


Reflexões Astrológicas
Eclipses
Eclipse Solar Parcial
(Lua Nova em Virgem)
Lisboa, 20h 43min, 21/09/2025
Sol-Lua
Decanato: Mercúrio
Termos: Saturno
Monomoiria: Lua
O
Eclipse Solar Parcial de 21 de Setembro ocorre no signo de Virgem, com Carneiro
a marcar a hora (hora de Lisboa), no Segmento de Luz (αἵρεσις) da Lua, com os luminares abaixo do horizonte, na VI, no
lugar do Má Fortuna (κάκη τύχη), e cerca de uma hora após o pôr-do-sol,
no decanato de Mercúrio, nos termos de Saturno e na monomoiria da Lua, no grau anarético
deste signo. Manílio define o lugar onde se dá o eclipse do seguinte modo: “porta laboriis erit: scandendum est atque
cadendum” (Astronomica II, 870: “a porta do trabalho serão: por uma se sobe e pela outra se desce”).
A tensão do incumprimento é a mais intensa do todo o δωδεκατόπος (doze lugares), pois não se une ao
Horóscopo e está sob o horizonte. No entanto, a união triangular ao lugar da Práxis, a X, permite que se efective,
mas só através do esforço, do labor. A sombra terá de ser trabalhada.
Paulo
de Alexandria define o sexto lugar como ἀπόκλιμα
φαῦλον (declínio débil) e designa-o de ποινέ, ou seja, retribuição, castigo ou vingança (Introdução, cap. 24). Fírmico Materno,
por seu lado, considera-o uma infelix
regio (região funesta) ou diz que é rebusque
inimica futuris (inimiga das acções futuras), fazendo dela vitio fecunda nimis (demasiado fecunda
em maldade). A VI é assim definida como um locus
piger, um lugar passivo (Mathesis,
II, 19, 7). Esta qualificação do sexto lugar é importante, pois, segundo a
ordem vernal, é neste lugar que recai o signo de Virgem, já segundo a ordem do Thema Mundi este signo ocupa o terceiro
lugar, designado tradicionalmente por Deusa, ou por lugar da Deusa da Lua. Consequentemente
a união destes dois sentidos torna-se fundamental para compreensão da natureza
do actual eclipse.
A
análise astro-mitológica do signo de Virgem estabelece uma ponte de sentido entre
estas duas qualificações. O signo de Virgem, segundo a tradição, representa Astreia,
filha de Astraeus e Eos (Aurora) ou de Zeus e Témis, ou Dikê (Némesis, na sua
forma de retribuição). Na astrologia moderna ou contemporânea, tendemos a
colocar o conceito de justiça mais associado ao signo de Balança que ao de Virgem.
No entanto, das constelações zodiacais, o signo de Balança foi o último a ser
definido, pois pertenceria inicialmente ao Grande Escorpião, do qual
representaria as suas pinças. Da sua divisão nasceria o signo de Balança, as
pinças tornaram-se escalas, e o signo Escorpião que ficaria com o resto do
corpo do Grande Escorpião. Esta origem é importante, pois mostra como o signo
de Balança, o único representado por um objecto, representa apenas o
instrumento que repousa nas mãos da deusa, no signo de Virgem. Está portanto
mais associado à aplicação da justiça.
A
deusa da Justiça é, segundo o mito das idades do mundo, a última a permanecer
na terra. Todos os outros deuses subiram ao Olimpo. No entanto, à medida que a
perfídia humana cresce, a Deusa começa a ser ignorada. Hesíodo, em Os Trabalhos e os Dias, conta-nos o
seguinte: “E ela segue-os, chorando pela
cidade e pelas moradas dos povos, / vestida da névoa, trazendo desventura aos
homens que a baniram e a não distribuem com rectidão” (222-4, trad. A.
Elias Pinheiro & J. Ribeiro Ferreira, 100. Lisboa, 2005: INCM). Progressivamente a deusa abandona a
humanidade. Esta ideia de ausência do Divino Feminino é assim associada ao
signo de Virgem. Numa perspectiva mais determinada pelos ciclos da natureza e pela
agricultura, a deusa Deméter, após o rapto de Cora (Perséfone), sua filha,
deixa o mundo e refugia-se numa gruta na Arcádia, deixando a natureza perecer e
levando todos à miséria. Ora o somatório destes elementos demonstra a
associação do signo Virgem aos lugares indicados, ou seja, à III enquanto Deusa
e à VI enquanto Má Fortuna, a miséria da ausência do feminino.
Como
o actual eclipse ocorre no signo de Virgem, a sombra dracôntica assume também,
sob o véu do obscurecimento, esta ausência do feminino enquanto degradação do
humano e corrupção da natureza. Na sua forma de retribuição, a sua face mais
severa, Dikê revela-se como Némesis. Foi a acção humana que levou a
deusa a tomar esta forma que é tradicionalmente associada a Saturno. Segundo o
mito das idades, Saturno rege a idade de ouro quando a justiça ainda existia
entre os humanos. Hoje, aquando do eclipse solar de dia 21, Saturno olha de
frente (oposição) para o encontro umbral dos luminares. A partir de Peixes,
trazendo consigo o peso do destino (Cauda
Draconis), Saturno fita esta ausência, esta negação da harmonia.
Este
abandono ou esta ausência não é, porém, definitiva, passada a sombra, renascido
o humano, a deusa voltará. Vergílio, nas Bucólicas, diz o seguinte: “A última idade do canto cumeio chegou já;/
a grande ordem dos séculos nasce de novo./
Já regressa a Virgem, regressam os reinos
saturninos; /já do céu alto uma nova
progénie é enviada.” (IV, 4.7: itima Cumaei
uenit iam cļńs aetas;/magnus ah integro saeclorum nascitur ordo./ iam redit et
Virgo, redeunt Satumia regna, /iam noua progenies caelo demittitur alto. Trad.
Frederico Lourenço, 109-10. Lisboa, 2021: Quetzal Editores). No entanto, o retorno da deusa, considerando o que
motivou o seu afastamento, nascerá de duas razões: ou porque a perfídia recuou
entre os humanos; ou porque a deusa quer ajudar o humano nesse recuo. As duas
razões não se excluem e obrigam ambas à transformação do humano, ao seu
regresso à excelência original. Esta ideia insere-se naturalmente na
conceptualização do eixo de integração que une Virgem a Peixes, ou seja, a
parte ao todo. Diante da sombra que oculta a luz, a parte não vê, não alcança o
todo. O humano não vê a deusa, não se integra na sua totalidade.
