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Reflexões Astrológicas 2023: Lua Nova em Virgem
Reflexões Astrológicas
Lisboa, 02h39min, 15/09/2023
Sol-Lua
Decanato: Mercúrio
Termos: Marte
Monomoiria: Mercúrio
A
Lua Nova de Setembro ocorre no signo de Virgem, estando Caranguejo a marcar a hora
para o tema de Lisboa e, deste modo, na III, no lugar da Deusa, no decanato de Mercúrio,
nos termos de Marte e na monomoiria de
Mercúrio. A sizígia dá-se pois abaixo do horizonte e a cerca de quatro horas e
meia do pôr-do-sol. Os luminares, estando a Lua no seu próprio segmento, embora
submersa, encontram-se num caminho de ascensão, rumo ao lugar de origem. Esse
efeito matriz é expresso pelo facto da distribuição tópica de lugares ou casas
ser a mesma do Thema Mundi, ou seja,
com Caranguejo a marcar a hora. A disposição torna-se particularmente
significativa se tivermos em consideração que a luz da sizígia emana de um
lugar que lhe natural.
Segundo
o Thema Mundi, o Eterno Feminino expressa,
no eixo de Virgem-Peixes, o seu valor de númen primordial de transformação, mas
de também de revolução. Este eixo, porque na ordem Vernal indica o meio e o fim
e na ordem do Thema Mundi o lugar da
Deusa e do Deus, vai apresentar o sentido profundo da parte e do todo. Esse é
um mistério iniciático que permite a revelação ou a interiorização dos
desígnios da Necessidade, da Fortuna. A compreensão da parte, ou seja, do lote
ou do quinhão do destino, do pequeno fio que cinge o caminho na urdidura da
Grande Tecedeira, é algo que podemos encontrar no signo de Virgem.
Toda
a parte passa, em Virgem, por um processo de distinção que só será estabilizado
em Peixes, com a integração no todo. Ora é neste lugar que Mercúrio encontra o
seu domicílio e exaltação, pedindo portanto esse esforço de análise ou
compreensão. Da lição de Hermes Trismegisto, isto é, do lugar da Deusa, o de
Virgem, podemos elevar-nos até ao lugar do Deus, onde os benéficos, Júpiter e
Vénus, expressam a sua luz. Em Peixes, a visão do todo vai permitir o regresso
da Deusa Mãe e a harmonia dos opostos. Esta é a sibila do tempo, cantando a
madrugada futura. A luz de uma sizígia em Virgem, no lugar da Deusa, escreve
esse potencial, guardando a candeia que se erguerá. No entanto, o esforço de
compreensão da parte não é fácil. Cada lote emanado pelas Meras representa um
desafio. Ele surge pois como um enigma, uma suspensão da realidade, do todo, de
modo a tornar possível a sua distinção face aos demais.
