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segunda-feira, 4 de setembro de 2023

Júpiter Retrógrado: De 4 de Setembro a 31 de Dezembro de 2023


Júpiter Retrógrado: De 4 de Dezembro a 31 de Dezembro.

Júpiter Retrógrado a partir das 15h11min do dia 4 de Dezembro.

Reflexões Astrológicas 2023: Retrogradação de Júpiter

  Reflexões Astrológicas


Retrogradações


Retrogradação de Júpiter

Lisboa, 15h11min, 04/09/2023

 

Júpiter

Decanato: Lua

Termos: Júpiter

Monomoiria: Mercúrio     

 


  Júpiter inicia a sua retrogradação no signo de Touro, no 16º grau (15º34΄), estando Sagitário a marcar a hora para o tema de Lisboa e, deste modo, na VI, o lugar da Má Fortuna (κάκη τύχη), no decanato da Lua, nos termos de Júpiter e na monomoiria do Mercúrio. A retrogradação começa assim de dia, abaixo do horizonte e depois do Sol passar a culminação. Em 2023, o movimento em que Júpiter nos concede a ilusão de estar a recuar estender-se-á até 31 de Dezembro, onde estará no 6º grau (5º34΄), nos termos de Vénus. Existirá pois um caminho de reintegração do potencial do bem entre os termos de Júpiter e os de Vénus, oposto ao que se assistiu na retrogradação de Vénus, quando o caminho se estendia entre os maléficos.  

  A ligação entre os benéficos torna-se particularmente expressiva se pensarmos que a retrogradação de Vénus termina quando vai começar a de Júpiter. A potencialidade do bem afirma-se durante todo este período com uma qualidade reflexiva, um meio de efectivação futura. Por outro lado, existe no fenómeno astrológico de retrogradação uma certa forma de negação da acção planetária. Ora é neste sentido que Hermann Melville, em Bartleby, o Escrivão (1853), expressou uma categoria filosófica que pode também ser entendida como um modo último de vida. A impotência, a não-potência, o acto de contrariar a acção impõe-se como possibilidade, como uma permanência na possibilidade. O dizer “Prefiro não o fazer” é o baluarte supremo da resistência, revelando que pode, mas prefere não o fazer.

  Existe aqui uma deliberação, uma escolha, que, embora impeça o acto, a realização, não deixa de ser activa. No entanto, para a astrologia, a retrogradação vai fixar-se entre a potencialidade, a impotência e a não-potência, não tanto por liberdade ou negação, mas por ser uma condição sine qua non, um meio através do qual a criação e a acção geram as suas raízes. Este processo de enraizamento contempla necessariamente a condição nefasta ou desvantajosa, descrita por Doroteu (Carmen Astrologicum, I, 6) ou por Paulo de Alexandria (Introdução, capítulo 14), sem perder, todavia, o carácter de semente. Por exemplo, Hades/Plutão é tanto o deus do submundo, dos mortos, como o deus da abundância, pois é sob a terra que a semente germina, ou não. Na retrogradação de Vénus e Júpiter, temos de considerar, desta forma, o enraizamento do bem e da justiça e, enquanto semente, o seu potencial de dádiva ou bênção. Esta terá de ser, neste caso, a matriz dos conceitos de δύναμις e de ἐνέργεια quando aplicados à astrologia.

  O sentido da retrogradação de Júpiter pode ser apreendido, à semelhança do que fizemos com Vénus, por uma análise astro-mitológica. A passagem de Júpiter pelo signo de Touro está intimamente associado ao Zeus cretense e à sua submissão à Grande Mãe, à deusa Reia. Seguindo essa interpretação, a retrogradação de Júpiter em Touro pode ligar-se, na teogonia cretense, ao momento em que os Curetes, os jovens guerreiros, dançam e brandem os seus escudos em redor de Zeus recém-nascido, para que o choro do jovem deus seja abafado e imperceptível para Cronos/Saturno, o pai reinante que devorava os próprios filhos. A acção dos Curetes é um acto iniciático, um que guarda o potencial de Zeus.

  Por outro lado, é a forma como Zeus se torna senhor do Olimpo, como adquire os seus poderes (potencialidades), que melhor descreve e define a retrogradação de Júpiter. O grande benéfico, seguindo as tradições matriarcais e matrilineares, embora algo corrompidas pela literatura já androcêntrica, herda os seus poderes de divindades femininas. Em termos astrológicos, este aspecto justifica, por exemplo, o facto de Caranguejo ser o lugar de exaltação de Júpiter. A misoginia, deliberada ou meramente ignorante, que ainda persiste em muita interpretação astrológica pode ficar um pouco arrepiada, mas a leitura astro-mitológica comprova esta raiz de sentido. As uniões de Zeus com outras divindades femininas são a forma de este adquirir os seus poderes.

  Ora é seguindo essa tradição mitológica que Hesíodo afirma o seguinte: “Zeus, rei dos deuses, tomou por primeira esposa Métis,/ a que mais sabe sobre os deuses e os homens mortais./ Mas, quando ela estava prestes a dar à luz a deusa Atena de olhos garços,/nessa altura, ele enganou o seu espírito,/com palavras ardilosas, e engoliu-a no seu ventre,/ por conselho da Terra e do Céu coberto de estrelas./ Ambos o aconselharam assim, para que o poder régio/ não pertencesse a nenhum outro dos deuses que vivem sempre, senão a Zeus./ Porque estava predestinado que dela nascessem filhos muito inteligentes:/ a primeira, a filha de olhos garços, a Tritogéneia,/ detentora de força e de uma sábia vontade igual à do pai;/ depois, seria a vez de um filho, rei dos deuses e dos homens,/ que ela daria à luz, um filho de coração soberbo./ Mas, antes, Zeus engoliu-a no seu ventre,/ para que a deusa lhe pudesse aconselhar o que é bom e o que é mau.” (886-900, trad. A. Elias Pinheiro & J. Ribeiro Ferreira. 2005: 74. Lisboa: IN-CM). Depois de Gaia e Reia, Métis é a primeira a permitir a hegemonia de Zeus/Júpiter. Na verdade, Atena nasce posteriormente com a condição de filha sem mãe, anulando o poder matrilinear. Este aspecto determina a forma como Zeus/Júpiter adquire o seu poder através de uma eliminação do poder feminino.

