalidade fazem de Saturno em Peixes, segundo a matriz mitológica
do deus romano da agricultura, o mestre do acto de semear, esperar e colher.
Caído o manto da sombra, este é o tempo das colheitas, não das trazem os frutos
da terra, mas sim das cumprem a consequência da desmedida. O trígono de Saturno
e Neptuno em Peixes ao Sol, a Mercúrio e Marte em Escorpião, seguindo a lição
de Petosíris de que nem todos os trígonos são bons, nem todas as quadraturas
são más, consubstancia a gravidade didáctica do destino enquanto disrupção
causal da Providência.
A ὕβρις representa
uma quebra na justa medida das coisas, naquilo que ocorre como é suposto que
aconteça. A guerra representa um corte na ordem natural das coisas, pois conduz
a uma destruição que não é própria da natureza cíclica de Gaia, mas sim da
natureza humana, das suas franquezas. O terrorismo é uma outra face desta
desmedida, levando o mal que nos consome ao outro. No entanto, o mito da
violação de Alcipe, filha de Ares, por Halirrótico, filho de Posídon, mostra o
outro lado de Escorpião, ou seja, a vingança como forma de resistência e
reposição da justiça (Figueiredo, R.M. de, 2021, Fragmentos Astrológicos, 126).
Este é o mito que está na origem do Areópago. Pela ofensa cometida, Ares mata
Halirrótico. Posídon exige o julgamento e a respectiva condenação. No entanto,
Ares é absolvido, pois o seu acto foi considerado legítimo. Os tempos que
vivemos revelam esse fio ténue entre a vingança e a justiça, entre opressão e
resistência.
Neste eclipse lunar, a tensão que
ocorre no eixo Touro-Escorpião fundamenta o sentido profundo do actual manto
umbral, fazendo deste choque entre a vida e a morte, entre criação e
destruição, um elemento estruturante. Se considerarmos a relação de aspectos
nos elementos Terra e Água (trígono), aqueles que fortalecem este fenómeno
astrológico, observamos que, como um pentagrama imperfeito, existe um signo que
não é habitado por nenhum planeta. Caranguejo, como signo da origem, torna-se
agora um sinal de incompletude e isso é bastante significativo. Falta-nos hoje,
por ocultação luminar, uma matriz feminina, lunar, de sentido. O mundo, a
humanidade, devido às suas próprias escolhas, vive sem a Mãe Divina e, com o
signo de Touro obscurecido, exaltando-se a Lua na sombra, a Terra não consegue
ser Mãe.
A grande maioria das posições e
aspectos astrológicos presentes no tema do eclipse lunar já foram analisadas na
reflexão do eclipse solar, todavia, é necessário destacar a posição dos
maléficos e os seus movimentos futuros, pois, dentro do período de influência
do eclipse lunar, Saturno iniciará, a 4 de Novembro o seu movimento directo e
Marte ingressará em Sagitário a 24 do mesmo mês. A ligação entre os dois
planetas passará do trígono à quadratura, agravando assim o seu carácter
maléfico e a sua acção disruptiva. Os próximos meses vão indicar um desafio, um
trabalho severo, para a humanidade. As nossas palavras e as nossas acções, mais
do que nunca, vão determinar quem somos e para onde vamos. Estamos à beira do
abismo.
O eclipse lunar de dia 18 é o último neste ciclo nodal actual, no eixo de Touro-Escorpião. Passaremos definitivamente para o eixo Carneiro-Balança, deixando o sentido de valor para encontrar-se o sentido de identidade. No entanto, até à primeira época de eclipses de 2024, os eclipses no eixo Touro-Escorpião ainda estarão presentes, perdendo progressivamente a sua influência. O actual eclipse pela sua área geográfica de influência e pelas significações que o tema astrológico introduz vai, por força do destino e da necessidade, mas também pelo efeito da desmedida, trará desastres naturais e humanos. Sem amor e sem sabedoria, a humanidade perder-se-á.
