terça-feira, 26 de março de 2024
Brevemente: O Resto Permanece Humano: Livro III
segunda-feira, 25 de março de 2024
Reflexões Astrológicas 2024: Eclipse Lunar Apulso (Lua Cheia Balança-Carneiro)
Reflexões Astrológicas
Eclipse Lunar Apulso
(Lua Cheia: Balança-Carneiro)
Lisboa, 07h13min, 25/03/2024
Lua
Decanato: Lua
Termos: Saturno
Monomoiria: Marte
Sol
Decanato: Marte
Termos: Júpiter
Monomoiria: Saturno
O Eclipse Lunar Apulso de dia 25 de Março
ocorre com a Lua no signo de Balança e o Sol no de Carneiro, com Carneiro a
marcar a hora e cerca de quarenta e cinco minutos após
o nascer-do-sol (hora de Lisboa), logo no Segmento de Luz (αἵρεσις) do Sol, estando este acima do horizonte, na I, no Leme do
tema (οἴαξ),
já a Lua está abaixo do horizonte, na VII, no lugar do Poente (δύσις). A Lua encontra-se no seu decanato, nos termos de Saturno
e monomoiria de Marte, enquanto o Sol
encontra-se no decanato de Marte, nos termos de Júpiter e monomoiria de Saturno. Após a aurora, com a noite terminada, o
eclipse colocará a sua sombra sobre o eixo do horizonte e, a partir da
Ascensão, trará consigo a mensagem do Dragão da Lua, aquela que une a necessidade
e o destino.
Um
eclipse lunar apulso ou penumbral acontece quando a Lua passa só pela penumbra
terreste, ou seja, pela parte menos escura da sombra da Terra. Neste tipo de
eclipse, o obscurecimento da Lua é subtil e difuso, tornando a sua observação
mais difícil. De um ponto de vista simbólico, a Terra não esconde a Lua, leva-a
sob o véu. Não é Deméter pesarosa à procura de Perséfone, oculta sob a Terra
com Hades, é sim Deméter, passeando, na Primavera e Verão, com Cora (Koré), protegida sob o manto materno. Um
eclipse lunar expressa, também por esta razão, algumas das matizes de luz e
sombra do feminino, mostrando a ponte de sentido que existe entre o mito e a
realidade. No entanto, o eclipse actual não favorece o feminino, pois a Lua, no
tema de Lisboa, afunda-se no Poente, num signo masculino e nos termos de
Saturno.
A
luz e a sombra, guardados pelo corpo do dragão primevo, revelam a forma como a
providência gere a parte e o todo, como concede cada porção de luz e sombra,
sem perder nunca a visão do todo, o olhar da montanha. Proclo, nos Elementos de Teologia, diz-nos o
seguinte: “Todo o todo-na-parte é uma parte de um todo-de-partes. Porque se é uma parte, é uma parte de
algum todo; e este deve ser ou o todo que contém, em virtude do qual é chamado
de todo-na-parte, ou então algum
outro todo. Mas, na suposição anterior, será uma parte de si mesmo, e a parte
será igual ao todo, e os dois idênticos. E se for uma parte de outro todo, ou é
a única parte, e se assim for será novamente indistinguível do todo, sendo a
única parte de uma unidade pura; ou então, uma vez que as partes de qualquer
todo são pelo menos duas, este todo incluirá um outro elemento e, sendo
composto por uma pluralidade de partes, será um todo das partes que o compõem.
Por conseguinte, o todo-na-parte é
uma parte de um todo-ou-partes.” (Prop.68, The Elements of Theology, ed. E.R.
Doods, p.65. Oxford, 1971: Clarendon Press).
Ora se ultrapassarmos sem preconceito a linguagem
filosófica, julgando que é erudição aquilo que apenas traduz a realidade,
compreendemos uma porção daquela que é relação entre a parte e o todo. Esta
relação é transcrita pelo eixo Peixes-Virgem, aquele será a próxima viagem do
ciclo nodal. No entanto, o actual ciclo de eclipses ocorre no eixo
Carneiro-Balança, ou seja, no eixo da identidade, aquele que une a unidade e a
dualidade e que estabelece a travessia da ponte da alteridade. A significação
destes dois eixos é fundamental para a compreensão, para a consciência íntima,
da luz e da sombra sobre estes binómios. A providência colocará a necessidade (Caput) e o destino (Cauda) sobre estes conceitos e sobre a forma como integramos o seu
sentido profundo. O eclipse de dia 25 de Março marca, neste ano de 2024, o
início da continuação dessa viagem. O desafio será passar, neste e
nos próximos anos, da identidade (Carneiro-Balança) à integração (Peixes-Virgem).