  A sua segunda esposa é Témis, a mãe das Horas e das Moiras. Esta concede ao deus o poder da justiça que, com o intelecto de Métis, vai estabelecer a sua omnisciência. Depois segue-se Eurínome, com quem teve as Graças e que, segundo a teogonia pelasga, foi a primeira a reinar no Olimpo, num tempo anterior ao de Cronos e de Zeus. Com Mnemósine tem as Musas, com Deméter, Perséfone, e com Latona, Apolo e Ártemis. Os poderes da memória e poderes sobre a terra, o sol e a lua são adquiridos assim através destas deusas e passados para a sua prole. A sua última esposa, aquela que ficou mais marcada na tradição e mais adulterada pela misoginia dos tempos, é Hera, com quem terá tido Hebe, Ares e Ilitia. Hera era uma grande deusa, adorada em Argos, em Samos e na Argólida e venerada em Olímpia antes do próprio Zeus, mas que a tradição descreve apenas como a esposa ciumenta e vingativa.

  A passagem do poder, das potencialidades radicais, das antigas divindades femininas para Zeus firma astrologicamente esse movimento que vai da retrogradação ao estado directo. Em 2023, retrogradação acontece não de forma isolada, mas como um acorde da música das esferas. Primeiro, inicia-se após a retrogradação de Vénus. Quando esta começou, Gémeos marcava a hora (tema de Lisboa) e agora quando Júpiter nos ilude com o seu retrocesso, é Sagitário que marca a hora. O eixo do conhecimento e da sabedoria fundam a interiorização da dádiva do bem. Paralelamente, a retrogradação de Júpiter inicia-se com cinco planetas retrógrados (Mercúrio, Saturno, Úrano, Neptuno e Plutão), acentuando-se assim a já descrita qualidade do estádio.

  No período em que Júpiter estará retrógrado, ou seja, de 4 de Setembro a 31 de Dezembro de 2023, devemos destacar os seguintes movimentos planetários: Mercúrio avançará de Virgem até Carneiro, estando retrógrado de 23 de Agosto a 15 de Setembro e de 13 de Dezembro a 2 de Janeiro de 2024, aqui já para além do período indicado; Vénus passará pelos signos de Leão a Sagitário; Marte transitará pelos signos de Balança, Escorpião e Sagitário; Saturno em Peixes ficará directo a 4 de Novembro; Neptuno também em Peixes passará a directo a 6 de Dezembro; e Plutão em Capricórnio terminará a retrogradação a 11 de Outubro, preparando agora o seu derradeiro périplo por esta constelação. Por fim, é preciso destacar o eclipse solar a 14 de Outubro e o eclipse lunar a 28 de Outubro. Estes são uma parte dos acordes celestes que nos acompanharão nos próximos tempos.

  O tema do início da retrogradação Júpiter é também um importante meio de análise do período que agora se inicia. Primeiramente é preciso considerar aqueles que estão co-presentes. Neste caso, Júpiter faz-se acompanhar pela Lua e por Úrano e, estando entre eles, firma-se um caminho de luz que se afunda sob o horizonte de Úrano à Lua. Esta é deveras importante, pois Touro é o seu lugar de exaltação. Aqui a Lua é Métis e todas as outras deusas que deram os poderes a Zeus. O caminho luminar agora descrito assinala também a ascensão de Zeus, pois começa com a castração de Úrano e subida de seu pai, Cronos/Saturno, ao trono do Olimpo e estende-se até às uniões com as deusas antigas e que permitiram a assimilação dos seus poderes.

  Por outro lado, a quadratura que se estabelece entre os benéficos é bastante significativa, senão mesmo estruturante e, por se dar em signos cardinais, vai fundar os movimentos colectivos e pessoais de integração dos conceitos ou ideias de verdade, de bem e de justiça. Por se estar a falar de Júpiter, os princípios vão adquirir um valor espacial e, por confirmação ou negação, vão espalhar-se ou afastar-se de tudo aquilo que nos rodeia. Se pensarmos que a retrogradação de Vénus terminou quando a de Júpiter começou, esta quadratura vê expandido o seu sentido profundo, aquele que, segundo Petosíris, nos diz que uma tensão quadrangular entre os benéficos não é necessariamente má. Uma tensão do bem não cria o mal. No entanto, devemos considerar sempre o seu valor reflexivo e estruturante. Vénus em Leão, no lugar de deus (IX), vem dizer-nos que a nobreza da alma pode triunfar sobre a má fortuna ou a suspensão da fortuna (Júpiter retrógrado em Touro, na VI), mas o egocentrismo e a vaidade não triunfarão.

  A posição de Júpiter em Touro, com a Lua e Úrano, insere-se num triângulo, fundado no elemento Terra, com o Sol e Mercúrio retrógrado em Virgem e com Plutão retrógrado em Capricórnio. A retrogradação tem o sentido que já abordámos. O potencial do valor da Terra, como elemento de estruturação da realidade, assume agora um sentido mais profundo, tanto pela sua expressão mais negativa, e que é observável nas várias formas de alienação que as estruturas materiais de valor produzem, como por tudo aquilo que ainda se pode produzir e que pode transformar beneficamente a humanidade. Esta posição triangular traz o destino para a integração do elemento Terra. Para a humanidade, é difícil criar estruturas colectivas, fundadas no elemento Terra, pois a partilha de riqueza, a igualdade, a solidariedade e a justiça social têm sempre uma qualquer forma de resistência. Se as considerarmos a partir dos elementos Água, Ar ou Fogo, como sentimentos, ideias ou princípios espirituais, é mais fácil, mas quando mexe com a carteira ou o estilo de vida, aí é que as coisas se complicam.

  O sextil de Júpiter, da Lua e de Úrano em Touro a Saturno e Neptuno em Peixes e destes últimos a Plutão em Capricórnio vai obrigar a fluir, esses dons ou penas da Terra, por entre os sentidos de necessidade e de solidariedade, nas águas universais. Estes aspectos vão servir de fundação da realidade, de restruturação a partir de valores antigos, de ideias que foram desenvolvidas, mas que aguardam uma expressão renovada. A oposição do Sol e Mercúrio retrógrado em Virgem a Saturno e Neptuno, ambos retrógrados, em Peixes aponta para esse caminho. Existem dois exemplos que servem esse propósito de recriação conceptual. De um lado, temos o hermetismo e o gnosticismo e, do outro, temos o estoicismo. Estes movimentos filosóficos e espirituais trazem assim para o nosso tempo uma expressão renovada e, na verdade, são todos muito próximos da astrologia, sendo até as suas maiores matrizes filosóficas.  

