segunda-feira, 8 de abril de 2024

Reflexões Astrológicas 2024: Eclipse Solar Total (Lua Nova em Carneiro)

 Reflexões Astrológicas


Eclipses


Eclipse Solar Total 

(Lua Nova em Carneiro)

Lisboa, 19h17min, 08/04/2024

 

Sol-Lua

Decanato: Sol  

Termos: Mercúrio   

Monomoiria: Saturno  

                                            

  O Eclipse Solar Total de 8 de Abril ocorre no signo de Carneiro, com Balança a marcar a hora, no Segmento de Luz (αἵρεσις) do Sol, com os luminares acima do horizonte, na VII, junto ao Poente (δύσις), e cerca de cinquenta minutos antes do ocaso (hora de Lisboa), no decanato de Sol, termos de Mercúrio e na monomoiria do Saturno. O sentido de luz, da sombra e da ocultação ganha assim um valor reforçado. Este eclipse apresenta algumas semelhanças com o eclipse solar de 14 de Outubro de 2023, pois, tanto num como noutro, o eclipse dá-se junto ao Poente. No entanto, existe uma inversão do eixo, o eclipse que ocorrera em Balança, acontece agora em Carneiro e assim o signo que marcava a hora é agora o seu oposto. O eixo da identidade, entre a luz e a sombra, continua a estabelecer-se como sentido profundo. Porém, o foco, o centro da ocultação da luz, encontra-se agora no signo de Carneiro, o que transporta naturalmente para algumas das significações do ano novo astrológico.

  Em termos astro-mitológicos, existe uma tradição em torno dos doze trabalhos de Hércules. A influência da leitura esotérica de Alice Bailey determinou em grande parte a sua predominância contemporânea, todavia, a tradição antiga dos trabalhos, sobretudo a sua reunião no número de doze episódios é relativamente tardia. O mito do herói zodiacal mais antigo, e quiçá mais simbólico, é o de Jasão e os argonautas. A viagem do Argo é uma viagem solar e a sua natureza é circular, é um eterno retorno. Apolónio de Rodes, na Argonáutica, descreve-o como “Jasão, herói de Ares” (I, 349) e quando este foi escolhido para liderar a expedição, afirmou o seguinte: Se me confiais esta distinção de me ocupar de vós,/ nada impede, como dantes, a nossa viagem./ Agora consigamos o favor de Apolo com sacrifícios/ e preparemos já um festim.” (I, 351-4, Apolónio de Rodes: Argonáutica, Livros I e II, ed. A.A.Alves de Sousa. Coimbra, 2021: Imprensa da Universidade de Coimbra). O herói de Ares (Marte, domicílio) precisa do favor de Apolo (Sol, exaltação) e a finalidade da viagem é o velo ou tosão de ouro (Κρίος Χρυσόμαλλος), a pele do aríete ou carneiro imortal (Carneiro), filho de Posídon (Neptuno, regente moderno de Peixes). A significação astro-mitológica é bastante explícita. Jasão, bem mais do Hércules, combina elementos tanto de Carneiro como de Peixes. A passagem de Peixes de fim de ciclo para Carneiro que inicia o novo ciclo e que tem como finalidade um novo Peixes está presente neste mito (cf. Figueiredo, R. M. de, 2024, Fragmentos Astrológicos, 2ª ed. revista e aumentada, 137-8. Lisboa: Livros – Rodolfo Miguel de Figueiredo).

  Este sentido astro-mitológico é fundamental para se compreender o ciclo de eclipses, tanto anual como nodal, em que este se insere. A passagem do eixo zodiacal-nodal Carneiro-Balança para o eixo Peixes-Virgem torna-se, deste modo, um elemento de sentido mimético do mito de Jasão. No entanto, no que aos eclipses solares concerne, esta mudança ainda demorará algum tempo, pois depois deste eclipse, em Carneiro, seguir-se-á um em Balança (2 de Outubro de 2024) e outro Carneiro (29 de Março de 2025), e só a 21 de Setembro de 2025 é que ocorrerá o primeiro eclipse solar no eixo Peixes-Virgem, neste caso em Virgem. No entanto, de um ponto de vista mundano, este é um ciclo de passagem, sobretudo se considerarmos que a influência dos eclipses solares se mede em anos. A passagem do eixo de identidade para o eixo de integração, ou seja, da unidade e dualidade à parte e ao todo, expressa uma ponte de sentido entre a consciência de si e a necessidade.

