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quinta-feira, 22 de setembro de 2022

Reflexões Astrológicas 2022: Equinócio de Outono

Reflexões Astrológicas

Estações


Equinócio de Outono

Lisboa, 02h04min, 23/09/2022

 

Sol

Decanato: Lua

Termos: Saturno

Monomoiria: Vénus

 

             Se o Equinócio da Primavera é, por excelência, um tempo de iniciação, o Equinócio de Outono indica então um tempo de repouso. A colheita iniciada em Agosto, no Lughnasadh ou Lammas da tradição pagã, mas cujo potencial teve origem no Solstício de Verão, começa agora a chegar ao seu termo. É a segunda e última colheita. Naturalmente, para o Hemisfério Sul, a interpretação é a inversa e poderá ser encontrada na reflexão acerca da Primavera. No entanto, o sentido de tempo após a colheita é universal seja qual for o período anual em que se fixa. Este é o tempo em que o grão se torna pão. É o tempo em que a vinha se torna vinho. A Mãe-Terra entrega assim ao Filho-Luz o seu último alimento.

            Os equinócios representam o equilíbrio, a harmonia. O dia e a noite estão ao mesmo nível. Porém, no fluxo anual existe uma continuidade e tudo segue o seu curso. O Sol prepara-se para a sua morte e a escuridão aproxima-se. As festas de São Miguel Arcanjo celebram-se uma semana após o equinócio: a 29 de Setembro. Ora o Arcanjo Miguel e o Portador da Luz (Lúcifer) são, na verdade, os guardiões da luz, deste equilíbrio equinocial. E, neste caso, estão ambos nos pórticos da luz, esperando pelo Inverno, pelas trevas e pela morte. O Sol extinguir-se-á para que um novo Sol possa renascer. A fénix voa morrente sobre nós.

            De um ponto de vista astrológico, esta tensão do equilíbrio é expressa pelo eixo Carneiro-Balança, pelo olhar de frente (oposição) entre Marte e Vénus, os domicílios diurnos destes signos. Curiosamente, o senhor do destino e da necessidade, o Dragão da Lua estende agora o seu corpo pelos domicílios nocturnos destes planetas (Escorpião-Touro). Com base na referência anterior, e de forma mais masculinizada, ou seja, por temor do feminino, estes são também o Arcanjo Miguel (Marte) e Lúcifer (Vénus). Ora este choque da polaridade, criando a harmonia ou a tensão, faz dos equinócios um momento de stress, de pressão psíquica. O medo da ausência da luz paira sobre o mundo e sobre o humano. A energia, fervilhando, trespassa, deste modo, tudo e todos na esperança de harmonia, de equilíbrio.

            Jung diz-nos, no Livro Vermelho, que “o diabo é a soma da escuridão da natureza humana. Aquele que vive na luz luta para ser a imagem de Deus; aquele que vive na escuridão luta para ser a imagem do diabo.(The Red Book 2009: 322 [H1 176]. Ed. S. Shamdasani. Nova Iorque/ Londres: Philemon Series, W. W. Norton & Company. A tradução é da minha responsabilidade). Existe no Equinócio de Outono, nos meses que o cercam, esta tensão entre a escuridão e a luz, entre as imagens de Deus e do Diabo e esta angústia da identidade, em si e no outro, torna-se dominantemente interna. A sua expressão externa, ou mundana, resulta do imperativo do repouso, do olhar que se fixa sobre si. Nas profundezas e nas alturas da luz e da escuridão, aquele viaja pode alcançar o olhar do abismo e o olhar da montanha e, em comunidade, como viajante renascido, transformar o mundo.

            O Outono traz consigo a espera da folha caída, o tempo intermédio, entre mundos, de guardar, contemplando, o grão e o pão. Esse é naturalmente um esforço interno que, por vezes, sai astrologicamente reforçado. É o caso destes meses de Outono (ou de Primavera para o Hemisfério Sul, neste caso, como iniciação). Neste período, o movimento planetário centrar-se-á na passagem de retrógrado a directo ou do seu inverso.