  A retrogradação de Júpiter que domina sempre uma parte considerável do ano astrológico é um período fértil em oportunidades, mesmo que nem sempre de forma explícita. É preciso encontrar os dons da verdade, do bem e da justiça nesse processo necessário de ensimesmamento individual e colectivo. Não devemos portanto temer o voltar a si, esse retorno ao potencial, à raiz, da nossa existência.

sexta-feira, 19 de maio de 2023

Reflexões Astrológicas 2023: Lua Nova em Touro

  Reflexões Astrológicas


Lunações



Lua Nova em Touro

Lisboa, 16h53min, 19/05/2023

 

Sol-Lua

Decanato: Saturno

Termos: Marte

Monomoiria: Vénus  

 


  A Lua Nova de Maio ocorre no signo de Touro, com Balança a marcar a hora para o tema de Lisboa e, deste modo, na VIII, no Lugar da Morte (θάνατος), da qualidade da morte, no decanato de Saturno, nos termos de Marte e na monomoiria de Vénus. A sizígia dá-se assim acima do horizonte e cerca de quatro horas antes do pôr-do-sol. No actual novilúnio, o encontro dos luminares ocorre a caminho do Poente, estando a Lua desfavorecida por estar fora do seu segmento de luz (αἵρεσις), mas num signo feminino, o da sua própria exaltação. A Lua Nova de Touro vem fechar um conjunto sucessivo de fenómenos astrológicos nesta constelação: o eclipse lunar, o ingresso de Júpiter em Touro e a actual sizígia. Estes colocaram em análise o sentido profundo deste signo. Segundo Vétio Valente, Touro é feminino, sólido, gera ordem, é terreno, rústico, está relacionado com a agricultura, é semi-vocal ou mudo, nobre, invariável, energético, inacabado e indicador de propriedade e posses (Antologia I, 2). A significação antiga permanece no tempo e continua a permitir o aprofundamento conceptual daquilo que foi estabelecido.

  A ligação entre o signo de Touro e a Terra, a Grande Mãe, encontra-se radical e estruturalmente enraizada. É a matriz do crescimento e da abundância. Na reflexão acerca do ingresso de Júpiter em Touro, já explorámos a relação entre Reia e Zeus/Júpiter, o seu nascimento e infância em Creta, ou seja, o poder matriarcal na dádiva do Júpiter astrológico. No entanto, para a análise da sizígia, o rapto de Europa e a relação entre Pasífae e o Touro de Creta possuem uma outra dinâmica, uma que, para além do consequente encontro dos luminares, também se encontra indicado na conjunção de Vénus e Marte em Caranguejo. O touro é o companheiro da Deusa-Mãe, da Πτνια Θηρῶν, a Senhora dos Animais. Esta é uma deusa das origens e da qual descendem muitas das divindades femininas, tais como Reia, Cíbele, Hera, Ártemis, Deméter ou Atena.

  No meu livro Fragmentos Astrológicos, encontra-se a seguinte descrição: O rapto de Europa marca uma das fundações do mito do Touro Cretense. Zeus enamorou-se de Europa e para a cativar transformou-se num touro de resplandecente brancura e com os cornos em forma de lua. A jovem sentou-se no dorso do touro que fugiu em direcção ao mar. Chegados a Creta, os dois consumam a paixão junto de uma fonte, em Gortina, à sombra de plátanos. Europa teve de Zeus três filhos: Minos, Sarpédon e Radamanto. Numa segunda fase, o Touro é enviado, a partir do mar, por Posídon para a costa de Creta, o reino de Minos. A rainha Pasífae enamora-se do animal e pede a Dédalo que construa uma vaca de madeira, onde ela possa entrar e assim unir-se ao animal. Dessa união nasce o Minotauro, um ser metade homem, metade touro, que será colocado num labirinto e, mais tarde, derrotado por Teseu com a ajuda de Ariadne, filha de Pasífae e Minos. Por fim, numa terceira fase, Héracles é encarregue de apanhar o Touro. Este é depois libertado, percorrendo a Grécia até chegar a Maratona, onde é morto por Teseu. O herói vence sempre a fera, mas é o feminino que persiste.” (135-6. Lisboa, 2021: Livros – Rodolfo Miguel de Figueiredo). Existe pois uma continuidade de sentido, um elemento mimético de passagem, que se estende ao longo da narrativa do mito do Touro Creta. O feminino, sobretudo se virmos para além do exacerbamento dos feitos masculinos, tem, nesta enunciação mitológica, um enorme poder, uma potencialidade criativa.

  A união da mulher e do touro e a passagem do animal ao humano, ou seja, a sua elevação, são elementos de transformação profundos. No encontro venusiano com o animal, a luz do feminino muda a realidade. Europa, Pasífae e Ariadne são elementos de continuidade, mas não são elementos passivos, é a sua acção que dá sentido à narrativa e que permite a possibilidade de mudança e, mesmo no caso de Héracles, não nos esqueçamos que o herói está ao serviço da deusa, de Hera, uma Deusa-Mãe. Ora o grande encontro de luz no signo de Touro (Lua, Sol, Úrano, Mercúrio e Júpiter) concede essa mesma mudança. Porém, esta não é nem súbita, nem radical, é uma mudança paciente, estruturada, que se funda e firma nas raízes da realidade, na demanda do valor, do sentido do viver. No tema de Lisboa, esse encontro de luz dá-se no lugar da morte. O signo da vida ocupa o espaço da morte. A frase lapidar Et in Arcadia ego que nos diz que também a Morte vive na Arcádia reafirma o seu sentido, a sua permanência conceptual e simbólica.

