sexta-feira, 19 de janeiro de 2024
Livros de Astrologia: Reflexões Astrológicas
sexta-feira, 12 de janeiro de 2024
Lançamento: Reflexões Astrológicas 2023: Parte II
segunda-feira, 8 de janeiro de 2024
Reflexões Astrológicas 2023: Parte I - Citação 5
quinta-feira, 21 de dezembro de 2023
Brevemente: Reflexões Astrológicas 2023 - Parte II
segunda-feira, 18 de dezembro de 2023
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terça-feira, 12 de dezembro de 2023
Reflexões Astrológicas 2023: Lua Nova em Sagitário
Reflexões Astrológicas
Lua Nova em Sagitário
Lisboa, 23h32min, 12/12/2023
Sol-Lua
Decanato: Lua
Termos: Mercúrio
Monomoiria: Saturno
A
Lua Nova de Dezembro ocorre no signo de Sagitário, estando Virgem a marcar a
hora para o tema de Lisboa e, deste modo, na IV, no lugar sob a terra (ὑπόγειον), no decanato de Lua, nos termos de Mercúrio e na monomoiria de Saturno. A sizígia dá-se
pois abaixo do horizonte e cerca de cinco horas e meia após o pôr-do-sol. Os
luminares, estando a Lua no seu próprio segmento, mas num signo masculino,
encontram-se num caminho de queda, rumo à anti-culminação. Esta é a primeira
via luminar do novilúnio, a que se inicia com a sizígia em queda e termina,
passando por Marte, no Ponto Subterrâneo. Agora em Sagitário, e seguindo uma
ideia já explorada, a luz não desce do céu, nasce no abismo, no útero de Gaia,
do Sagrado Feminino. Nesta constelação, essa luz é a sabedoria.
Acerca
do quarto lugar, Manílio afirma o seguinte: “Contudo, a que completa a via de retorno
sob a aurora/ e que, de volta, com as forças exaustas, o arco/ escala, abraça por fim os derradeiros anos,/
a luz desvanecente da vida e a trémula
velhice.” (Astronomica II, 852 – 855,
ed. Goold, 1985, 56: at, qua perficitur cursus redeunte sub ortum,/
tarda supinatum lassatis viribus arcum/ ascendens, seros demum complectitur
anos/ labentemque diem vitae tremulamque senectam. As traduções de Manílio são
da minha responsabilidade). Este lugar, segundo
o mesmo autor antigo, tem a regência de Saturno, uma que é diferente da de
Trasilo e da tradição hermética, que coloca Saturno na XII. A significação de
Manílio é fundamentalmente astro-mitológica, pois esta é a herança que vê
Cronos/Saturno aprisionado por Zeus/Júpiter no Tártaro, no abismo da terra. A
velhice e a morte tornam-se assim um elemento de sentido, daí que Manílio diga
que é “de onde o Sol foge
tombado e para o Tártaro se extende” (II, 794, ed. Goold,
1985, 54: unde fugit mundus
praecepsque in Tartara tendit).
O quadrante que se alonga do Poente (VII) ao Subterrâneo (IV) encerra em si uma
qualidade de morte, mas também um carácter temporal profundo, pois ambos criam
uma ponte de sentido entre o passado, a morte e o além.
Neste
novilúnio, a luz está assim guardada no abismo da realidade, no útero da
história. Por outro lado, por a Lua Nova ocorrer no signo de Sagitário, a
sabedoria torna-se a potência dessa mesma luz. Esta atribuição pode ser entendida
primeiramente pelo facto de Sagitário ser o domicílio de Júpiter. Do ponto de
vista astro-mitológico, lembremo-nos que o poder de Zeus/Júpiter é fortalecido
quando este absorve Métis, a deusa da sabedoria. Ora o eixo Gémeos-Sagitário
que coloca, por via da regência domiciliar, Mercúrio e Júpiter a olharem-se de
frente firma, desta forma, a palavra ou a razão diante da sabedoria. O
conhecimento das coisas torna-se pois a sabedoria da coisa única. Este é o ar
que se torna fogo. O elemento estruturante torna-se dinâmico, podendo este
produzir a verdadeira mudança. Neste sentido, a seta de Sagitário tem um
sentido literal, pois a sabedoria tem sempre um valor de propósito e
finalidade.