  Proclo afirma, no seu Comentário à República de Platão, o seguinte: “O daemon distribuído é o guardião das vidas centradas nas obras do devir, e guia toda a nossa constituição interna no reino da geração. Os lotes significam, por sua vez, a ordem cósmica que determina para as almas os tipos de existência que cada uma merece, de acordo com o seu próprio mérito. Nesta estrutura, Láquesis é a regente, porque estabelece a ordem em todos os céus. Os tipos de existência são as formas de vida centradas nas obras da criação, que são atribuídas pelo universo às almas à medida que estas descendem, sendo estas vidas em maior ou menor número. As escolhas indicam as projecções do pensamento, de acordo com o poder das almas de se colocarem a si mesmas em movimento, agindo em harmonia com a ordem do universo. A transferência para diferentes animais, melhores e piores, significa os muitos e variados caminhos da alma segundo os diferentes poderes, racionais ou irracionais, pois o semelhante é sempre atraído pelo semelhante de acordo com a justiça do cosmos.(Essay 15 94.25-95.10. Proclus: Commentary on Plato Republic, vol. II: Essays 7-15, ed. D. Baltzly, J. F. Finamore & G. Miles, p. 330.  Cambridge, 2022: Cambridge University Press).

  O significado astrológico do lote distribuído e do seu guardião é imenso, transcende o sentido de certos lugares (XI e XII), bem como o valor da doutrina dos lotes, pois está enraizado na matriz filosófica da astrologia antiga e subentendido em muitos conceitos da astrologia contemporânea. Ora o lote distribuído – ou escolhido – e o guardião são o momento inaugural do princípio de identidade que rege o início da viagem, existencial e zodiacal. Carneiro, com um sentido profundo de unidade, conduz a embarcação da vida e da alma, tal como Jasão no Argo, num caminho entre a luz e a sombra, numa viagem que culminará na integração da totalidade (Peixes), ou seja, na compreensão profunda do valor do lote e do seu guardião. Num eclipse no signo de Carneiro, existe necessariamente uma expressão deste acto primeiro de avançar entre a luz e a sombra, de encontrar uma via electiva.

  Por todas estas razões, o eclipse de 8 de Abril terá uma influência abrangente, todavia, em sentido restrito, a influência astrológica fixar-se-á em cerca de um ano e dois meses. Porém, se considerarmos a declinação dos luminares, a sua influência será de cerca de sete anos, incluindo-se assim num contexto de ciclo nodal mais amplo. A questão da influência dos eclipses tem sido um pouco descurada. Em termos mundanos, o eclipse, isto é, a ocultação da luz, tem um valor profundo e antiquíssimo. Desde a Antiga Babilónia, desde os presságios astrológicos, que começaram a ser compilados em 1800 AEC, mas que podem remontar ao século VIII AEC (Enūma Anu Enlil), que os eclipses são fortes indicadores das transformações colectivas. E não é por acaso, visto que a luz e a sombra e, em especial, um fenómeno de ocultação da luz, possuem uma influência radical. Todas as outras influências astrológicas dependem ou deveriam depender deste binómio (luz e sombra) e, desta forma, dos luminares (Sol e Lua). Já a influência genetlíaca é tradicionalmente mais restrita e, por norma, cinge-se ao grau do eclipse.

