segunda-feira, 31 de julho de 2023
segunda-feira, 17 de julho de 2023
Reflexões Astrológicas 2023: Lua Nova em Caranguejo
Reflexões Astrológicas
Lua Nova em Caranguejo
Lisboa, 19h31min, 17/07/2023
Sol-Lua
Decanato: Lua
Termos: Júpiter
Monomoiria: Marte
A
Lua Nova de Julho ocorre no signo de Caranguejo, estando Capricórnio a marcar a
hora para o tema de Lisboa e, deste modo, na VII, o Poente (δύσις), no decanato de Lua, nos termos de Júpiter e na monomoiria de Marte. A sizígia dá-se assim
acima do horizonte e a cerca de uma hora e trinta minutos do pôr-do-sol. Os
luminares encontram-se no eixo do horizonte, do lado poente, onde a luz se
afunda e desaparece. Este é o novilúnio que expressa o sentido da origem, a
matriz radical do Eterno Feminino. Caranguejo é o domicílio da Lua e, no Thema Mundi, é partir deste lugar que a
vida emerge, marcando-se, deste modo, o Ascendente do Mundo.
A
relação entre a Lua e o Ascendente, entre o leme da vida e a própria da vida,
estabelece a fundação da realidade, a sua origem. Naturalmente, esta é a matriz
inaugural do Feminino, do Eterno Feminino. Nesta relação, encontramos,
nomeadamente, o mito pelasgo da criação, em que deusa Eurínome surge como a
senhora da origem, a criadora de tudo o que existe. De um ponto de vista
astrológico, a forte herança mitológica em torno de divindade lunares deveria
fazer-nos repensar os sentidos profundos da Lua, mas para isso tinha de se
relativizar um certo exacerbamento, por um lado, da significação lunar de cariz
psicológico e, por outro, da tendência interpretativa de sobrevalorizar o
masculino face ao feminino. A Lua astrológica deveria continuar a ser uma deusa
da origem.
Neste
novilúnio, existe, porém, uma inversão dos pólos inaugurais no eixo do horizonte,
ou seja, Capricórnio está a ascender e Caranguejo a descender. De certa forma,
a origem está no fim e o fim está na origem. Ao estender-se no tempo, como a
própria Necessidade, o Eterno Feminino faz emergir, no ocaso da realidade, a
Senhora da Nova Era. Este é o tempo do Espírito Santo. Partindo da premissa de que
o termo hebraico (ruah) para espírito
é feminino, o Evangelho de Felipe afirma o seguinte: “Alguns dizem que Maria concebeu do Espírito Santo.
Erram não sabem o que dizem. Quando é que uma mulher concebeu de mulher? ” (55.20-30, ed. Piñero, Torrents & Bazán, II,
31. Lisboa, 2005: Ésquilo). No
entanto, um Espírito Santo feminino não nasce apenas de uma significação
terminológica, ele é o herdeiro natural da deusa hebraica e da hegemonia do
Sagrado Feminino na Antiguidade mais profunda. Esta é uma expressão do numinoso
que incomoda, que ofende o androcentrismo do pensamento religioso dominante dos
dois últimos milénios, mas também muita da espiritualidade actual. No entanto,
mesmo que seguido por poucos, ela existiu e continua a existir.
Os
versículos de Marcos que dizem que “aquele que blasfemar contra o Espírito Santo, nunca mais terá perdão, mas será réu de pecado eterno” (3:29, ed. João Ferreira de Almeida actualizada), mas também de Mateus, “Se alguém disser alguma palavra contra o Filho do homem, isso lhe será perdoado; mas se alguém falar contra o Espírito Santo, não lhe será perdoado, nem neste mundo, nem no vindouro” (Mateus 12:32), assinalam esta associação entre o Espírito Santo
e a Mãe Divina. Numa trindade de Pai, Mãe e Filho, como, por exemplo, a de
Osíris, Ísis e Hórus, a ofensa ao feminino será sempre a mais gravosa. Hoje o que
diríamos de alguém de ofende uma mulher, nomeadamente, a sua mãe, a esposa ou a
sua filha? Teria perdão o homem que ofende a mulher? O novilúnio de Caranguejo,
colocando a luz sobre o feminino, firma também esta questão. Uma outra de forma
de a vermos é se pensarmos no fogo de Héstia, na chama do feminino que arde no
centro do lar.
Menandro afirma que “O verdadeiro escravo do lar é o seu senhor”
(Frag. 760 Kock: εἷς ἐστι δοῦλος οἰκίας ὁ δεσπότης). Ora o fogo de Héstia/Vesta, ardendo no centro do
lar, é a imagem quase perfeita de um novilúnio no signo de Caranguejo e desta
servidão. Hoje este fogo arde sobre o Poente, mostrando, como uma palavra que
range no caminho (Marte en Virgem), que o fogo do feminino continua eclipsado
por um modo de ser, uma ponte corrompida entre o carácter e o valor, que tende
a rejeitar este fogo primordial. O pensamento androcêntrico dos últimos
séculos, ou milénios, fez com que colocássemos nas “cadeiras de poder” (o
antigo trono de Ísis, da Terra) figuras masculinos. Zeus/Júpiter, Ares/Marte ou
Apolo são a imagem do poder ou da força, todavia, Héstia/Vesta é a primogénita
de Reia e Cronos/Saturno e tem um lugar em todos os templos. Sem o fogo de
Héstia, os deuses não receberiam as suas oferendas.
