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sábado, 6 de setembro de 2025

Reflexões Astrológicas 2025: Eclipse Lunar Total (Lua Cheia Peixes-Virgem)

 Reflexões Astrológicas

Eclipses 




Eclipse Lunar Total

(Lua Cheia: Virgem-Peixes)   

Lisboa, 19h12min, 07/09/2025

 

Lua

Decanato: Júpiter 

Termos: Júpiter

Monomoiria: Lua       

 

Sol

Decanato: Vénus

Termos: Vénus

Monomoiria: Marte   

 

  O Eclipse Lunar Total de dia 7 de Setembro ocorre com a Lua no signo de Peixes e com o Sol no de Virgem, com Aquário a marcar a hora e a cerca de uma hora e meia do pôr-do-sol (hora de Lisboa), logo no Segmento de Luz (αἵρεσις) do Sol, estando este acima do horizonte, na VIII, no lugar da Morte (θάνατος), já a Lua está abaixo do horizonte, na II, no lugar do Viver (δύσις). A Lua encontra-se pois no decanato e nos termos de Júpiter e na sua monomoiria, enquanto o Sol encontra-se no decanato e nos termos de Vénus e na monomoiria de Marte.

  No caso das dignidades, afirma-se o facto de os luminares serem regidos, tanto no decanato como nos termos, pelo benéfico que rege o segmento de luz contrário, ou seja, Vénus para o Sol e Júpiter para a Lua. Daqui que se depreende um certo reforço benéfico da qualidade dos lugares onde se encontra o eixo umbral. No entanto, convém salientar-se que, devido a troca de regências, essa valoração do bem só ocorre se o feminino integrar o masculino e o masculino, o feminino. Esta inversão de regentes serve pois um sentido profundo.

  Os eixos umbral e nodal encontram-se no eixo de sentido da integração, existindo assim uma união significativa entre a sombra do eclipse e a integração do todo (Peixes) na parte (Virgem), uma vez que a Lua se encontra em Peixes. No δωδεκατόπος (doze lugares), a Lua encontra-se no lugar do Viver, βίος (II). Paulo de Alexandria designa este lugar de Porta do Hades, ιδου πύλη (Introdução, cap. 24), devido à sua posição junto ao Ascendente e abaixo do horizonte. Encontramos o valor do modo de vida e da morte neste eixo (II-VIII), pois como diria Trasilo, a II é um “indicador de esperanças”, ἐλπίδων σημαντικήν (CCAG VIII/3: 101.20), já a VIII é nas palavras de Paulo de Alexandria indicadora da “realização da morte”, θανάτου τελευτήν (Introdução, cap. 24). Consequentemente, os sentidos cruzados de todos estes eixos ganham uma unidade significativa.

  É necessário também considerar-se a ponte de sentido no eixo Peixes-Virgem que se estabelece entre o actual eclipse lunar e o eclipse solar de dia 21 de Setembro. Em certa medida, neste ano de 2025, o sentido já havia sido iniciado pelo eclipse lunar de 14 de Março, todavia, é neste período de 7 a 21 de Setembro que a proposta significativa da sombra sobre o eixo de integração se torna mais intensa. Com a sombra a cair sobre a totalidade ou sobre a integração do sentido de totalidade (Lua em Peixes no eclipse lunar), quando o manto umbral cobrir os luminares, a parte poderá sentir uma maior dificuldade de integração tanto da sua própria natureza e condição como do seu lugar no todo. Desta forma, e à semelhança do que se afirmara aquando do eclipse lunar de 14 de Março, o obscurecimento dracôntico recai sobre o sentido da parte e o valor da totalidade. No entanto, no actual eclipse, é o valor da totalidade que se encontra sob uma maior tensão umbral.   

  A integração da totalidade obriga a uma consciência do todo, daquilo que engloba a alma humana na Alma do Mundo. Ora para que isso aconteça o indivíduo deverá primeiramente reconhecer a liberdade da sua própria alma face a tudo aquilo que não lhe diz respeito. Epicteto diz-nos o seguinte: “Ao vires alguém preferido em honras, ou muito poderoso, ou mais estimado, presta atenção para que jamais creias – arrebatado pela representação – que ele seja feliz. Pois se a essência do bem está nas coisas que são encargos nossos, não haverá espaço nem para a inveja, nem para o ciúme. Tu mesmo não irás querer ser nem general, nem prítane ou cônsul, mas homem livre. E o único caminho para isso é desprezar o que não é encargo nosso.(Encheiridion 19b, trad. A. Dinucci & A. Julien, 2014: 46-7. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra). A sombra na totalidade pisciana é um alerta para a dificuldade de ver esta liberdade e de encontrar a felicidade apenas naquilo que é encargo nosso. Sê feliz porque amas e grato porque és amado. Existe aqui uma diferença substancial entre o amor que damos que depende de nós, e que por isso resulta em felicidade, do amor recebido que depende do outro, e logo deverá gerar gratidão.

  A integração da parte no todo e do todo na parte está, como podemos observar nesta máxima de Epicteto, intimamente relacionada com a liberdade que é fixarmos a nossa existência apenas naquilo nos compete, mas com um outro aspecto enunciado por Séneca. O filósofo diz-nos o seguinte: “Frequentemente dá-se o caso de um exército temer o inimigo sem motivo e de o itinerário que lhe parecera mais perigoso ser afinal o mais seguro. A ignorância, essa, está sempre em sobressalto; os perigos assaltam-na quer de cima quer de baixo; à direita e à esquerda há razões de pânico; os perigos quer a atacam pelas costas quer se lhe levantam na frente; qualquer situação a enche de medo, a encontra impreparada, a tal ponto que o próprio socorro a apavora! O sábio, porém, sempre alerta, sempre pronto a responder a qualquer assalto, não recuará um passo mesmo que sobre ele caiam a pobreza, a desgraça, a ignomínia ou a dor; impertérrito, o sábio afrontará estes males, passará pelo meio deles.” (Ep.59.8; Cartas a Lucílio, 2ª ed,, trad. J. A. Segurado e Campos. Lisboa, 2004: Fundação Calouste Gulbenkian).

  O comportamento do sábio, oposto ao daquele que se move por ignorância, é essencialmente uma integração da parte no todo e uma consciência da totalidade. Ao observarmos a acção do sábio, vemos que este cruza uma visão holística com o olhar da montanha, daí que não se deixe perturbar. A premeditação do mal serve o sábio que, contemplando o mal possível, se preparara para todas as suas vicissitudes. Ora, num eclipse como o actual, as duas propostas, a de Epicteto e de Séneca, estão ameaçadas. A sombra invade o carácter humano e impede esta integração. A parte segue a parte em vez de entrar no mar da totalidade.