            Mercúrio, que se encontra retrógrado, ficará directo no dia 2 de Outubro. Já Marte iniciará a estação em movimento directo, mas, no dia 30 de Outubro, passará a retrógrado. Esta retrogradação estender-se-á até 12 de Janeiro de 2023, já em pleno Inverno, permanecendo, porém no mesmo signo, em Gémeos. Como sentido profundo, a acção tornar-se-á potência e o carácter, potencialidade. Júpiter começa retrógrado, assim ficando até 23 de Novembro, e, no dia 28 de Outubro, sairá de Carneiro, permanecendo em Peixes até ao dia 20 de Dezembro (véspera do Solstício de Inverno). A justiça e o bem expandir-se-ão entre a acção e a totalidade. Saturno deixará a sua retrogradação no dia 23 de Outubro, tornando a consciência do tempo numa aceitação da necessidade.

            Quanto aos planetas transaturninos ou transpessoais, Úrano e Neptuno mantêm a retrogradação, respectivamente em Touro e Peixes, enquanto Plutão em Capricórnio passará a directo no dia 8 de Outubro. Ora este caminho de avanço real e do recuo aparente será particularmente intenso na estação que agora se inicia. Saturno e Plutão são aqueles que, de forma mais célere, irão escapar a esse processo interno de retorno a si mesmo, fazendo da sua acção um processo efectivo e que exteriormente se concretiza.

            A partir do outro, da apreensão da dualidade (Balança), o eu (Carneiro) já não regressará ao próprio eu, terá de integrar e expressar o si. Esse esforço, essa tensão, firmar-se-á entre a Luz e a Sombra, entre o olhar de Marte e o olhar de Vénus. No entanto, a Necessidade (Saturno) e a Morte (Plutão) tendem agora, por força da acção directa, a criar as suas raízes, trazendo os frutos da sua obra aos tempos de escuridão que se avizinhavam. A escuridão não deve, todavia, alimentar o temor, deve sim servir de sentido profundo, pois só na noite escura é que a candeia da alma se erguerá.

            Nas Máximas de Delfos, encontramos dois aforismos que marcam este processo de transformação: πρρόνοιαν τίμα (Honra a providência) e ἄρχε σεαυτοῦ (Governa-te a ti próprio). Ora a aceitação do destino e o governo de si mesmo actuam como ponte, sobretudo no tempo de repouso, para a passagem da escuridão à luz. Existe um aspecto astrológico que marca o equinócio e que confirma a mensagem destas máximas. O Sol e Mercúrio em Balança unem-se triangularmente a Marte em Gémeos e a Saturno Retrógrado em Aquário.

            Um trígono com os dois maléficos, já diziam os antigos, tem um sempre um efeito maligno, apesar de ser um trígono, contudo, pelo modo como um triângulo reúne em si a força da necessidade, a Providência faz do mal e da destruição uma condição de potencialidade, ou seja, só depois da queda existe ascensão e é do abismo que desejamos o cume. No entanto, por ocorrer no elemento Ar, coloca um peso, uma gravidade, nas ideias e na comunicação. A intolerância, por vezes violenta, pode destruturar a paz social e acentuar as assimetrias e as desigualdades sociais. Existe palavras que destroem e essa será uma experiência nos próximos meses.

            De um outro modo, a dupla quadratura de Marte em Gémeos a Vénus em Virgem e a Neptuno em Peixes que, desta forma, se opõem, assume também um carácter estruturante e dinâmico. Marte lança um olhar quadrangular a Vénus e à sua oitava sobre um eixo (Virgem-Peixes) que rege, por excelência, o serviço à humanidade e à divindade. O cuidar da parte e do todo, a solidariedade com elemento civilizacional, sofre aqui uma enorme ameaça, pois a palavra como forma de manipulação e propaganda, isto é, como arma, não de luta social, mas de imposição de narrativas, será agora particularmente nociva.

            Paralelamente, encontramos um triângulo no elemento Terra que reúne Úrano e a Caput Draconis em Touro, Vénus em Virgem e Plutão em Capricórnio. Existe aqui, como também é próprio de um equinócio, uma necessidade de integração da dádiva, ou seja, é imperativo que se colham as graças da abundância, da Mãe-Terra. Porém, Úrano e Plutão podem, ou melhor dizendo, exigem, que novas formas de receber essas dádivas sejam criadas e, para que isso aconteça, as velhas formas de lidar com a riqueza, com os bens de primeira necessidade, com tudo aquilo que se recebe e produz a partir da Mãe-Terra vão ter de morrer, de ser destruídas. Na verdade, essa é também a mensagem do Dragão da Lua sobre o eixo Escorpião-Touro. Só existirá um novo modo de viver quando os velhos valores sucumbirem. A vida nascerá assim da morte.