Séneca apresenta um percurso para aquilo que deverá ser,
segundo o espírito de Virgem, a sanidade da alma: “Dir-te-ei
agora o que significa uma alma sã: é cada um contentar-se consigo mesmo, ter
confiança em si próprio, saber que todos os votos feitos pelos homens, todos os
benefícios que trocam entre si não têm a mínima importância para a obtenção da
felicidade. Uma coisa passível de acréscimo não é uma coisa perfeita; o homem
que quer vir a possuir uma permanente alegria, tem de fruir apenas do que efectivamente
lhe pertence. Ora rodos os bens a que o comum dos mortais aspira são, de uma
forma ou outra, transitórios, pois de coisa alguma a fortuna nos permite a
posse para sempre. Mesmo esses bens transitórios, contudo, podem ser-nos
agradáveis se estiverem sujeitos ao controlo e à influência da razão; apenas a
razão pode tornar recomendáveis esses bens, cujo usufruto se revela nocivo a
quem os ambiciona por si mesmos.” (Ep.72.7; Cartas a Lucílio, 2ª ed,, trad. J. A.
Segurado e Campos. Lisboa, 2004: Fundação Calouste Gulbenkian). Este itinerário da alma é, na verdade, uma negação do
que conduziu ao afastamento da deusa, é uma rejeição da Má Fortuna, tornando-se
assim o sentido do actual eclipse.
A influência temporal deste eclipse deve ser analisada
com alguma ponderação, pois, como veremos mais adiante, este eclipse pertence a
uma série Saros recente, iniciada em 1917, logo a sua assinatura mundana de
sentido ainda se está estruturar. Por um lado, por ser um eclipse parcial com
uma tipologia rara, a sua duração, bem como a ascensão recta, é maior, logo a
influência também será. No entanto, por a sua significação ainda se estar a
estabelecer, a influência temporal poderá ser maior, mas o efeito tenderá a ser
mais ténue ou até difuso. A duração fixaria assim a influência em cerca de
quatro anos e meio e a ascensão recta em mais de uma década, já a declinação dos
luminares colocaria em destaque uma influência maior entre os quatro e os cinco
meses.
A influência geográfica do eclipse de dia 21 tem o seu
centro no mar, entre o sul da Austrália e a Antárctida, perto também da Nova
Zelândia, sendo visível nas ilhas Fiji, Tuvalu, Tonga, Samoa, Samoa Americana, Ilhas
Cook, Tahiti e Polinésia Francesa. A área geográfica como podemos ver é
restrita. Já segundo as regências geográficas antigas, Vétio Valente (Antologia I, 2) diz-nos que Virgem rege a
Mesopotâmia, a Babilónia, a Grécia, a Acaia (Grécia), Creta, Cíclades (Grécia),
Peloponeso, Arcádia, Cirene (Líbia), Dória (Grécia), Sicília e Pérsia ou Parsa
(Irão). Manílio, por seu lado, afirma que a Jónia (Turquia), a Cária (Turquia),
Rodes e a Grécia estão sob a sua influência (Astronomica IV, 763-8).
O
eclipse solar parcial de 21 de Setembro pertence à série Saros 154, sendo o 7º
eclipse de um total de 71. O próximo vai iniciar uma fase de eclipses anulares.
O primeiro eclipse total só ocorrerá em 2404. O eclipse inicial é a matriz de
sentido para toda a série. O primeiro eclipse desta série ocorreu a 19 de Julho
de 1917. O Sol e a Lua estavam em Caranguejo e o Dragão da Lua estendia-se no
eixo Caranguejo-Capricórnio. Mercúrio e Vénus estavam em Leão, Marte e Júpiter
em Gémeos e Saturno em Leão. Nos transaturninos, Úrano estava em Aquário,
Neptuno em Leão e Plutão em Caranguejo. Nesta data e na hora de Lisboa, Gémeos
marcava a hora e Aquário culminava. A série Saros 154 terminará a 25 de Agosto
de 3179, com um eclipse no signo de Virgem, tal como o actual.
No ano 1917, antes do eclipse, deu-se, a 5 de
Fevereiro, a Revolução Mexicana que com a nova constituição, vai ser a primeira
a instituir os direitos sociais, dois anos antes da Constituição de Weimar,
nela estavam inscritos direitos como o direito à greve, o voto feminino,
liberdade de expressão, a separação entre estado e igreja, entre outros. Este é
o ano das aparições de Fátima, tendo sido a primeira a 13 de Maio e as 13 de
Outubro já depois do eclipse. Na Rússia, dá-se a Revolução de Outubro que leva
Lenine e o Partido Bolchevique ao poder. O mês de Dezembro será um mês de
grande instabilidade. Em Espanha, assistir-se-á a três mudanças no presidente
do governo. Não nos podemos esquecer que estávamos na Primeira Guerra Mundial
e, neste mês, os Estados Unidos da América entram na guerra. É também de
assinalar a 6 de Dezembro o choque entre dois cargueiros em Halifax, no Canadá,
que vai dar origem a uma grande explosão que, por sua vez, provocará um
tsunami. Em Mondane (França), o descarrilamento de um comboio com mil soldados
provocará a morte de oitocentos deles.
Uma informação que é também
relevante é que o actual eclipse dá-se com o Sol no último grau de Virgem, o
grau anarético. Ora isto serve
primeiramente para desfazer um erro que infelizmente é muito comum. É grau anarético e não anorético, ou seja, é o grau destruidor e não o grau com falta de apetite.
O primeiro provém de anareta (ἀναιρέτης) e o segundo é o adjectivo de
anorexia, do prefixo negativo ana que
indica aqui falta ou ausência e o substantivo orexis (ὄρεξις),
fome ou apetite ou desejo. Pela internet este erro é muito comum. A destruição neste
caso ocorre por força do limite e imposição do limiar do lugar onde aquele
signo se perde e o seguinte já se avista. Um eclipse solar neste lugar vai
adensar o peso sobre o sentido da sombra. Curiosamente, a sizígia umbral
encontra-se a trinta de graus de Marte que também se encontra num grau anarético, mas neste caso o de Balança.
Em ambos os casos, devemos considerar que esta destruição é limite de algo.