O novilúnio de Julho, não só por
ocorrer no signo de Caranguejo, mas por todas as relações que entre os astros
se estabelecem, aprofunda o valor universal do feminino. Existem, em termos
políticos, económicos e sociais, todo um caminho por trilhar no que ao feminino
concerne, porém, em termos espirituais, a senda tem sido frequentemente
negligenciado ou desprezado. Na espiritualidade contemporânea, o androcentrismo
continua a ser dominante, tocando ainda por vezes uma misoginia patriarcal,
totalmente antiquada e bolorenta. Existe, mesmo nos meios mais esotéricos, uma
grande resistência ao númen feminino em harmonia plena com o masculino, e não
um degrau abaixo. Não precisamos de uma Mãe de Deus, mas sim de um Deus-Mãe.
A presença do Dragão da Lua no
início do eixo Touro-Escorpião, grau zero e minuto zero, marcando a sua
despedida deste eixo e o facto de no tema do novilúnio não existir nenhum astro
no quadrante da ascensão à culminação, excepto a Cauda Draconis, assinala uma
forma muito específica de significação de Feminino sobre o Poente. O Destino
está nas alturas, contudo, é a memória do fim no cume da montanha. Esta não é
uma cantiga de júbilo, mas sim uma ode de inevitabilidade. Adrasteia diz-nos
apenas que o fio está tecido.
Os dois trígonos que se fundem nos
elementos Água e Terra adensam e aprofundam o sentido último de origem e o
valor universal do feminino. O Sol e a Lua em Caranguejo unem-se, desta forma,
a Saturno e a Neptuno em Peixes e à Cauda Draconis em Escorpião. No trígono de
Água, a significação assenta radicalmente na Necessidade ou no Destino como
origem. No centro da realidade, as Meras tecem o que foi, é e será. Por outro
lado, mas complementarmente, o trígono de Terra estrutura a realidade do
feminino na Natureza e no Humano. Neste elemento, unem-se assim em trígono
Júpiter, Úrano e a Caput Draconis em Touro, Marte em Virgem e Plutão em
Capricórnio.
O triângulo de Terra vai dizer-nos
como a vida e a morte, a criação e a destruição, são os meios através dos quais
a Providência se expressa. O destino funda essa passagem entre o que nasce e o
que morre, o que ascende e o que descende, o que surge e o que se oculta. Um
novilúnio em Caranguejo sobre o Ponto Poente revela, com a voz de sibila, que a
origem e o fim são uma e a mesma realidade. Tudo se une pois em um no intelecto
do mundo, na Anima Mundi, e o Eterno
Feminino é a matriz desse sentido.
Naturalmente, e de acordo com a
beleza geométrica da doutrina de aspectos, os dois triângulos de Água e Terra
fazem com que os astros que neles se enraízam se unam hexagonalmente. Convém
que se note, porém, que estas uniões resultam da doutrina antiga de aspectos
que segue o sistema de casa-signo ou signo inteiro. Segundo esta, os aspectos
são ao signo e não ao grau, a orbe traduz-se, deste modo, nos conceitos de
aplicação (συναφή) e separação (ἀπορρόη). A Deusa Primeva, senhora da Necessidade, da Vida e da Morte, surge
portanto no centro destes dois triângulos e deste grande hexágono.
Existe, todavia, um elemento
disruptivo, uma vez que a oposição da sizígia a Plutão tem um carácter mais
destruturante do que disruptivo. As quadraturas de Vénus e Mercúrio em Leão à
Caput Draconis, a Júpiter e a Úrano em Touro e dos primeiros à Cauda Draconis
em Escorpião revelam a tensão radical em torno do valor de Destino, da
Necessidade, e de como este pode colidir com o exacerbamento do eu e com a soma
de todas as vaidades. Se a alma for nobre, se brilhar como o sol, o destino não
se opõe à identidade, mas se, pelo contrário, a alma beber do lago de Narciso,
os lotes que a Necessidade distribuir, vão tornar-se motivo de revolta e
contenda. Aquele que julga que o destino lhe furtou o brilho, o reflexo, não
pode nunca ser a luz que verdadeiramente é.
O novilúnio de Julho recentra,
porém, a dinâmica nas águas uterinas da realidade, no sentido profundo da
origem e, neste lugar, o espelho de Narciso estilhaça-se, pois na radicalidade
última ele ainda não existe. No ventre do mundo e da alma, está tudo despojado,
livre das amarras que o tempo, a realidade e a vaidade tendem a forjar. O lugar
da origem é um espaço matriarcal e o seu tempo, a sua era, é a do Eterno
Feminino, a do Espírito Santo.
segunda-feira, 3 de julho de 2023
Lua Fora de Curso: Julho de 2023
sexta-feira, 30 de junho de 2023
domingo, 18 de junho de 2023
Reflexões Astrológicas 2023: Lua Nova em Gémeos
Reflexões Astrológicas
Lua Nova em Gémeos
Lisboa, 05h37min, 18/06/2023
Sol-Lua
Decanato: Sol
Termos: Saturno
Monomoiria: Sol
A
Lua Nova de Junho ocorre no signo de Gémeos, estando este a marcar a hora para
o tema de Lisboa e, deste modo, na I, o Leme (οἴαξ) do tema, no decanato de Sol, nos
termos de Saturno e na monomoiria de Sol.