Seguindo
a ideia desenvolvida por Proclo, será necessário compreender-se como a parte
que nos coube participa do todo e de que tipo é esse todo, o que é, de facto,
uma integração da identidade na totalidade. Porém, essa integração ocorre
primeiro como revelação da consciência de si e depois como desagregação dessa
mesma consciência na consciência do todo, ou seja, seguindo a inspiração
estóica, a alma individual compreende que participa da Alma do Mundo. Quando um
eclipse se firma sobre o horizonte, dando luz à sombra e sombra à luz,
confirmando as suas naturezas, esse processo de integração toma a forma de
desafio ou enigma. Se excluirmos Júpiter, Úrano e Plutão, todos os outros
planetas estão presentes em signos dos eixos indicados. Na verdade, em Peixes,
existe uma forte co-presença planetária (ou Stellium
como hoje se diria). Neste signo, aquando do eclipse, estão Marte, Saturno,
Vénus e Neptuno, os maléficos e os planetas da dádiva do amor (Vénus exaltada e
Neptuno no signo por si regido).
Face
ao exposto, a influência do actual eclipse terá de conciliar a sua presença nos
ciclos nodais com a extensão temporal da sua acção concreta. A questão da influência
dos eclipses deve considerar sempre uma metodologia plural, uma que se fixe
para além das horas equatoriais descritas por Ptolomeu. A leitura das
declinações do Sol e da Lua colocariam uma influência restrita de um a dois
meses, já a duração penumbral fixaria uma influência mais ténue, de quase cinco
meses. Um outro critério que também firma a sua influência é a série Saros em
que se insere. A série Saros 113 é uma série antiga que começou a 29 de Abril
de 888 e que vai terminar a 10 de Junho de 2150. Este é o 64º eclipse de um
total de 71 eclipses, o que confere uma certa maturidade à mensagem proposta
pela série.
A
série Saros 113 é inaugurada por um eclipse em que o Dragão da Lua se estende pelo
mesmo eixo que o actual, todavia, o eixo luminar encontrava-se no eixo
Touro-Escorpião, ou seja, no eixo do ciclo nodal anterior ao que estamos a
viver. Este factor, para a questão da influência, corrobora o sentido de uma
influência abrangente, escrita num ciclo astrológico mundano mais amplo. O tema
do primeiro eclipse de uma série Saros serve de matriz para toda a série e,
seguindo este modelo interpretativo, existe uma proximidade do sentido astrológico
inicial com o actual.
No
eclipse de 29 de Abril de 888, a Lua e Úrano estavam no signo que marca a hora,
Escorpião, e no signo oposto, Touro, estavam o Sol, Mercúrio e Plutão. Em
Carneiro, estava a Caput Draconis,
Marte e Neptuno. Júpiter estava em Caranguejo e Saturno, culminando, em Leão.
Curiosamente, Vénus era o único planeta que se encontrava cadente, o mesmo que
hoje está exacerbado, mas também cadente. Porém, em 888, estava no lugar da
Deusa (III) e hoje está na XII, no Mau Destino (ou Espírito). Existe pois uma
potência por cumprir. Ora, aquando deste eclipse-matriz, ocorrem três mortes
que conduzem a mudanças em três reinos diferentes. Morre o imperador carolíngio
Carlos III, levando a mais uma cisão no Reino dos Francos. Morre Al-Mundhir,
emir de Córdoba, sendo sucedido pelo irmão Abdullah ibn Muhammad al-Umawi. Ora
Emirado de Córdoba vai anteceder o Califado de Córdoba que tanta importância
terá na história política e cultural da época. Por fim, morre o imperador Xi
Zong que também será sucedido pelo irmão, neste caso, Zhao Zong, e que dará
continuidade à dinastia Tang.
No
mesmo ano, o rei Alfredo, o Grande, funda a Abadia de Shaftesbury, mas é
sobretudo pelas efemérides militares que o período deste eclipse é lembrado. O
conde de Vannes, Alan I, e o seu rival, Judicael, unem forças para derrotar os
Vikings em Questembert. Dá-se também a Batalha de Milazo, em que os aglábidas
esmagam a armada bizantina ao largo da Sicília. Deve-se salientar igualmente as
expedições militares do rei Arnulfo da Caríntia na região dos Alpes e do norte
de Itália, confirmando o seu poder na sucessão de Carlos III. Todos estes
acontecimentos fundam um período de transformações e que, num curto período, vão
provocar várias mudanças. O trígono entre os maléficos potenciou muitos destes
momentos (Marte em Carneiro e Saturno em Leão).