  Epicteto afirma o seguinte: “Humanos, aguardai Deus. Quando ele enviar o sinal e vos libertar desse serviço, então vos liberteis para ele. Mas, por ora, suportai, permanecendo neste mesmo lugar ao qual ele vos designou. Pouco é o tempo para permanecer aqui, e fácil para os que estão desse modo dispostos. Pois qual tirano ou qual ladrão, ou quais tribunais ainda serão temíveis para os que tornaram comparáveis a nada o corpo e as posses deste? Esperai! Não partais de modo irracional!” (Diatribes I.9, 16-17, trad. Dinucci, 88. Coimbra, 2020: IUC). A dádiva da luz é uma bênção do bem e da virtude e a procura do valor, desse absoluto que pertence à terra, implica um processo racional de elevação: do animal ao humano, do humano ao divino. Não esqueçamos, porém, que o deus estóico não é um ser distante que traz até nós a revelação. Para o estoicismo, e em particular para Epicteto, nós somos um fragmento de Deus, somos o próprio deus, logo a revelação não é externa, ela inicia-se única e exclusivamente naquilo que somos, é um conhecimento de si.

  O encontro de luz no signo de Touro, sobretudo se pensarmos que se inicia na Lua e no Sol, passa por Úrano e Mercúrio assexuais ou andróginos, embora neste caso, devido à posição helíaca, masculinos, e termina em Júpiter, e também pela conjunção destes à estrela Algol, encontramos um choque, uma colisão, entre a necessidade de ressurgimento do númen feminino e as estruturas patriarcais dominantes. Algol dá poder ao feminino, mas alimenta a intensidade, não fosse ela a cabeça da Medusa, um símbolo por excelência do feminino. Segundo Ovídio, Medusa era uma bela donzela que terá sido violada por Posídon no templo de Atena. Ora a deusa sem mãe castiga a donzela, transformando-a num monstro, por esta ter conspurcado com o seu templo. Encontramos aqui a simbologia desta união de luz, do encontro dos planetas em Touro com a estrela Algol. No entanto, não se pode esquecer a tradição e, neste caso, a malignidade de Algol. Neste sentido, o encontro desta estrela com a sizígia pode, de facto, trazer violência e destruição, sobretudo desastres naturais resultantes das alterações climáticas.

  Por outro lado, o tema da sizígia encerra também uma outra dinâmica que já se iniciara no eclipse lunar e que continuou no ingresso de Júpiter de Touro. O facto de Marte e Plutão se estenderem, opondo-se ou quase, ao longo do eixo de culminação, e de Balança marcar a hora apresenta-se como uma dinâmica comum, uma que funda também, sobre o caminho do abismo ao cume, uma potência de destruição. Marte traz destruição, ou violência, ao lugar da Lua e Plutão espalha quadrangularmente os raios da morte até à sizígia e àqueles que a acompanham. Este novilúnio, embora firme a matriz do signo de Touro, transporta consigo uma potencialidade disruptiva que pode estender a sua influência para além do mês lunar. A humanidade está sobre aviso e isso está cada vez mais claro.

  Séneca, referindo-se aos tempos áureos, diz-nos, na sua Medeia, que “Os nossos pais viveram em tempos / magníficos dos quais o embuste estava bem arredado. / Cada um ficava tranquilamente nos seus litorais / e chegava à velhice nos campos ancestrais, / rico com pouco; não conhecia senão / as riquezas que o solo pátrio produzia. (329-334, trad. A. A. Alves de Sousa. Coimbra, 2013: Imprensa da Universidade de Coimbra). Se tivermos em consideração que a Idade de Ouro fora regida por Saturno, encontrarmos um indício da proposta de transformação. O sextil da sizígia e daqueles que estão co-presentes a Saturno e Neptuno em Peixes e os trígonos destes últimos a Vénus e Marte em Caranguejo e à Cauda Draconis em Escorpião congregam uma mensagem semelhante àquela que Séneca descreve. Está a ser-nos pedido, senão mesmo exigido, que mudemos o modo de vida. Pede-se um regresso à Idade de Ouro, em que a Terra esteja viva e em que a sua abundância nos seja suficiente. As deslocações desenfreadas, face ao facto de serem extremamente poluentes e nos desviarem do essencial, e o nosso consumismo colocaram a humanidade sobre o fio da navalha. Tornámo-nos a sombra da nossa desmedida e isso traz até nós o peso, a gravidade, do destino. Existe uma causalidade que encaminhou até nós as penas de Némesis. E, perante o abismo, o que podemos fazer? Seguir a luz. Essa é nossa única solução.

  O novilúnio de Maio, com a sua intensa concentração de luz, mas também de alguma sombra, no signo de Touro, encerra uma proposta de abundância. Ora essa proposta, em particular no actual ano astrológico, estará em evidência sobretudo nos movimentos astrológicos pelos signos de Terra e de Água. A Era do Espírito Santo, do Sagrado Feminino, está a anunciar-se tanto com a pomba que cinge o céu como com a sacerdotisa que sibila e dança ao som do tambor nocturno. Nesta Lua Nova, a Deusa-Mãe, a Terra, concede-nos uma dádiva que precisamos de aceitar.

terça-feira, 16 de maio de 2023

Júpiter em Touro: De 16 de Maio de 2023 a 26 de Maio de 2024


Júpiter em Touro: De 16 de Maio de 2023 a 26 de Maio de 2024

Júpiter ingressa em Touro às 18h20min.

Reflexões Astrológicas 2023: Júpiter em Touro

 Reflexões Astrológicas


Ingressos


Júpiter em Touro

Lisboa, 18h20min, 16/05/2023

 

Júpiter

Decanato: Mercúrio

Termos: Vénus

Monomoiria: Vénus  

 

 

  O ingresso de Júpiter em Touro ocorre com Balança a marcar a hora, para o tema de Lisboa e, deste modo, na VIII, no Lugar da Morte (θάνατος), da qualidade da morte, no decanato de Mercúrio, nos termos e na monomoiria de Vénus. O ingresso dá-se assim acima do horizonte e a duas horas e vinte e cinco minutos do pôr-do-sol. Júpiter encontra-se, deste modo, favorecido por estar no seu próprio segmento (αἵρεσις) e acima do horizonte. O estudo deste ingresso e do seu tema é essencial para a compreensão dos tempos que se avizinham. A análise relativa dos ingressos de Júpiter e Saturno em 2023 atribuirá uma qualificação estrutural dos elementos significativos que definem, consequentemente, o ano em curso.  