A sizígia dá-se ainda abaixo do horizonte e a cerca de vinte e cinco minutos do
nascer-do-sol. No actual novilúnio, os luminares encontram-se sob o horizonte,
ainda ocultos, mas rumando, na barca da luz, o caminho de ascensão. A Lua
encontra-se pois desfavorecida por estar num signo masculino e, considerando-se
que apenas Mercúrio acompanha os luminares e numa fase helíaca também ela
masculina, a força do feminino assim encontra-se debilitada.
A
harmonia dos contrários depara-se, nesta qualidade essencial, com o primeiro
elemento disruptivo. Existe aqui um sentido inicial para o actual
desenraizamento da terra, do feminino. A dualidade de Gémeos, expressa
radicalmente no mito dos Dióscoros (cf.
Figueiredo, R. M. de, 2021, Fragmentos
Astrológicos, 137-8. Lisboa: Livros – Rodolfo Miguel de Figueiredo), indica
o movimento de passagem entre o humano e o divino, tal como o signo que lhe é
oposto, Sagitário, aponta para a passagem do animal ao humano. Na verdade, esta
é a senda sapiencial, da forma como se passa do conhecimento à sabedoria. Ora
essa é a proposta do eixo Gémeos-Sagitário.
O
impulso primordial que nos deve encaminhar para a sabedoria é o mesmo que nos
faz procurar o divino. No entanto, a questão deste eixo é que ele não anula a
dualidade. Esta permanece activa, promovendo a alternância de sentido entre os
elementos duais. Neste eixo, não existe a integração do múltiplo no uno ou na
totalidade como aquela que é proposta no eixo Virgem-Peixes. A relação entre os
dois eixos torna-se aqui particularmente significativa porque Saturno
retrógrado em Peixes é, neste novilúnio, aquele que alimenta a cisão da
harmonia.
No
mito dos Dióscoros, não existe uma união dos contrários. Pólux conserva a sua
natureza semidivina, já Castor morre por ser humano, e mesmo a ascensão ao céu
estrelado não representa uma conciliação ou encontro, pois o dom do céu é
concedido em dias alternados. A desmedida e a retribuição não distinguem, contudo,
a natureza humana ou semidivina. Os dois pares de gémeos, Pólux e Helena
(divino) e Castor e Clitemnestra (humano), sofrem o peso, a gravidade, da
Necessidade. A tensão da sizígia em Gémeos a Saturno em Peixes é, desta forma,
indicadora desta condição primordial.
Cícero
adverte o leitor para a discórdia existencial entre a força da Necessidade e a
Virtude, dizendo o seguinte: “Tu
não sabes, insensato, não sabes de que força dispõe a virtude; limitas-te a
usar o nome da virtude, mas ignoras o seu efectivo valor. Ninguém que dependa
exclusivamente de si e considere que todo o seu bem está na qualidade do seu
carácter poderá não ser o mais feliz dos homens. Quem, pelo contrário, põe
todas as suas esperanças, cálculos e projectos na dependência da fortuna, esse
nunca possuirá nada seguro, nada do que empreendeu estará certo de guardar como
seu até ao fim do dia. Se encontrares no teu caminho um homem destes ameaça-o
com a morte ou com o exílio, e vê-lo-ás ficar em pânico. Pela minha parte, nem
tentarei subtrair-me nem oferecerei qualquer resistência a nada do que me
aconteça nesta tão ingrata cidade.” (Paradoxa
Stoicorum, Paradoxo II, 17-18 in
Cícero, Textos Filosóficos I, 2ª ed.,
trad. J. A. Segurado e Campos. Lisboa, 2018: Fundação Calouste Gulbenkian, 12).
Viver sob a égide da Fortuna, dos
ditames da Necessidade, conduz-nos naturalmente a uma forma de servidão. Neste
novilúnio, depois de Marte reinar no cume do céu, Saturno em Peixes é o astro
mais alto, colocando assim a Necessidade e a proposta de totalidade como
elementos profundos de sentido. Cícero lembra-nos que é a virtude que nos
liberta do destino. Para quem crê na metempsicose, só a excelência nos
libertará da roda de reencarnações, dos ditames da Necessidade. Esta não é,
porém, nem uma virtude catequista, empoeirada por pó e cinza, nem uma aura de
herói que assombra o humano com o divino. A
virtude estóica é um modo de vida.
Séneca, na continuidade desse
sentido, diz-nos que “Para formar juízos
de valor sobre as grandes questões há que ter uma grande alma, pois de outro
modo atribuiremos às coisas um defeito que é apenas nosso, tal como objectos
perfeitamente direitos nos parecem tortos e partidos ao meio quando os vemos
metidos dentro de água. O que interessa não é o que vemos, mas o modo como
vemos; e no geral o espírito humano mostra-se cego para a verdade!” (Ep.71.24-5; Cartas a Lucílio, 2ª ed,, trad. J. A.
Segurado e Campos. Lisboa, 2004: Fundação Calouste Gulbenkian). Ora
a dualidade luminar da sizígia em Gémeos em colisão com a necessidade como
totalidade indica-nos essa mesma cegueira da verdade. No fundo, e hoje mais do
nunca, a ignorância e o excesso de si tolda-nos os juízos e impede-nos de ver a
verdade. A palavra pode ser também aqui um elemento disruptivo.
