Reflexões Astrológicas
Eclipse Lunar Total
(Lua Cheia:
Touro-Escorpião)
Lisboa, 10h59min, 08/11/2022
Lua
Decanato: Lua
Termos: Júpiter
Monomoiria: Mercúrio
Sol
Decanato: Sol
Termos: Mercúrio
Monomoiria: Vénus
O Eclipse Lunar Total de dia 8 de Novembro
ocorre com a Lua no signo de Touro e o Sol no de Escorpião, com Capricórnio a
marcar a hora (hora de Lisboa), no Segmento de Luz (αἵρεσις) do Sol, estando este abaixo do
horizonte, na V, no lugar da Boa Fortuna (ἀγαθή τύχη),
e a Lua acima, na XI, no lugar do Bom Espírito (ἀγαθόν δαίμων). A Lua encontra-se no seu próprio decanato, nos termos de
Júpiter e monomoiria de Mercúrio. O
Sol encontra-se também no seu próprio decanato, nos termos de Mercúrio e monomoiria de Vénus. Na hora de Lisboa,
o eclipse dar-se-á cerca de quatro horas após o ocaso do Lua e o nascimento do
Sol. A ocultação da Lua, do Feminino e da Deusa, quer pela condição natural do
próprio eclipse lunar, quer por estar abaixo do horizonte no segmento do Sol,
será mais evidente, tornando simbólico o caminho por trilhar.
Se seguirmos uma outra técnica,
diferente daquela que utilizámos no passado eclipse solar e baseada na ascensão
recta no período de maior magnitude, concluímos que o efeito deste eclipse pode
ficar perto dos três meses. Por outro lado, se nos sustentarmos no tempo de
duração do eclipse, podemos fixar então um efeito que vai de cerca de um mês e
meio até perto dos quatro meses, o que, na verdade, não faz divergir em muito o
resultado.
Estas diferentes formas de se
calcular o tempo em que os efeitos de um eclipse estarão mais presentes servem
sobretudo para demonstrar que existem outros modelos para além do ptolemaico e
das horas equatoriais. O eclipse de dia 8 quer pelo tempo que se acabou de
fixar, quer pelas suas próprias características astrológicas não terá um efeito
externo evidente, todavia possuirá um grande efeito interno, ou seja, o seu
efeito nascerá das profundezas tanto da Terra como da alma.
Quanto ao seu efeito espacial,
devemos observar primeiro as lições antigas. Manílio
que nos deixou o primeiro manual de Astrologia Helenística – sim, porque
Doroteu não só poderá ser ligeiramente posterior como o seu livro chegou até
nós ou em fragmentos ou em versões posteriores – diz-nos que Touro rege a
Cítia, a Ásia, por causa dos Montes Tauro na Turquia, e a Arábia (Astronomica, IV, 744-817). Vétio Valente segue esta tradição e
coloca Touro a reger as regiões da Média (o actual noroeste do Irão, o
Azerbaijão, o Curdistão Iraniano e o Tabaristão ou Mazandarão), da Cítia (Irão,
mas também uma área que se estendeu da Bulgária às fronteiras da Rússia,
Mongólia e China), do Chipre, da Arábia, da Pérsia e das montanhas do Cáucaso,
da Samártia (junto à Média), de África, de Elymais
ou Elamais (Cuzistão, uma província do Irão), de Cartago, da Arménia, da Índia
e da Germânia (Antologia I, 2).
Por outro lado, o mapa da sombra do
eclipse diz-nos, porém, que este abrange uma área que é quase a oposta à do
eclipse solar de dia 25 de Outubro, pois, no actual a Europa e a África ficam
quase excluídas do manto penumbral. O eclipse recairá sobre a Ásia, a
Austrália, o Pacífico e as Américas. A regência astrológica sobre o continente
Asiático coincide com as lições de Manílio e de Valente, confirmando as
questões globais em torno da Rússia, da China, de Taiwan e das Coreias, bem
como os problemas no Irão, no Iraque, no Afeganistão e no Paquistão.