A
respeito desta senda, Cícero, em Luculo
(Academica priori), diz-nos o
seguinte: “Pela minha parte, como não
costumo coibir-me de discutir com todos quantos [têm por certo aquilo que
julgam saber], não posso também
recusar-me a admitir que haja quem não esteja de acordo comigo. A minha causa
agora é fácil, já que não pretendo mais do que procurar a verdade com todo o
interesse e esforço, mas sem facciosismo. A obtenção do conhecimento é sempre
dificuldade por toda a espécie de obstáculos, uma mesma insuficiência decorre
tanto da obscuridade das próprias matérias como da debilidade da nossa
capacidade de julgar, pelo que não é sem razão, que os mais antigos e cultos
filósofos duvidaram da possibilidade de encontrar o que procuravam; mas mesmo
assim nem eles desistiram, nem eu abandonarei, cansado, o meu empenho em investigar
a verdade.” (III,
7 in Textos Filosóficos, 2 ed., trad.
J. A. Segurado e Campos, 99-100. Lisboa, 2018: Fundação Calouste Gulbenkian). A sabedoria e a verdade são ideias
jupiterianas cujo valor se reacende neste novilúnio. Esta é uma luz de
transformação e uma via que, embora exigente e incerta, nos conduz à
felicidade.
Em Gémeos, a discussão das ideias
leva-nos ao conhecimento, mas, em Sagitário, coloca-nos no caminho da
sabedoria. Se, de um ponto de vista da astrologia helenística, observarmos as
atribuições planetárias dos termos egípcios, podemos constatar que só os signos
regidos por Júpiter é que concedem mais de metade dos seus graus aos benéficos
(Sagitário 17 graus e Peixes 16 graus). As dádivas da sabedoria e da verdade
estão aqui particularmente activas. Séneca, na obra Dos Benefícios, alerta-nos para aceitação do destino como via de
sabedoria e verdade quando afirma o seguinte: “Considera
também isto, nada que seja externo obriga os deuses, pelo contrário, a sua
vontade é eterna e segue a sua própria lei. O que eles estabeleceram não muda.
Não parece que vão fazer algo que não queiram. Seja o que for que não possam
parar, eles querem que continue a mover-se; eles nunca se arrependem do plano
que inicialmente conceberam. Certo é que não podem ficar parados, nem
afastar-se para o lado, mas a única razão é que a sua própria força os prende
ao seu propósito; permanecem firmes, não por fraqueza, mas porque não lhes
agrada afastar-se da perfeição, e porque assim se devem mover. Desta forma,
naquela primeira dispensação, quando o cosmos se formou, eles até tiveram em
consideração o nosso lote, e preocuparam-se com a humanidade. Por isso, não se
pode dizer que percorram os céus e desenvolvam a sua obra apenas para si
próprios, pois também nós fazemos parte dessa obra.” (De Beneficiis 6.23. Seneca: How to
Give - An Ancient Guide to Giving and Receiving, selected, translated, and
introduced by J. S. Romm, 198-201. Princeton and Oxford, 2020:
Princeton University Press. A tradução do latim é da minha responsabilidade).
A
inevitabilidade, a lei de Adrasteia, é uma realidade que conjuga os sentidos
profundos de Júpiter e Saturno. Ora Saturno em Peixes, acompanhado por Neptuno,
junto ao Poente vem trazer, uma vez mais, a aceitação do destino como
integração da totalidade. A visão da montanha não é nem determinista, nem
fatalista, é sim a compreensão serena de que tudo o que está em movimento
concorda consigo mesmo. A necessidade é a mãe do destino, da fortuna. No
entanto, o individualismo exacerbado teme esta visão, pois pensa que retira a
liberdade, mas ignora que a visão da montanha é a forma suprema de liberdade.