  O derradeiro ingresso de Saturno em Peixes que só daqui a quase três décadas voltará a este signo veio adensar o peso da necessidade sobre o manto umbral. As estruturas conservadoras, por um lado, e a dificuldade de integração dos valores piscianos, por outro lado, confirmam o peso de um mundo em decadência. Assistimos no conforto dos lares dos países mais desenvolvidos a um genocídio, no qual a fome se tornou arma de guerra, levado a cabo por um estado intocável. A alegada dívida histórica está a ser cobrada com a vida de inocentes, sobretudo crianças, e nós permitimos. É a total anulação do humanismo e dos valores essenciais e primitivos do cristianismo. O actual eclipse que, para o tema de Lisboa, faz justamente a Lua cair no lugar do Viver (II), do valor da vida, e devia servir de alerta, neste caso aos portugueses, para a cumplicidade desumana da sua inacção.           

  A influência geográfica do eclipse de dia 7 tem o seu centro no Oceano Índico, ao largo do Sri Lanka e à entrada da Baía de Bengala. O manto umbral e penumbral alastrar-se-á pela Ásia, pela África, pela Europa e pela Austrália. Segundo as regências geográficas antigas, Vétio Valente (Antologia I, 2) diz-nos que Peixes exerce influência sobre o Eufrates e o Tigre, a Síria, o Mar Vermelho e o Mar Arábico, a Índia, a Média-Pérsia e as regiões circundantes, o rio Borístenes ou Boristene (Dniepre), a Trácia, a Ásia e a Sardenha. Manílio, por seu lado, concede a Peixes o Eufrates, o Tigre e o Mar Vermelho, as terras da Pártia, a Báctria, a Etiópia, a Babilónia, Susa e Nínive (Astronomica IV, 800-6). Já Virgem rege a Mesopotâmia, a Babilónia, a Grécia, a Acaia (Grécia), Creta, Cíclades (Grécia), Peloponeso, Arcádia, Cirene (Líbia), Dória (Grécia), Sicília e Pérsia ou Parsa (Irão). Manílio, por seu lado, afirma que a Jónia (Turquia), a Cária (Turquia), Rodes e a Grécia estão sob a sua influência (Astronomica IV, 763-8).

  A influência temporal será, devido à duração do período total, de cerca de um mês e meio. No entanto, dada à duração do período umbral, poderá estender-se até cerca de três meses e meio e de uma forma já ténue, sustentada no período penumbral, poderia ir até ao limite de cinco meses e meio, o que estaria em concordância com o cálculo baseado nas declinações dos luminares. Devemos numa análise da influência temporal voltar a reforçar que, no período até ao eclipse solar de dia 21 de Setembro, o sentido profundo deste eclipse terá uma maior intensidade que progressivamente irá diminuindo.

  É necessário frisar, uma vez mais, a ligação que existe entre os eclipses lunares e as dinâmicas do planeta Terra, nomeadamente o que designamos por desastres naturais. Dada a natureza deste eclipse, podemos observar, por exemplo, como o tufão Kajiki no Vietname foi um prenúncio da sua sombra. Os sismos e tempestades com origem no mar estão potenciadas, podendo originar tsunamis e tufões. A lua em Peixes, com a regência moderna de Neptuno, agora em Carneiro com uma força mais destrutiva, e com o Júpiter, regente antigo ou tradicional, em Caranguejo, outro signo de água e com o qual forma um trígono, potencia estes fenómenos. A co-presença da Lua e Saturno também firma uma vibração mais tensa. Lembremo-nos que Cronos/Saturno foi preso no lugar mais profundo do submundo, após ter sido derrotado por Zeus/Júpiter. No Tártaro, lutava contra as correntes que os sustinham, ou seja, fazia vibrar as profundezas da Terra.   

  O eclipse lunar total de 7 de Setembro pertence à série Saros 128, sendo o 41º eclipse de um total de 71. É o 11º eclipse dos 15 eclipses totais da série, o que transmite um certo desenvolvimento da sua proposta significativa. O eclipse inicial, como sabemos, serve de matriz de sentido para toda a série. Ora o primeiro eclipse desta série ocorreu a 18 de Junho de 1304 (Calendário Juliano). A Lua estava em Capricórnio e o Sol em Caranguejo e o Dragão da Lua estendia-se no eixo Sagitário-Gémeos. Mercúrio e Marte estavam em Gémeos, Vénus em Touro, Júpiter em Leão e Saturno em Balança. Nos transaturninos, Úrano estava em Balança, Neptuno em Escorpião e Plutão em Aquário. Nesta data e na hora de Lisboa, Virgem marcava a hora e Touro culminava. A série Saros 128 terminará a 2 de Agosto de 2566, com um eclipse no eixo Leão-Aquário, ou seja, com a Lua em Carneiro e o Sol em Balança.

  A análise comparada dos dois temas, face ao seu ciclo planetário, faria logo sobressair o facto de Plutão se encontrar em Aquário no eclipse-matriz tal como hoje se encontra. Naturalmente, isto adensa esta ligação entre o signo da humanidade e o planeta da morte. Em tempos sombrios como os que vivemos, resgatar a semente da morte, o memento mori, da consciência do humano recupera esse sentido primário e matricial que encontramos em toda a série Saros. Por outro lado, temos Neptuno em Escorpião e agora em Carneiro, os dois domicílios de Marte recebem o planeta da imaginação. A força de Marte tende, por um lado, a intensificar a imaginação criativa, se for recebida como dom, ou, por outro lado, pode com uma força bélica e disruptiva trazer uma ilusão massificada. Os populismos e os avanços da extrema-direita traduzem essa realidade. A ideologia vai-se tornar progressivamente violência.

  Úrano e Saturno em Balança, estando este último na sua exaltação, favorecem a criação e estruturação de modelos de pensamento. Algo que será transmitido pelos raios triangulares ao actual Úrano em Gémeos. A comunicação pede um sentido renovado que tanto pode dar origem a novas formas de conhecimento como de desinformação. Do ponto vista histórico, aquando do eclipse-matriz, é de se assinalar o início do conclave papal, após a morte de Bento XI a 7 de Julho de 1304, que só terminará no ano seguinte, a 5 de Junho de 1305, com eleição de Clemente V e que marcará o início de período conhecido como o Papado ou o Cativeiro de Avinhão (1309-1377). É também de assinalar a primeira guerra pela independência da Escócia.