A relação entre liberdade e destino
é um pilar de sentido na filosofia astrológica, todavia, não deve ser entendida
como é comummente abordada, como se existisse um antagonismo radical nos
conceitos. A questão é que, da perspetiva que dominou uma parte considerável
do pensamento antigo, a liberdade está para além da roda da necessidade e não
no seu interior. A união de Saturno e Neptuno em Peixes no cume do tema da Lua
Nova representa essa dificuldade e, do outro lado do sentido, encontra-se a
dualidade de luz entre o humano e o divino como leme da vida e da acção. A
sizígia em Gémeos, pela regência domiciliar de Mercúrio, vai pedir uma
reestruturação da palavra e da razão, ou seja, é exigida uma renovada mediação.
O elemento de passagem é essencial neste signo dual. A integração da necessidade
na vida pede portanto que se encontre a harmonia nesta tensão radical.
Neste novilúnio, Plutão surge também
como elemento disruptivo, primeiro por seu o único astro do hemisfério
ocidental e depois devido à sua retrogradação e ao seu regresso a Capricórnio.
As estruturas afectadas por este trânsito vão voltar a sofrer as influências
plutonianas, nomeadamente os sistemas económicos e financeiros, mas também as
estruturas profundas da terra, como por exemplo as erupções vulcânicas das últimas
semanas, mas também as consequências das alterações climáticas, como os
incêndios no Canadá.
Nos meses em que Plutão estiver em
Capricórnio, podemos voltar a assistir a falências ou crises no sistema
bancário, bem como às consequências da inflação, da subida das taxas de juros e
da especulação imobiliária. No entanto, a relação benéfica de Plutão a Júpiter
e a Úrano em Touro (trígono) e a Saturno e Neptuno em Peixes (sextil), bem como
ao Dragão da Lua (trígono à Caput em Touro e sextil à Cauda em Escorpião),
conferem uma possibilidade de transformação colectiva. A renovação do valor do
viver, a ligação à Terra e a necessidade de empatia e solidariedade são a luz
no caminho.
O último grande elemento disruptivo
possui também ele uma qualidade dual, ou seja, possui tanto um valor benéfico
como um potencial maléfico. A posição de Vénus e Marte em Leão junto ao Ponto
Subterrâneo enraíza, no tema do novilúnio, esta harmonia dos contrários. De um
ponto de vista colectivo, a nobreza da alma e o narcisismo serão as duas faces
da mesma realidade e, neste sentido, esta dicotomia leonina será colocada entre
o desejo e a força, entre Vénus e Marte. Porém, esta pulsão ou paixão
primordial possui uma dimensão relativa e é esta que atribuirá ou condicionará
o seu valor. O sextil de Vénus e Marte em Leão à sizígia e a Mercúrio em Gémeos
poderá, através da palavra e da razão ou do elemento de passagem entre o humano
e o divino, criar as condições para a nobreza da alma, para um carácter
transformação. No entanto, a quadratura de Vénus e Marte a Júpiter e a Úrano em
Touro, na XII, no lugar do Mau Espírito (κακός δαίμων), bem
como ao Dragão da Lua, condicionará fortemente o potencial do aspecto anterior.
Existe assim uma resistência à dádiva
e ao espírito transformador. Os modos de ser e estar estão de tal forma enraizados
que, mesmo que exista a consciência da necessidade de transformação, se tornarão
extensões da identidade e da afirmação social. Face à corrupção do planeta e da
Mãe-Terra, o que estaríamos dispostos a fazer? Deixaríamos, por exemplo, de
utilizar um veículo próprio? Consumiríamos menos e de forma mais responsável? Alteraríamos
o nosso estilo de vida? A grande questão é saber se possuímos uma
disponibilidade genuína de mudança.
A passagem anunciada do Dragão da Lua do eixo Touro-Escorpião para Carneiro-Balança, ou seja, do eixo do valor para o da identidade, aprofunda o sentido desta inquirição e o novilúnio de Gémeos vem anunciá-la, representando a necessidade de mediação e de construção de elementos de passagem, sejam eles pessoais ou colectivos. A harmonia dos contrários nasce de uma dualidade comprometida tanto com a identidade como com a necessidade de relação. Essa é uma proposta para o presente e para o futuro.
quinta-feira, 1 de junho de 2023
Lua Fora de Curso: Junho de 2023
quarta-feira, 31 de maio de 2023
sexta-feira, 19 de maio de 2023
Reflexões Astrológicas 2023: Lua Nova em Touro
Reflexões Astrológicas
Lisboa, 16h53min, 19/05/2023
Sol-Lua
Decanato: Saturno
Termos: Marte
Monomoiria: Vénus
A
Lua Nova de Maio ocorre no signo de Touro, com Balança a marcar a hora para o
tema de Lisboa e, deste modo, na VIII, no Lugar da Morte (θάνατος), da qualidade da morte, no decanato
de Saturno, nos termos de Marte e na monomoiria
de Vénus. A sizígia dá-se assim acima do horizonte e cerca de quatro horas
antes do pôr-do-sol. No actual novilúnio, o encontro dos luminares ocorre a
caminho do Poente, estando a Lua desfavorecida por estar fora do seu segmento
de luz (αἵρεσις), mas num signo feminino, o da sua própria exaltação. A Lua
Nova de Touro vem fechar um conjunto sucessivo de fenómenos astrológicos nesta
constelação: o eclipse lunar, o ingresso de Júpiter em Touro e a actual
sizígia. Estes colocaram em análise o sentido profundo deste signo. Segundo Vétio
Valente, Touro é feminino, sólido, gera ordem, é terreno, rústico, está relacionado
com a agricultura, é semi-vocal ou mudo, nobre, invariável, energético,
inacabado e indicador de propriedade e posses (Antologia I, 2). A significação
antiga permanece no tempo e continua a permitir o aprofundamento conceptual
daquilo que foi estabelecido.