segunda-feira, 23 de outubro de 2023
sexta-feira, 13 de outubro de 2023
Reflexões Astrológicas 2023: Eclipse Solar Anular - Lua Nova em Balança
Reflexões Astrológicas
Eclipse Solar Anular
(Lua Nova em Balança)
Lisboa, 18h59min, 14/10/2023
Sol-Lua
Decanato: Vénus
Termos: Saturno
Monomoiria: Sol
O
Eclipse Solar Anular de 14 de Outubro ocorre no signo de Balança, com Carneiro
a marcar a hora, no Segmento de Luz (αἵρεσις) da Lua, com os luminares abaixo do
horizonte, na VII, junto ao Poente (δύσις), e cerca de cinco minutos após o
ocaso (hora de Lisboa), no decanato de Vénus, termos de Saturno e na monomoiria do Sol. O sentido de sombra e
ocultação ganha assim um valor reforçado. O eclipse e o poente partilham o
carácter de lugar ou momento de escuridão. A luz é ferida pela dicotomia da sua
própria natureza e, sendo Saturno, o Sol
da Noite - como designaram os babilónicos -, o regente de Balança, este
eclipse adquire pois essa significação profunda.
Neste eclipse, mais do
que nos últimos e talvez mais do nos próximos, o Dragão da Lua cingirá por
completo a luz, o Sol, não por ser um eclipse com uma sombra extensa ou
espacialmente significativa, mas sim por encerrar uma conjugação reforçada de
sentidos. Por esta razão, a análise do eclipse solar de 14 de Outubro deve
considerar primeiramente o valor conceptual e escatológico da luz e da sombra
e, de forma paralela, o carácter simbólico deste dragão primordial. A
astrologia moderna, perdendo a herança mitológica e a imagem do dragão ou
serpente, preferiu as designações nodais em vez das dragontinas, todavia a sua
presença original deve ser recuperada.
No tratado gnóstico Pistis Sophia, tendo por base esta
inspiração, diz-se o seguinte: “Nesse momento, todavia, todos os céus vieram para o oeste, com todos os
aeons e a esfera e os seus arcontes e
todos os seus poderes. Todos eles correram para o oeste para a esquerda do
disco do sol e do disco da lua. Mas o disco do sol era um grande dragão cuja
cauda estava na sua boca e que levava consigo os sete poderes da esquerda.”
(IV, 136, ed C. Schmidt
& V. Macdermot, 1978: 354. Leiden: E. J. Brill). O
ourobóros, a serpente que circunda o
Sol ou um ovo, é por excelência uma imagem tanto do sagrado feminino como da
sombra eclíptica, lembremo-nos, por exemplo, do mito pelasgo da criação, de
Eurínome e Ofíon. Na astrologia, o Dragão da Lua, o eixo nodal, preserva toda uma
tradição de sentido, uma herança, que é particularmente fértil no que aos
eclipses concerne.
A natureza sombria do eclipse
implica, no entanto, e de acordo com a sua própria natureza, um carácter
maléfico. Uma leitura astrológica que teme a sombra, a destruição e a morte,
tão comum na astrologia contemporânea, fica sempre aquém da realidade. Dante, na Divina
Comédia, no Purgatório, diz, pela boca de Virgílio, falando para Estácio: “Tu se' ombra e ombra vedi.” (XXI, 132). De certa forma, é a
nossa condição: somos sombras e vemos sombras. Foi, todavia, o amor, a amizade
entre eles, que fê-lo tratar uma sombra como se fosse uma coisa sólida (Purgatório, XXI, 133-6: Ed ei
surgendo: «Or puoi la quantitate
/ comprender de l’amor ch’a te mi scalda,/
quand’ io dismento nostra vanitate,/ trattando l’ombre come cosa salda.»). O amor possui portanto o poder de transformar a sombra,
de lhe dar a forma de uma realidade interna ou externa, materializando-a, e
isso acontece por uma única razão: o amor é luz e não existe sombra sem luz.
Na subida
da montanha, o canto XX do Purgatório, anterior a este que aborda a amizade,
termina com um terramoto. Os desastres naturais e, em certa medida, os
desastres humanos (guerras, revoluções, assassinatos, etc.) têm uma relação
íntima com os eclipses. Entre a sombra e a ruína, existe um caminho e, por vezes,
é nos estilhaços, como um vestígio de vida, que a luz pode ser encontrada. A
observação do tema de eclipse para cada localidade, e em especial se manto
umbral a cobrir, é fundamental. Não devemos temer as previsões. Se um luminar
tiver a preponderância de bons aspectos, especialmente dos benéficos, e se
estiver no seu domicílio ou exaltação, os efeitos negativos serão minimizados,
mas não anulados. Já se estiver no seu exílio ou queda ou junto dos maléficos,
produzirá uma acção negativa aumentada. Os eclipses tendem assim a gerar
mudanças, redistribuições e desastres.