  O eclipse-matriz revela para um eclipse lunar uma forte influência política e militar. De facto, se pensarmos bem o início do século XIV, marca um período de intensas mudanças tanto políticas como filosóficas e espirituais. A conjunção de Mercúrio, Marte e a Cauda Draconis vai assinalar o carácter disruptivo de muitas dessas transformações. As heresias ou heterodoxias cristãs ou o crescimento do poder do Santo Ofício da Inquisição são dois elementos de destaque, bem como as profundas alterações políticas. O sextil Júpiter em Leão a Saturno e Úrano em Balança é também revelador dessas transições. Um eclipse lunar com a Lua exilada em Capricórnio traz consigo uma forte dinâmica saturnina que lhe confere uma influência semelhante à de um eclipse solar e, sendo um eclipse-matriz, essa significação vai estender-se a toda a série.

  Convém, no entanto, salientar-se que, por neste eclipse a Lua estar em Peixes, vamos encontrar um certo sentido de destruturação desse sentido-matriz. A imersão no todo que o Peixes tende a apresentar com candura vai agora tomar outras formas. A sombra vai apresentar rudemente a despersonalização como inevitável e a ilusão da realidade tornará tudo mais confuso. Lembremo-nos que a sombra vai incidir sobre o signo de Virgem que a guardará até ao eclipse solar. Com Sol e Mercúrio exaltado em Virgem, e com a quadratura a Úrano em Gémeos, tudo o que é representado pela razão, pelo pensamento, pela palavra, pela organização das estruturas comunicacionais está sob pressão. A sombra dracôntica quer levar tudo o que está estabelecido até ao grande oceano e mostrar que aquilo que a mente humana produz não chega a ser um grau de areia na totalidade que é a Alma do Mundo e o seu Intelecto.    

  Se de Peixes vem uma totalidade assombrada, Júpiter em Caranguejo com o trígono à Lua, a Saturno e à Caput Draconis e o sextil ao Sol, a Mercúrio e à Cauda Draconis vem contribuir com a expansão do sentido da origem. Na verdade, a totalidade e a origem são duas expressões ou conceitos para a mesma realidade inefável que não cabe em nenhum conceito. Esta é, porém, a via para conhecimento de si. O Eu perde-se na totalidade do oceano da origem e surge renovado como o Si. A dificuldade para o humano é o medo de entrar no oceano e perder-se. Está tão agarrado ao que julga ser importante que não vê que ao perder-se encontra-se. Terá pois de olhar para o fundo do mar e encarar as sombras que se movem na escuridão.    

  Marte em Balança, exilado, ameaça as estruturas relacionais, contudo, o sextil a Vénus em Leão e a quadratura a Júpiter em Caranguejo trazem alguma moderação ou progressividade a disrupção interpessoal. O trígono entre Vénus em Leão e Neptuno em Carneiro contribui também com certa elevação do fogo do amor, se for vivido dessa forma. Vénus em Leão pode elevar o amor na beleza de alma nobre ou pode afundá-la num narcisismo patológico. Algo que pode ser potenciado, para o bem e para o mal, pela oposição a Plutão em Aquário. Os trígonos de Úrano em Gémeos e Plutão em Aquário a Marte em Balança trazem, sob a égide do destino, uma força transformadora à forma que como lemos e pensamos a realidade. Essa força não é, porém, voluntária, pois traz consigo os ditames da providência e necessidade.   

  Se considerarmos a sistema antigo de leitura de aspectos, ou seja, pelos conceitos de aplicação e separação, temos de destacar três deles pela força da aplicação. Primeiramente, o trígono entre Júpiter exaltado em Caranguejo e Saturno em Peixes que traz consigo a dádiva da Água. Depois, a quadratura de Saturno em Peixes a Úrano em Gémeos e o trígono entre Úrano e Plutão em Aquário são, na verdade, duas faces da mesma moeda. O primeiro traz, com alguma tensão, a criação de novas estruturas e a necessidade de romper com certas formas de estar e pensar, já o segundo que se estenderá ao longo de vários anos marcará esse ponte de sentido entre revolução e transformação, entre progresso e morte. Se pensarmos que nestes dois aspectos Úrano está presente, este é o vendaval do Anjo da História.

  O eclipse lunar total de 7 de Setembro encerra assim um sentido intermédio entre o eclipse de lunar de 14 de Março e o eclipse solar de 21 de Setembro. Em 2025, a sombra alongar-se-á no eixo Virgem-Peixes, no eixo de integração da parte no todo, e com um foco particular no signo de Virgem. Não devemos portanto perder esta oportunidade enquanto humanidade de colher as suas lições. Se esquecermos a solidariedade, o melhor do humano, viveremos sempre na escuridão.       

sábado, 24 de maio de 2025

Reflexões Astrológicas 2025: Saturno em Carneiro

 Reflexões Astrológicas

Ingressos



Saturno em Carneiro

Lisboa, 04h36min, 25/05/2025

 

Saturno

Decanato: Marte

Termos: Júpiter

Monomoiria: Marte    

 


   O primeiro ingresso de Saturno em Carneiro ocorre com o próprio Carneiro a marcar a hora (hora de Lisboa) e, deste modo, na I, no Leme (οἴαξ) do tema, no decanato de Marte, nos termos de Júpiter e na monomoiria de Marte. O ingresso dá-se assim acima do horizonte, com Saturno em pós-ascensão, e cerca de uma hora e trinta minutos antes do nascer-do-sol. Saturno encontra-se, deste modo, desfavorecido por estar no segmento de luz da Lua (αἵρεσις) e acima do horizonte.

   Se considerarmos a ordem vernal, percebemos logo a importância deste ingresso, pois inicia-se aqui um novo ciclo de cerca de vinte e nove anos e meio. Já se distribuirmos as posições planetárias de acordo com o Thema Mundi, Saturno fixará então o seu ingresso na X, no lugar da Práxis (πράξις), logo definir-se-á como particularmente activa a influência deste planeta no signo de Carneiro, um signo que, por ser o domicílio de Marte e a exaltação do Sol, já encerra esta significação.

   Pelas razões já abordadas na reflexão acerca do ano astrológico de 2025, Saturno terá uma influência bastante expressiva ao longo do ano. Desta forma, devemos sistematizar as efemérides de Saturno ao longo dos próximos tempos. O primeiro ingresso de Saturno em Carneiro ocorre de 25 de Maio a 1 Setembro. Nesta última data, Saturno voltará a Peixes, onde ficará até 14 de Fevereiro de 2026. O segundo ingresso em Carneiro será até ao fim da sua passagem por este signo, ou seja, de 14 de Fevereiro de 2026 a 13 de Abril de 2028, quando ingressará em Touro. Vão observar-se também três períodos de retrogradação: o primeiro, de 13 de Julho a 28 de Dezembro de 2025; o segundo, de 26 de Julho a 10 de Dezembro de 2026; e o terceiro e último, de 9 de Agosto de 24 de Dezembro de 2027. Pela sua duração, o primeiro ingresso vai ter o sentido de promotor de um valor primordial, mas também de integração da mensagem do ingresso anterior. Terá de existir, neste ano de 2025 e também no início de 2026, uma ponte de significação entre os sentidos de Saturno em Peixes e os de Saturno em Carneiro.