Face ao tema do eclipse lunar de dia
7, deve-se destacar as duas grandes diferenças nas posições planetárias:
Mercúrio deixa o seu signo de domicílio e exaltação, Virgem, para ingressar em
Balança e Vénus deixa o signo de Leão para entrar no signo de Virgem. Vénus em
Virgem assume-se como Estrela da Manhã e encontra-se numa posição já para além
dos raios abrasivos do Sol. Mercúrio, embora no signo seguinte ao do Sol,
encontra-se sob os raios e numa posição helíaca posterior, adquirindo desta
forma uma expressão feminina e um carácter mais emotivo, sentimental e
intuitivo.
Apesar de Marte estar a deixar o signo de
Balança, onde se encontrar em detrimento, para entrar em Escorpião, o seu
domicílio, vai ainda oferecer, durante cerca de um dia, os seus raios maléficos
ao recém-chegado Mercúrio. Já a Vénus em Virgem, no domicílio e exaltação de
Mercúrio, não espalha todas as suas qualidades, algo que só acontecerá quando
entrar em Balança, o seu domicílio masculino e diurno. Vénus em Virgem assume
na Deusa Tríplice a sua face de Donzela, da jovem que ainda não se iniciou no
mistério da maternidade. No entanto, apesar de estar fora do alcance dos raios
solares, Vénus está numa posição conjunta e a fazer aplicação à sizígia umbral,
logo participa deste sentido profundo de ocultação e obscurecimento.
Do ponto de vista astro-mitológico,
seria o momento em que Cora (Perséfone) seria raptada por Hades, conduzindo
assim ao lamento de Deméter. O sextil da sizígia umbral, de Vénus e da Cauda Draconis em Virgem a Júpiter em
Caranguejo vai trazer a dádiva da origem, o bem que se encontra no começo da
viagem, a esta relação, ou seja, a procura do estado anterior de abundância de
modo a recuperar, a restaurar esse bem. O retorno à natureza e aos seus bens é hoje
um exemplo dessa relação.
A oposição Saturno em Peixes ao
lugar do eclipse, o trígono dele a Júpiter em Caranguejo, lembrando a lição de
Petosíris de que nem todos os trígonos são bons, nem todas as quadraturas são
más, e a quadratura de Saturno e do lugar umbral a Úrano em Gémeos é a marca
dos tempos sombrios em que vivemos. O humano está escolher o seu lugar na
história. Estamos à assistir a um genocídio em tempo real, com toda a
informação, com imagens, sim porque há imagens de Gaza, da destruição, da fome,
do infanticídio, do massacre de gentes à procura de comida, de um povo, e a
maioria permanece num estado de absoluta dormência, como se nada fosse, com uma
cumplicidade absurda para com os algozes de Israel. O conceito de humanidade
assenta numa premissa primordial: um humano é um humano, isto é, os seres
humanos têm todos o mesmo valor. Desta premissa decorre, segundo o espírito que
agrega o conceito de humanidade, a solidariedade, ou seja, quem sofre, quem
precisa deve ser a força da acção humana para reparar, para mitigar esse
sofrimento, essa necessidade. Enquanto permitirmos as ideias de que um humano
vale mais do outro e de que existem terras prometidas, a humanidade cairá no
seu próprio abismo. E aqueles que não fazem nada, que nem uma opinião
expressam, permitem essas atrocidades.
A posição fragilizada de Úrano em
Gémeos, onde a palavra devia ser revolução permanente, bem como a quadratura de
Mercúrio em Balança a Júpiter em Caranguejo, onde o espírito nacionalista da
extrema-direita corrompe a justiça e harmonia entre as gentes, entre os povos,
vão mostrar como a inteligência e a palavra se afundam na sombra da ignorância.
A quadratura de Mercúrio em Balança a Júpiter em Caranguejo e a oposição a
Neptuno em Carneiro são uma marca da transmissão das novas ideologias
populistas, nacionalista, xenófobas e misóginas que existem na extrema-direita,
nos novos totalitarismos.
Já os trígonos de Mercúrio (e de
Marte, embora já por pouco tempo) em Balança a Úrano em Gémeos e a Plutão em
Aquário trazem, sob os desígnios da providência e da necessidade, toda uma
proposta de transformação da palavra, do discurso e do conhecimento. Porém,
devido à retrogradação de Úrano e de Plutão, este é o gérmen de uma criação que
pode florescer nuns e desaparecer noutros ou nunca sequer existir, ficando como
mera potencialidade não efectivada. Este grande trígono não deixa de ser o
vendaval do Anjo da História que coloca o humano e o seu carácter sob
avaliação.
A semelhança do que se referiu no eclipse lunar, o
trígono entre Júpiter exaltado em Caranguejo e Saturno em Peixes que traz
consigo a dádiva da Água. Curiosamente, nos tempos líquidos que vivemos essa é
uma dádiva frequentemente desvalorizada. As sociedades actuais e a natureza
humana expressam hoje muito mais os espectros do criar (Terra), do pensar (Ar)
e do agir (Fogo) que os do sentir (Água). Os sentimentos e a intuição, o amor e
a fé como via de sabedoria, perdem-se no frenesim dos dias e na superficialidade
das relações. A retrogradação de Saturno e o seu derradeiro estágio no signo de
Peixes é uma proposta de sentido profundo onde a dádiva da Água será veículo de
transformação.
A Vénus em Virgem, unindo-se hexagonalmente a Júpiter em
Caranguejo, quadrangularmente a Úrano em Gémeos e opondo-se a Saturno em
Peixes, relembra-nos o verso de Séneca que “não
há caminho fácil da terra até às estrelas” (Hercules Furens 437: non est ad astra mollis e terris via). Vénus, neste lugar,
traz consigo a lição de Pigmalião e os perigos do ideal de perfeição sem
humanidade, porque se apenas divino é perfeito, mas sem humanamente divino
contrasta com o ideal os espectros de luz e sombra que caracterizam a
humanidade. Nós devemos aprender a ser humanos. A perfeição no amor está no
gesto e no cuidado, não no ideal. Colhemos a dádiva do bem onde ele existe.
O
sextil entre os benéficos mostra como a acção humana, fruto do seu carácter,
nos coloca entre o reconhecimento da origem, do que lá existia e a perfeição
que é a realização do amor, não como finalidade, mas como viagem. Já quadratura
entre Vénus em Virgem e Úrano em Gémeos vem destruturar a rigidez das
estruturas comunicacionais e transformar os ideais de beleza e perfeição. Este
encontro entre os signos regidos por Mercúrio será um marco de revolução nas
próximas semanas. A oposição Vénus-Saturno, no eixo Virgem-Peixes, firma a
ponte, o elemento de passagem, entre o amor e o tempo, entre o amor e o
destino, ou seja, a roda gira mesmo para os amantes e por a roda girar existe
amor.