A
ligação entre o signo de Touro e a Terra, a Grande Mãe, encontra-se radical e
estruturalmente enraizada. É a matriz do crescimento e da abundância. Na
reflexão acerca do ingresso de Júpiter em Touro, já explorámos a relação entre
Reia e Zeus/Júpiter, o seu nascimento e infância em Creta, ou seja, o poder
matriarcal na dádiva do Júpiter astrológico. No entanto, para a análise da
sizígia, o rapto de Europa e a relação entre Pasífae e o Touro de Creta possuem
uma outra dinâmica, uma que, para além do consequente encontro dos luminares,
também se encontra indicado na conjunção de Vénus e Marte em Caranguejo. O
touro é o companheiro da Deusa-Mãe, da Πότνια Θηρῶν, a
Senhora dos Animais. Esta é uma deusa das origens e da qual descendem muitas
das divindades femininas, tais como Reia, Cíbele, Hera, Ártemis, Deméter ou
Atena.
No meu livro Fragmentos Astrológicos, encontra-se a seguinte descrição: “O rapto de Europa
marca uma das fundações do mito do Touro Cretense. Zeus enamorou-se de Europa e
para a cativar transformou-se num touro de resplandecente brancura e com os
cornos em forma de lua. A jovem sentou-se no dorso do touro que fugiu em
direcção ao mar. Chegados a Creta, os dois consumam a paixão junto de uma
fonte, em Gortina, à sombra de plátanos. Europa teve de Zeus três filhos:
Minos, Sarpédon e Radamanto. Numa segunda fase, o Touro é enviado, a partir do
mar, por Posídon para a costa de Creta, o reino de Minos. A rainha Pasífae
enamora-se do animal e pede a Dédalo que construa uma vaca de madeira, onde ela
possa entrar e assim unir-se ao animal. Dessa união nasce o Minotauro, um ser
metade homem, metade touro, que será colocado num labirinto e, mais tarde,
derrotado por Teseu com a ajuda de Ariadne, filha de Pasífae e Minos. Por fim,
numa terceira fase, Héracles é encarregue de apanhar o Touro. Este é depois
libertado, percorrendo a Grécia até chegar a Maratona, onde é morto por Teseu.
O herói vence sempre a fera, mas é o feminino que persiste.” (135-6. Lisboa, 2021: Livros – Rodolfo Miguel de Figueiredo). Existe pois uma continuidade de sentido, um elemento mimético
de passagem, que se estende ao longo da narrativa do mito do Touro Creta. O
feminino, sobretudo se virmos para além do exacerbamento dos feitos masculinos,
tem, nesta enunciação mitológica, um enorme poder, uma potencialidade criativa.
A união da
mulher e do touro e a passagem do animal ao humano, ou seja, a sua elevação,
são elementos de transformação profundos. No encontro venusiano com o animal, a
luz do feminino muda a realidade. Europa, Pasífae e Ariadne são elementos de
continuidade, mas não são elementos passivos, é a sua acção que dá sentido à
narrativa e que permite a possibilidade de mudança e, mesmo no caso de
Héracles, não nos esqueçamos que o herói está ao serviço da deusa, de Hera, uma
Deusa-Mãe. Ora o grande encontro de luz no signo de Touro (Lua, Sol, Úrano,
Mercúrio e Júpiter) concede essa mesma mudança. Porém, esta não é nem súbita,
nem radical, é uma mudança paciente, estruturada, que se funda e firma nas
raízes da realidade, na demanda do valor, do sentido do viver. No tema de Lisboa,
esse encontro de luz dá-se no lugar da morte. O signo da vida ocupa o espaço da
morte. A frase lapidar Et in Arcadia ego
que nos diz que também a Morte vive na
Arcádia reafirma o seu sentido, a sua permanência conceptual e simbólica.
Epicteto
afirma o seguinte: “Humanos, aguardai
Deus. Quando ele enviar o sinal e vos libertar desse serviço, então vos
liberteis para ele. Mas, por ora, suportai, permanecendo neste mesmo lugar ao
qual ele vos designou. Pouco é o tempo para permanecer aqui, e fácil para os
que estão desse modo dispostos. Pois qual tirano ou qual ladrão, ou quais
tribunais ainda serão temíveis para os que tornaram comparáveis a nada o corpo
e as posses deste? Esperai! Não partais de modo irracional!” (Diatribes I.9,
16-17, trad. Dinucci, 88. Coimbra, 2020:
IUC).
A dádiva da luz é uma bênção do bem e da virtude e a procura do valor, desse
absoluto que pertence à terra, implica um processo racional de elevação: do
animal ao humano, do humano ao divino. Não esqueçamos, porém, que o deus estóico
não é um ser distante que traz até nós a revelação. Para o estoicismo, e em
particular para Epicteto, nós somos um fragmento de Deus, somos o próprio deus,
logo a revelação não é externa, ela inicia-se única e exclusivamente naquilo
que somos, é um conhecimento de si.