A
influência espacial do eclipse de 25 de Março coloca o centro da sombra no mar,
no Oceano Pacífico, perto do Equador, entre Puerto Ayora (Ilha de Santa Cruz,
Equador) e as ilhas Marquesas, da Polinésia Francesa, estas um pouco mais a
sul. À semelhança dos últimos eclipses e do próximo, o eclipse será visível em
grande parte do continente americano. Já o manto penumbral será visível na
ascensão da Lua nas zonas orientais da Europa e de África e, no seu declínio,
no extremo ocidental da Ásia e da Oceania. Já nas regências geográficas antigas,
e de uma forma menos intensa, o Sol em Carneiro, segundo Vétio Valente (Antologia I, 2), rege as seguintes regiões: a Babilónia,
Elymais ou Elamais (Cuzistão,
província do Irão), a Pérsia, a Palestina e as regiões
circundantes, a Arménia, a Trácia, a Capadócia, Susã (cidade antiga, capital do
Elão ou Susiana, hoje sudoeste do Irão), o Mar Vermelho e o Mar Negro, o Egipto
e o Oceano Índico. Para Manílio, rege Helesponto
(Estreito de Dardanelos), Propontis (Mar de Mármara), a Síria, a Pérsia e o
Egipto (Astronomica, IV, 744-817).
De
uma forma mais intensa, a Lua em Balança, também segundo Valente (Antologia I, 2), vai ter influência sob a Báctria (região
persa do Coração que corresponde actualmente ao Afeganistão, Tajiquistão,
Uzbequistão, Paquistão e China), a China, a zona do Cáspio, Tebaida (região do
Antigo Egipto entre Abidos e Assuão), o Oásis (Oásis de Siwa ou Siuá, no
deserto da Líbia), Troglodítica (região antiga do deserto líbio, mas que se
pode estender por região que vai até ao Mar Vermelho e ao Corno de África), a
Itália, a Líbia, a Arábia, o Egipto, a Etiópia, Cartago, Esmirna (Anatólia,
Turquia), os Montes Tauro (Sul da Turquia), Cilícia (Turquia) e Sinope (Norte
de Turquia, junto ao Mar Negro). Manílio coloca a Itália e, em especial, a cidade
de Roma sob a regência de Balança, referindo, por um lado, que Roma controla as
mais variadas coisas, exaltando e precipitando as nações nos pratos da balança,
por outro lado, este é signo do imperador, de Augusto que terá nascido a 23 de
Setembro de 63 AEC (Astronomica IV,773-77).
O
tema do eclipse de dia 25 de Março tem, como já observarmos uma grande
concentração planetária nos eixos anunciados. Dos doze signos, apenas cinco tem
a presença de planetas. Em Carneiro, temos o Sol, Mercúrio (e a Caput Draconis), já em Balança está a
Lua (e a Cauda Draconis). Neste eixo
de identidade, entre a unidade e a dualidade, a luz da acção e da palavra e a
mediação criativa encontram-se obscurecidas, pendem sobre o horizonte como as
escalas desequilibradas de uma balança. A sombra do eclipse vai trazer um
obscurecimento ao sentido de identidade, à consciência daquilo que se é, tanto
pessoal como colectivamente. De uma perspectiva política, o enraizamento dos
valores democráticos encontra-se assombrado. A penumbra de um individualismo
narcísico, incapaz de integrar as ideias de solidariedade e de Estado Social,
corrompe a ponte democrática entre a igualdade e a liberdade. A Lua em Balança,
num eclipse lunar, acentua o desequilíbrio de valores. Em Portugal, a cada dia
que passa, o valor da Revolução de Abril perde-se na espuma dos dias, no
desligamento da realidade.
Mercúrio
em Carneiro, como Estrela da Tarde, abaixo do horizonte, revela uma palavra que
não faz, que tenta, mas não cria, que não promove uma verdadeira práxis. Tudo
se perde na desinformação, na ignorância, na liquidez dos tempos. O sextil de
Plutão em Aquário ao Sol, a Mercúrio e à Caput
em Carneiro e o trígono à Lua e à Cauda
em Balança, ambos em separação, trazem o sentido profundo da morte ao humano e
à humanidade, potenciando o elemento de transformação anteriormente descrito.