   Por outro lado, a observação das dignidades permite uma consideração radical do valor desta passagem. Em Peixes, Saturno ocupa o domicílio de Júpiter e a exaltação de Vénus, encontra-se portanto no lugar dos benéficos. Em Carneiro, vai ocupar o domicílio de Marte e a exaltação do Sol. A união dos maléficos tende a ser sempre nociva, sobretudo se pensarmos que um pertence ao segmento de luz do Sol (Saturno) e o outro, ao da Lua (Marte). Já quando se dá a união dos benéficos a complementaridade Sol-Lua torna-se um sinal de dádiva, de harmonia dos opostos. O facto dos primeiros termos de Carneiro pertencerem a Júpiter é também aqui significativo, sobretudo pela análise do ingresso de Júpiter em Caranguejo. Em síntese, com o ingresso de Saturno em Carneiro, devemos observar com maior atenção, tendo em conta as dignidades essenciais, as suas relações com Marte (domicílio, primeiro decanato e primeira monomoiria), com o Sol (exaltação, sobretudo quando chegar ao grau 19) e com Júpiter (primeiros termos).

   No caso do Sol, este encontra-se em Gémeos aquando do ingresso de Saturno em Carneiro, unindo-se assim hexagonalmente aos seus raios. Depois, convém atentar-se ao seu grau de exaltação, tanto quando Saturno chegar a ele como quando for a vez do Sol. No entanto, é entre Marte e Júpiter que se deve fixar mais atentamente um olhar crítico. Ora Marte encontra-se em Leão, olhando triangularmente para Saturno em Carneiro. Porém, lembrando a lição de Petosíris acerca dos trígonos e das quadraturas, um trígono entre os maléficos continua a encerrar um carácter maligno. A força primária sobre o poder (Marte em Leão) une-se à acção retributiva (Saturno em Carneiro). Se pensarmos nos actuais ímpetos de militarização da sociedade, alimentando as indústrias da guerra, e a acção belicosa e desgovernada de muitos líderes, este aspecto pode agudizar essas pulsões. Já Júpiter encontra-se em Gémeos, olhando hexagonalmente tanto para Marte como para Saturno e fomentando alguns esforços isolados de moderação e diálogo, todavia, será só por alguns dias.

   A 9 de Junho, Júpiter ingressará em Caranguejo e aí formará uma quadratura a Saturno. Por se fixar então a angularidade em signos cardinais, este aspecto vai tornar a relação entre Júpiter e Saturno ainda mais estrutural. Os movimentos nacionalistas e xenófobos vão formar uma maior tensão face às migrações voluntárias e involuntárias e face a um mundo global que querem negar. Júpiter em Caranguejo vai mostrar que paralelemente à pátria existe uma mátria por cumprir. A mátria acolhe todos, pois é uma expressão da Mãe-Terra, da Grande Mãe. Já a pátria constrói-se na vontade de poder que pode ser sempre corrompida. No entanto, quando Saturno regressar a Peixes, formará um trígono a Júpiter em Caranguejo. Este será um momento em que a esperança na humanidade poderá ganhar um novo fôlego, um que alimente os combates futuros. A conjunção dos benéficos, Vénus e Júpiter, em Caranguejo, a 12 de Agosto, será o momento mais elevado dessa expressão. O Divino Feminino concederá a bênção da origem, da Grande Mãe, a quem a reconheça como derradeira esperança da humanidade. A barca de Ísis cruzará de novo o firmamento.

   De um outro modo, a relação de Saturno em Carneiro com os transaturninos também merece alguma distinção. Dos três planetas, será Neptuno aquele que exercerá uma maior influência. A conjunção de Saturno e Neptuno em Carneiro marcará os próximos meses e anos. Esta tende a ser uma co-presença que irá favorecer a confusão das coisas que define o nosso tempo. Saturno cristaliza e Neptuno dispersa são movimentos contrários. Um cria montanhas, o outro, oceanos. Em termos mundanos, esta conjunção vai favorecer o crescimento da extrema-direita, da intolerância, da xenofobia e do racismo, da misoginia e das ilusões que favorecem a guerra e o belicismo. Nesta união, não se encontrará qualquer esforço de harmonia e paz. A mensagem de que serão as armas a nossa salvação continuará a prevalecer e para isso é necessário encontrar inimigos em todo o lado. A ideia de inimigo comum serve sempre de impulsionador de totalitarismos.

   A relação de Saturno com Úrano só acontecerá quando este ingressar em Gémeos, formando assim uma troca hexagonal de raios. Esta ligação favorecerá uma transformação das estruturas e organizações através da tecnologia e da inovação. No entanto, por ser um sextil, os resultados transportam consigo a ambivalência da natureza humana. A inteligência artificial pode ser utilizada como meio de transformar o acesso à informação ou pode corrompê-la, manipulando-a e esvaziando a sua profundidade. A inteligência torna-se um meio e não uma finalidade. De um outro modo, mas complementarmente, o sextil de Saturno (e Neptuno) em Carneiro a Plutão em Aquário vai tentar equilibrar a ponte de sentido entre um dever de acção e a morte no humano. O narcisismo colectivo dos nossos dias tende a esquecer o memento mori dos estóicos, a sabedoria de que sabermos que vamos morrer. Essa é uma fragilidade poderosa.

   Depois de analisadas as principais relações, devemos explorar a natureza deste ingresso e o que leva consigo o planeta ao lugar, sim porque é o planeta que faz o lugar e não contrário. Existe, por vezes, numa certa astrologia contemporânea, a ditadura do signo sobre o planeta. Os deuses de passagem são os planetas e os lugares (signos) são apenas as suas casas ou templos. Saturno, para além da conhecida regência sobre o tempo e a necessidade, traz consigo o sentido de dever que é o outro lado do poder, expresso por Júpiter. Ora o dever é, de uma perspectiva estóica, uma forma de aprendizagem. A filosofia estóica define ἄσκησις como um exercício, um treino ou uma prática que conduz à virtude, à excelência. Neste sentido, é também um modo de vida, uma ascese. Saturno traz esta aprendizagem como dever que se expressa no lugar, no signo de Carneiro, como acção, como prática, ou seja, como uma práxis. Para o estoicismo, esta prática pode ser alcançada com os exercícios espirituais.  