O
encontro de luz no signo de Touro, sobretudo se pensarmos que se inicia na Lua
e no Sol, passa por Úrano e Mercúrio assexuais ou andróginos, embora neste
caso, devido à posição helíaca, masculinos, e termina em Júpiter, e também pela
conjunção destes à estrela Algol, encontramos um choque, uma colisão, entre a
necessidade de ressurgimento do númen feminino e as estruturas patriarcais
dominantes. Algol dá poder ao feminino, mas alimenta a intensidade, não fosse
ela a cabeça da Medusa, um símbolo por excelência do feminino. Segundo Ovídio,
Medusa era uma bela donzela que terá sido violada por Posídon no templo de
Atena. Ora a deusa sem mãe castiga a donzela, transformando-a num monstro, por
esta ter conspurcado com o seu templo. Encontramos aqui a simbologia desta
união de luz, do encontro dos planetas em Touro com a estrela Algol. No
entanto, não se pode esquecer a tradição e, neste caso, a malignidade de Algol.
Neste sentido, o encontro desta estrela com a sizígia pode, de facto, trazer
violência e destruição, sobretudo desastres naturais resultantes das alterações
climáticas.
Por
outro lado, o tema da sizígia encerra também uma outra dinâmica que já se
iniciara no eclipse lunar e que continuou no ingresso de Júpiter de Touro. O
facto de Marte e Plutão se estenderem, opondo-se ou quase, ao longo do eixo de
culminação, e de Balança marcar a hora apresenta-se como uma dinâmica comum,
uma que funda também, sobre o caminho do abismo ao cume, uma potência de
destruição. Marte traz destruição, ou violência, ao lugar da Lua e Plutão
espalha quadrangularmente os raios da morte até à sizígia e àqueles que a
acompanham. Este novilúnio, embora firme a matriz do signo de Touro, transporta
consigo uma potencialidade disruptiva que pode estender a sua influência para
além do mês lunar. A humanidade está sobre aviso e isso está cada vez mais
claro.
Séneca,
referindo-se aos tempos áureos, diz-nos, na sua Medeia, que “Os nossos pais viveram em tempos / magníficos dos
quais o embuste estava bem arredado. / Cada
um ficava tranquilamente nos seus litorais / e chegava à velhice nos campos ancestrais, / rico com pouco; não conhecia senão / as riquezas que o solo pátrio produzia.” (329-334, trad. A. A. Alves de Sousa. Coimbra, 2013: Imprensa da Universidade de Coimbra). Se tivermos em consideração
que a Idade de Ouro fora regida por Saturno, encontrarmos um indício da
proposta de transformação. O sextil da sizígia e daqueles que estão
co-presentes a Saturno e Neptuno em Peixes e os trígonos destes últimos a Vénus
e Marte em Caranguejo e à Cauda Draconis em Escorpião congregam uma mensagem semelhante
àquela que Séneca descreve. Está a ser-nos pedido, senão mesmo exigido, que
mudemos o modo de vida. Pede-se um regresso à Idade de Ouro, em que a Terra
esteja viva e em que a sua abundância nos seja suficiente. As deslocações
desenfreadas, face ao facto de serem extremamente poluentes e nos desviarem do
essencial, e o nosso consumismo colocaram a humanidade sobre o fio da navalha. Tornámo-nos
a sombra da nossa desmedida e isso traz até nós o peso, a gravidade, do destino.
Existe uma causalidade que encaminhou até nós as penas de Némesis. E, perante o
abismo, o que podemos fazer? Seguir a luz. Essa é nossa única solução.
O novilúnio de Maio, com a sua intensa concentração de luz, mas também de alguma sombra, no signo de Touro, encerra uma proposta de abundância. Ora essa proposta, em particular no actual ano astrológico, estará em evidência sobretudo nos movimentos astrológicos pelos signos de Terra e de Água. A Era do Espírito Santo, do Sagrado Feminino, está a anunciar-se tanto com a pomba que cinge o céu como com a sacerdotisa que sibila e dança ao som do tambor nocturno. Nesta Lua Nova, a Deusa-Mãe, a Terra, concede-nos uma dádiva que precisamos de aceitar.
sexta-feira, 5 de maio de 2023
Reflexões Astrológicas 2023: Eclipse Lunar Penumbral (Lua Cheia: Touro-Escorpião)
Reflexões Astrológicas
Eclipse Lunar Penumbral
(Lua Cheia:
Touro-Escorpião)
Lisboa, 18h23min, 05/05/2023
Lua
Decanato: Sol
Termos: Mercúrio
Monomoiria: Marte
Sol
Decanato: Lua
Termos: Júpiter
Monomoiria: Vénus
O Eclipse Lunar Penumbral de dia 5
de Maio ocorre com a Lua no signo de Escorpião e o Sol no de Touro, com Balança
a marcar a hora e a cerca de duas do pôr-do-sol (hora de Lisboa), logo no
Segmento de Luz (αἵρεσις) do Sol, estando este acima do
horizonte, na VIII, no lugar da Morte (θάνατος), já a Lua está abaixo do horizonte, na II, no lugar do Viver
(βιός).
A Lua encontra-se no decanato do Sol, nos termos de Mercúrio e monomoiria de Marte, enquanto o Sol encontra-se
no decanato da Lua, nos termos de Júpiter e monomoiria
de Vénus. Se pensarmos que, da Lua até ao Ponto de Culminação, não existe
nenhum astro, concluímos então que é o caminho luminar em que Sol se insere, e
que é por si dominado, que se torna mais significativo, pois de uma forma mais
abrangente é aquele que vai de Marte em Caranguejo a Júpiter em Carneiro ou, se
preferirmos uma maior simbólica cadente, dado que Marte está junto à
Culminação, será aquele que vai de Vénus em Gémeos a Júpiter em Carneiro. Este
é o caminho dos benéficos, ou do bem, rumo ao Poente, onde o Sol se encontra
obscurecido. Neste ocaso da realidade, a acção do bem vive na sombra.