A
co-presença de Marte com a sizígia, pelo segundo novilúnio consecutivo, e agora
fora do domicílio e do segmento, adensa uma certa rebeldia ou desejo de
mudança. Esta conjunção não pede para se abrir os horizontes, exige. Os jovens
activistas climáticos estão aqui incluídos e, na verdade, o problema não está
nem no facto de não terem razão, porque têm, nem na forma dos protestos, porque
também com palmadinhas nas costas não se muda nada, a questão está no olhar dos
outros que simplesmente não quer ver. Existem, porém, alguns elementos
disruptivos. Primeiro, o Júpiter de Sagitário que deseja afirmar, enquanto o de
Peixes procura estabilizar, não faz qualquer aspecto à sizígia, permanece
desligado, passivo, face ao encontro dos luminares. Depois, a quadratura de
Saturno e Neptuno em Peixes vai mostrar que esta mudança não será rápida, pois
existe uma resistência estrutural à transformação dos modos de vida.
Por
outro lado, por não existir nenhum astro no quadrante da ascensão à culminação,
a atenção foca-se nos planetas que, embora altos, já estão em queda, ou seja,
em Úrano e Júpiter em Touro, na IX, mas sobretudo na via luminar mais
abrangente em que se insere a sizígia. O caminho que se estende hexagonalmente
de Plutão em Capricórnio a Vénus em Escorpião contempla aquilo que Antero de
Quental inscreveu no soneto “Mors-Amor” e que já foi abordado noutras
reflexões. A união simbólica, conceptual e existencial do Amor e da Morte
possui um carácter transformador essencial e que, visceralmente, reduz a
realidade ao que é fundamental. Esta via, passando pelo Tártaro profundo,
confere pois uma proposta de refundação.
Paralelamente,
existem outros dois aspectos que se relacionam com esta via luminar. A oposição
ou diâmetro, como diriam os antigos astrólogos, entre Vénus em Escorpião e
Júpiter (e Úrano) em Touro marca uma época quase solsticial e natalícia. Ora,
seguindo a lição de Petosíris, uma oposição ou quadratura entre os benéficos
nunca é má, excepto se acompanhada pelos maléficos, o que não é o caso. Assim,
esta ligação de Vénus a Júpiter tem um efeito de dádiva e de uma atribuição
positiva de valor ao eixo de sentido que se estende entre a vida e a morte.
Por
outro lado, o sextil entre Vénus em Escorpião e Saturno e Neptuno em Peixes vai
colocar o amor e a morte na roda da necessidade. Face ao destino, o amor
possuirá ou deverá possuir um carácter universal. Este é a teia que une tudo e
todas numa simpatia universal, na Anima
Mundi. Na astrologia esotérica, Neptuno tem um tom similar ao de Vénus, mas
numa oitava acima, ou seja, na música das esferas, o amor ecoa pelo universo.
Na verdade, para o astrólogo tradicional que siga o saber antigo e hermética,
esta é somente uma expressão da exaltação de Vénus em Peixes. Júpiter e Úrano
em Touro acompanham, também em sextil, a ligação da Vénus de Escorpião a
Saturno e Neptuno em Peixes. Porém, a retrogradação de ambos vai restringir
ainda a efectivação das suas bênçãos. Elas surgem no horizonte, mas não se
tornam acção. Podemos ver aqui a situação dos civis palestinianos. Todos, com bom
senso, vêem nos actos praticados crimes de guerra, crimes contra humanidade,
todavia, face ao genocídio, permanecem imóveis, incapazes de produzir justiça e
mudança.
Neste
novilúnio, os aspectos ao corpo do Dragão da Lua são igualmente significativos.
No eixo da identidade, aquele que une Carneiro a Balança, a unidade e a
dualidade, ou seja, o conheci de si como via de alteridade, surgem outros
desafios. Sob a égide do destino e da necessidade, o eu enfrenta o mistério do
outro. A luz da sabedoria, como proposta do novilúnio, une agora, de forma
bem-aventurada (trígono à Caput e sextil à Cauda), a sizígia e Marte em
Sagitário ao Dragão da Lua. O guardião da Lua, este dragão que cinge a luz,
permitindo o seu reconhecimento, pois só depois de ver a sombra é que se
reconhece a luz, vai conceder-nos, como bênção no caminho, a dádiva da sabedoria.
No entanto, o gesto de seguir a sabedoria, ao oferecer a passagem do destino à
necessidade, implica sempre um acto voluntário. É preciso ter iniciativa.
Depois do despojamento de si, a sabedoria mantém aqueles que a seguem para além
da fortuna.