O
eclipse solar de dia 21 apresenta, como vimos, uma proposta de sentido que se estenderá
pelos próximos tempos, marcando com transformação, em especial, os signos da
cruz mutável, sobretudo aquando de presença planetárias temporalmente mais
extensas. Nos próximos eclipses da série Saros 154, a significação do actual
eclipse será recuperada, pois existem elementos de sentido que ainda se estão a
formar e que se irão relacionar com outras efemérides. Desta forma, entre a luz
e a sombra, o lugar onde colocámos as sementes da nossa humanidade será
determinante e marcará o nosso futuro.
Reflexões Astrológicas
Eclipses
Lisboa, 19h12min, 07/09/2025
Lua
Decanato: Júpiter
Termos: Júpiter
Monomoiria: Lua
Sol
Decanato: Vénus
Termos: Vénus
Monomoiria: Marte
O Eclipse Lunar Total de dia 7 de Setembro
ocorre com a Lua no signo de Peixes e com o Sol no de Virgem, com Aquário a
marcar a hora e a cerca de uma hora e meia do pôr-do-sol (hora de Lisboa), logo
no Segmento de Luz (αἵρεσις) do Sol, estando este acima do
horizonte, na VIII, no lugar da Morte (θάνατος), já a Lua está abaixo do horizonte,
na II, no lugar do Viver (δύσις). A Lua encontra-se pois no decanato e
nos termos de Júpiter e na sua monomoiria,
enquanto o Sol encontra-se no decanato e nos termos de Vénus e na monomoiria de Marte.
No caso das dignidades, afirma-se o
facto de os luminares serem regidos, tanto no decanato como nos termos, pelo
benéfico que rege o segmento de luz contrário, ou seja, Vénus para o Sol e Júpiter
para a Lua. Daqui que se depreende um certo reforço benéfico da qualidade dos
lugares onde se encontra o eixo umbral. No entanto, convém salientar-se que,
devido a troca de regências, essa valoração do bem só ocorre se o feminino
integrar o masculino e o masculino, o feminino. Esta inversão de regentes serve
pois um sentido profundo.
Os eixos umbral e nodal encontram-se
no eixo de sentido da integração, existindo assim uma união significativa entre
a sombra do eclipse e a integração do todo (Peixes) na parte (Virgem), uma vez
que a Lua se encontra em Peixes. No δωδεκατόπος (doze lugares), a Lua encontra-se no
lugar do Viver, βίος (II). Paulo de Alexandria designa este
lugar de Porta do Hades, Ἅιδου πύλη (Introdução, cap. 24), devido à sua posição junto ao
Ascendente e abaixo do horizonte. Encontramos o valor do modo de vida e da
morte neste eixo (II-VIII), pois como diria Trasilo, a II é um “indicador de esperanças”, ἐλπίδων σημαντικήν (CCAG VIII/3: 101.20),
já a VIII é nas palavras de Paulo de Alexandria indicadora da “realização da morte”, θανάτου τελευτήν (Introdução, cap. 24). Consequentemente, os sentidos cruzados
de todos estes eixos ganham uma unidade significativa.
É necessário também considerar-se a
ponte de sentido no eixo Peixes-Virgem que se estabelece entre o actual eclipse
lunar e o eclipse solar de dia 21 de Setembro. Em certa medida, neste ano de
2025, o sentido já havia sido iniciado pelo eclipse lunar de 14 de Março,
todavia, é neste período de 7 a 21 de Setembro que a proposta significativa da
sombra sobre o eixo de integração se torna mais intensa. Com a sombra a cair
sobre a totalidade ou sobre a integração do sentido de totalidade (Lua em
Peixes no eclipse lunar), quando o manto umbral cobrir os luminares, a parte
poderá sentir uma maior dificuldade de integração tanto da sua própria natureza
e condição como do seu lugar no todo. Desta forma, e à semelhança do que se
afirmara aquando do eclipse lunar de 14 de Março, o obscurecimento dracôntico
recai sobre o sentido da parte e o valor da totalidade. No entanto, no actual
eclipse, é o valor da totalidade que se encontra sob uma maior tensão umbral.
A integração da totalidade obriga a uma consciência do
todo, daquilo que engloba a alma humana na Alma do Mundo. Ora para que isso
aconteça o indivíduo deverá primeiramente reconhecer a liberdade da sua própria
alma face a tudo aquilo que não lhe diz respeito. Epicteto diz-nos o seguinte:
“Ao vires alguém preferido em
honras, ou muito poderoso, ou mais estimado, presta atenção para que jamais
creias – arrebatado pela representação – que ele seja feliz. Pois se a essência
do bem está nas coisas que são encargos nossos, não haverá espaço nem para a
inveja, nem para o ciúme. Tu mesmo não irás querer ser nem general, nem prítane
ou cônsul, mas homem livre. E o único caminho para isso é desprezar o que não é
encargo nosso.” (Encheiridion 19b, trad. A. Dinucci & A. Julien, 2014: 46-7. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra). A sombra na totalidade pisciana é um alerta para a dificuldade
de ver esta liberdade e de encontrar a felicidade apenas naquilo que é encargo
nosso. Sê feliz porque amas e grato porque és amado. Existe aqui uma diferença
substancial entre o amor que damos que depende de nós, e que por isso resulta
em felicidade, do amor recebido que depende do outro, e logo deverá gerar
gratidão.
A integração da parte no todo e do todo na parte está,
como podemos observar nesta máxima de Epicteto, intimamente relacionada com a liberdade
que é fixarmos a nossa existência apenas naquilo nos compete, mas com um outro
aspecto enunciado por Séneca. O filósofo diz-nos o seguinte: “Frequentemente dá-se o caso de um exército
temer o inimigo sem motivo e de o itinerário que lhe parecera mais perigoso ser
afinal o mais seguro. A ignorância, essa, está sempre em sobressalto; os
perigos assaltam-na quer de cima quer de baixo; à direita e à esquerda há
razões de pânico; os perigos quer a atacam pelas costas quer se lhe levantam na
frente; qualquer situação a enche de medo, a encontra impreparada, a tal ponto
que o próprio socorro a apavora! O sábio, porém, sempre alerta, sempre pronto a
responder a qualquer assalto, não recuará um passo mesmo que sobre ele caiam a
pobreza, a desgraça, a ignomínia ou a dor; impertérrito, o sábio afrontará
estes males, passará pelo meio deles.” (Ep.59.8; Cartas a Lucílio, 2ª ed,, trad. J. A.