   Séneca oferece-nos este exemplo de exercício espiritual: “Tenho, aliás, tanta vontade de pôr à prova a tua firmeza de alma que, com base nos preceitos de filósofos ilustres, forjaria este outro preceito destinado à tua pessoa: fixa alguns dias intercalados nos quais mates a fome com alimentos exíguos e vulgares, e te vistas com roupa o mais possível grosseira, de modo a comentares para ti próprio: ‘era então disto que eu tinha medo’. A alma deve preparar-se para as dificuldades durante os períodos de tranquilidade, deve-se fortalecer contra as injúrias da fortuna nos períodos em que ela nos sorri.” E continua, dizendo: “Se não queres que um homem entre em pânico perante uma situação concreta, treina-o antes que tal situação ocorra. Este princípio foi posto em prática por aqueles que todos os meses imitavam uma situação de pobreza a tal ponto que atingiram quase a miséria extrema, na intenção de nunca terem de recear o que de uma vez por todas aprendessem a suportar.” (Ep.18.5-6; Cartas a Lucílio, 2ª ed,, trad. J. A. Segurado e Campos. Lisboa, 2004: Fundação Calouste Gulbenkian).

   Outro exercício espiritual é a autoconsciência do erro, expresso do seguinte modo: “Certos indivíduos há que se gabam dos seus vícios: como imaginar que pode pensar em curar-se gente que torna os próprios defeitos como virtudes? Por isso mesmo, tanto quanto possas, acusa-te, move processos a ti mesmo. Começa por fazeres ante ti próprio o papel de acusador, depois o de juiz, depois o de advogado de defesa; e uma vez por outra aplica uma pena a ti mesmo!” (Ep.28.10; Cartas a Lucílio, 2ª ed,, trad. J. A. Segurado e Campos. Lisboa, 2004: Fundação Calouste Gulbenkian). Os exercícios espirituais servem o sentido saturnino de dever. No entanto, é preciso não esquecer que este dever não é para com o exterior é um dever para consigo mesmo.

   A acção proposta pelo signo de Carneiro nasce da sua própria significação de unidade enquanto parte do eixo de identidade (Carneiro-Balança) e, desta forma, confere a Saturno este dever para si consigo mesmo, para uma reflexão proactiva da ponte que é a identidade, ou seja, de uma que se estende entre a unidade e a dualidade. Os exercícios espirituais de premeditação da adversidade e de autoconsciência do erro são exemplos da proposta de ἄσκησις de Saturno em Carneiro.

   Na perspectiva da astrologia mitológica, poder-se-ia dizer que o mito da Titanomaquia é o que melhor define o ingresso de Saturno em Carneiro. Deve-se considerar, de início, o mito que coloca primeiramente como soberanos do céu e da terra Eurínome e Ofião. O poder passaria depois para Cronos (Saturno) e Reia e, por fim, para Zeus (Júpiter) e Hera. Encontramos, por exemplo, este mito já na fase helenística na Alexandra de Licofrão de Cálcis (1191 e ss.). De uma era matriarcal, onde reinaria Eurínome, a Grande Deusa dos pelasgos, e o seu consorte Ofião, uma grande serpente por si criada, seguir-se-ia uma era de transição, com Cronos (Saturno) e Reia e, por fim, a imposição do poder patriarcal, com Zeus (Júpiter) e Hera.

   Cronos/Saturno é um soberano de transição, porque nos seus mitos existe ainda uma prevalência de divindades femininas. O deus chega ao poder com a ajuda da mãe Gaia e de esposa Reia, duas Grandes Mães da era matriarcal. Tanto Cronos como Zeus sobem ao trono por via matrilinear, seja ela directa ou não. No entanto, é Zeus que impõe o poder patriarcal. Por vezes, isso acontece através de Atena e Apolo, tal como se pode ler na Oresteia de Ésquilo. De um ponto de vista astrológico, esta é uma das razões que justifica que alguns autores antigos tenham considerado Saturno um planeta feminino (Figueiredo, R. M., 2024, “Saturno e o Feminino na Astrologia Antiga” in Fragmentos Astrológicos, 2ª ed. revista e aumentada, 163-77. Lisboa: Livros – Rodolfo Miguel de Figueiredo).

   Este prelúdio mitológico coloca em contexto a Titanomaquia, ou seja, a luta entre os deuses antigos, os titãs, e os deuses olímpicos. Cronos liderava os primeiros e Zeus, os segundos. Convém assinalar-se que os titãs são deuses elementais e os deuses olímpicos são deuses ideais, ou seja, com o tempo tornaram-se sobretudo ideias ou conceitos. Existe portanto uma racionalização conceptual dos poderes divinos, uma que passa progressivamente a derivar apenas de uma divindade central, Zeus/Júpiter. Na obra de Ésquilo Prometeu Agrilhoado, o próprio Prometeu descreve esta oposição divina dizendo que os deuses começaram a encolerizar-se e gerou-se uma contenda entre os apoiantes de Cronos/Saturno e os apoiantes de Zeus/Júpiter (197-229). No entanto, convém assinalar-se que Zeus é apoiado pela avó Gaia e pela mãe Reia, ou seja, a Grande Mãe, o Divino Feminino, continua a ser o poder por detrás do poder, aquele gera os novos reis.  

   Com a derrota dos titãs, estes, e em especial Cronos, são atirados para o Tártaro, o lugar mais profundo do submundo. Foi lá que Cronos permaneceu acorrentado até que, segundo alguns mitógrafos, é perdoado e passa a reinar na Ilha dos Bem Aventurados. Este último mito tem uma forte relação com a passagem de Saturno pelo signo de Peixes, ou seja, existe um sentido de viagem, da guerra à redenção, de Carneiro a Peixes. A derrota dos titãs conduz também a uma diminuição do valor dos poderes elementais, da natureza. O mundo da pólis vence o mundo natural. A religiosidade helénica é profundamente marcada por esta significação: a vitória da civilização sobre a natureza. Hoje o nosso olhar é diferente e procuramos, em alguns movimentos espirituais, o regresso de divindades elementais e da natureza enquanto expressão do divino ou sendo ela mesma a divindade.

   No tema do ingresso de Saturno em Carneiro, podemos encontrar alguns dos elementos mitológicos da Titanomaquia. Os três irmãos que dividiram o poder depois de o tomarem do pai posicionam-se agora astrologicamente: Hades/Plutão que reina no submundo encontra-se junto ao Ponto de Culminação, sendo este o astro mais alto do tema; Zeus/Júpiter encontra-se junto do Ponto sob a Terra, o abismo do tema; e Posídon/Neptuno encontra-se a marcar a hora, subindo no horizonte após a ascensão e junto ao seu pai, Cronos/Saturno. Existe pois uma via ascendente que se estende de Júpiter até Plutão e se expressa com maior intensidade em Touro e Carneiro, devido a uma maior presença planetária. 