Existe uma desintegração de valores colectivos. Aquando da ascensão do nazismo,
Saturno estava em Aquário e Úrano em Carneiro. De uma outra forma, quando
Saturno e Neptuno passarem para Carneiro vamos encontrar elementos concordantes,
diferentes, mas comuns. De uma outra forma, na Marcha sobre Roma, que marca a
ascensão do fascismo italiano, Saturno estava em Balança e Marte em Capricórnio.
Existe muitos pontos de ligação com a actual ascensão da extrema-direita.
Júpiter
e Úrano em Touro em quadratura a Plutão em Aquário e em sextil a Marte,
Saturno, Vénus e Neptuno em Peixes servem de base conceptual e de estrutura de
sentido para o tema do eclipse lunar. Nesta configuração astrológica, a par da
que se estende no eixo Carneiro-Balança, repousa a mensagem de luz e sombra que
a providência nos concede. Evágrio do Ponto, um
monge-asceta e teólogo do século IV EC, afirma o seguinte: “O
conhecimento espiritual é ‘as asas’ da mente; o gnóstico é a mente das asas. E
se isto é assim, então as coisas carregam o signo das ‘árvores’: (elas são)
aquelas coisas em que a mente se empoleira, desfrutando das suas folhas e
deleitando-se com os seus frutos, enquanto almeja, a cada momento, a ‘árvore da
vida’.” (Kephalaia gnóstica 3.56
S2 in Evagrius of Pontus: The Gnostic
Trilogy, ed. R. Darling Young, J. Kalvesmaki, C. Stewart, C. Stang & L.
Dysinger, 284. Oxford, 2024: Oxford
University Press). A humanidade precisa de asas, de voar pelo
céu da gnose até à sabedoria. No entanto, a configuração astrológica mostra o
contrário ou, no mínimo, as dificuldades de possuir essas asas e voar.
Existe
um elemento de sentido, e que já abordamos no tema do Ano Novo Astrológico, que
pode ser designado como a estranheza do bem ou a negação da dádiva. A conjunção
dos maléficos (Marte e Saturno) em Peixes traz a experiência do mal à vontade
de totalidade. Porém, esta experiência do mal, como tal como o eclipse sugere no
eixo luminar, nodal e de ascensão, é colocada numa balança, onde de um lado
está a própria experiência do mal e do outro está a dádiva do amor. A união de
Vénus e de Neptuno em Peixes, ou seja, o lugar de exaltação e de domicílio
moderno, potencia exacerbadamente esta bênção. Contudo, esta dádiva perder-se-á
até ao momento do eclipse solar e, nesse momento, a conjunção dos maléficos
forçará o seu peso nas escalas da balança.
Seguindo
a citação de Evágrio do Ponto, Júpiter e
Úrano em Touro são hoje, no voo da gnose, as árvores do conhecimento espiritual.
Nesta posição e também pelos aspectos que se forma, nomeadamente o sextil aos
planetas no signo de Peixes. A relação destes dois posicionamentos conjuga dois
elementos, pois temos tanto o factor de estruturação ou reestruturação da
realidade como a liberdade ou o livre-arbítrio sobre a experiência do mal e a dádiva
do amor. No caso do tema de Lisboa, podemos observar como os regentes do eixo luminar
recaem ambos na XII, no lugar do Mau Destino (κακός δαίμων), revelando a degradação da mediação, do elemento de passagem,
entre o humano e a providência.
O Eclipse Lunar Apulso de dia 25 de Março é o primeiro momento alto do Dragão da Lua em 2024 e é a primeira grande luta entre a luz e a sombra. No actual ciclo, é também o penúltimo eclipse lunar no eixo nodal Carneiro-Balança, o último em que o Dragão da Lua e os luminares estão neste eixo. Por isso, a questão da luz e da sombra sobre o eixo da identidade, sobre a unidade e a dualidade, tornar-se-á mais revelante, bem como o peso da sua mensagem durante o período de influência. Como em todo o eclipse, será necessário enfrentar a sombra e seguir a luz.