Segurado e Campos. Lisboa, 2004: Fundação Calouste Gulbenkian).
O comportamento do sábio, oposto ao daquele que se move
por ignorância, é essencialmente uma integração da parte no todo e uma
consciência da totalidade. Ao observarmos a acção do sábio, vemos que este
cruza uma visão holística com o olhar da montanha, daí que não se deixe
perturbar. A premeditação do mal serve o sábio que, contemplando o mal
possível, se preparara para todas as suas vicissitudes. Ora, num eclipse como o
actual, as duas propostas, a de Epicteto e de Séneca, estão ameaçadas. A sombra
invade o carácter humano e impede esta integração. A parte segue a parte em vez
de entrar no mar da totalidade.
O derradeiro ingresso de Saturno em Peixes que só daqui a
quase três décadas voltará a este signo veio adensar o peso da necessidade
sobre o manto umbral. As estruturas conservadoras, por um lado, e a dificuldade
de integração dos valores piscianos, por outro lado, confirmam o peso de um
mundo em decadência. Assistimos no conforto dos lares dos países mais
desenvolvidos a um genocídio, no qual a fome se tornou arma de guerra, levado a
cabo por um estado intocável. A alegada dívida histórica está a ser cobrada com
a vida de inocentes, sobretudo crianças, e nós permitimos. É a total anulação
do humanismo e dos valores essenciais e primitivos do cristianismo. O actual
eclipse que, para o tema de Lisboa, faz justamente a Lua cair no lugar do Viver
(II), do valor da vida, e devia servir de alerta, neste caso aos portugueses,
para a cumplicidade desumana da sua inacção.
A influência geográfica do eclipse de dia 7 tem o seu
centro no Oceano Índico, ao largo do Sri Lanka e à entrada da Baía de Bengala.
O manto umbral e penumbral alastrar-se-á pela Ásia, pela África, pela Europa e
pela Austrália. Segundo as regências geográficas antigas, Vétio Valente (Antologia I, 2) diz-nos que Peixes exerce influência
sobre o Eufrates e o Tigre, a Síria, o Mar Vermelho e o Mar Arábico, a Índia, a
Média-Pérsia e as regiões circundantes, o rio Borístenes ou Boristene
(Dniepre), a Trácia, a Ásia e a Sardenha. Manílio, por seu lado, concede a
Peixes o Eufrates, o Tigre e o Mar Vermelho, as terras da Pártia, a Báctria, a
Etiópia, a Babilónia, Susa e Nínive (Astronomica IV, 800-6). Já Virgem rege a Mesopotâmia, a
Babilónia, a Grécia, a Acaia (Grécia), Creta, Cíclades (Grécia), Peloponeso,
Arcádia, Cirene (Líbia), Dória (Grécia), Sicília e Pérsia ou Parsa (Irão).
Manílio, por seu lado, afirma que a Jónia (Turquia), a Cária (Turquia), Rodes e
a Grécia estão sob a sua influência (Astronomica IV, 763-8).
A influência temporal será, devido à duração do período
total, de cerca de um mês e meio. No entanto, dada à duração do período umbral,
poderá estender-se até cerca de três meses e meio e de uma forma já ténue,
sustentada no período penumbral, poderia ir até ao limite de cinco meses e
meio, o que estaria em concordância com o cálculo baseado nas declinações dos
luminares. Devemos numa análise da influência temporal voltar a reforçar que,
no período até ao eclipse solar de dia 21 de Setembro, o sentido profundo deste
eclipse terá uma maior intensidade que progressivamente irá diminuindo.
É necessário frisar, uma vez mais, a ligação que existe
entre os eclipses lunares e as dinâmicas do planeta Terra, nomeadamente o que
designamos por desastres naturais. Dada a natureza deste eclipse, podemos
observar, por exemplo, como o tufão Kajiki no Vietname foi um prenúncio da sua
sombra. Os sismos e tempestades com origem no mar estão potenciadas, podendo
originar tsunamis e tufões. A lua em Peixes, com a regência moderna de Neptuno,
agora em Carneiro com uma força mais destrutiva, e com o Júpiter, regente
antigo ou tradicional, em Caranguejo, outro signo de água e com o qual forma um
trígono, potencia estes fenómenos. A co-presença da Lua e Saturno também firma
uma vibração mais tensa. Lembremo-nos que Cronos/Saturno foi preso no lugar
mais profundo do submundo, após ter sido derrotado por Zeus/Júpiter. No
Tártaro, lutava contra as correntes que os sustinham, ou seja, fazia vibrar as
profundezas da Terra.
O eclipse lunar total de 7 de Setembro
pertence à série Saros 128, sendo o 41º eclipse de um total de 71. É o 11º
eclipse dos 15 eclipses totais da série, o que transmite um certo
desenvolvimento da sua proposta significativa. O eclipse inicial, como sabemos,
serve de matriz de sentido para toda a série. Ora o primeiro eclipse desta
série ocorreu a 18 de Junho de 1304 (Calendário Juliano). A Lua estava em Capricórnio
e o Sol em Caranguejo e o Dragão da Lua estendia-se no eixo Sagitário-Gémeos.
Mercúrio e Marte estavam em Gémeos, Vénus em Touro, Júpiter em Leão e Saturno
em Balança. Nos transaturninos, Úrano estava em Balança, Neptuno em Escorpião e
Plutão em Aquário. Nesta data e na hora de Lisboa, Virgem marcava a hora e Touro
culminava. A série Saros 128 terminará a 2 de Agosto de 2566, com um eclipse no
eixo Leão-Aquário, ou seja, com a Lua em Carneiro e o Sol em Balança.
A análise comparada dos dois temas,
face ao seu ciclo planetário, faria logo sobressair o facto de Plutão se
encontrar em Aquário no eclipse-matriz tal como hoje se encontra. Naturalmente,
isto adensa esta ligação entre o signo da humanidade e o planeta da morte. Em
tempos sombrios como os que vivemos, resgatar a semente da morte, o memento mori, da consciência do humano
recupera esse sentido primário e matricial que encontramos em toda a série
Saros. Por outro lado, temos Neptuno em Escorpião e agora em Carneiro, os dois
domicílios de Marte recebem o planeta da imaginação. A força de Marte tende,
por um lado, a intensificar a imaginação criativa, se for recebida como dom,
ou, por outro lado, pode com uma força bélica e disruptiva trazer uma ilusão
massificada. Os populismos e os avanços da extrema-direita traduzem essa
realidade. A ideologia vai-se tornar progressivamente violência.