No caso
específico dos desastres naturais, os eclipses são indicadores importantes. Por
exemplo, as conjunções ou oposições de Marte, Júpiter ou Saturno são sinais
indiscutíveis, sobretudo em certos signos ou sobre os pólos (κέντρα).
Antes de avançar nesta questão, convém fixar-se a influência temporal e
geográfica do eclipse de 14 de Outubro. Se utilizarmos uma técnica que me é
cara, e um pouco diferente da ptolemaica, e que concilia a duração do eclipse
com os tempos de ascensão, chegamos a uma influência que se estende até cerca
de um ano e oito meses. Quanto a área geográfica, o eclipse ocorre ao longo do
continente americano, estando o seu centro ao largo da Nicarágua e da Costa
Rica. Este aspecto é interessante se pensarmos que o eclipse tem o seu lugar de
maior escuridão mesmo diante de um conjunto de parques e reservas naturais. Do
lado da Nicarágua, temos a Reserva Biológica Indio Maíz e, do lado da Costa
Rica, o Refúgio Nacional de Vida Silvestre Barra del Colorado e o Parque
Nacional Tortuguero. Se quisermos um planeta vivo no futuro, a vida selvagem
precisará urgentemente de luz.
De acordo com as regências da
astrologia antiga, a influência geográfica é um pouco diferente. Segundo
Valente (Antologia I, 2), as seguintes zonas estão sob a influência de
Balança: a Báctria (região persa do Coração que corresponde actualmente ao
Afeganistão, Tajiquistão, Uzbequistão, Paquistão e China), a China, a zona do
Cáspio, Tebaida (região do Antigo Egipto entre Abidos e Assuão), o Oásis (Oásis
de Siwa ou Siuá, no deserto da Líbia), Troglodítica (região antiga do deserto
líbio, mas que se pode estender por uma área que vai até ao Mar Vermelho e ao
Corno de África), a Itália, a Líbia, a Arábia, o Egipto, a Etiópia, Cartago,
Esmirna (Anatólia, Turquia), os Montes Tauro (Sul da Turquia), Cilícia
(Turquia) e Sinope (Norte de Turquia, junto ao Mar Negro). Manílio coloca a
Itália e, em especial, a cidade de Roma sob a regência de Balança, referindo,
por um lado, que Roma controla as mais variadas coisas, exaltando e
precipitando as nações nos pratos da balança e, por outro lado, este é signo do
imperador Augusto, que terá nascido a 23 de Setembro de 63 AEC (Astronomica
V,773-77).
O eclipse solar de 14 de Outubro
insere-se na série Saros 134. Esta série iniciou-se a 22 de Junho de 1248 e
terminará a 6 de Agosto de 2510. Começa portanto em Caranguejo (Lua) e finda em
Leão (Sol). A relação entre luz e sombra torna-se, uma vez mais, determinante.
O próximo eclipse da série será a 25 de Outubro de 2041, em Escorpião,
passando-se na série de Vénus a Marte. Existe novamente aqui um jogo de
polaridades que também se encontra no tema do actual eclipse: o caminho
descendente em que se insere a sizígia obscurecida estende-se também de Marte
em Escorpião até Vénus em Virgem. De outra forma e considerando-se apenas
Balança, o actual eclipse é o segundo da série a ocorrer de forma seguida neste
mesmo signo. O primeiro foi a 3 de Outubro de 2005. Os dois primeiros eclipses
totais da série 134 também se deram em Balança: a 9 de Outubro de 1428 e a 20
de Outubro de 1446. No entanto, a máxima interpretativa que se deve seguir é de
que o primeiro eclipse de uma série Saros e
o seu tema astrológico servem de matriz para toda a série, é o seu tema
genetlíaco.
A
22 de Junho de 1248, o Sol e a Lua estavam em Caranguejo, como já foi referido,
bem como Neptuno, Marte e Mercúrio em Leão, Saturno e Plutão em Escorpião,
Júpiter e Caput Draconis em Sagitário, logo a Cauda está em Gémeos, Úrano em
Aquário e Vénus em Touro.