quinta-feira, 21 de março de 2024
Dial Mundial da Poesia - 21 de Março
terça-feira, 19 de março de 2024
Reflexões Astrológicas 2024: Ano Novo Astrológico
Reflexões Astrológicas
2024 – Ano Astrológico
Lisboa, 03h07min, 20/03/2024
Sol
Decanato: Marte
Termos: Júpiter
Monomoiria: Marte
O
início do Ano Astrológico ocorre, como sabemos, com o ingresso do Sol no signo
de Carneiro, logo no decanato de Marte, nos termos de Júpiter e na monomoiria de Marte. Já a Lua
encontra-se, neste ano, no seu próprio segmento, em Leão, no mesmo elemento do
Sol, em Fogo, e no decanato de Saturno, também nos termos de Júpiter e na sua monomoiria. A posição da Lua é aqui
particularmente significativa, pois, daqui a um ano, aquando do início do Ano Astrológico
de 2025, estará em Sagitário, completando-se, deste modo, o triângulo de Fogo. A
Lua em Fogo está em desarmonia, masculinizada por um elemento dinâmico que a
torna irascível e visceralmente instintiva. Para a hora de Lisboa, Capricórnio
está a marcar a hora, colocando assim o Sol na IV, no Lugar sob a Terra (ὑπόγειον). O poder da finalidade ergue-se pois como o leme do ano,
um que culmina na morte (Ponto de Culminação em Escorpião).
O
Sol, encerrado no Lugar sob a Terra (ὑπόγειον), conserva em si um valor de gérmen,
de potência de luz. A acção da luz (Sol em Carneiro) está guardada entre as
mãos, como dádiva do futuro. Epicteto diz-nos o
seguinte: “Fixa, a partir de agora, um
carácter e um padrão para ti próprio, que guardarás quando estiveres sozinho,
ou quando te encontrares com outros.”(Encheiridion 33.1, trad. A. Dinucci & A. Julien, p.56. Coimbra, 2014: Imprensa da Universidade de Coimbra). A
frase de Epicteto surge como indicador daquele que pode ser o regente ou os
regentes do ano. Numa análise astrológica mundana, fixar um único regente para
todo o planeta é metodologicamente errado e qualquer astrólogo rigoroso evitará
esse diagnóstico. No entanto, a análise dos planetas com maior força ou poder (δύναμις) torna-se ela mesma imperativa.
Para o tema de Lisboa, logo para
Portugal, Saturno, por ser o regente do signo que marca a hora, será um planeta
com força ou poder reforçado no ano de 2024, já a Lua em Leão é o único astro
acima do horizonte, o que lhe confere o poder da luz visível, embora esta
esteja num lugar inactivo e sob um olhar diametral tenso (Marte e Plutão). Face
ao tema simbólico de Portugal e a uma tradição astrológica que faz de Peixes o
seu signo regente, Saturno, a transitar por esse mesmo signo, torna-se assim um
regente significativo. Já de uma perspectiva geograficamente indeterminada,
Vénus é o planeta que tem mais força, pois aquando do ingresso vernal
encontra-se no seu signo de exaltação (Peixes) e nos seus próprios termos.
Mercúrio e Júpiter gozam também desta última dignidade, todavia a força de
Vénus é maior. Esta encontra-se para além dos raios solares, numa posição
dianteira, como Estrela da Manhã. A fase helíaca vai aumentar o seu poder.
Se regressarmos à frase de Epicteto,
podemos compreender melhor a questão do regente ou dos regentes do ano
astrológico de 2024. De um lado, temos Vénus em Peixes, o planeta mais
dignificado, mas, no mesmo signo, temos também Saturno, que exerce pressão determinante
sobre o período em causa. Os planetas em Peixes surgem, neste ano, como a potência
de valor para a acção do Sol em Carneiro. Nesse sentido, é fundamental fixar,
como diz Epicteto, um carácter, um padrão que sirva o próprio e a sua relação
com os outros, ou seja, que firme a partir do interior a acção exterior, tanto
individual como colectiva. Vénus e Saturno não são um par improvável, dado que
o Amor e o Tempo caminham a mesma via. Só semeando se poderá depois ceifar.
Porém, esta influência exercer-se-á sobretudo na primeira estação do ano,
Primavera no hemisfério norte e Outono no hemisfério sul.