            Dada a proximidade temporal da Lua Nova (dia 25), deixarei algumas das posições e aspectos para essa reflexão. Porém, a posição da Lua merece ainda a nossa atenção. A Lua encontra-se em Leão, no domicílio do Sol, com quem se une, juntamente com Mercúrio, em sextil. Lança igualmente raios hexagonais para Marte em Gémeos e triangulares para Júpiter em Carneiro, olha de frente (oposição) para Saturno em Aquário e estabelece uma tensão quadrangular com Úrano e o Dragão da Lua. Esta posição relativa da Lua coloca a nobreza da alma, a sua expressão biológica e emocional, bem como o carácter, sobre os laços da liberdade e os nós do destino. Estão colocados pois, nos passos da humanidade, os sinais que firmam a sua vida e determinam a evolução da alma.

            Neste Equinócio de Outono, ao seguirmos o repouso após a colheita, relembramos a lição de que é no silêncio que repousa a sabedoria e, perante as sombras, os sábios não choram, rejubilam. O Divino Feminino, a Sagrada Sabedoria e a Deusa, tal como em Elêusis, esperam por nós com a semente do nosso futuro e essa é dádiva da esperança.    

sábado, 19 de março de 2022

Reflexões Astrológicas 2022: Equinócio da Primavera (Ano Novo Astrológico)

 Reflexões Astrológicas

Estações



Equinócio da Primavera 

(Ano Novo Astrológico)


Lisboa, 15h34min, 20/03/2022

 

Sol

Decanato: Marte

Termos: Júpiter

Monomoiria: Marte

 

            O retorno da Primavera traz sempre consigo um potencial de renovação. Essa é de facto a palavra que melhor descreve a raiz de sentido do ingresso anual do Sol em Carneiro e de um novo ano astrológico. O termo renovação constrói-se a partir de uma simbiose de repetição e novidade. Existe pois uma recuperação antagónica do novo, ou seja, repete-se o ciclo sem anular a novidade e que é, na verdade, um Eterno Retorno que conserva o carácter inaugural da consciência da vida e do tempo. O ciclo zodiacal que se inicia com a Primavera não é assim nem uma repetição, nem uma novidade, mas sim uma renovação. É a Perséfone que sobe do Hades, da semente guardada na terra, e renova a natureza, traz à mesma árvore, uma nova flor, um novo fruto.

            Desta forma, existe no fim de um ciclo em Peixes e de um novo ciclo em Carneiro uma passagem hermética da contemplação à acção. A sabedoria da totalidade torna-se a acção sobre a realidade. No entanto, sem o registo sobre a Roda da Necessidade do ciclo anterior, Carneiro age sozinho e, centrado no eu – e não no si –, inicia a experiência de cada estágio de vida, de cada tempo e lugar. Este é Hércules, realizando sozinho, como exigência de Euristeu, cada um dos doze trabalhos. Existe, porém, uma excepção. Para matar a Hidra (o trabalho que representa o signo de Escorpião), Hércules precisa da ajuda de Iolau para cauterizar as cabeças decepadas, impedindo-as assim de voltar a crescer. Curiosamente, é precisamente o veneno da Hidra que, mais tarde, mata o herói.

            O planeta Marte, que coloca a viagem iniciática em acção (Carneiro, dia), é o mesmo que conduz ao veneno que mata o herói (Escorpião, noite) e ao único trabalho em que Hércules é efectivamente ajudado, onde o eu recorre ao outro para vencer o pior dos monstros, o temor da morte certa. Este é o trabalho que se segue ao que é diametralmente oposto ao primeiro (eixo Carneiro-Balança). Depois do eu e do outro, do que nasce e do que se põe, apreende-se a experiência da morte, do limiar.