  No tempo (Saturno) e no espaço (Júpiter), o Eterno Feminino tornar-se-á a dádiva da transformação. Esta é uma ideia que explorámos quando Saturno ingressou em Peixes e que agora, com entrada de Júpiter em Touro, é reafirmada. Partindo da premissa que é o planeta que transmite as suas qualidades ao lugar (signo) e não o contrário, podemos concluir que Júpiter chega à casa, ou ao templo, da Grande Mãe. Touro é, por excelência, o lugar da Mãe-Terra, da Mãe dos Deuses. A natureza criadora é particularmente activa neste lugar e, nesse sentido, será aí que Júpiter expressará as suas qualidades. A pergunta que se coloca é saber que Júpiter é que encontraremos neste lugar. E não, não pensemos, baseados no androcentrismo do pensamento astrológico comum, que vamos encontrar aqui o senhor do Olimpo, sentado no seu trono. A melhor imagem de Júpiter em Touro surge naturalmente da mitologia e da sua tradição. Zeus em Creta firmar-se-á como sentido profundo deste ingresso.  

  Em Creta, o mito do nascimento e da infância de Zeus são elementos mitológicos que tornam o deus dependente, ou subalternizado, face ao númen feminino. Reia é uma Grande Mãe, frequentemente desvalorizada. Antonino Liberal afirma o seguinte: “Conta-se que existe, em Creta, uma gruta sagrada cheia de abelhas. No seu interior, conforme afirmam os narradores, Reia deu à luz Zeus. Trata-se de um local sagrado de que ninguém deve aproximar-se, seja deus ou mortal. Numa certa altura de cada ano, diz-se que uma grande labareda emana da gruta. Na sequência da história, diz-se que isto acontece sempre que o sangue proveniente do nascimento de Zeus começa a fervilhar. As abelhas sagradas que eram amas de Zeus ocupam esta gruta.(Metamorfoses, 19, ed. R. M. Troca Pereira. Coimbra, 2017: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2017). As abelhas, o parto e a nutrição são elementos que estabelecem aqui uma hegemonia do Sagrado Feminino. Por outro lado, não em Creta, mas sim na Arcádia, Pausânias conta-nos que o Lymax, na Figália, um afluente do Neda, é um rio que teve a sua origem na limpeza de Reia após o parto, depois do nascimento de Zeus, pois a ninfas que a auxiliaram atiraram para o rio os restos da dequitação (placenta e membranas), também nos diz ainda que, perto da nascente do Alpheio, existia um templo sem telhado, com dois leões de pedra, dedicado à Mãe dos Deuses (Descrição da Grécia VIII.41.1 e VIII.44.5). Este é o poder do divino feminino.

  Zeus/Júpiter nasce em Creta, quando Reia fugia de Cronos/Saturno que queria devorar o seu filho, tal como fizera com os seus irmãos. Reia dá à luz numa caverna, no Monte Dícti, e depois entrega a criança aos cuidados das ninfas Adrasteia e Ida e dos Curetes. O jovem Zeus será alimentado pela cabra Amalteia (Capricórnio) e por abelhas, ou seja, com leite e mel. Os elementos ou categorias ginocêntricas superiores a uma divindade masculina são aqui determinantes. Às deusas minóicas com serpentes, encontradas no Palácio de Cnosso, junta-se o culto do touro em Gotina, representado, por exemplo, pelo rapto de Europa, quando Zeus, sob a forma de touro, leva a filha do rei de Tiro, Agenor, para Creta. Por outro lado, temos, também de acordo com a tradição mitológica, a história de Pasífae, do Touro e do Minotauro, mas igualmente o trabalho de Hércules em que este terá de tomar o Touro de Creta. A relação entre a Grande Mãe, Zeus/Júpiter e o Touro são a matriz de sentido que define o ingresso de Júpiter em Touro. Zeus é aqui “o Touro de sua Mãe”. De um poder matriarcal, inaugura-se um poder matrilinear, tanto que Zeus/Júpiter só conseguirá desafiar e destronar o seu pai, Cronos/Saturno, com o auxílio de divindades femininas, nomeadamente a sua mãe (Reia) e a sua avó (Gaia). 

  A viagem de Júpiter pela constelação de Touro inicia-se a 16 de Maio de 2023 e termina a 26 de Maio de 2024, tendo um período de retrogradação de 4 de Setembro a 31 de Dezembro de 2023. É portanto um trânsito consistente, sem saídas e reingressos como aquele que observamos em Carneiro ou em Peixes. Essa afirmar-se também como significação estrutural de Touro, um signo de Terra. Existe, durante o período deste ingresso, uma relação íntima com a retrogradação, em especial, com a de Vénus (23/07 a 04/09/2023) que termina quando a de Júpiter começa, mas também com a Saturno (17/06 a 04/11/2023), ou seja, a matriz primordial das potencialidades planetárias pede uma renovada efectivação, o processo inaugural de passagem de sentido entre a potência e o acto traz até nós uma nova proposta criativa. Paralela ao estado relativo de retrogradação planetária, encontramos a relação elemental, aquela que une harmoniosamente Júpiter (Touro/Terra), Saturno (Peixes/Água), Úrano (Touro/Terra), Neptuno (Peixes/Água) e, por algum tempo, Plutão (Capricórnio/Terra). Na verdade, só este último, ao encontrar-se em Aquário (Ar), vai criar uma tensão elemental. A harmonia em torno de elementos femininos (Terra e Água) reafirma tudo aquilo que já foi mitologicamente referido.

  A análise do tema de ingresso apresenta, para além da assinalável concentração de luz no signo de Touro, a semelhança do eixo de culminação com aquele que regeu o eclipse lunar. Marte e Plutão continuam, respectivamente, no cume e no abismo, estendendo, entre si e os pólos os que definem, uma promessa de destruição que surge como aviso ou lembrança. Este marco na estrada diz-nos que o criar e o destruir são duas faces de uma mesma realidade. No entanto, se compararmos com o tema do eclipse lunar, Marte afasta-se da culminação, encontrando-se no signo seguinte. A ausência de planetas entre a ascensão e a culminação vem retirar alguma firmeza ou aspereza a esta posição. O trígono entre os maléficos (Marte em Caranguejo e Saturno em Peixes) diz-nos que esta destruição não acontece por acidente, não é fruto do acaso, ela surge porque faz parte do destino, resulta da necessidade, de uma causalidade natural. Tudo está de acordo com a natureza.