Plutarco, no
livro A Fortuna ou a Virtude de Alexandre
Magno, fala-nos desta dificuldade, quando diz que “Devemos dizer, então, que a Fortuna faz os
homens pequenos, medrosos e mesquinhos? Mas não é justo ligar o vício à má
sorte, nem a coragem e a sabedoria à boa sorte. Muito, ao invés, teve a Fortuna
a ganhar no reinado de Alexandre, porque então ela foi prestigiosa, invencível,
magnânima, moderada e humana; pois, mal que ele morreu, logo Leóstenes disse
que as suas forças, nas suas errâncias até à exaustão, se assemelhavam ao
Ciclope que, depois de ter ficado cego, estendia suas mãos para tudo sem
nenhuma meta: do mesmo modo o grande império agitava-se no vazio e desabava por
causa da anarquia.” (336E-F, ed. R. Marques Liparotti, 90. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2017). A
distinção do sentido de cada lote conduz-nos necessariamente a este esforço de
compreensão, daí que, por exemplo, os lotes astrológicos tenham uma importância
vital em todo o sistema helenístico. São a mimésis
deste sentido primordial
O filósofo platónico continua essa
ideia, afirmando que “Assim
como os artistas inábeis, colocando grandes bases sob pequenas estátuas
votivas, lhes expõem a insignificância, também a Fortuna, de cada vez que eleva
um ânimo medíocre por actos de peso e notoriedade, o que faz é desnudá-lo e
desonrá-lo mais explicitamente, por causa dos erros e da vacilação gerados pela
sua leviandade. A grandeza consiste, portanto, não na posse, mas no uso dos
bens, já que até as crianças herdam reinos e poderes paternos, como Carilau,
que Licurgo levou de fraldas a um convívio público e proclamou, em sua vez, rei
de Esparta.” (337 C-D, ed. R. Marques Liparotti, 92). Se,
de acordo com os dons de Hermes, se compreender, separando e distinguindo, os
fios que o destino teceu, então a Vénus Celestial, exaltada em Peixes, poderá
surgir como revelação. Essa é, de certa forma, a mensagem do Livro XI de O Burro de Ouro de Apuleio, quando a
deusa Ísis surge como a salvadora de Lúcio, metamorfoseado em burro e sujeito
às vicissitudes da Fortuna. Compreendida a parte, o todo ilumina-se.
A sizígia de Setembro insere-se,
primeiramente, num caminho ascendente de luz que se estende do próprio encontro
dos luminares até Mercúrio retrógrado, o único planeta nesta condição abaixo do
horizonte. Este caminho indica, porém, uma certa dificuldade de passar a
mensagem de Virgem, de compreender, distinguindo, cada lote do destino.
Paralelamente, este caminho insere-se numa via mais extensa que vai de Marte em
Balança, junto ao Ponto Subterrâneo até à Vénus em Leão. Nesta senda, a
harmonia dos opostos vê reforçada o seu imperativo escatológico de via
salvífica de união entre o Deus e a Deusa, entre o Sol e a Lua. A retrogradação
de Mercúrio apresenta, deste modo, uma certa resistência em interiorizar-se a
mensagem do Eterno Feminino. Esta não é, todavia, uma novidade. Nas últimas
décadas, quando se assistiu a uma expressão dinâmica da mensagem de um Divino
Feminino, independentemente da sua forma, existiu sempre um qualquer tipo de
resistência, ora mais académico, ora menos. Marte, no seu exílio em Balança,
evidencia essa permanência, essa acção disruptiva, que suspende ou enfraquece a
força transformativa da Mãe Divina.
Já com uma outra manifestação, agora
acima do horizonte, todos os planetas estão retrógrados (Úrano, Júpiter,
Neptuno, Saturno e Plutão) e, num caminho de escalada pela montanha do céu,
qual Monte Ida, ou seja, do Ascendente à Culminação, Júpiter é o astro mais
alto. A mensagem do grande benéfico é aquela que já abordámos na reflexão
acerca da sua actual retrogradação. No entanto, no tema do novilúnio de Virgem,
Júpiter retrógrado em Touro firma-se no lugar do Bom Espírito (ἀγαθόν δαίμων),
corroborando aqui o sentido profundo da compreensão de um lote ou parte do
destino, pois o termo δαίμων é
tanto o espírito como o destino, como ainda a divindade. A terminologia astrológica
antiga é fértil e revela a especificidade do sistema helenístico,
justificando-se assim a sua continuidade e o seu estudo.
Esta extensão espacial de planetas
retrógrados acima do horizonte encerra ainda uma significação suplementar.