            Paralelamente, como segunda viagem iniciática, a que que parte de um Carneiro que viaja a partir de Peixes e renova a sua demanda, temos a busca de Jasão e dos Argonautas pelo velo de ouro. Note-se que o aríete imortal que possuía o tosão dourado (Carneiro como exaltação do Sol) era filho de Posídon (Peixes). Nesta viagem, Jasão não vai sozinho. As suas aventuras são partilhadas. No entanto, após a demanda, Jasão abandona Medeia, com quem tinha dois filhos e que o ajudara a conseguir o velo, por Creúsa, sua prima. Furiosa, Medeia envenena o vestido de noiva de Creúsa, matando-a, e assassina os filhos que tivera com Jasão. Medeia é então levada para Atenas por um carro puxado por dragões, ou serpentes, oferecido pelo seu avô, o deus Hélios (Sol). Os deuses estão do lado de Medeia e Jasão, perdendo os favores de Hera, morre sozinho.

            Estas duas variações do ciclo zodiacal e vernal têm um elemento em comum: a relação entre o eu e o outro e o Sagrado Feminino. A mitologia olímpica, demasiado masculinizada e a que mais influenciou os modelos astrológicos elementares, faz de Hera a esposa ciumenta e vingativa. Porém, Hera é uma Grande Mãe, sucessora de Reia-Cíbele. E, esquecido quiçá por os leitores de Os Trabalhos de Hércules de Alice Bailey (1957-8), Hércules é o grego Herácles (Ἡρακλῆς) que significa glória de Hera (Ἥρα+κλέος). A inimiga patriarcal é, na verdade, a deusa benévola. De uma forma ou de outra, tanto Hércules como Jasão rejeitam o Feminino e sofrem o seu castigo. Se nos focarmos em demasia no simbolismo masculino do signo de Carneiro e ignorarmos a exaltação do Feminino que é o início da Primavera, perdemos o valor primordial da transformação, da passagem da noite escura invernal à natureza em flor, dádiva do Feminino.

            A Perséfone, renascida no Equinócio da Primavera é, segundo o hino órfico que lhe é dedicado (hino 29), tanto “a rainha sob a terra” (ὑποχθονίων βασίλεια, hino órfico a Perséfone 29.6) como “a donzela abundante em frutos” (κόρη καρποῖσι βρύουσα, hino órfico a Perséfone 29.10). É a mãe das Erínias e a filha de Démeter. É a luz e a sombra. A Primavera implica sempre essa passagem da sombra do Inverno à luz que brota da cornucópia primaveril e que atinge a sua plenitude no Solstício de Verão. Ora, neste equinócio, a luz do Sol no início de Carneiro estende-se até à Lua no final de Balança e, tal como nos exemplos astro-mitológicos, a projecção do eu no outro e do outro em nós determinam os tempos difíceis que vivemos em que Marte brande o gume e o escudo, a lança e o elmo.

            O regente de Carneiro encontra-se em Aquário, no signo da humanidade, e, com ele, Vénus e Saturno constroem essa potência concentrada de força, desejo e necessidade. A guerra não surge como sinal dos tempos, mas como consequência do humano. E, nessa ponte entre o eu e o outro, a solidariedade e a bondade (Júpiter e Neptuno) colidem com a impossibilidade dessa relação. A apreensão do outro torna-se apenas imagem de nós. A caridade líquida e fotogénica (Mercúrio em Peixes), que não é uma verdadeira solidariedade e que nasce da corrupção do espírito da Era de Peixes e que se acentua no trânsito de Júpiter e Neptuno, serve mais quem a pratica do quem recebe, pois não tem por objectivo transformar a realidade. Confortar quem sofre não é o mesmo que impedir o sofrimento.

            Devemos então trazer até nós a questão e a dúvida. Porque conseguimos mostrar mais empatia porque sofre na Ucrânia do que por quem sofre no Iémen, na Somália, na Palestina ou em Myanmar, só para dar alguns exemplos? Será que esse outro que sofre mais longe permanece o outro, o estranho, e não serve a projecção do eu no imediatismo dos media e na vaidade das redes sociais? As crianças que morrem de fome, por exemplo, no Iémen e por quem a ONU e a UNICEF têm clamado não merecem a nossa atenção e compaixão? Ou que ajuda humanitária entregámos colectivamente nos campos de refugiados de Calais ou Mória? Neptuno e Júpiter em Peixes são tanto a empatia e a justiça social como a ilusão e o fanatismo. A necessidade de totalidade não se efectiva e a parcialidade permanece.