Úrano e Saturno em Balança, estando
este último na sua exaltação, favorecem a criação e estruturação de modelos de
pensamento. Algo que será transmitido pelos raios triangulares ao actual Úrano
em Gémeos. A comunicação pede um sentido renovado que tanto pode dar origem a
novas formas de conhecimento como de desinformação. Do ponto vista histórico, aquando do eclipse-matriz, é de
se assinalar o início do conclave papal, após a morte de Bento XI a 7 de Julho
de 1304, que só terminará no ano seguinte, a 5 de Junho de 1305, com eleição de
Clemente V e que marcará o início de período conhecido como o Papado ou o
Cativeiro de Avinhão (1309-1377). É também de assinalar a primeira guerra pela
independência da Escócia.
O eclipse-matriz revela para um eclipse lunar uma forte influência
política e militar. De facto, se pensarmos bem o início do século XIV, marca um
período de intensas mudanças tanto políticas como filosóficas e espirituais. A
conjunção de Mercúrio, Marte e a Cauda
Draconis vai assinalar o carácter disruptivo de muitas dessas
transformações. As heresias ou heterodoxias cristãs ou o crescimento do poder
do Santo Ofício da Inquisição são dois elementos de destaque, bem como as
profundas alterações políticas. O sextil Júpiter em Leão a Saturno e Úrano em
Balança é também revelador dessas transições. Um eclipse lunar com a Lua exilada
em Capricórnio traz consigo uma forte dinâmica saturnina que lhe confere uma
influência semelhante à de um eclipse solar e, sendo um eclipse-matriz, essa
significação vai estender-se a toda a série.
Convém, no entanto, salientar-se que, por neste eclipse a
Lua estar em Peixes, vamos encontrar um certo sentido de destruturação desse
sentido-matriz. A imersão no todo que o Peixes tende a apresentar com candura
vai agora tomar outras formas. A sombra vai apresentar rudemente a
despersonalização como inevitável e a ilusão da realidade tornará tudo mais
confuso. Lembremo-nos que a sombra vai incidir sobre o signo de Virgem que a guardará
até ao eclipse solar. Com Sol e Mercúrio exaltado em Virgem, e com a quadratura
a Úrano em Gémeos, tudo o que é representado pela razão, pelo pensamento, pela
palavra, pela organização das estruturas comunicacionais está sob pressão. A
sombra dracôntica quer levar tudo o que está estabelecido até ao grande oceano
e mostrar que aquilo que a mente humana produz não chega a ser um grau de areia
na totalidade que é a Alma do Mundo e o seu Intelecto.
Se de Peixes vem uma totalidade assombrada, Júpiter em
Caranguejo com o trígono à Lua, a Saturno e à Caput Draconis e o sextil ao Sol, a Mercúrio e à Cauda Draconis vem contribuir com a
expansão do sentido da origem. Na verdade, a totalidade e a origem são duas
expressões ou conceitos para a mesma realidade inefável que não cabe em nenhum
conceito. Esta é, porém, a via para conhecimento de si. O Eu perde-se na
totalidade do oceano da origem e surge renovado como o Si. A dificuldade para o
humano é o medo de entrar no oceano e perder-se. Está tão agarrado ao que julga
ser importante que não vê que ao perder-se encontra-se. Terá pois de olhar para
o fundo do mar e encarar as sombras que se movem na escuridão.
Marte em Balança, exilado, ameaça as estruturas
relacionais, contudo, o sextil a Vénus em Leão e a quadratura a Júpiter em
Caranguejo trazem alguma moderação ou progressividade a disrupção interpessoal.
O trígono entre Vénus em Leão e Neptuno em Carneiro contribui também com certa elevação
do fogo do amor, se for vivido dessa forma. Vénus em Leão pode elevar o amor na
beleza de alma nobre ou pode afundá-la num narcisismo patológico. Algo que pode
ser potenciado, para o bem e para o mal, pela oposição a Plutão em Aquário. Os
trígonos de Úrano em Gémeos e Plutão em Aquário a Marte em Balança trazem, sob
a égide do destino, uma força transformadora à forma que como lemos e pensamos
a realidade. Essa força não é, porém, voluntária, pois traz consigo os ditames
da providência e necessidade.
Se considerarmos a sistema antigo de leitura de aspectos,
ou seja, pelos conceitos de aplicação e separação, temos de destacar três deles
pela força da aplicação. Primeiramente, o trígono entre Júpiter exaltado em
Caranguejo e Saturno em Peixes que traz consigo a dádiva da Água. Depois, a
quadratura de Saturno em Peixes a Úrano em Gémeos e o trígono entre Úrano e
Plutão em Aquário são, na verdade, duas faces da mesma moeda. O primeiro traz,
com alguma tensão, a criação de novas estruturas e a necessidade de romper com
certas formas de estar e pensar, já o segundo que se estenderá ao longo de
vários anos marcará esse ponte de sentido entre revolução e transformação,
entre progresso e morte. Se pensarmos que nestes dois aspectos Úrano está
presente, este é o vendaval do Anjo da História.
O eclipse lunar total de 7 de Setembro encerra assim um
sentido intermédio entre o eclipse de lunar de 14 de Março e o eclipse solar de
21 de Setembro. Em 2025, a sombra alongar-se-á no eixo Virgem-Peixes, no eixo
de integração da parte no todo, e com um foco particular no signo de Virgem. Não
devemos portanto perder esta oportunidade enquanto humanidade de colher as suas
lições. Se esquecermos a solidariedade, o melhor do humano, viveremos sempre na
escuridão.

Reflexões Astrológicas
Trânsitos e Aspectos
Conjunção Vénus – Júpiter em Caranguejo
Lisboa,06h15min, 12/08/2025
Vénus - Júpiter
Decanato: Mercúrio
Termos: Mercúrio
Monomoiria: Lua
A
conjunção de Vénus e Júpiter em Caranguejo ocorre, no seu momento exacto, com
Leão a marcar a hora para o tema de Lisboa e, deste modo, na XII, no Lugar do Mau
Destino ou Mau Espírito (κακός
δαίμων), no decanato e termos de Mercúrio e
na monomoiria da Lua. O ingresso
dá-se assim acima do horizonte e cerca de meia hora antes do nascer-do-sol. Vénus
encontra-se no seu próprio segmento (αἵρεσις) e Júpiter fora, fazendo de Vénus o
grande benéfico do tema. Podemos estabelecer também uma via ascendente que
começa no Sol, numa posição pré-ascensão, e vai até o Úrano, o astro que mais
se aproxima do Ponto de Culminação.