Se
pensarmos que este eclipse ocorreu no início do segundo quartel do século XIII,
numa época de profundas alterações políticas, socias, religiosas, espirituais e
culturais, estes elementos astrológicos tornam-se mais evidentes. Temos, por
exemplo, a fundação do império Mongol, do qual é preciso destacar o cerco de
Bagdad e a destruição da Casa da Sabedoria, mas também a criação da Inquisição.
Na data do eclipse inaugural desta série, é lançada a sétima cruzada pelo rei
de França Luís IX. A tensão nesta região estende-se até hoje, até ao conflito
israelo-palestiniano. Por outro lado, o rei Fernando III de Leão e Castela
recupera Sevilha aos Almóadas. Já de um ponto de vista religioso, a capela gótica
de Sainte-Chapelle é finalizada e consagrada com a cora de espinhos, uma relíquia
concedida pelo imperador de Constantinopla Balduíno II. Uns meses mais tarde é
colocada a pedra inaugural da Catedral de Colónia, depois da igreja antiga ter
ardido.
Séneca
afirma que “A luz distingue-se do reflexo por ter a sua origem em si mesma,
enquanto o reflexo brilha com luz alheia; a mesma diferença separa os dois
tipos de vida: a vida mundana tira o seu brilho de circunstâncias exteriores, e
o mínimo obstáculo imediatamente a torna sombria; a vida do sábio, essa brilha
com a sua própria luminosidade!” (Ep.21.2; Cartas a Lucílio, 2ª ed,, trad. J. A.
Segurado e Campos, 2004: 74. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian). Ora
esta é, em certa medida, a matriz de sentido da série 134 e que se assume, de
forma bastante expressiva, no eclipse de solar de Outubro. Os factores de
intolerância política e religiosa, construídos sob o apelo da construção de
novas verdades, estenderam-se até hoje. No eclipse inaugural, a conjunção da
sizígia com Neptuno em Caranguejo, de Marte e Mercúrio em Leão, de Plutão e
Saturno em Escorpião, estando estes em quadratura a Úrano em Aquário, e de
Júpiter e da Caput Draconis em Sagitário são, de facto, sinais da promoção de
uma luz alheia como luz verdadeira. A humanidade tende a confundir-se com
sombras, ignorando a luz que brilha solitária e incógnita.
Paralelamente, a análise do eclipse
de dia 14 deve considerar, primeiramente, dois vectores que estão muito
marcados e que se estabelecem, de um ponto vista astrológico e de modo radical,
o caminho luminar descendente que se alonga entre Marte em Escorpião e Vénus em
Virgem, entre um deus da guerra domiciliado e uma deusa do amor em queda. Este
via obscurecida é mediada pela sizígia umbral em Balança e que coloca sob os
seus raios negros Mercúrio e a Cauda Draconis. Ora este caminho, e tendo em
mente a regência de Balança, trará problemas sérios às democracias e, em
especial, aos poderes parlamentares. A situação norte-americana é um bom exemplo,
todavia, a situação é bem mais ampla e para isso basta observar o galgar
mediático da extrema-direita populista e o carnaval que tem promovido nos
vários parlamentos europeus. Na América do Sul, encontramos também exemplos
semelhantes. A forma como o populismo confiscou os media constrói-se igualmente
nesta premissa.
Por outro lado, a conjugação desta
via com a oposição entre Marte em Escorpião a Júpiter e Úrano em Touro, bem
como a ligação destes a Saturno e Neptuno em Peixes (trígono e sextil) e a
Plutão em Capricórnio (sextil e trígono), conduzirá inevitavelmente a desastres
naturais, muitos deles particularmente destrutivos. Esta interpretação
astrológica não é catastrofista, é sim realista, pois os sinais são evidentes.
No caso português, e tendo em conta que o tema em análise foi elaborado para
Lisboa, é impossível não vislumbrar a aproximação de um grande sismo. O período
que circunscreve o actual eclipse, o eclipse solar total de 2 de Agosto de 2027 e o
eclipse solar anular de 26 Janeiro de 2028 é crítico, sobretudo pelo facto do manto umbral
destes dois últimos passar pelo epicentro do Terramoto de 1755 e pelo
paralelismo simbólico com esta série Saros. Colher estes sinais é difícil, mas
não os devemos temer. Na astrologia, como na vida, nem tudo são arco-íris.