Estes alongam-se triangularmente pelo céu, desde Úrano e Júpiter em Touro até
Plutão em Capricórnio, junto ao Poente. Existe aqui uma senda da vida à morte,
consolidando-se assim o bem da vida e o poder da morte, o modo de vida e a
finalidade. Este trígono forma com a sizígia e Mercúrio em Virgem um Grande Triângulo
de Terra, um que pede, pela força da retrogradação, uma reformulação das
estruturas de valor. Dada a proximidade astro-mitológica de Virgem, e não
Balança, à deusa da Justiça (cf. Figueiredo, R. M.
de, 2021, Fragmentos Astrológicos,
143-6),
esta renovação axiológica exige que se faça dos bens uma virtude, ou seja, em
si mesmos, os bens do mundo não valem nada, servem apenas de meio para a
natureza humana se expressar e para a humanidade ter uma vida melhor. A
necessidade conduz-nos, seja por lição ou retribuição, a essa mudança de
paradigma.
A
relação do Grande Triângulo de Terra com o elemento Água é igualmente
significativa, pois temos, por um lado, a oposição de Saturno e Neptuno em
Peixes à sizígia e a Mercúrio em Virgem e, por outro, os dois sextis dos primeiros
tanto a Júpiter e a Úrano em Touro como a Plutão em Capricórnio. Esta é a seta
do destino que refunda a força da Necessidade na possibilidade de se criar uma
liberdade de ser. Estes aspectos, conjuntamente ao sentido profundo do eixo
Virgem-Peixes, vão colocar diante da percepção humana a compreensão daquilo que
se julga ser a dicotomia entre determinismo e livre-arbítrio. Segundo o
espírito da astrologia helenística, influenciada pelo estoicismo, pelo platonismo
e pelo pitagorismo, os fios da Meras tecem os acontecimentos, mas não o nosso
modo de ser e estar. Nesse sentido, a astrologia antiga, ou a sua herança para
uma prática contemporâneo, não pode dizer que indica tendências ou
possibilidades. O destino não muda, o que muda é a percepção de nós mesmos e do
mundo. É um tema complicado, mas Saturno em Peixes vem colocar a Necessidade
num sentido renovado de totalidade. No entanto, para que isso aconteça, e essa
é a mensagem da oposição, é necessário a compreensão de cada lote ou quinhão do
destino, ou seja, seguindo a máximo de Santo Agostinho é preciso crer para
compreender e compreender para crer.
O Dragão da Lua vem fortalecer o sentido profundo da Necessidade. Sobre o eixo Carneiro-Balança, a identidade, criando um elemento significativo de passagem entre a dualidade (Balança) e a unidade (Carneiro), terá de sair renascida, não por via da ilusão da alteridade, mas porque o peso do destino firma a consciência num ensimesmamento esclarecido. Na Cauda Draconis em Balança, a sombra do destino testará o humano e, na Caput Draconis em Carneiro, a luz da providência renovará a sua acção. Esta é uma mensagem importante sobretudo se tivermos em conta que se aproxima a segunda época de eclipses de 2023 (Eclipse Solar a 14 de Outubro e Eclipse Lunar a 28 de Outubro). O peso da sombra do destino está agora mais denso pelo facto de Marte está co-presente à Cauda Draconis em Balança. A debilidade de Marte em Balança e a gravidade da cauda do Dragão da Lua vão trazer consigo a inevitabilidade dos acontecimentos e se considerarmos, por exemplo, a quadratura destes a Plutão em Capricórnio, o sismo de Marrocos e a erupção do Kilauea encontrarão um sentido astrológico.
Já a Vénus em Leão continua, agora no seu movimento directo, o significado que já explorámos anteriormente, dando a nobreza da alma ao desejo e às ligações. A sua união ao Dragão da Lua, por trígono à Caput e sextil à Cauda, vai fazer com que, rumo a um bem maior, o destino consuma a vaidade. Na verdade, a quadratura entre os benéficos fortalece esse imperativo: a universalidade do bem como tensão criadora. Já o sextil de Vénus em Leão a Marte em Balança recupera aquilo que já dissemos acerca do caminho ascendente de luz onde se insere o actual novilúnio. A Lua Nova de Virgem pede, em suma, esse esforço de compreensão dos desígnios da Fortuna, inserindo na razão de um todo cada parte do destino.