A conjunção Vénus-Júpiter no signo de Caranguejo é a dádiva
que vem do mar, é o canto de Ariel, mas a Ariel de Caranguejo tem cabelos de
azeviche e olhos de obsidiana. Não é a sereia pisciana da exaltação de Vénus. Na
Pequena Sereia, Ariel para andar na terra perde a voz, para andar por entre os
homens deixa de ser quem é, sujeita-se às suas regras, às suas obrigações, e
para isso deixa de ser a mulher que vem do mar, perde a integridade do próprio
corpo, transformado a pedido, por imposição do mal. O canto de Ariel é encanto
e não é nem um canto de ninguém, nem um canto para ninguém, é um canto que
ilumina o mar profundo e que toca com encanto os seus abismos.
Para quem
tenha visto a versão de animação, mais antiga, da Pequena Sereia da Disney,
lembrar-se-á que na gruta de Ariel encontra-se um quadro de Maria Madalena. A
perda da voz ou a voz roubada é um clássico do feminino agrilhoado. Na actual
conjunção, em pleno mar, Júpiter já se encontra em Caranguejo, o masculino que coexiste
com o Divino Feminino, espera a deusa anunciada, espera o encontro com Vénus.
Este elemento é particularmente importante. Sobretudo se pensarmos que Vénus
está no seu próprio segmento e Júpiter na sua exaltação. A luz espalha-se no
masculino e espalha-se por se encontrar no lugar do feminino, no lugar da Lua,
com a Deusa do Amor. Se existe um exacerbamento da dádiva de Júpiter este nasce
da presença do Divino Feminino.
Existe uma
beleza profunda no encontro dos benéficos, uma que torna qualquer tema especial,
porém, nem sempre as suas dádivas são colhidas, nem as suas bênçãos
reconhecidas. No lugar da Lua (Caranguejo), estes dons podem adquirir um valor
de mistério primordial e, por no tema de Lisboa se encontrar na XII, ganha
também um sentido de aprisionamento. O Mau Espírito ou Mau Destino envolve esta
dádiva, tentando, dada a natureza do lugar, toldar os dons do bem. No entanto,
a persistência do bem resulta daquilo que Séneca descreve do seguinte modo: “O supremo bem não admite qualquer grau
superior a si, desde que nele se contenha a virtude, e desde que a virtude não
seja diminuída pela adversidade e permaneça intacta mesmo que o corpo sofra
alguma amputação: e de facto a virtude mantém-se! É que eu concebo a virtude
como animosa e sublime, e tanto mais ardente quanto mais obstáculos encontra.”
(Ep.71.18;
Cartas a Lucílio, 2ª ed,, trad. J. A. Segurado e Campos. Lisboa, 2004:
Fundação Calouste Gulbenkian). Se o termo virtude
desagradar o leitor contemporâneo, poder-se-á utilizar a tradução do termo grego
ἀρετή, ou seja, a excelência.
A ideia de
supremo bem torna-se, de um ponto de vista astrológico, bastante expressiva na
conjunção dos benéficos. A questão que se coloca é que ele se aplica à
conjunção quando é considerado em si mesma, pois, de um ponto de vista
relativo, a persistência do bem terá de ser sempre colocada em contexto. No
entanto, as lições de Petosíris indicam que, mesmo num aspecto tenso com os
maléficos, a acção profícua dos benéficos supera, ou tende a superar, a dos
maléficos. Ora esta ideia da virtude ou da excelência como bem supremo assume,
na expressão astrológica, uma ponte de sentido entre os benéficos, por um lado,
e os luminares, por outro. É desta união da dádiva à luz que se pode alcançar o
supremo bem. A excelência astrológica terá de nascer desta relação primordial.
Contudo, a simples presença da conjunção dos benéficos torna-se um indicador,
por um lado, da dádiva e, por outro, da persistência do bem. Na distribuição de
raios a sua força, estará sempre reforçada.
Nesta
conjunção, as duas energias do bem fundem-se numa única expressão. Cada uma
contribui com a sua própria natureza e de acordo com o lugar que ocupa. Neste
caso, Caranguejo, o lugar da Lua, recebe os benéficos com os dons que lhe são
próprios. O lado materno de Caranguejo é diferente do lado materno, por
exemplo, de Touro que representa a Mãe Terra. Caranguejo é a Lua como mãe, é a
Mãe Divina, a luz do feminino iluminando o céu em cada um das suas faces.
Quando os planetas ocupam um lugar, os deuses estão ali, estão de passagem e
fixam-se nessa morada. Afrodite e Zeus ou Vénus e Júpiter estão no lugar da Lua,
da Mãe Divina. Ora isto remete-nos para Séneca quando diz que “Os deuses não nos desprezam nem invejam,
antes nos admitem à sua presença e nos estendem a mão para ajudar-nos a subir!
Admiras-te que um homem possa ascender à presença dos deuses? A divindade é que
vem até junto dos homens e mesmo, para lhes ficar mais próxima, penetra até ao
interior dos homens, pois sem a presença divina não é possível existir a
virtude! As sementes divinas existem dispersas no corpo humano: se forem
tratadas por quem as saiba cultivar, elas crescerão à semelhança da sua origem,
desenvolver-se-ão em plano idêntico ao da divindade de que provieram; mas se
caírem nas mãos de um mau cultivador então este, tal como um terreno estéril e
pantanoso, matá-las-á, produzindo ervas daninhas em vez de searas.” (Ep.73.15-6; Cartas a Lucílio, 2ª ed,,
trad. J. A. Segurado e Campos. Lisboa, 2004: Fundação Calouste Gulbenkian).
Se considerarmos um tema astrológico, onde os deuses se
encontram é lá que se encontram as suas sementes. Um tema que receba a
conjunção dos benéficos, seja ele natal ou mundano, será sempre um com uma dimensão
especial de dádivas. Quem quer que conheça alguém nascido com esta conjunção,
verá que se encontra ali alguém que tem algo para dar. As bênçãos do bem não se
guardam para si. Vénus e Júpiter, unidos num tema, pedem uma distribuição do
bem, ou seja, a luz recebida deve ser devolvida de acordo com os dons que
receberam. O bem recebido não se esgota em si mesmo. Pelo contrário, cresce
como semente e torna-se uma árvore robusta, uma que entregará ao mundo os
frutos e as futuras sementes. Segue o caminho do bem e lá encontrarás as suas
dádivas. Nesse caminho, encontrarás o tesouro.