No tema do eclipse, Plutão é o astro
mais alto e o sextil deste a Marte em Escorpião, os dois regentes deste signo,
adensam a sua acção. No entanto, considerando-se o futuro ingresso de Plutão em
Aquário, devemos ressalvar que a actividade destrutiva de Plutão não se limitará
ao signo de Capricórnio. A sua passagem por Aquário trará transformações que
não acontecerão connosco de mãos dadas, inspirando incenso e entoando mantras.
Plutão não actua desta forma. Lembremo-nos que é o regente moderno de Escorpião
e que olha quadrangularmente para Aquário, que é regido por Saturno (convém não
esquecer) e por Úrano, ou seja, existe tensão nestas duas naturezas. Por outro
lado, o facto de o tema do eclipse, para a hora de Lisboa, estabelecer-se de
acordo com a ordem vernal coloca Marte em Escorpião, na VIII, no lugar da
Morte. Esta posição dará uma força suplementar ao Senhor da Guerra e à sua
natureza primordial. Note-se também que o anterior novilúnio estabeleceu-se
segundo a ordem do Thema Mundi, o que confere um carácter radical e
estruturante e uma continuidade aos dois eventos astrológicos.
Este eclipse coloca naturalmente uma
sombra sobre o signo de Balança, obscurecendo o seu potencial e adensando as
suas qualidades negativas. Mercúrio estará sob esta influência contrária, trazendo
uma expressão disruptiva à palavra e ao conhecimento. Não existirá portanto na
comunicação um palco para a concórdia, bem pelo contrário. A presença da Cauda
Draconis contrai, sob a égide do destino, o peso, a gravidade, da desmedida. A
humanidade cai diante dos seus próprios erros. O grande maléfico, Saturno, traz
consigo e com o seu companheiro de viagem, Neptuno, as feridas da Fortuna,
sempre visíveis aquando do fim de um ciclo. Em Peixes, a pressão ou libertação
que a totalidade confere torna-se realidade. Carneiro começa a subida da
montanha, Capricórnio com o sentido de finalidade alcança o cume e Peixes
senta-se e contempla a visão do mundo. Ora a acção, a finalidade e a totalidade
são algumas das etapas da nossa viagem, individual e colectiva. Saturno
pede-nos uma visão desempoeirada do mundo, liberta das amarras, das feridas,
das vaidades, das paixões desse nosso caminho (sextil de Saturno e Neptuno a
Júpiter e Úrano). No entanto, essa visão é extremamente difícil, sobretudo na
actualidade, pois Saturno pede-nos para manter os olhos abertos,
contemplativos, no meio de uma tempestade de areia. Neptuno, por seu lado,
continua a alertar-nos para a necessidade de uma imaginação criativa e de uma
vida compassiva, integrando a fantasia no sonho e não na ilusão. Este
relembra-nos também que existem humanos de primeira e humanos de segundo.
Por entre as sombras, é preciso,
porém, saber colher as bênçãos. Procurá-las e encontrá-las, mesmo que seja por
entre as cinzas. Vivemos tempos de guerra, de destruição e, por necessidade, de
transformação. Os perigos, mais do que à espreita, circulam à nossa frente,
todavia, existem sempre bênçãos. De uma perspectiva astrológica, mas também
filosófica, para cada maléfico existe um benéfico e ao lado de cada sombra
existe sempre luz. Temos de observar portanto Vénus e Júpiter. A posição dos
benéficos não é contudo das mais favoráveis: Vénus está em queda e Júpiter
retrógrado. Mas unem-se em trígono, dizendo-nos que a necessidade tece a vida
electiva do bem. Vénus encontra-se fechada em si mesma, distante do mundo. Face
à acção humana, o eterno feminino recuou e a Deusa escondeu-se.
A oposição de Vénus em Virgem a
Saturno e Neptuno em Peixes revela, como ferida do tempo e do destino, o peso
da retribuição, desse afastamento. Porém, o trígono de Vénus em Virgem e
Júpiter em Touro a Plutão em Capricórnio traz-nos, de acordo com a ordem tempo
e da providência, uma era que conjuga a vingança de Gaia com o renascimento de
Gaia. A natureza encontra caminho, já o humano pode perder-se na estrada da
realidade. O sextil de Vénus a Marte e de Júpiter a Saturno exemplifica, uma
vez mais, essa justaposição de bem e mal, de luz e sombra. A liberdade humana
não está nos acontecimentos, está sim nesta escolha.