   De um ponto de vista simbólico é revelante o facto de Zeus/Júpiter se encontrar ainda no ventre de sua mãe, ou seja, sob a terra. Plutão a culminar lembra a canção de Zeca Afonso “A Morte saiu à Rua” que logo no início diz o seguinte: “A morte saiu à rua num dia assim / Naquele lugar sem nome pra qualquer fim”. A morte à vista de todos lembra tanto o memento mori, a certeza de que vamos morrer, como derradeira expressão da perfídia humana. No caso da canção de Zeca Afonso, temos o assassinato pelas mãos da PIDE, da polícia política da ditadura do Estado Novo. Existe um aviso que nos diz que, se o deixarmos, o mal encontra caminho. Em certa medida é como o paradoxo da tolerância descrito por Popper: a tolerância para com o intolerante pode levar a perda da própria tolerância. Saturno em Carneiro é, como já se observou, um dever de acção que coloca diante de nós a responsabilidade e a retribuição.                 

   O ingresso de Saturno em Carneiro traz consigo um tempo de desafios. Se em Peixes existia um dever interior de aceitar, de comungar, com o destino, com as leis do tempo e da necessidade, abraçando-se assim a totalidade, agora em Carneiro, esse desafio fixa-se na própria acção. Nos tempos que vivemos, nestes tempos sombrios, Saturno em Carneiro diz-nos que não podemos ser neutros. Temos hoje um dever de acção, uma responsabilidade, ou seja, o dever que transformar o interior terá de se espelhar no exterior. Em última análise, ao nos transformarmos, transformamos o mundo.   

sexta-feira, 28 de março de 2025

Reflexões Astrológicas 2025: Eclipse Solar Parcial (Lua Nova em Carneiro)

Reflexões Astrológicas

Eclipses 



Eclipse Solar Parcial 

(Lua Nova em Carneiro)

Lisboa, 10h47min, 29/03/2025

 

Sol-Lua

Decanato: Marte  

Termos: Vénus   

Monomoiria: Sol    

                                           

 

   O Eclipse Solar Parcial de 8 de Abril ocorre no signo de Carneiro, com Caranguejo a marcar a hora (hora de Lisboa), no primeiro grau e apenas a quatro minutos, no Segmento de Luz (αἵρεσις) do Sol, com os luminares acima do horizonte, na X, no lugar daquilo que se faz, da Práxis (πράξις), embora a culminação caia na IX (casa-signo ou signo inteiro), e cerca de quatro horas e vinte minutos após a hora de alba, no decanato de Marte, termos de Vénus e na monomoiria do Sol. Os eclipses solares anteriores ocorreram junto ao Poente, já o actual encontra-se a caminho da culminação. Este elemento de análise consagra o sentido deste eclipse como marco de transição, pois é o último do ciclo no signo de Carneiro. O eixo nodal vai fixar-se no eixo Virgem-Peixes. O próximo eclipse solar de 2025 será no signo de Virgem, ou seja, define-se uma via de sentido que corresponde a metade do ciclo zodiacal.

   Nesta senda nodal de Carneiro a Virgem, lembrámo-nos dos versos inaugurais da Divina Comédia de Dante: “Nel mezzo del cammin di nostra vita/ mi ritrovai per una selva oscura,/ ché la diritta via era smarrita.” (No meio do caminho em nossa vida/eu me encontrei por uma selva escura/ porque a direita via era perdida. Inferno I, 1-3, trad. Vasco Graça Moura. Venda Nova, 2000: Bertrand Editora). No entanto, Carneiro não chega a Virgem pela “direita via”, o caminho nodal é uma via de retorno e terá de passar por Peixes sem o integrar o seu sentido. Caminha até à parte sem tomar como sua a totalidade, a finalidade do caminho. A identidade do eixo Carneiro-Balança segue uma via de sombra onde terá de enfrentar os seus fantasmas e aqui também no sentido etimológico do termo, ou seja, terá de se destruir e recriar a partir das suas próprias imagens. A “selva escura” é o lugar onde o humano e a humanidade podem ver o maior dos seus medos. Nesse lugar, vêem-se a si mesmos. A visão do espelho é assustadora. É como Dorian Gray a deixar o pano que cobre o objecto misterioso que esconde o seu verdadeiro eu. O olhar para si mesmo, seja para o humano, individualmente, ou para a humanidade, é aterrador e é assim que deve ser, pois a iniciação nasce desse medo, nessa “selva escura”.

   Como já constatámos anteriormente, Jasão, o herói de Ares (Marte, domicílio) precisa do favor de Apolo (Sol, exaltação) para que a finalidade da viagem seja alcançada, ou seja, precisa da luz para encontrar o fim, para chegar ao velo ou tosão de ouro (Κρίος Χρυσόμαλλος), a pele do aríete ou carneiro imortal (Carneiro), filho de Posídon (Neptuno, regente moderno de Peixes). A ligação nodal entre os dois eixos (Carneiro-Balança e Virgem-Peixes) leva-nos, pela via do destino e da necessidade, pelo corpo do Dragão da Lua, numa viagem que terá de estabelecer uma ligação de sentido, um elemento de passagem, entre a identidade e a integração. Curiosamente, os dois eclipses solares de 2025 fixam-se do lado desses eixos onde os elementos estão separados. São a unidade (Carneiro) sem a dualidade (Balança). São a parte (Virgem) sem o todo (Peixes). Essa ausência é a sombra sobre o sentido, é a ocultação da finalidade.

   Num eclipse solar, é a luz que sofre o avanço da escuridão, pois o seu manto de sombra cobre o alcance dos raios. Ora isso acontece, todavia, por decreto da Providência. É o destino a operar e a necessidade a determinar. A este respeito, Séneca diz-nos o seguinte: “Que a nossa alma, por tanto, se habitue a entender e a suportar o seu destino, a saber que nada é interdito à fortuna, que esta tanto se abate sobre os impérios como sobre os imperadores, que tanto poder tem sobre as cidades como sobre os homens. E não devemos indignar-nos contra as desgraças: nós entramos num mundo que se rege precisamente por esta lei. Se a lei te agrada, obedece-lhe; se não, sai deste mundo pelo processo que quiseres! Indigna-te, sim, com alguma iniquidade que o destino te tenha feito somente a ti; mas as leis que regem o mundo constrangem tanto os grandes como os humildes, e por isso deverás reconciliar-te com o destino: ele dará solução a tudo! Não deves avaliar os homens pelos túmulos, pelos monumentos fúnebres que, uns maiores outros menores, se erguem ao longo das estradas: reduzidos a cinzas, todos os homens são iguais. Desiguais no nascimento, todos somos iguais na morte.” (Ep.91.15-16; Cartas a Lucílio, 2ª ed,, trad. J. A. Segurado e Campos. Lisboa, 2004: Fundação Calouste Gulbenkian).