De um outro modo, se, por um lado,
temos em 2024 a permanência de Saturno no mesmo signo, em Peixes, por outro
lado, temos Júpiter e o seu ingresso em Gémeos. O senhor da justiça e do bem,
regendo o espaço, será também um regente do futuro. Ao ingressar em 2024 num
signo de Ar, marca o tempo de influência que se iniciou com a grande conjunção
em Aquário, em 2020, e se estenderá até 2060 com o encontro de Júpiter e
Saturno em Gémeos, passando pela conjunção de 2040 em Balança. Em 2024, o
ingresso de Júpiter em Gémeos torna-se particularmente significativo, pois possui
elementos radicais desse ciclo mundano. No entanto, ao ingressar em Gémeos,
Júpiter passará a olhar quadrangularmente para Saturno em Peixes,
intensificando-se o carácter estruturante dessa relação.
A questão do regente do ano não pode
limitar-se a uma redução numerológica, nem a uma sequência planetária, seguindo
uma qualquer ordem, como, por exemplo, a ordem caldaica. Na verdade, como se
percebe pela explanação anterior, não é possível reduzir a questão a um único
planeta, pois os critérios de análise e determinação são plurais. Desta forma,
podemos concluir que Vénus, Saturno e Júpiter vão ter uma força reforçada. No
entanto, também Marte tem uma influência especial, uma vez que é o regente de
Carneiro onde se encontra a Caput
Draconis, determinando o actual ciclo nodal de eclipses. Marte terá assim
uma relação óbvia com o Dragão da Lua e com sentido profundo do destino e da
necessidade. Existe também um outro critério que eleva a influência de Marte em
2024. A conjunção dos maléficos que ocorre, mais ou menos, de dois em dois anos,
firma-se agora no signo de Peixes, ou seja, Marte e Saturno vão exercer uma
influência conjunta entre 22 de Março a 30 de Abril.
Convém,
no entanto, frisar-se um aspecto que determina com frequência muitas das
interpretações. A explanação do mal tende a tornar-se mais atractiva. Existe um
fascínio por aquilo que destrói, todavia, tende-se a ignorar que a destruição é
apenas uma fase do ciclo e que a destruição é antecedida e sucedida pela
criação. Este encantamento do mal conduz-nos, deste modo, a um certo esquecimento
da dádiva do bem. Séneca, no De
Constantia Sapientis, afirma o seguinte: “Finalmente, deve ser mais forte o que danifica em relação ao que é
danificado; mas a maldade não é mais vigorosa do que a virtude; o sábio,
portanto, não pode ser danificado. A injúria contra os bons só é tentada pelos
maus; os bons, entre si, vivem em paz, os maus são tão perniciosos aos bons
quanto entre si. Mas se não possível danificar a não ser o mais fraco, e o mau,
por outro lado, é mais fraco que o bom, e os bons só devem recear injúria de
quem não é bom, a injúria não atinge o homem sábio. Com efeito, já não é mais
preciso ficar-te relembrando de que ninguém é bom, excepto o sábio.” (7.2, Séneca, Sobre a
Providência Divina e Sobre a Firmeza do Homem Sábio, ed. R. da Cunha Lima,
p. 90. São Paulo, 2000: Nova Alexandria).
No
tema do Ano Novo Astrológico, esta prevalência da sabedoria e do bem pode ser
observada na relação entre os benéficos. Ora Vénus encontra-se num signo regido
por Júpiter e é também o regente da triplicidade diurna de Júpiter e este
encontra-se num signo regido por Vénus, sendo também o regente do decanato em que
esta se fixa. Existe uma interdependência no valor da dádiva do bem, dando
forma à afirmação de Séneca e mostrando como a sabedoria e o bem não se deixam
afectar pela acção do mal. A retrogradação dos maléficos, de Saturno de 29 de
Julho a 15 de Novembro e de Marte de 6 de Dezembro a 24 de Fevereiro de 2025,
servem essa suspensão da acção do mal através da interiorização do potencial do
bem. Essa ponte da potencialidade à acção, do pensamento ao acto, relembra-nos
que a sabedoria é imperativa e que não se deixa ferir, pois ela é em si mesma o
bem supremo, ou seja, a ignorância estende-se, mas não faz caminho.
De
igual forma, a retrogradação de Júpiter, de 9 de Outubro a 4 de Fevereiro de
2025, já com este em Gémeos, traz-nos também essa ponte, mas com algumas
diferenças. Neste período, existirá um movimento que nos lembrará, colhendo os
dons do signo de Gémeos, que a palavra e o conhecimento são vias de
transformação, ou seja, neste caso, precisa de existir um reconhecimento
positivo da dádiva da sabedoria. Já no que concerne aos transaturninos é
preciso referir também as retrogradações e dizer-se que, pela sua própria
natureza, não têm o mesmo tipo de influência. Ora Úrano estará retrógrado de 1
de Setembro a 4 de Fevereiro de 2025, Neptuno de 2 de Julho a 12 de Outubro e
Plutão de 5 de Maio a 12 de Outubro. Destes planetas, quer no período de
retrogradação, quer no seu movimento directo, só Plutão mudará de signo. De 3
de Setembro a 19 de Novembro, regressará pela última vez a Capricórnio. Esta é,
na nossa era, a última oportunidade de assimilação da sua mensagem.