O eclipse solar de 14 de Outubro, no signo de Balança, vem colocar a sombra sobre a harmonia dos contrários, ocultando a luz da concórdia. Este manto umbral vai dar-nos, como síntese do tempo, a retribuição, o preço da nossa desmedida. Só caminhando pela sombra chegaremos à luz.
sábado, 23 de setembro de 2023
quarta-feira, 23 de agosto de 2023
domingo, 23 de julho de 2023
quarta-feira, 21 de junho de 2023
domingo, 21 de maio de 2023
sexta-feira, 5 de maio de 2023
Reflexões Astrológicas 2023: Eclipse Lunar Penumbral (Lua Cheia: Touro-Escorpião)
Reflexões Astrológicas
Eclipse Lunar Penumbral
(Lua Cheia:
Touro-Escorpião)
Lisboa, 18h23min, 05/05/2023
Lua
Decanato: Sol
Termos: Mercúrio
Monomoiria: Marte
Sol
Decanato: Lua
Termos: Júpiter
Monomoiria: Vénus
O Eclipse Lunar Penumbral de dia 5
de Maio ocorre com a Lua no signo de Escorpião e o Sol no de Touro, com Balança
a marcar a hora e a cerca de duas do pôr-do-sol (hora de Lisboa), logo no
Segmento de Luz (αἵρεσις) do Sol, estando este acima do
horizonte, na VIII, no lugar da Morte (θάνατος), já a Lua está abaixo do horizonte, na II, no lugar do Viver
(βιός).
A Lua encontra-se no decanato do Sol, nos termos de Mercúrio e monomoiria de Marte, enquanto o Sol encontra-se
no decanato da Lua, nos termos de Júpiter e monomoiria
de Vénus. Se pensarmos que, da Lua até ao Ponto de Culminação, não existe
nenhum astro, concluímos então que é o caminho luminar em que Sol se insere, e
que é por si dominado, que se torna mais significativo, pois de uma forma mais
abrangente é aquele que vai de Marte em Caranguejo a Júpiter em Carneiro ou, se
preferirmos uma maior simbólica cadente, dado que Marte está junto à
Culminação, será aquele que vai de Vénus em Gémeos a Júpiter em Carneiro. Este
é o caminho dos benéficos, ou do bem, rumo ao Poente, onde o Sol se encontra
obscurecido. Neste ocaso da realidade, a acção do bem vive na sombra.
Existe uma clara aproximação de
sentido entre este eclipse e o anterior eclipse solar, visto que, por um lado,
Balança marca a hora no actual eclipse e este é um dos signos que integra o
eixo para o qual avançará o eixo nodal e marcará a próxima fase de eclipses, iniciada
com o eclipse de dia 20 de Abril, e, por outro lado, a Lua recai nos dois
eclipses na II, no Lugar do Viver (βιός), exacerbando a sua significação
tópica. É igualmente assinalável o facto de em ambos os eclipses a Lua se
encontrar sob o horizonte. A ocultação luminar, seja pela sua visibilidade ou,
neste caso, também pela sombra do eclipse, adquire sempre um simbólica radical,
um valor que transmite uma representação profunda da realidade. Ora a ocultação
da Lua, da Deusa, do Espírito Santo ou do Divino Feminino, num lugar que
determina o valor do viver, assume um carácter primordial de transformação, ou
seja, diz-nos que, na sombra, sob o manto da nossa ignorância, se encontra
aquilo que nos falta, a fonte da nossa angústia, da nossa incompletude. Não
provimos aquilo verdadeiramente nos sustem.
A área geográfica do actual eclipse
é maior que a do eclipse solar, embora semelhante. A zona principal incide
sobre a Ásia e sobre a Oceânia, expandindo a influência do eclipse de dia 20 de
Abril. A segunda zona alcança, já de forma parcial, África e a Europa. No caso
de Portugal, este manto chega sensivelmente até ao Tejo, ou seja, cobre apenas
metade do país. Se seguirmos, porém, a tradição antiga, a Lua em Escorpião fornece-nos
um conjunto de informações adicionais. Valente diz-nos que Escorpião rege a Metagonitis
ou Numídia (Norte de África, Argélia e Tunísia), a Mauritânia, a Getúlia (Norte
de África, Argélia e Tunísia), a Síria, Comagena (Ásia Menor), a Capadócia,
Itália, Cartago, Líbia, Amom (Jordânia), Sicília, Espanha e Roma. Já para Manílio
Escorpião rege Cartago, a Líbia, o Egipto, Cirene, a Itália e a Sardenha (Astronomica IV, 777-82).