  O eclipse solar total de 8 de Abril tem o seu centro geográfico na região de Durango, no México, incidindo o manto penumbral sobre a América Central e a América do Norte. Nas regências geográficas antigas, o Sol e a Lua em Carneiro regem, segundo Manílio, o Helesponto (Estreito de Dardanelos), Propontis (Mar de Mármara), a Síria, a Pérsia e o Egipto (Astronomica, IV, 744-817). Já Vétio Valente (Antologia I, 2) diz-nos que o signo exerce influência sobre as seguintes regiões: a Babilónia, Elymais ou Elamais (Cuzistão, província do Irão), a Pérsia, a Palestina e as regiões circundantes, a Arménia, a Trácia, a Capadócia, Susã (cidade antiga, capital do Elão ou Susiana, hoje sudoeste do Irão), o Mar Vermelho e o Mar Negro, o Egipto e o Oceano Índico. Heféstion de Tebas transmite-nos que Carneiro tem as seguintes regências geográficas: “Segundo Ptolomeu: a Britânia, a Galácia, a Germânia, a Palestina, Edom e a Judeia. Mas, tal como Hiparco, os antigos egípcios também fizeram de acordo com as partes: para o ombro esquerdo, a Babilónia; para o ombro direito, a Trácia; para o peito, a Arménia; para a coluna, tanto o vale da Pérsia como o da Capadócia, a Mesopotâmia, a Síria, o Mar Vermelho. Fizemos uma exposição separada de cada uma das partes, porque é assim que comummente utilizado nos prognósticos desses lugares.” (Apotelesmática I, 1).

  O eclipse actual, no signo de Carneiro, pertence à série Saros 139, sendo o seu 30º eclipse. Esta série começou a 17 de Maio de 1501 (calendário juliano), com um eclipse no signo de Gémeos, e terminará a 3 de Julho de 2763, com um eclipse no signo de Caranguejo. É portanto uma série recente e com uma matriz de sentido que nos conduz da dualidade da palavra e do conhecimento à matriz do feminino e ao reconhecimento da origem da alma. Depois da sombra, a luz da Grande Mãe emergirá do oceano primordial. No entanto, no que à série concerne, ainda nem chegámos a meio do caminho e, neste eclipse masculinizado, assente apenas num dos númenes do par divino, a sombra permanecerá sobre a Terra-Mãe. No tema matriz da série, o Sol, a Lua, Mercúrio e Saturno estavam em Gémeos, Vénus e a Caput em Touro, Júpiter em Carneiro, Marte e Úrano em Peixes, Neptuno em Capricórnio e Plutão e Cauda em Escorpião.

  Aquando deste eclipse, com os maléficos em quadratura, colocando os luminares e Mercúrio sob a sua influência, é fácil compreender como 1501 foi um ano de conflitos e guerras e de redefinições geoestratégicas. Neste ano, César Bórgia, filho do Papa Alexandre VI, será uma figura determinante. De cardeal a gonfaloneiro papal, terá um papel importante para assegurar o poder do papa e os interesses franceses, seus aliados. A 25 de Julho de 1501, o rei Frederico I rende-se a César Bórgia e ao rei francês Luís XII, entregando-lhes assim o Reino de Nápoles. A 13 de Maio, a República de Veneza assinou um tratado com o Papa Alexandre VI e com o Reino da Hungria pela protecção da Dalmácia veneziana na guerra com os Otomanos. Por outro lado, em Espanha, termina a rebelião muçulmana de Alpujarras, assegurando-se assim a controlo espanhol de Granada. Paralelamente a todos os acontecimentos bélicos, Pedro Álvares Cabral regressa a Portugal da sua expedição, iniciando-se a hegemonia portuguesa na Índia e no Brasil (Neptuno culminando em Capricórnio). 

  No eclipse de dia 8 de Abril, assistimos, à semelhança do que ocorrera no eclipse lunar de 25 de Março, a uma co-presença planetária em apenas quatro signos zodiacais. No entanto, existem algumas diferenças. A Lua que estava em Balança está agora em Carneiro, como o Sol, e Vénus deixou a sua exaltação, em Peixes, e entrou no domicílio de Marte, Carneiro. Estas duas mudanças são significativas, sobretudo porque sobrevalorizam o masculino em detrimento do feminino. A Lua deixa o domicílio de Vénus para entrar no Marte e Vénus também, deixando a sua exaltação. Este é um lugar difícil para os planetas femininos. É uma posição que está negativamente exacerbada se se pensar que está agora sob a influência de um eclipse. O lugar de exaltação do Sol (Carneiro) tem, neste momento, a sua luz ocultada. Um manto de sombra tolda o entendimento do Sol, o carácter espiritualmente transformador da sua luz. 