            A ligação hexagonal que se estabelece entre o Sol em Carneiro com Vénus, Marte e Saturno em Aquário ou triangular destes com Lua colide com a relação diametral dos luminares e com o aspecto quadrangular do Sol a Plutão em Capricórnio. Os instintos primários do humano são aqueles fazem transparecer a impossibilidade filosófica da relação sujeito-objecto, do eu com o outro. E, por outro lado, tanto o Dragão da Lua como Úrano em Touro pedem uma reavaliação (ou mesmo revolução) dos valores e uma refundação necessária que estende da morte ao viver (eixo nodal Escorpião-Touro). A configuração do equinócio vernal alerta também, em consequência destas posições ou aspectos, aliadas a Mercúrio, Júpiter e Neptuno em Peixes, para os perigos do pensamento único e dos nacionalismos.

            Quando Marte e Júpiter estiverem co-presentes em Carneiro no Solstício de Verão, a guerra e os nacionalismos que estão na origem de regimes totalitários podem não só persistir como agravar-se. Natália Correia escreveu, num papel avulso, conservado no seu espólio: “Consumada que é a Pátria, falta dizer Mátria para que no tempo os amantes escrevam o nome da realidade unificante: Frátria.” (Franco, J. E. & J. A. Mourão, 2005, A Influência de Joaquim de Flora em Portugal e na Europa: Escritos de Natália Correia sobre a Utopia da Idade Feminina do Espírito Santo, 229. Lisboa: Roma Editora). Uma Mátria não tem fronteiras, nem nacionalidades, tem terra e gentes. E uma Frátria só tem um planeta e uma humanidade. Essa a verdadeira promessa aquariana. E o Sagrado Feminino é o elemento de passagem. O destino por cumprir não é de um país é sim de uma “Mãe que é Deus também”, uma proposta de sentido explorada no meu romance A Casa da Torre Velha (2022).

            Marte em Gémeos no Equinócio de Outono e no Solstício de Inverno podem trazer hostilidade às negociações e extremismo aos media, mas pelo menos existirão verdadeiras negociações. O movimento ao longo do ano de Marte e Júpiter serão fundamentais para compreender o que nos espera num mundo que pede mudança, mas permanece no mesmo. Por outro lado, o regresso dos movimentos de retrogradação retomará a difícil lição que vai da desmedida à retribuição, trazendo até nós o imperativo da Necessidade. Neste ano em que infelizmente os conflitos serão o gérmen dos dias, será fundamental compreender a primeira de todas as lições da astrologia antiga: a luz e a sombra.

            A doutrina do segmento de luz (αἵρεσις) permite-nos compreender essa harmonia dos opostos. No ingresso das estações e com um olhar a partir de Lisboa, os luminares estarão em acima do horizonte nos dois primeiros e de dia (Primavera e Verão) e nos outros dois abaixo e de noite (Outono e Inverno), cumprindo o significado radical. Existe, deste modo, e como sempre, uma necessidade de integrar a luz na sombra e a sombra na luz. De um ponto de vista astrológico, é preciso sobretudo não ler o mundo com os olhos do nosso próprio tema, pois se o fizermos, rejeitarem-nos a parte que a sombra guarda em nós e no mundo e revelaremos apenas a dimensão inabitada dos nossos temores.

            Liz Greene resume na perfeição esta dificuldade quando diz que "Se nos identificamos muito fortemente com um determinado conjunto de qualidades na nossa própria natureza, quando o oposto vem à superfície ou aparece em outra pessoa, o resultado em geral é a repulsa. Trata-se de uma profunda repulsa moral, uma verdadeira aversão pelo que a outra pessoa representa. Não é apenas um desinteresse ou um desagrado casual. A sombra desperta em nós uma raiva totalmente desproporcional à situação." (Greene, Liz, 1994, "A Sombra na Astrologia" in Ao Encontro da Sombra: O Potencial Oculto do Lado Escuro da Natureza Humana, org. C. Zweig & J. Abrams, 177 [175-8]. São Paulo: Editora Cultrix). É portanto necessário integrar a sombra na luz e compreender que nem nós, nem o mundo somos o sentido absoluto da parte, mas devemos sim aspirar a ser o todo, um verdadeiro microcosmos. O ciclo anual das estações e do Zodíaco é uma imagem dessa totalidade.

            Em suma, quer-se que esta Primavera reforce o espírito de renovação que a natureza nos transmite e que o humano tende a rejeitar. A serenidade da compaixão, tornada uma natureza em acto, deve ser o caminho e a humanidade precisa dessa renovação. O Sagrado Feminino é luz no caminho.