   A lei de Adrasteia, senhora do inevitável, impera sobre o mundo e um eclipse solar tende a recair mais sobre impérios e imperadores do que sobre o comum. A estes, só a lei das Meras (Moiras) afecta o seu destino, ou seja, só o grau do eclipse tende a afectar o tema natal, pois moira (μοίρα) é em grego tanto o destino como o grau. A Lua é a vida e o Sol a consciência da vida, daí que um eclipse lunar anuncie mais a vida planetária e um eclipse solar a sua consciência, ou seja, a organização política e social. Os eclipses solares vão pesar mundanamente sobre a humanidade. O peso do destino, a sombra, recai sobre o que se faz colectivamente. Este sentido é particularmente expressivo no tema do eclipse.

   Se pensarmos que, no tema, a posição dos signos sobre os lugares ou casas reproduz o Thema Mundi, ou seja, com Caranguejo a marcar a hora, observamos que essa conciliação entre πράξις, entre aquilo que se faz, e o encontro umbral dos luminares no signo de Carneiro se torna uma unidade de sentido. Ora esta unidade vai acentuar uma pressão da sombra sobre a luz, ou seja, na expressão ou na acção dos líderes mundiais sobre as comunidades. O facto de Marte estar no signo que marca a hora, Caranguejo, e Saturno estar junto ao Ponto de Culminação, em Peixes, contribui para o carácter deletério dessa acção. Ao vermos hoje a acção política assustadoramente centrada nos líderes, temos de trazer à memória outros tempos, tempos em que os cultos da personalidade eram cultivados e impostos. O sentido de comunidade tende então a perder-se

   A ascensão recta dos luminares fixa uma influência temporal mais intensa até pouco mais de seis meses, o que nos leva a estabelecer um tempo electivo até ao eclipse solar de 21 de Setembro. No entanto, a magnitude do eclipse pode estender o seu efeito até perto de um ano, já as declinações dos luminares, em especial, a do Sol, determina uma extensão dos efeitos até cerca dos três anos e meio. Aquilo que acontecer até Setembro produzirá um efeito que se fará sentir até ao final de 2028. Em termos espaciais, o centro do eclipse firma-se no Pólo Norte, no extremo norte do Québec, numa área muito próxima da Gronelândia. Se pensarmos nas deambulações megalómanas de um certo líder quanto ao domínio territorial desta zona do planeta, o centro deste eclipse ganha um sentido mais consentâneo. O manto umbral e penumbral estender-se-á, porém, pelo Oceano Atlântico até às áreas ocidentais e mais a norte da Europa e de África, alcançando a Rússia.

   Nas regências geográficas antigas, o Sol e a Lua em Carneiro regem, segundo Manílio, o Helesponto (Estreito de Dardanelos), Propontis (Mar de Mármara), a Síria, a Pérsia e o Egipto (Astronomica, IV, 744-817). Já Vétio Valente (Antologia I, 2) diz-nos que o signo exerce influência sobre as seguintes regiões: a Babilónia, Elymais ou Elamais (Cuzistão, província do Irão), a Pérsia, a Palestina e as regiões circundantes, a Arménia, a Trácia, a Capadócia, Susã (cidade antiga, capital do Elão ou Susiana, hoje sudoeste do Irão), o Mar Vermelho e o Mar Negro, o Egipto e o Oceano Índico. Heféstion resume as regências dizendo que, para Ptolomeu, rege a Britânia, a Galácia, a Germânia, a Palestina, Edom e a Judeia e, para Hiparco e para os antigos egípcios, rege a Babilónia, a Trácia; a Arménia, o vale da Pérsia, a Capadócia, a Mesopotâmia, a Síria, o Mar Vermelho (Apotelesmática I, 1).

   O actual eclipse pertence à série Saros 149. É 21º eclipse de um total de setenta. Deve-se assinalar que este é o último eclipse parcial antes da fase de eclipses totais que se inicia com outro eclipse no signo de Carneiro (9 de Abril de 2043). A série Saros 149 teve o seu início a 21 de Agosto de 1664, com um eclipse no signo Leão, e terminará a 28 de Setembro de 2926, com um eclipse no signo de Balança. No eclipse-matriz, o Sol, a Lua, Mercúrio, Vénus e a Caput Draconis estavam em Leão, no mesmo elemento do eclipse actual. Marte estava em Balança e Saturno em Sagitário. Júpiter e Neptuno encontravam-se em Capricórnio. Em Aquário, estava Úrano e a Cauda Draconis e, em Gémeos, Plutão. Balança marcava a hora e Caranguejo culminava (hora de Lisboa).

   No ano de 1664, aquando do eclipse-matriz, temos de assinalar a vitória dos portugueses sobre os espanhóis, na Batalha de Castelo Rodrigo (7 de Julho), um feito essencial na Guerra da Restauração. A 1 de Agosto, também antes do eclipse, dá-se a Batalha de São Gotardo onde o exército habsburgo derrota o exército otomano. Por outro lado, a 27 de Agosto é fundada a companhia francesa das índias orientais. A 8 de Setembro, Nova Amsterdão rende-se a uma esquadra naval britânica, liderada por Richard Nicolls. A cidade capturada será então renomeada, em homenagem ao Duque de York, o futuro rei Jaime II, passando a chamar-se Nova Iorque. O enquadramento histórico do eclipse-matriz serve sobretudo para acentuar a intensa expressão político-militar desta série. Ora este carácter bélico vai evidenciar o seu lado mais negativo pelo facto da posição original dos maléficos estar em aspecto quadrangular à posição actual (Marte em Balança e agora em Caranguejo e Saturno em Sagitário e agora em Peixes). Se tivermos dúvidas da repetição da história, podemos afirmar com certeza a repetição do humano.

   O eclipse solar de 29 de Março é o terceiro de três eventos astrológicos que mereceram uma reflexão, tendo sido o primeiro o eclipse lunar de 14 de Março e o novo ano astrológico com o ingresso do Sol em Carneiro a 20 de Março. Se observarmos os três temas, podemos concluir que as retrogradações de Mercúrio e Vénus são as principais diferenças. No caso de Vénus, existe inclusive um reingresso no signo anterior, em Peixes.  