  No lugar do Poente, temos assim Vénus, em posição pós-poente, logo abaixo do horizonte e como Estrela da Manhã, a Caput Draconis, a Lua, o Sol e Mercúrio, este sob os raios solares eclipsados e como Estrela da Tarde. Se, por um lado, Vénus é uma promessa do amanhã, escondida sob o horizonte, por outro, Mercúrio é a palavra que arde na sombra, o conhecimento obscurecido. A posição de Vénus, ligeiramente abaixo do horizonte, marca um caminho descendente da luz. Não existem astros nem a ascender, nem a culminar. Vénus é como Perséfone a entrar no submundo, para se unir a Hades (Plutão) que avança para o lugar mais profundo, para o Tártaro. O amor e a morte ocultam-se sob o véu da realidade mais profunda, da verdadeira natureza das coisas. O sextil de Plutão em Aquário aos astros em Carneiro aponta para este sentido, para o aprofundamento destruturado das nossas acções.

  Com a Lua e Vénus em Carneiro, o feminino entra no lugar de exaltação do Sol, um lugar onde a luz está agora ocultada, subtraída à realidade humana pessoal e colectiva. Ao deixar para trás o signo de Peixes, Vénus deixou desequilibrado o poder dos maléficos, ou seja, já não é um travão para a expansão dos seus raios. A dádiva do amor perde o sentido de totalidade. Devemos ter também em consideração que existe uma relação tensa com a posição dos maléficos no tema matriz da série Saros: Marte está em conjunção e Saturno em quadratura. Esta ligação mostra-se como o espelho do mal, o olhar devolvido do abismo humano. Outro aspecto a salientar é que a conjunção exacta dos maléficos ocorrerá dois dias depois do actual eclipse, no grau 15 de Peixes. Contudo, a fé e a esperança continuam no horizonte, pois este grau pertence ao decanato e aos termos de Júpiter.

  Esta posição, a par da de Plutão em Aquário, olhando quadrangularmente para Júpiter e Úrano em Touro, revela uma total corrupção do sentido primordial de humanidade e do valor do humano. O conflito entre Israel e o Hamas e o genocídio do povo palestino evidencia esta disrupção. As tensões começam com a quadratura de Marte em Balança com Plutão em Capricórnio, adensam-se com a entrada de Plutão em Aquário, a 21 de Janeiro, e, por fim, culminam com a conjunção dos maléficos em Peixes. O fim da humanidade é a extinção do humano. A pergunta que se coloca é o que faz com que o mal (Marte e Saturno em Peixes) não se torne total e não se espalhe como uma praga, e a resposta, de acordo com o lugar que esse ocupa, só pode uma, a união pelo amor, pela compaixão (Neptuno em Peixes), da Fé à Sabedoria (Pistis-Sophia).

  O sextil de Marte, Saturno e Neptuno em Peixes a Júpiter e Úrano em Touro concede à liberdade, à afinidade electiva, a transformação do mal em bem, exigindo um esforço real de reestruturação. A via da justiça, da justa medida, é uma parte da dádiva, das bênçãos que a humanidade pode colher. Júpiter concede a bênção da luz do bem. Porém, uma vez que o eclipse ocorre no segmento diurno, fazendo de Júpiter o grande benéfico, essa bênção encontra-se obscurecida, existe, mas não é vista. Este obscurecimento do bem é observável em outros dois elementos de análise. No tema de Lisboa, Júpiter e Úrano estão na VIII, no lugar da morte, ou seja, num lugar inactivo, sem vida, e, por outro lado, olham quadrangularmente para Plutão, o senhor da morte. Esta ligação da morte ao bem, à revolução do bem, coloca a humanidade sobre o abismo.

  O eclipse solar de dia 8 de Abril, no signo de Carneiro, resume, desta forma, um momento da humanidade e da sua história em que a acção humana se encontra obscurecida, incapaz de se fixar na luz ausente, mas esperada. A acção precisa de finalidade. O acto inaugural em Carneiro precisa de saber que a finalidade da viagem é o tesouro da totalidade que se encontra Peixes. No entanto, nos tempos que vivemos, o humano é como um Jasão sem o Argo e sem companheiros de viagem, sem o conhecimento do tosão de ouro. O humano precisa de reencontrar a humanidade e seguir a luz.    

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