O efeito do eclipse sobre o Irão
dará, por exemplo, continuidade aos actuais protestos políticos, bem como à sua
repressão, e fará permanecer a questão em torno dos direitos das mulheres,
embora esta seja uma questão que se colocará muito para além das fronteiras do
Irão. Os avanços do populismo e da extrema-direita, tanto na Europa como nos
Estados Unidos da América têm minado os direitos das mulheres. Em todos estes
casos e, em especial, neste último, a descida da sombra, no tema astrológico de
referência, sobre a terra e sobre o lugar que a Lua ocupa assume aqui um
sentido literal que torna agora o símbolo uma realidade.
Este
eclipse insere-se na série Saros 136, uma série relativamente recente, que se
iniciou com o eclipse de 13 de Abril de 1680 sobre o eixo Balança-Carneiro.
Esta série terminará a 16 de Junho de 2383 no eixo Sagitário-Gémeos, mas o
primeiro eclipse da série é aquele que serve de matriz. Neste caso, menos de um
mês após o eclipse, já em Maio de 1680, o Krakatoa, entre as ilhas de Java e
Sumatra, entra em erupção. Algo que é astrologicamente confirmado pela
quadratura da Lua e da Caput Draconis
em Balança e do Sol, de Úrano, Marte e da Cauda
Draconis em Carneiro a Saturno e Plutão em Caranguejo. Encontramos, com
frequência, nos eclipses e, em especial, nos eclipses lunares, uma certo efeito
sobre os desastres naturais, sejam eles erupções vulcânicas, sismos, tsunamis ou furacões.
Para
além da erupção do Krakatoa, deve-se salientar o grande o auto-de-fé de 30 de
Junho na Plaza Mayor, em Madrid, e cuja imagética pode ser apreendida pelo
quadro de Francisco Rizi, exposto no Museu do Prado. Ora este facto é
perceptível pela quadratura de Mercúrio e Júpiter em Touro a Neptuno em
Aquário. A humanidade tende a acreditar na cristalização dos valores e na
certeza de que a forma de alguns serem e estarem é a única que se pode aceitar.
Umas
semanas antes, a 10 de Junho, é assinado um tratado de defesa mútua entre
Espanha e Inglaterra. O sextil entre Mercúrio e Júpiter em Touro a Vénus em
Peixes favoreceu a assinatura deste tipo de tratado. Por fim, e já para além
dos efeitos imediatos do eclipse, mas assinalável, é o primeiro avistamento do
cometa de 1680 que passou, nomeadamente, do tom cinza ao vermelho, como se
visse, no céu, um feixe de luz, primeiro Saturno e depois Marte. À semelhança
dos cometas antigos, a passagem do cometa de 1680 será de extrema importância.
Na
série 136, o último eclipse parcial da primeira da fase deu-se a 14 de Setembro
de 1932. A Guerra de Chaco, entre a Bolívia e o Paraguai, marca o período em
redor do eclipse, em especial, a Batalha de Boquerón, ou seja, o cerco da
fortaleza de Boquerón pelos paraguaios, que ocorreu entre os dias 9 e 29 de
Setembro de 1932, durante o próprio eclipse. Já o primeiro eclipse total da
segunda fase desta série Saros aconteceu no dia 26 de Setembro de 1950.
Várias
das séries Saros em que se inserem os últimos eclipses, os dos últimos anos,
tiveram eclipses que correspondem ao período da Guerra da Coreia, o que encerra
um sentido profundo, pois as questões que aí surgiram vão marcar acontecimentos
actuais e futuros. A área geográfica das duas coreias continua a ser uma ameaça
à paz mundial, pois o gatilho de uma grande guerra tende a ser puxado em
questões aparentemente circunscritas.