Existe uma clara aproximação de
sentido entre este eclipse e o anterior eclipse solar, visto que, por um lado,
Balança marca a hora no actual eclipse e este é um dos signos que integra o
eixo para o qual avançará o eixo nodal e marcará a próxima fase de eclipses, iniciada
com o eclipse de dia 20 de Abril, e, por outro lado, a Lua recai nos dois
eclipses na II, no Lugar do Viver (βιός), exacerbando a sua significação
tópica. É igualmente assinalável o facto de em ambos os eclipses a Lua se
encontrar sob o horizonte. A ocultação luminar, seja pela sua visibilidade ou,
neste caso, também pela sombra do eclipse, adquire sempre um simbólica radical,
um valor que transmite uma representação profunda da realidade. Ora a ocultação
da Lua, da Deusa, do Espírito Santo ou do Divino Feminino, num lugar que
determina o valor do viver, assume um carácter primordial de transformação, ou
seja, diz-nos que, na sombra, sob o manto da nossa ignorância, se encontra
aquilo que nos falta, a fonte da nossa angústia, da nossa incompletude. Não
provimos aquilo verdadeiramente nos sustem.
A área geográfica do actual eclipse
é maior que a do eclipse solar, embora semelhante. A zona principal incide
sobre a Ásia e sobre a Oceânia, expandindo a influência do eclipse de dia 20 de
Abril. A segunda zona alcança, já de forma parcial, África e a Europa. No caso
de Portugal, este manto chega sensivelmente até ao Tejo, ou seja, cobre apenas
metade do país. Se seguirmos, porém, a tradição antiga, a Lua em Escorpião fornece-nos
um conjunto de informações adicionais. Valente diz-nos que Escorpião rege a Metagonitis
ou Numídia (Norte de África, Argélia e Tunísia), a Mauritânia, a Getúlia (Norte
de África, Argélia e Tunísia), a Síria, Comagena (Ásia Menor), a Capadócia,
Itália, Cartago, Líbia, Amom (Jordânia), Sicília, Espanha e Roma. Já para Manílio
Escorpião rege Cartago, a Líbia, o Egipto, Cirene, a Itália e a Sardenha (Astronomica IV, 777-82).
No entanto, devemos também
considerar o Sol em Touro, embora com uma menor expressão geográfica. Segundo Vétio Valente (Antologia I, 2), vai reger as regiões da Média (o actual noroeste do Irão,
o Azerbaijão, o Curdistão Iraniano e o Tabaristão ou Mazandarão), da Cítia
(Irão, mas também uma área que se estendeu da Bulgária às fronteiras da Rússia,
Mongólia e China), do Chipre, da Arábia, da Pérsia e das montanhas do Cáucaso,
da Samártia (junto à Média), de África, de Elymais ou Elamais (Cuzistão,
província do Irão), de Cartago, da Arménia, da Índia e da Germânia. Para
Manílio, Touro rege Cítia, a Ásia (por causa dos Montes Tauro) e a Arábia. (Astronomica, IV, 744-817). No caso dos eclipses lunares, a
questão da influência geográfica é deveras importante, já que, no seu período
de influência, encontramos frequentemente a existência de fenómenos naturais
extremos, tais como sismos, erupções vulcânicas ou tempestades.
Em termos temporais, a acção deste
eclipse pode ser fixada entre perto dos dois meses até aos seis ou sete meses.
O período de cerca de dois meses pode ser estabelecido a partir da ascensão
recta, enquanto a linha temporal mais extensa é alcançada pela extensão
temporal dos contactos umbrais. No entanto, podemos afirmar que a sua
influência será mais intensa nos dois meses que se seguem ao eclipse. Existe,
porém, um outro factor a ter em consideração acerca desta influência, pois,
segundo a série Saros em que está inserido, este eclipse está intimamente
ligado ao eclipse da mesma série que acontecerá a 16 de Maio de 2041, também no
eixo Escorpião-Touro. Os sentidos propostos pelo actual eclipse criam uma ponte
significativa entre os dois eclipses, estendendo assim a sua proposta de representação
da realidade.
A série Saros 141 é uma série
relativamente recente que se iniciou a 27 de Agosto de 1608, com eclipse no
eixo Peixes-Virgem, e que terminará a 11 de Outubro de 2888, com um eclipse no
eixo Carneiro-Balança. O primeiro eclipse total só acontecerá em 2167 com um eclipse
no eixo Aquário-Leão. Nesta série, dado o primeiro e o último eclipse, existe
uma união de sentido entre o fim e o início, entre a significação dos dois
eixos. Esta ideia matriz serve, face ao actual eclipse, a consolidação, a
integração na consciência humana que a Natureza é um ser vivo, com alma, que
nasce, morre e renasce. O eixo Escorpião-Touro está a oferecer-nos uma profunda
lição acerca do valor da Terra, da Mãe-Terra. Marco Aurélio diz-nos o seguinte:
“Contempla o curso dos astros como se
levado foras nas suas revoluções, e considera de contínuo como os elementos se
transformam uns nos outros. Tal contemplação purifica-nos das nódoas da terra.”
(Pensamentos VII, 47, trad.