  A forma como a luz se reúne em Touro confirma a superioridade do poder da natureza sobre a realidade humana. Gaia impõe a sua vontade. A vingança de Gaia é hoje tão real como a soberba humana. A natureza está recriar as suas estruturas, mesmo que isso produza destruição. Em Touro, existe um caminho de luz do Sol a Júpiter, passando por Úrano, Mercúrio e a Caput Draconis e avançado até ao Poente, a seguir ao qual se encontra a Lua, em Carneiro e já sob o horizonte. Esta é uma posição onde a Lua se encontra enfraquecida e subjugado ao poder masculino e que conduz, sobretudo se considerarmos a posição de Marte em Caranguejo e consequente quadratura à Lua, àquilo que anteriormente se referiu como o medo do feminino. Este tende a gerar formas de violência contra as mulheres e reservas na adopção espiritual do Sagrado Feminino. No entanto, o facto de Vénus e Marte se encontrarem juntos, em Caranguejo, mostra que o medo não esconde ou anula a atracção. Com Vénus e Marte em Caranguejo, o herói quer obter o amor da Grande Mãe, quer regressar a casa, à origem.

  A posição relativa de Júpiter estabelece a qualidade do seu ingresso. Se, por um lado, temos a conjunção em Touro que agrega uma qualidade que confere luz, intelecto, razão, inovação e necessidade à dádiva do bem, por outro lado, a forma como estes raios se unem aos demais vai intensificar a sua qualidade. Primeiro, não existe nenhuma outra relação com o elemento Terra. Com a Água, temos os dois sextis: o primeiro com Vénus e Marte em Caranguejo e o segundo com Saturno e Neptuno. Com o Fogo, também não existe uma ligação, exceptuando a quadratura ao Ponto de Culminação. E com o Ar, temos a quadratura com Plutão em Aquário e com o Ponto Subterrâneo. Estas são ligações que se estabelecem com Júpiter e com aqueles que estão co-presentes no signo de Touro e que confirmam astrologicamente tudo aquilo que já se explorou. Existe pois uma união entre o sentido mitológico e a significação astrológica e esta aprofunda uma mensagem que anuncia a aurora de uma Nova Era.

  O ingresso de Júpiter em Touro reúne o sentido de dádiva, que é próprio de qualquer benéfico, neste caso, a bênção do bem e da justiça, com a Natureza e com a Grande Mãe. Esta é uma significação que não devemos perder de vista e pode ser conciliada, colocada em harmonia e concórdia, com qualquer outra que se possa apresentar. A beleza do pensamento é a sua pluralidade e astrologia deve ser plural como o universo.          

segunda-feira, 7 de novembro de 2022

Reflexões Astrológicas 2022: Eclipse Lunar Total - Lua Cheia Touro-Escorpião

  Reflexões Astrológicas


Eclipses



Eclipse Lunar Total 

(Lua Cheia: Touro-Escorpião)

Lisboa, 10h59min, 08/11/2022

 

Lua

Decanato: Lua

Termos: Júpiter

Monomoiria: Mercúrio  

 

Sol

Decanato: Sol

Termos: Mercúrio

Monomoiria: Vénus

 

O Eclipse Lunar Total de dia 8 de Novembro ocorre com a Lua no signo de Touro e o Sol no de Escorpião, com Capricórnio a marcar a hora (hora de Lisboa), no Segmento de Luz (αἵρεσις) do Sol, estando este abaixo do horizonte, na V, no lugar da Boa Fortuna (ἀγαθή τύχη), e a Lua acima, na XI, no lugar do Bom Espírito (ἀγαθόν δαίμων). A Lua encontra-se no seu próprio decanato, nos termos de Júpiter e monomoiria de Mercúrio. O Sol encontra-se também no seu próprio decanato, nos termos de Mercúrio e monomoiria de Vénus. Na hora de Lisboa, o eclipse dar-se-á cerca de quatro horas após o ocaso do Lua e o nascimento do Sol. A ocultação da Lua, do Feminino e da Deusa, quer pela condição natural do próprio eclipse lunar, quer por estar abaixo do horizonte no segmento do Sol, será mais evidente, tornando simbólico o caminho por trilhar.

Se seguirmos uma outra técnica, diferente daquela que utilizámos no passado eclipse solar e baseada na ascensão recta no período de maior magnitude, concluímos que o efeito deste eclipse pode ficar perto dos três meses. Por outro lado, se nos sustentarmos no tempo de duração do eclipse, podemos fixar então um efeito que vai de cerca de um mês e meio até perto dos quatro meses, o que, na verdade, não faz divergir em muito o resultado.

Estas diferentes formas de se calcular o tempo em que os efeitos de um eclipse estarão mais presentes servem sobretudo para demonstrar que existem outros modelos para além do ptolemaico e das horas equatoriais. O eclipse de dia 8 quer pelo tempo que se acabou de fixar, quer pelas suas próprias características astrológicas não terá um efeito externo evidente, todavia possuirá um grande efeito interno, ou seja, o seu efeito nascerá das profundezas tanto da Terra como da alma.

Quanto ao seu efeito espacial, devemos observar primeiro as lições antigas. Manílio que nos deixou o primeiro manual de Astrologia Helenística – sim, porque Doroteu não só poderá ser ligeiramente posterior como o seu livro chegou até nós ou em fragmentos ou em versões posteriores – diz-nos que Touro rege a Cítia, a Ásia, por causa dos Montes Tauro na Turquia, e a Arábia (Astronomica, IV, 744-817). Vétio Valente segue esta tradição e coloca Touro a reger as regiões da Média (o actual noroeste do Irão, o Azerbaijão, o Curdistão Iraniano e o Tabaristão ou Mazandarão), da Cítia (Irão, mas também uma área que se estendeu da Bulgária às fronteiras da Rússia, Mongólia e China), do Chipre, da Arábia, da Pérsia e das montanhas do Cáucaso, da Samártia (junto à Média), de África, de Elymais ou Elamais (Cuzistão, uma província do Irão), de Cartago, da Arménia, da Índia e da Germânia (Antologia I, 2).