No entanto, devemos também
considerar o Sol em Touro, embora com uma menor expressão geográfica. Segundo Vétio Valente (Antologia I, 2), vai reger as regiões da Média (o actual noroeste do Irão,
o Azerbaijão, o Curdistão Iraniano e o Tabaristão ou Mazandarão), da Cítia
(Irão, mas também uma área que se estendeu da Bulgária às fronteiras da Rússia,
Mongólia e China), do Chipre, da Arábia, da Pérsia e das montanhas do Cáucaso,
da Samártia (junto à Média), de África, de Elymais ou Elamais (Cuzistão,
província do Irão), de Cartago, da Arménia, da Índia e da Germânia. Para
Manílio, Touro rege Cítia, a Ásia (por causa dos Montes Tauro) e a Arábia. (Astronomica, IV, 744-817). No caso dos eclipses lunares, a
questão da influência geográfica é deveras importante, já que, no seu período
de influência, encontramos frequentemente a existência de fenómenos naturais
extremos, tais como sismos, erupções vulcânicas ou tempestades.
Em termos temporais, a acção deste
eclipse pode ser fixada entre perto dos dois meses até aos seis ou sete meses.
O período de cerca de dois meses pode ser estabelecido a partir da ascensão
recta, enquanto a linha temporal mais extensa é alcançada pela extensão
temporal dos contactos umbrais. No entanto, podemos afirmar que a sua
influência será mais intensa nos dois meses que se seguem ao eclipse. Existe,
porém, um outro factor a ter em consideração acerca desta influência, pois,
segundo a série Saros em que está inserido, este eclipse está intimamente
ligado ao eclipse da mesma série que acontecerá a 16 de Maio de 2041, também no
eixo Escorpião-Touro. Os sentidos propostos pelo actual eclipse criam uma ponte
significativa entre os dois eclipses, estendendo assim a sua proposta de representação
da realidade.
A série Saros 141 é uma série
relativamente recente que se iniciou a 27 de Agosto de 1608, com eclipse no
eixo Peixes-Virgem, e que terminará a 11 de Outubro de 2888, com um eclipse no
eixo Carneiro-Balança. O primeiro eclipse total só acontecerá em 2167 com um eclipse
no eixo Aquário-Leão. Nesta série, dado o primeiro e o último eclipse, existe
uma união de sentido entre o fim e o início, entre a significação dos dois
eixos. Esta ideia matriz serve, face ao actual eclipse, a consolidação, a
integração na consciência humana que a Natureza é um ser vivo, com alma, que
nasce, morre e renasce. O eixo Escorpião-Touro está a oferecer-nos uma profunda
lição acerca do valor da Terra, da Mãe-Terra. Marco Aurélio diz-nos o seguinte:
“Contempla o curso dos astros como se
levado foras nas suas revoluções, e considera de contínuo como os elementos se
transformam uns nos outros. Tal contemplação purifica-nos das nódoas da terra.”
(Pensamentos VII, 47, trad.
J. Maia. Lisboa: Relógio D’Água, 1995).
Fomos nós que colocámos as “nódoas da terra” e somos nós que as temos de
tirar.
O início da série Saros 141 é
marcado por alguns acontecimentos em torno da fundação da colónia americana de
Jamestown. A 13 de Agosto de 1608 é submetida para publicação a história dos
primeiros dias da colónia de John Smith e, a 10 de Outubro, este é eleito
presidente do conselho colonial. A história de John Smith e de Pocahontas é um
exemplo de aceitação do outro, da diferença e de criar laços afectivos com
alguém que a maioria tende a rejeitar. Face à crise dos refugiados, da pobreza
e das desigualdades sociais, o simbolismo por detrás desta história torna-se imperativo.
Podemos encontrar astrologicamente esse sentido no trígono que, hoje, une os
astros nos três signos de água. A sua significação congrega a tensão e a possibilidade.