No
entanto, devemos relembrar que estes planetas avançam muito pouco num ano.
Úrano trilhará em diante cerca de quatro graus e meio, Neptuno pouco mais de
dois graus e Plutão quase dois graus. Assim, é com cautela que se deve
interpretar a sua influência anual e sobretudo a influência pessoal. Será
portanto aconselhável circunscrever a orbe de análise. Existe um extravasar de
sentidos acerca da influência destes planetas que é, por vezes, descabida.
Quando Plutão ingressou em Aquário, estando neste signo cerca de vinte anos,
ouviu-se e leu-se disparates como por exemplo: “entrou na minha casa IV, um dos
pais pode morrer”, “entrou na casa VI, indica doença grave” ou “entrou na casa
VII, vai existir um divórcio”. Em vinte anos, é natural que qualquer uma dessas
coisas possa acontecer, sem que que o responsável directo seja Plutão. O estudo
astrológico é sempre holístico, ou seja, é uma visão do todo.
Na
análise mundana de um ano astrológico, o tema do ingresso vernal e a evolução
dos movimentos planetários até ao ingresso seguinte é o primeiro indicador. A
este deve, porém, seguir-se o estudo dos eclipses, sobretudo por duas razões: a
primeira assenta no facto de os eclipses serem expressões radicais da luz e da
sombra, logo dos luminares, e a segunda por a sua influência se estender
durante meses ou anos. Em 2024, existirão quatro eclipses: dois eclipses
lunares, a 25 de Março e a 18 de Setembro, e dois eclipses solares, a 8 de
Abril e a 2 de Outubro. Todos estes eclipses ocorrem no eixo Carneiro-Balança,
logo no eixo de sentido entre a unidade e a dualidade. No entanto, antes do ano
terminar, o Dragão da Lua passará para o eixo Peixes-Virgem, ou seja, para a
ponte de sentido entre a parte e o todo, entre o conhecimento do lote e a
sabedoria da totalidade. Passar-se-á então de eixo de identidade para um de
integração.
No
tema do actual ingresso vernal, a interpretação das relações planetárias pode
agora começar pelos transpessoais, pois existe com a mudança de signo de Plutão
uma alteração no paradigma. Com Úrano em Touro, Neptuno em Peixes e Plutão em
Capricórnio, existe uma harmonia entre estes planetas (sextil e trígono), mas,
com Plutão em Aquário, este passará a estar em quadratura com Úrano e
desligado, sem aspecto ptolemaico, face a Neptuno. Esta mudança representará
não um qualquer deslumbramento aquariano, mas sim um agravamento de muitas das
tensões que já se encontram latentes. Se não nos esquecermos que Aquário é
primeiramente regido por Saturno e se observarmos no tema vernal como Marte e
Plutão estão conjuntos neste signo, podemos concluir que existe uma corrupção
nas estruturas de poder e na forma como estas se relacionam com as populações. A
ligação de Marte e Plutão em Aquário ao Dragão da Lua (trígono à Cauda e sextil à Caput) coloca a destruição actual na urdidura da providência. A
desagregação dos valores democráticos e o avanço da extrema-direita e do
populismo são disso exemplo e a chegada, em 2025, de Saturno e Neptuno a
Carneiro adensará os perigos que estão à espreita.
Mercúrio
que, em Carneiro, teria posição particularmente, por estar para além dos raios
solares, mas como Estrela da Tarde e conjunto à Caput Draconis, poderá adquirir um valor de sentido ambíguo,
apontando, por um lado, para o ímpeto da palavra criativa e, por outro, para a
palavra que confunde, que deturpa e que promove a mentira como verdade. O
destino e a necessidade pesam sobre palavra e conduzem o humano ao seu enigma
primordial: para escolher a sabedoria é preciso seguir a via da verdade e esta
implica sempre uma qualquer forma de angústia e de revelação. O sextil do Sol,
de Mercúrio e da Caput Draconis em
Carneiro a Marte e Plutão em Aquário e o trígono à Lua em Leão firmam um elo
entre liberdade e destruição. No tema de Lisboa, o Ponto de Culminação
encontra-se em Escorpião, logo numa posição que é quadrangular face aos seus
regentes (Marte e Plutão em Escorpião). Existe um fenómeno de desagregação do
humano como senda de possibilidade da criação de uma nova humanidade ou como
via para uma nova extinção. O abismo abeira-se.