J. Maia. Lisboa: Relógio D’Água, 1995).
Fomos nós que colocámos as “nódoas da terra” e somos nós que as temos de
tirar.
O início da série Saros 141 é
marcado por alguns acontecimentos em torno da fundação da colónia americana de
Jamestown. A 13 de Agosto de 1608 é submetida para publicação a história dos
primeiros dias da colónia de John Smith e, a 10 de Outubro, este é eleito
presidente do conselho colonial. A história de John Smith e de Pocahontas é um
exemplo de aceitação do outro, da diferença e de criar laços afectivos com
alguém que a maioria tende a rejeitar. Face à crise dos refugiados, da pobreza
e das desigualdades sociais, o simbolismo por detrás desta história torna-se imperativo.
Podemos encontrar astrologicamente esse sentido no trígono que, hoje, une os
astros nos três signos de água. A sua significação congrega a tensão e a possibilidade.
Séneca
afirma o seguinte: “Pensa bem como esse
homem que chamas teu escravo nasceu da mesma semente que tu, goza do mesmo céu,
respira, vive e morre como tu. Tanto direito tens tu a olhá-lo como homem livre
como ele a olhar-te como escravo” (Ep.47.10;
Cartas a Lucílio, 2ª ed,, trad. J. A. Segurado e Campos. Lisboa, 2004:
Fundação Calouste Gulbenkian). Ora este é também o espírito da Saturnália
e de Saturno (e Neptuno) em Peixes.
A
refundação da justiça social e das estruturas políticas, económicas e sociais
estará intimamente relacionada com o medo de feminino que se apresenta com
Marte em Caranguejo. A respeito de Marte convém referir-se que é o astro mais
alto, em conjunção ao Ponto de Culminação. Este factor, aliado à posição de
Plutão retrógrado em Aquário, junto ao Ponto Subterrâneo, embora em posição
pós-polar e noutro signo, vai colocar sob pressão os fenómenos naturais
extremos. O trígono de Água apresenta, neste eclipse, um sentido profundo. O
medo de feminino é um sinal dos tempos, mas a forma abusiva como utilizamos os
recursos do planeta também o é, e sobre estes dois eixos de acção e reacção
vive a morte, a retribuição e a necessidade. A sombra do eclipse, com a Lua em
Escorpião, revela-nos que, face à gravidade da desmedida, será apenas sob a
terra queimada, sob as cinzas da história, que o renascimento acontecerá. O
tempo pede, novamente, que os escravos se ergam e se tornem senhores. Essa é,
como já observámos, a lição de Saturno em Peixes e que agora se une à do
eclipse lunar.
A
quadratura de Plutão em Aquário aos luminares e ao Dragão da Lua, a partir do
lugar da Boa Fortuna, confirma a sua mensagem fundamental de que a morte paira
sobre o humano e de que a semente do amanhã repousa ainda sob a terra, oculta
no ventre da Grande Mãe. Não existe criação sem destruição. Essa é a ideia que
nos deve servir de guia e que contribuirá para nos redimensionarmos. Os
complexos humanos de super-homem deverão cair, pois a actividade humana tem
sido exacerbada por um narcisismo desenfreado que quer que esqueçamos a nossa
finitude, a nossa incompletude. É esvaziando-nos que nos tornámos plenos. O
trígono de Vénus em Gémeos, no lugar do Deus Sol, a Plutão em Aquário indica a
palavra do Amor que vence a dualidade, a separação. Porém, é sempre mais fácil
distinguir do que congregar. Se por vaidade dizemos que reunimos, estamos a
apenas a criar mais separação. A quadratura de Vénus a Saturno e Neptuno aponta
para essa dificuldade. A teia que une a necessidade e a compaixão, criando
possibilidade e redenção, exige esforço. Temos de primeiro nos perder, para
depois nos encontrarmos, renovados e renascidos.
Na
casa da Grande Mãe, da Mãe Natureza, que é o signo de Touro, o Sol, Mercúrio, Úrano
e a Caput Draconis expressam uma mensagem que se firma no ocaso da realidade.
Fundar um novo modo de vida quando tudo o que se vê é morte é o desafio dos nossos
tempos. A qualidade da morte alia-se aqui à noção de poente. O caminho de Júpiter
em Carneiro avança para o seu fim, o que, neste tema, assume literalmente esse término.
A acção do bem tornar-se-á a bondade da terra. Júpiter em Touro chegará com a dádiva
de Gaia. Porém, a actual quadratura entre Júpiter em Carneiro e Marte em Caranguejo
revela esse mesma dificuldade de acolher os dons da terra e do feminino. Neste eclipse
lunar, este choque entre o grande benéfico e o grande maléfico assume um carácter
de definição e prenúncio. A par do trígono de Água e do eixo do eclipse, este é
um símbolo do futuro que resume a mensagem da actual ocultação luminar.
O
eclipse lunar de dia 5 de Maio, como lhe é natural, mas aqui um pouco mais acentuado,
vai trazer consigo um conjunto de sentidos subliminares, como se sibilados pela
Senhora do Tempo e da Necessidade. Nem tudo é literal, directo ou evidente, existem
pois sentidos que preenchem a trama de um tear. A união de Júpiter em Touro e Saturno
em Peixes, bem como a longa travessia de Vénus em Leão, assinalam uma era do feminino
e o actual eclipse é a sombra que antecede a luz. Em suma, é sobre a sombra que
se guarda a luz e iluminado é aquele que guarda a centelha da sabedoria.