Por outro lado, o mapa da sombra do eclipse diz-nos, porém, que este abrange uma área que é quase a oposta à do eclipse solar de dia 25 de Outubro, pois, no actual a Europa e a África ficam quase excluídas do manto penumbral. O eclipse recairá sobre a Ásia, a Austrália, o Pacífico e as Américas. A regência astrológica sobre o continente Asiático coincide com as lições de Manílio e de Valente, confirmando as questões globais em torno da Rússia, da China, de Taiwan e das Coreias, bem como os problemas no Irão, no Iraque, no Afeganistão e no Paquistão.

O efeito do eclipse sobre o Irão dará, por exemplo, continuidade aos actuais protestos políticos, bem como à sua repressão, e fará permanecer a questão em torno dos direitos das mulheres, embora esta seja uma questão que se colocará muito para além das fronteiras do Irão. Os avanços do populismo e da extrema-direita, tanto na Europa como nos Estados Unidos da América têm minado os direitos das mulheres. Em todos estes casos e, em especial, neste último, a descida da sombra, no tema astrológico de referência, sobre a terra e sobre o lugar que a Lua ocupa assume aqui um sentido literal que torna agora o símbolo uma realidade.    

Este eclipse insere-se na série Saros 136, uma série relativamente recente, que se iniciou com o eclipse de 13 de Abril de 1680 sobre o eixo Balança-Carneiro. Esta série terminará a 16 de Junho de 2383 no eixo Sagitário-Gémeos, mas o primeiro eclipse da série é aquele que serve de matriz. Neste caso, menos de um mês após o eclipse, já em Maio de 1680, o Krakatoa, entre as ilhas de Java e Sumatra, entra em erupção. Algo que é astrologicamente confirmado pela quadratura da Lua e da Caput Draconis em Balança e do Sol, de Úrano, Marte e da Cauda Draconis em Carneiro a Saturno e Plutão em Caranguejo. Encontramos, com frequência, nos eclipses e, em especial, nos eclipses lunares, uma certo efeito sobre os desastres naturais, sejam eles erupções vulcânicas, sismos, tsunamis ou furacões.

Para além da erupção do Krakatoa, deve-se salientar o grande o auto-de-fé de 30 de Junho na Plaza Mayor, em Madrid, e cuja imagética pode ser apreendida pelo quadro de Francisco Rizi, exposto no Museu do Prado. Ora este facto é perceptível pela quadratura de Mercúrio e Júpiter em Touro a Neptuno em Aquário. A humanidade tende a acreditar na cristalização dos valores e na certeza de que a forma de alguns serem e estarem é a única que se pode aceitar.

Umas semanas antes, a 10 de Junho, é assinado um tratado de defesa mútua entre Espanha e Inglaterra. O sextil entre Mercúrio e Júpiter em Touro a Vénus em Peixes favoreceu a assinatura deste tipo de tratado. Por fim, e já para além dos efeitos imediatos do eclipse, mas assinalável, é o primeiro avistamento do cometa de 1680 que passou, nomeadamente, do tom cinza ao vermelho, como se visse, no céu, um feixe de luz, primeiro Saturno e depois Marte. À semelhança dos cometas antigos, a passagem do cometa de 1680 será de extrema importância.       

Na série 136, o último eclipse parcial da primeira da fase deu-se a 14 de Setembro de 1932. A Guerra de Chaco, entre a Bolívia e o Paraguai, marca o período em redor do eclipse, em especial, a Batalha de Boquerón, ou seja, o cerco da fortaleza de Boquerón pelos paraguaios, que ocorreu entre os dias 9 e 29 de Setembro de 1932, durante o próprio eclipse. Já o primeiro eclipse total da segunda fase desta série Saros aconteceu no dia 26 de Setembro de 1950.

Várias das séries Saros em que se inserem os últimos eclipses, os dos últimos anos, tiveram eclipses que correspondem ao período da Guerra da Coreia, o que encerra um sentido profundo, pois as questões que aí surgiram vão marcar acontecimentos actuais e futuros. A área geográfica das duas coreias continua a ser uma ameaça à paz mundial, pois o gatilho de uma grande guerra tende a ser puxado em questões aparentemente circunscritas.

O eclipse de 1950 inclui-se nesse lote. Uns dias antes do eclipse, deu-se a Batalha de Inchon (15/09) e, entre os dias 31 de Agosto e 19 de Setembro, a Batalha do Rio Ham. Como sinal claro do agravamento do conflito, a China entra na guerra, fortalecendo a posição norte-coreana. De uma outra forma e do outro lado do mundo, no Brasil, Getúlio Vargas é eleito presidente (03/10) para o último mandato e que terminará com o seu suicídio (24/08/1954). Neste período, criou-se muitas das dicotomias que ainda hoje persistem na sociedade e política brasileira. O eclipse 26 de Setembro de 1950 definiu-se por um carácter que diverge do actual, pois a sua expressão era externa e manifestou-se de forma explícita na geopolítica do seu tempo. Já o actual eclipse funda-se num elemento de ocultação que, na verdade, se une à natureza primordial de um eclipse.     

Robert Hand diz-nos, em Essays on Astrology, que “Os antigos adoravam todas as formas de divindades femininas, a maioria das quais estavam relacionadas com a Lua de alguma forma.” (1982: 14. Atglen: Whitford Press). Existe uma persistência natural da Lua no Sagrado Feminino, mas que, na astrologia, é por vezes desvalorizada. O exacerbamento conceptual da actual astrologia psicológica sobre a Lua traduz, na verdade, o medo do feminino e a rejeição, muitas vezes inconsciente, do seu potencial.          Tem-se esvaziado a Lua astrológica do espanto primordial, teofânico, que define a Lua como Grande Deusa.

Na mitologia grega, Hesíodo diz-nos, na Teogonia, que Hemera, Ἠμέρα (o Dia), e o Éter, Αἰθήρ (a Luz Celestial), nasceram de Érebo, Ἔρεβος (as Trevas), e de Nix, Νύξ (a Noite). Esta escuridão que reside na origem continua hoje a indicar esse medo do feminino, que assusta e faz enraivecer homens e mulheres, enraizados no patriarcalismo e na fragilidade de um masculino estereotipado e na distorção do feminino. Aquele que emerge nas águas da Grande Mãe, da deusa Sige, tem medo de se perder.