Por
o tema de Lisboa dignificar o segmento de luz nocturno, Vénus torna-se o grande
benéfico e, por estar exaltada e nos seus próprios termos, ganha uma força
reforçada. Desta forma, Afrodite expande o amor no domicílio de Júpiter, onde
também se encontra Saturno e Neptuno, o seu regente moderno de Peixes. Este
será um lugar de dádiva, a partir do qual se poderá expandir o seu sentido
radical. O sextil a Júpiter e Úrano em Touro recuperam naturalmente o tema da
Grande Mãe, da Mãe Terra e do Divino Feminino. No entanto, este é um númen que
continua oculta entre o crepúsculo e a aurora. A quadratura da Lua em Leão a
Júpiter e a Úrano em Touro e destes a Marte e a Plutão em Aquário impedem a
dignidade espiritual do Divino Feminino e o reconhecimento da nobreza de
espírito da sua dignificação. A nova ecologia precisa espiritualidade do
feminino e a sociedade também.
O
ano astrológico de 2024 aponta para um sentido que exalta a criação de pontes,
de elementos de passagem. Vénus e Saturno, o desejo de criar e a necessidade de
destruição, vão colocar o humano sob a égide radical desse factor de
transformação. Existe pois uma necessidade de revalorização da dádiva do bem (Vénus
e Júpiter), mostrando-nos que também entre as ruínas existem tesouros. É a luz da
candeia, guardada sob o manto do sábio. O planeta que habitamos e a humanidade
estão ao viver aquele momento entre eras, entre um ciclo que se fecha e um que
ainda não se abriu. Em 2024, a experiência do limiar tornar-se-á, desta forma, um
sentido profundo.
terça-feira, 12 de março de 2024
Reflexões Astrológicas 2023: Parte II - Citação 1
sexta-feira, 8 de março de 2024
Lançamento: Fragmentos Astrológicos 2ª edição, revista e aumentada
Os Fragmentos Astrológicos são uma forma de conhecer a Astrologia Antiga com um olhar contemporâneo e de encontrar um outro sentido para a astrologia enquanto linguagem ou representação da realidade.
Neste livro, estão reunidos um conjunto de textos que se encontravam dispersos no sítio, no blogue e nas redes sociais do autor. As primeiras três secções (Dicas Astrológicas, Reflexões Astro-Filosóficas e Considerações Astro-Mitológicas) serviram de mote para o título, pois inscrevem-se no estilo fragmentário sem perderem, porém, uma visão de totalidade. Na última parte, foram incluídos três ensaios (“Saturno e o Feminino na Astrologia Antiga”, “Dodecatemoria ou a Harmonia da 12ª Parte” e “O Mito como Sentido das Estrelas”) que estão em harmonia com os excursos anteriores e abordam três temas específicos da Astrologia Helenística.
Passados quase três anos da primeira edição, observou-se a necessidade de apresentar uma nova edição totalmente revista e aumentada. A revisão tentou uniformizar a terminologia, corrigir alguns erros e desenvolver certas formulações. Por outro lado, procedeu-se também a uma repaginação e a um melhoramento gráfico. Por fim, foram ainda incluídas actualizações na bibliografia.
Existiu, porém, um caso que mereceu um maior desenvolvimento. No ensaio “Dodecatemoria ou a Harmonia da 12ª Parte”, optou-se por aumentar os textos primários apresentados e as respectivas traduções. Na primeira edição, podia-se ler apenas o capítulo de Fírmico Materno dedicado à dodecatemoria. Ora, nesta edição, acrescentaram-se os versos de Manílio e o capítulo de Paulo de Alexandria. Estes três textos são as mais extensas exposições da técnica da dodecatemoria da literatura astrológica antiga, justificando-se assim esta opção.
A segunda edição dos Fragmentos Astrológicos pretende, desta forma, levar ao leitor, numa versão melhorada, uma obra que resume o pensamento astrológico do autor, bem como permitir a leitura, em língua portuguesa, de alguns dos textos que estão na origem da astrologia.