   A retrogradação de Mercúrio obriga a um pensar ou repensar da palavra que nos poderia levar até Epicteto quando este diz o seguinte: “Sinais de quem progride: não recrimina ninguém, não elogia ninguém, não acusa ninguém, não reclama de ninguém. Nada diz sobre si mesmo – como quem é ou o que sabe. Quando, em relação a algo, é entravado ou impedido, recrimina a si mesmo. Se alguém o elogia, se ri de quem o elogia. Se alguém o recrimina, não se defende.(Encheiridion 48.b1, trad. A. Dinucci & A. Julien, 2014: 64. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra). Mercúrio em Carneiro dá uma certa impulsividade à palavra. Ora a retrogradação neste signo conduz ao domínio dessa pulsão o que combina perfeitamente com a lição de Epicteto.

   A retrogradação de Vénus até ao signo da sua exaltação, embora não de volta ao grau exacto, mas colocando-a conjunta a Neptuno, o seu regente moderno, vai firmar primeiramente a reformulação daquilo que se deseja, estabelecendo uma necessidade de foco que se estenda para além da identidade e, de uma forma mais profunda, que restabeleça a gravidade do amor. A dádiva de Vénus, neste olhar de novo, é um tesouro de vida, pois que permite que se olhe uma outra vez para o lugar onde o amor caiu, onde a sua gravidade se fundou. É uma bênção que não deve ser ignorada. Por outro lado, a senda de uma Vénus que sai de Carneiro para voltar a Peixes e para, por sua vez, regressar renovada a Carneiro tem um sentido profundo. O amor sai dos perigos da identidade, da frágil ponte entre unidade e dualidade, para regressar a imersão do todo, à integração da totalidade. Ora nessa viagem o amor pode perder-se e afundar-se ou pode dar à costa, brilhante, com um sentido de finalidade, de propósito. Neste tempo, podem estabelecer-se intensas afinidades electivas e conexões para lá da vida e da morte.

   No tema do eclipse solar de 29 de Março, Vénus vai voltar a reunir-se com Neptuno, com Saturno e com a Caput Draconis. Os sentidos do passado são recuperados, todavia, não é um regresso ao mesmo, é uma renovação. No rio do tempo, as águas que passam não são iguais. A união de Vénus e Neptuno vai dar ao princípio do amor a imaginação criativa, o que potencia a sua acção natural e criativa. Quando se une a Saturno, o que em Peixes não tende a ser muito negativo, Vénus vai conciliar a gravidade do tempo com a ardência do desejo. A Caput Draconis conjuga com estes a possibilidade de elevação face à força da necessidade. Esta é uma bênção quase oculta em pleno eclipse solar. Numa viagem pela sombra, é possível trazer do todo a unicidade de si.    

   No eclipse lunar era Plutão em Aquário o astro mais alto agora é Saturno em Peixes. Da lição da morte passamos para lição do tempo. Na verdade, não existe verdadeira aprendizagem sem a integração destas duas lições. Se a vida não pedisse estas duas lições, as pulsões dos planetas pessoais dominariam e iriam corromper a natureza a um ponto de não retorno. A morte e o tempo fazem com que se dê valor às coisas, às pequenas coisas, às coisas importantes. Nós, humanos, somos a soma dessas pequenas, unidas em algo único, na felicidade. Na sua origem etimológica, a felicidade consiste é ter em si uma bom estado demiúrgico, ou seja, ter um bom elemento de passagem. Ora essa viagem só possível com a consciência íntima da morte e do tempo e, por outro lado, pela elevação que só o amor e a sabedoria concedem.

            Neste eclipse solar, esta senda é uma subida de Marte em Caranguejo até Saturno em Peixes e é nessa viagem que o manto umbral se estende, escondendo os luminares. A quadratura destes, e de Mercúrio retrógrado, a Marte revelam o medo da origem e a violência de regressar ao passado. Ora, sabendo nós de uma maior influência geopolítica nos eclipses solares, este sentido torna-se mais vivo e mais actual. Estamos a viver, quer queiramos, quer não, tempos sombrios. Na verdade, a humanidade que almejava por progresso vê-se hoje à beira do princípio. Os sinais estão lá. As Meras falam nos astros e indicam os lugares de todas as encruzilhadas, sim porque, sob a égide de Hécate, numa das vias reside, como sempre, a esperança. Esta é a razão pela qual no fim do caminho zodiacal, naquele de Carneiro a Peixes, se encontram os dois benéficos: Júpiter no seu domicílio, Vénus na sua exaltação. Com o manto de sombra em Carneiro, esse fim do caminho não é vislumbrado. Vivemos tempos em que a verdadeira esperança tende a perder-se.

   A beleza da vida diz-nos sempre que a luz da esperança gosta de se ocultar nas ruínas, pois é sob a cinza e a poeira que se escondem as pequenas luzes que salvam o mundo. Os sextis de Júpiter em Gémeos e de Plutão em Aquário aos luminares em Carneiro permitem ver elementos potenciais de transformação. Estes são aspectos que trazem consigo a potencialidade da busca, da procura, de ver entre os fragmentos da realidade a luz que ilumina e transforma. Esta é uma bênção da vontade, do ímpeto salvífico. Já a quadratura entre Vénus em Peixes e Júpiter em Gémeos traz consigo a estruturação do bem. Curiosamente, esta são duas constelações representadas de forma mitológica pelo amor: em Peixes, Afrodite e Cupido; em Gémeos, Castor e Pólux. O trígono entre Marte em Caranguejo e Vénus em Peixes que antecede, na já enunciada via de culminação, o mesmo aspecto mas com Saturno vai servir de apelo ao caminho do meio, à via da moderação. Actualmente, a prudência, a temperança é tão esquecida quanto necessária. A arte e a nobreza de colocar racionalidade nas pulsões são por vezes o que resta à humanidade e, em especial, aos seus líderes. Se não existirem, o abismo torna-se mais próximo.

   O eclipse solar de 29 de Março, o último do actual ciclo nodal no signo de Carneiro, apresenta-nos os riscos de colocarmos as nossas angústias e os nossos anseios em certas lideranças. O manto de sombra cai hoje de forma muito notória nos perigos de semear as autocracias no seio das democracias modernas. Existe também, apesar de certos esforços ilusórios de paz, um perigo iminente de continuação e alastramento de certos conflitos mundiais. Quando é mais fácil dar dinheiro para o armamento e a guerra do que para a pobreza e a desigualdade, revelamos uma humanidade doente. No entanto, antes e depois da sombra, temos de continuar sempre a procurar a luz.