Ora na actual conjunção Vénus-Júpiter firma-se e
evidencia, de forma facilmente observável, uma predominância do númen feminino.
O Divino Feminino é, neste momento, uma luz que se vê, que surge erguida sob o
horizonte, anunciada, como proposta de transformação da humanidade. Pelo facto,
da conjunção se fixar em Caranguejo, o lugar da Lua, esse já seria por si só um
anúncio, mas os elementos não se reduzem a essa determinação. Vénus e Júpiter
em Caranguejo unem-se triangularmente à Lua e à Caput Draconis em Peixes. Do lugar da exaltação de Vénus e do domicílio
de Júpiter, a Lua e o Dragão da Lua vão contribuir e consubstanciar a expressão
do Divino Feminino nesta efeméride. Porém, não nos devemos esquecer que para o
tema de Lisboa os lugares não favorecem nem a conjunção, nem a união
triangular, pois a conjunção cai na XII e a Lua e Caput Draconis encontra-se na VIII, no lugar da Morte.
Existem também outros dois elementos de tensão que atacam
este prenúncio escatológico do Divino Feminino. Os maléficos fixam
quadrangularmente o seu olhar na conjunção dos benéficos. Marte em Balança e
Saturno (e Neptuno) em Carneiro criam dois aspectos de tensão a Vénus e Júpiter
em Caranguejo. O eixo da identidade (Carneiro-Balança) revela a dificuldade de
receber a transformação que representa o númen do Divino Feminino. Existe uma
resistência, uma oposição declarada ao elemento transformativa, ou seja, a
humano teme a desintegração da identidade e a imersão na origem. É como se a
humanidade revelasse colectivamente o medo do útero divino, o que não é difícil
de apreender dada a misoginia em que estamos envolvidos. O númen feminino tem
sido sempre alvo de oposição, de resistência. No entanto, relembrando Séneca e
Petosíris, existe, por um lado, a prevalência do bem supremo e, por outro, a
persistência dos benéficos, daí resulta a conclusão de que; apesar destes
elementos restritivos, o Divino Feminino fará o seu caminho pelo menos até
aqueles que o queiram receber.
Os elementos de tensão devem ser assim considerados de
forma distinta e específica. Saturno e Neptuno em Carneiro revelam como a práxis de uma identidade, enraizada em
estruturadas patriarcais cristalizadas e em elementos espirituais
preconceituosos que ainda persistem, tende a rejeitar a integração do númen
feminino. Saturno e Neptuno em Carneiro são uma oportunidade humana de
transformação, por meio da acção, de estruturas caducas, porém, a natureza humana
tende a resistência. Esta quadratura à conjunção dos benéficos apresenta-nos a
base dessa fortaleza dogmática. Por outro lado, mas consequentemente, a
quadratura de Marte em Balança à conjunção é bom exemplo da força debilitada,
uma força (Marte) erguida a partir das deficientes estruturas relacionais do
humano (Balança), como promotora de uma violência estrutural contra o feminino
e contra a mulher. Os nossos tempos, a realidade sombria que vivemos, continua
a ser absurdamente perigosa para uma mulher. A transformação a partir do Divino
Feminino vem contrariar a continuidade desse padrão destrutivo.
Aos raios quadrangulares, lançados a partir de Carneiro e
Balança até à conjunção dos benéficos, podemos juntar também a quadratura entre
a Lua e a Caput Draconis em Peixes e
Úrano em Gémeos. Neste elemento de tensão, face à proposta considerada pela
conjunção, vai encontrar-se uma dificuldade de conciliar as estruturais
comunicacionais da sociedade contemporânea, baseadas numa expressão líquida e
informe, e a profundidade espiritual de integração na totalidade imersiva de
uma deusa sob a água e que dá à costa. A racionalidade dedutiva, por um lado, e
a ausência de profundidade, por outro, apresenta-se como um sério obstáculo
aquilo que é proposto pela conjunção e pela sua relação com a Lua e com o seu Dragão.
Existe assim uma barreira de discurso ou de entendimento desse discurso à
proposta de transformação desta co-presença dos benéficos.
Paralelamente, sob um traço astrológico da aversão, Sol e
Mercúrio em Leão apresenta uma outra mensagem que, na verdade, se relaciona com
aquela que a conjunção quer transmitir. Quando o Sol em Leão alcança o melhor
de si, ultrapassando as pulsões narcísicas que lhe são inatas, chega àquilo que
se pode designar de nobreza da alma e com Mercúrio promove a nobreza do
discurso. Existe, porém, uma raridade neste estágio leonino, uma que não
chegará a todos por determinação geral, e que também não se limita ao Sol ou a
Mercúrio, abrangendo também outros planetas ou pontos astrológicos. A proposta
do melhor de Leão servirá, por exemplo, para atenuar a acção deletéria dos
maléficos. A união em trígono a Saturno (e Neptuno) e em sextil a Marte, os
dois em separação, faz do Sol e de Mercúrio os arautos de uma transformação
através do carácter.
A oposição do Sol e Mercúrio em Leão a Plutão vai adensar
esta proposta transformativa. Plutão traz o Memento
Mori à nobreza da alma. Alguém com uma alma nobre trará sempre si a
sabedoria de que se vai morrer. A presença tangível da morte permite que se dê
valor à vida. Os tolos que pensam que não vão morrer não dão valor a nada. O Memento Mori como semente plutoniana vai
contrariar a acção dos maléficos, relativizando a sua influência e mostrando-nos
que devemos colocar as nossas preocupações naquilo que controlamos e não em
eventos externos. A morte como lição tem o poder de exercer um processo de reductio, ou seja, devemos estabelecer
como lição essa redução ao essencial, àquilo que contribui para o
estabelecimento de uma via transformativa.
Em 2025, a conjunção entre Vénus e Júpiter em Caranguejo
vai trazer aquele que pode ser entendido como o dom ou a dádiva que neste ano
se anuncia. O Divino Feminino surge acima do horizonte, como estrela que guia,
como luz no caminho. Se utilizarmos como unidade simbólica o tema de lisboa,
vemos que o Sol ainda não nasceu e que Vénus e Júpiter ascendem acima do
horizonte. Nesse amanhecer olissiponense, os benéficos são Estrelas da Manhã,
guias de uma luz que rompe a escuridão. A permanência e persistência do bem é
algo que deve estar sempre presente, lembrando-nos que onde está o tesouro,
está a transformação. Na subida para o templo, é o amor que nos salvará e a
deusa do amor indicar-nos-á o caminho.