O
eclipse de 1950 inclui-se nesse lote. Uns dias antes do eclipse, deu-se a
Batalha de Inchon (15/09) e, entre os dias 31 de Agosto e 19 de Setembro, a
Batalha do Rio Ham. Como sinal claro do agravamento do conflito, a China entra
na guerra, fortalecendo a posição norte-coreana. De uma outra forma e do outro
lado do mundo, no Brasil, Getúlio Vargas é eleito presidente (03/10) para o
último mandato e que terminará com o seu suicídio (24/08/1954). Neste período, criou-se
muitas das dicotomias que ainda hoje persistem na sociedade e política
brasileira. O eclipse 26 de Setembro de 1950 definiu-se por um carácter que
diverge do actual, pois a sua expressão era externa e manifestou-se de forma
explícita na geopolítica do seu tempo. Já o actual eclipse funda-se num
elemento de ocultação que, na verdade, se une à natureza primordial de um
eclipse.
Robert
Hand diz-nos, em Essays on Astrology,
que “Os antigos adoravam todas as formas
de divindades femininas, a maioria das quais estavam relacionadas com a Lua de
alguma forma.” (1982: 14. Atglen: Whitford Press). Existe uma persistência natural da
Lua no Sagrado Feminino, mas que, na astrologia, é por vezes desvalorizada. O
exacerbamento conceptual da actual astrologia psicológica sobre a Lua traduz,
na verdade, o medo do feminino e a rejeição, muitas vezes inconsciente, do seu
potencial. Tem-se esvaziado a Lua
astrológica do espanto primordial, teofânico, que define a Lua como Grande
Deusa.
Na
mitologia grega, Hesíodo diz-nos, na Teogonia,
que Hemera, Ἠμέρα (o
Dia), e o Éter, Αἰθήρ
(a Luz Celestial), nasceram de Érebo, Ἔρεβος (as
Trevas), e de Nix, Νύξ
(a Noite). Esta escuridão que reside na
origem continua hoje a indicar esse medo do feminino, que assusta e faz
enraivecer homens e mulheres, enraizados no patriarcalismo e na fragilidade de
um masculino estereotipado e na distorção do feminino. Aquele que emerge nas
águas da Grande Mãe, da deusa Sige, tem medo de se perder.
É
curioso que os gregos faziam uma distinção entre o Éter que representa a luz celestial
e o céu dos deuses com Úrano, o céu da natureza e dos humanos. Isto é algo que
hoje tendemos a esquecer e que nos leva, uma vez mais, a repensar os planetas
para além de Saturno e o seu verdeiro sentido. No caso do eclipse lunar, este
aspecto é particularmente importante, uma vez que Úrano se encontra com a Lua,
abaixo do horizonte, no reino sob a Terra. É impossível, também pela ausência
do elemento Fogo neste eclipse, não relacionar o mesmo com a imagem da caverna,
visto que ela representa essa escuridão primordial, essa Noite a partir da qual
tudo nasce.
Na
alegoria da caverna, Platão afirma o seguinte: “se alguém o forçasse a olhar para a própria
e luz, doer-lhe-iam os olhos e voltar-se-ia, para buscar refúgio junto dos
objectos para os quais podia olhar” (República 515e, trad. Maria Helena da Rocha Pereira. Lisboa: Fundação
Calouste Gulbenkian, 15ª ed., 2017). O medo do feminino, da escuridão uterina, revela, com uma
frequência abissalmente comum, o medo da luz. Por norma, aquele que teme a sombra
quebra também perante a luz. A revelação, tanto por aquilo que se oculta como
por aquilo se expõe, causa quase sempre um temor avassalador, daí que aquele
que aceita a luz e nasce da caverna do feminino seja rejeitado e vilipendiado.
A excepção e o comum nunca andam de mãos dadas. Porém, tanto a escuridão como a
luz, tanto a noite como o dia são o nosso único caminho.
Com o Sol, Vénus e Mercúrio em Escorpião, ambos sob os
raios solares e Mercúrio no Coração do Sol, sendo estes, para o tema de Lisboa,
os únicos acima do horizonte, o sentido de mediação, segundo aquilo que se
oculta, ganha uma nova força, uma outra dinâmica. Na XI, no lugar do Bom
Espírito, esta pulsão solar torna-se assim a nascente no interior da caverna, a
origem do rio e da passagem. Caído o escorpião, uma águia erguer-se-á, mas
engana-se aquele que julga que a águia é um escorpião benévolo, pois se um ataca
escondido na terra, o outro precipita-se oculto no ar. A morte é, contudo, uma
e a mesma.