É curioso que os gregos faziam uma distinção entre o Éter que representa a luz celestial e o céu dos deuses com Úrano, o céu da natureza e dos humanos. Isto é algo que hoje tendemos a esquecer e que nos leva, uma vez mais, a repensar os planetas para além de Saturno e o seu verdeiro sentido. No caso do eclipse lunar, este aspecto é particularmente importante, uma vez que Úrano se encontra com a Lua, abaixo do horizonte, no reino sob a Terra. É impossível, também pela ausência do elemento Fogo neste eclipse, não relacionar o mesmo com a imagem da caverna, visto que ela representa essa escuridão primordial, essa Noite a partir da qual tudo nasce. 

Na alegoria da caverna, Platão afirma o seguinte: se alguém o forçasse a olhar para a própria e luz, doer-lhe-iam os olhos e voltar-se-ia, para buscar refúgio junto dos objectos para os quais podia olhar” (República 515e, trad. Maria Helena da Rocha Pereira. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 15ª ed., 2017). O medo do feminino, da escuridão uterina, revela, com uma frequência abissalmente comum, o medo da luz. Por norma, aquele que teme a sombra quebra também perante a luz. A revelação, tanto por aquilo que se oculta como por aquilo se expõe, causa quase sempre um temor avassalador, daí que aquele que aceita a luz e nasce da caverna do feminino seja rejeitado e vilipendiado. A excepção e o comum nunca andam de mãos dadas. Porém, tanto a escuridão como a luz, tanto a noite como o dia são o nosso único caminho.

Com o Sol, Vénus e Mercúrio em Escorpião, ambos sob os raios solares e Mercúrio no Coração do Sol, sendo estes, para o tema de Lisboa, os únicos acima do horizonte, o sentido de mediação, segundo aquilo que se oculta, ganha uma nova força, uma outra dinâmica. Na XI, no lugar do Bom Espírito, esta pulsão solar torna-se assim a nascente no interior da caverna, a origem do rio e da passagem. Caído o escorpião, uma águia erguer-se-á, mas engana-se aquele que julga que a águia é um escorpião benévolo, pois se um ataca escondido na terra, o outro precipita-se oculto no ar. A morte é, contudo, uma e a mesma.

Vénus em Escorpião é a sensualidade que mata e o desejo que envenena, é como a música dos UHF “Matas-me com o teu olhar”, e essa morte não é apenas erótica, é também bélica. A deusa do amor e da guerra passeia-se por entre as hordas. Já Mercúrio em Escorpião é palavra que eleva os mortos, o cântico do Psicopompo que guia as almas no submundo. Aqui a palavra é um demiurgo necromante que recupera a sabedoria do passado e dos ancestrais. Neste eclipse, se temermos a morte e os mortos, a destruição, não alcançaremos a sua mensagem.

Existe, porém, nesta palavra sussurrada uma dádiva que emerge: Júpiter e Neptuno em Peixes unem-se triangularmente a esta concentração de luz e sombra em Escorpião. O retorno de Júpiter a Peixes e o reencontro com Neptuno recupera a dádiva das Musas e das Graças. A criação nasce do bem e, mesmo que discreta, pode salvar o mundo. O novo humano nasce também da sua criatividade, daquela que nasce da solidão do espírito e não da vaidade no meio da multidão.

Com Marte em Gémeos, em retrogradação, olhando para trás, quadrangularmente, para Júpiter e Neptuno em Peixes, rangendo os dentes e arranhando os cotovelos, a inveja ficará à espreita e irá expandir esse azedume para com o outro com a força que evita o choque de olhar para si. A aversão do lugar do Sol e dos seus porta-estandartes, Mercúrio e Vénus, ou seja, de Escorpião ao lugar de Marte, Gémeos, revela também este desligamento radical, esta apostrofia tópica, que, neste eclipse, enfraquece o próprio Marte. Paralelamente, e por Marte estar fora do segmento de luz dominante, Saturno torna-se o grande maléfico, tornando estruturante, uma vez mais, o trígono com Marte. O destino coloca a retribuição e a desmedida sobre os excessos da humanidade.

Saturno em Aquário, neste eclipse na II, no lugar do Viver (hora de Lisboa), representa aqui a ameaça sobre os bens de primeira necessidade, sobre a dignidade humana, e a prevalência da desigualdade social sobre a justa distribuição da riqueza. Saturno lança quadrangularmente, a partir do reino sob a terra, os seus raios sobre o eclipse, sobre os astros em Touro e Escorpião, que devolvem a escuridão penumbral, enlaçando-a entre a vida e a morte. As raízes da Terra, com a Lua, Úrano e a Caput Draconis em Touro, na Boa Fortuna (V), junto à Cornucópia de Amalteia, querem lançar, em igualdade, a abundância sobre todas e todos, mas as trevas impedem o caminho do bem.

O grande benéfico, que é Júpiter em Peixes, une-se em trígono (Escorpião) e em sextil (Touro) aos luminares, ao Dragão da Lua e aos planetas que os acompanham e revela, de facto, a via do bem que se oculta sob a sombra do eclipse. Júpiter e Neptuno trazem, de novo, dando à humanidade a outra hipótese de anular os erros do passado, a dádiva da bondade e compaixão, de trazer a si, ao si que se revela depois do eu, a bênção da totalidade, da imersão da alma individual na alma do mundo. Plutão em Capricórnio contribui para esta dádiva com sextil aos astros em Escorpião e Touro, com o poder da morte e com a transformação radical de nos apercebermos que tudo nasce, morre e renasce, que o que se cria também se dissolve. O apego é uma outra senda que não pertence ao caminho do bem.            

Este eclipse lunar total, no eixo Touro-Escorpião, coloca o binómio luz-sombra sobre a vida e a morte, sobre a qualidade do viver e do morrer, estabelecendo sobre o que se cria e o que se perde novas estruturas de valor. Será, deste modo, e se for essa nossa vontade, a Deusa eclipsada, o Feminino renegado, a recuperar o absoluto que pertence à Terra.