Séneca
afirma o seguinte: “Pensa bem como esse
homem que chamas teu escravo nasceu da mesma semente que tu, goza do mesmo céu,
respira, vive e morre como tu. Tanto direito tens tu a olhá-lo como homem livre
como ele a olhar-te como escravo” (Ep.47.10;
Cartas a Lucílio, 2ª ed,, trad. J. A. Segurado e Campos. Lisboa, 2004:
Fundação Calouste Gulbenkian). Ora este é também o espírito da Saturnália
e de Saturno (e Neptuno) em Peixes.
A
refundação da justiça social e das estruturas políticas, económicas e sociais
estará intimamente relacionada com o medo de feminino que se apresenta com
Marte em Caranguejo. A respeito de Marte convém referir-se que é o astro mais
alto, em conjunção ao Ponto de Culminação. Este factor, aliado à posição de
Plutão retrógrado em Aquário, junto ao Ponto Subterrâneo, embora em posição
pós-polar e noutro signo, vai colocar sob pressão os fenómenos naturais
extremos. O trígono de Água apresenta, neste eclipse, um sentido profundo. O
medo de feminino é um sinal dos tempos, mas a forma abusiva como utilizamos os
recursos do planeta também o é, e sobre estes dois eixos de acção e reacção
vive a morte, a retribuição e a necessidade. A sombra do eclipse, com a Lua em
Escorpião, revela-nos que, face à gravidade da desmedida, será apenas sob a
terra queimada, sob as cinzas da história, que o renascimento acontecerá. O
tempo pede, novamente, que os escravos se ergam e se tornem senhores. Essa é,
como já observámos, a lição de Saturno em Peixes e que agora se une à do
eclipse lunar.
A
quadratura de Plutão em Aquário aos luminares e ao Dragão da Lua, a partir do
lugar da Boa Fortuna, confirma a sua mensagem fundamental de que a morte paira
sobre o humano e de que a semente do amanhã repousa ainda sob a terra, oculta
no ventre da Grande Mãe. Não existe criação sem destruição. Essa é a ideia que
nos deve servir de guia e que contribuirá para nos redimensionarmos. Os
complexos humanos de super-homem deverão cair, pois a actividade humana tem
sido exacerbada por um narcisismo desenfreado que quer que esqueçamos a nossa
finitude, a nossa incompletude. É esvaziando-nos que nos tornámos plenos. O
trígono de Vénus em Gémeos, no lugar do Deus Sol, a Plutão em Aquário indica a
palavra do Amor que vence a dualidade, a separação. Porém, é sempre mais fácil
distinguir do que congregar. Se por vaidade dizemos que reunimos, estamos a
apenas a criar mais separação. A quadratura de Vénus a Saturno e Neptuno aponta
para essa dificuldade. A teia que une a necessidade e a compaixão, criando
possibilidade e redenção, exige esforço. Temos de primeiro nos perder, para
depois nos encontrarmos, renovados e renascidos.
Na
casa da Grande Mãe, da Mãe Natureza, que é o signo de Touro, o Sol, Mercúrio, Úrano
e a Caput Draconis expressam uma mensagem que se firma no ocaso da realidade.
Fundar um novo modo de vida quando tudo o que se vê é morte é o desafio dos nossos
tempos. A qualidade da morte alia-se aqui à noção de poente. O caminho de Júpiter
em Carneiro avança para o seu fim, o que, neste tema, assume literalmente esse término.
A acção do bem tornar-se-á a bondade da terra. Júpiter em Touro chegará com a dádiva
de Gaia. Porém, a actual quadratura entre Júpiter em Carneiro e Marte em Caranguejo
revela esse mesma dificuldade de acolher os dons da terra e do feminino. Neste eclipse
lunar, este choque entre o grande benéfico e o grande maléfico assume um carácter
de definição e prenúncio. A par do trígono de Água e do eixo do eclipse, este é
um símbolo do futuro que resume a mensagem da actual ocultação luminar.
O
eclipse lunar de dia 5 de Maio, como lhe é natural, mas aqui um pouco mais acentuado,
vai trazer consigo um conjunto de sentidos subliminares, como se sibilados pela
Senhora do Tempo e da Necessidade. Nem tudo é literal, directo ou evidente, existem
pois sentidos que preenchem a trama de um tear. A união de Júpiter em Touro e Saturno
em Peixes, bem como a longa travessia de Vénus em Leão, assinalam uma era do feminino
e o actual eclipse é a sombra que antecede a luz. Em suma, é sobre a sombra que
se guarda a luz e iluminado é aquele que guarda a centelha da sabedoria.