Vénus em Escorpião é a sensualidade que mata e o desejo
que envenena, é como a música dos UHF “Matas-me com o teu olhar”, e essa morte
não é apenas erótica, é também bélica. A deusa do amor e da guerra passeia-se por
entre as hordas. Já Mercúrio em Escorpião é palavra que eleva os mortos, o cântico
do Psicopompo que guia as almas no submundo. Aqui a palavra é um demiurgo
necromante que recupera a sabedoria do passado e dos ancestrais. Neste eclipse,
se temermos a morte e os mortos, a destruição, não alcançaremos a sua mensagem.
Existe, porém, nesta palavra sussurrada uma dádiva que
emerge: Júpiter e Neptuno em Peixes unem-se triangularmente a esta concentração
de luz e sombra em Escorpião. O retorno de Júpiter a Peixes e o reencontro com
Neptuno recupera a dádiva das Musas e das Graças. A criação nasce do bem e,
mesmo que discreta, pode salvar o mundo. O novo humano nasce também da sua
criatividade, daquela que nasce da solidão do espírito e não da vaidade no meio
da multidão.
Com Marte em Gémeos, em retrogradação, olhando para trás,
quadrangularmente, para Júpiter e Neptuno em Peixes, rangendo os dentes e
arranhando os cotovelos, a inveja ficará à espreita e irá expandir esse azedume
para com o outro com a força que evita o choque de olhar para si. A aversão do
lugar do Sol e dos seus porta-estandartes, Mercúrio e Vénus, ou seja, de
Escorpião ao lugar de Marte, Gémeos, revela também este desligamento radical,
esta apostrofia tópica, que, neste
eclipse, enfraquece o próprio Marte. Paralelamente, e por Marte estar fora do
segmento de luz dominante, Saturno torna-se o grande maléfico, tornando
estruturante, uma vez mais, o trígono com Marte. O destino coloca a retribuição
e a desmedida sobre os excessos da humanidade.
Saturno em Aquário, neste eclipse na II, no lugar do
Viver (hora de Lisboa), representa aqui a ameaça sobre os bens de primeira
necessidade, sobre a dignidade humana, e a prevalência da desigualdade social
sobre a justa distribuição da riqueza. Saturno lança quadrangularmente, a
partir do reino sob a terra, os seus raios sobre o eclipse, sobre os astros em
Touro e Escorpião, que devolvem a escuridão penumbral, enlaçando-a entre a vida
e a morte. As raízes da Terra, com a Lua, Úrano e a Caput Draconis em Touro, na Boa Fortuna (V), junto à Cornucópia de
Amalteia, querem lançar, em igualdade, a abundância sobre todas e todos, mas as
trevas impedem o caminho do bem.
O grande benéfico, que é Júpiter em Peixes, une-se em
trígono (Escorpião) e em sextil (Touro) aos luminares, ao Dragão da Lua e aos planetas
que os acompanham e revela, de facto, a via do bem que se oculta sob a sombra do
eclipse. Júpiter e Neptuno trazem, de novo, dando à humanidade a outra hipótese
de anular os erros do passado, a dádiva da bondade e compaixão, de trazer a si,
ao si que se revela depois do eu, a bênção da totalidade, da imersão da alma
individual na alma do mundo. Plutão em Capricórnio contribui para esta dádiva
com sextil aos astros em Escorpião e Touro, com o poder da morte e com a transformação
radical de nos apercebermos que tudo nasce, morre e renasce, que o que se cria
também se dissolve. O apego é uma outra senda que não pertence ao caminho do
bem.
Este eclipse lunar total, no eixo Touro-Escorpião, coloca
o binómio luz-sombra sobre a vida e a morte, sobre a qualidade do viver e do morrer,
estabelecendo sobre o que se cria e o que se perde novas estruturas de valor. Será,
deste modo, e se for essa nossa vontade, a Deusa eclipsada, o Feminino renegado,
a recuperar o absoluto que pertence à Terra.
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