Por
fim, é preciso referir a posição de Mercúrio (e Plutão) em Capricórnio. No
signo da finalidade, onde agora o poder da palavra e o poder da morte se
expressam, a fortuna outorga uma possibilidade de futuro. Esta potência,
anunciando a época zodiacal seguinte, tem um valor de dádiva (trígono a Júpiter
e Úrano e sextil a Vénus, Saturno e Neptuno). Porém, esta bênção de futuro,
alertando-nos que a palavra tem um poder transformador (conjunção
Mercúrio-Plutão), colide com o Dragão da Lua e com as exigências autocentradas
da identidade (quadratura ao eixo nodal). O poder da palavra pode elevar-nos
pois ao cume da montanha ao afundar-nos nas profundezas da nossa desmedida. A
desinformação, o discurso único e a intolerância podem assim minar este
potencial de dádiva.
O
novilúnio de Dezembro, o último de 2023, transporta-nos, desta forma, para a
mensagem de Sagitário e para a luz da sabedoria. A imagética, mesmo com
reservas mitológicas, coloca-nos perante um centauro erguido, lançando a sua
seta, e revela-nos que o elemento de passagem entre o animal e o humano
acontece apenas devido à luz da sabedoria. Devemos assim segui-la e deixar que
transforme as nossas vidas.
quinta-feira, 7 de dezembro de 2023
Reflexões Astrológicas 2023: Parte I - Citação 4
segunda-feira, 13 de novembro de 2023
Reflexões Astrológicas 2023: Lua Nova em Escorpião
Reflexões Astrológicas
Lua Nova em Escorpião
Lisboa, 09h27min, 13/11/2023
Sol-Lua
Decanato: Vénus
Termos: Júpiter
Monomoiria: Júpiter
A
Lua Nova de Novembro ocorre no signo de Escorpião, estando Sagitário a marcar a
hora para o tema de Lisboa e, deste modo, na XII, no lugar do Mau Destino ou
Mau Espírito (κάκον δαίμων), no decanato de Vénus, nos termos e
na monomoiria de Júpiter. A sizígia
dá-se pois acima do horizonte e a cerca de uma hora e quarenta e cinco minutos
após o nascer-do-sol. Os luminares, estando a Lua fora do seu próprio segmento,
mas num signo feminino, encontram-se num caminho de ascensão, rumo à culminação.
A posição pós-ascendente, sem qualquer ligação ao Leme do tema, encerra sempre
um mistério de sombra e de promessa de luz que pode confundir o seu sentido. A
XII, segundo o entendimento antigo, não é, apesar de tudo, uma posição tal
maligna como a VI, pois, por estar no início da escalada celeste, confere à luz
o potencial de superação de si, o ânimo de quem sobe a montanha. Neste lugar, a
sizígia em Escorpião é, mais do que qualquer outro, a luz que vence o destino e
a morte.
O
novilúnio de Novembro, em Escorpião, no signo que encerra em si o sentido
profundo da morte e no lugar do Mau Destino ou Mau Espírito, conjuga necessariamente
as significações de luz e sombra, de valor da morte e de superação do destino.
A XII, com o qualificativo κάκον
para δαίμων,
confere um valor negativo, seja pela
sua própria natureza, seja pela sua dinâmica relacional, a um conceito ou
entidade que reúne em si a divindade, o espírito ou génio e o destino. O facto
da XII não se relacionar por envio de raios ou aspecto com a I revela a
dificuldade da vida, do carácter ou do temperamento (leia-se personalidade ou
consciência da vida) em aceitar as vicissitudes do destino que contrariam a
vontade, ou seja, os acontecimentos, tanto internos como externos. Uma relação
com a XI ou com XII implica sempre esta interacção existencial com o destino, a
necessidade e a providência. O conceito de δαίμων
traduz esta relação entre a vida e o
destino, mas obriga sempre a um processo de mediação, neste caso, espiritual ou
divina.
Ao
colocar-se a luz perante a morte e o destino, o que, para Escorpião, conduz a
um desafio, o conceito filosófico de ἐγκράτεια adquire um valor de revelação, pois cada um terá de se
tornar mestre de si mesmo. Séneca, nas Cartas
a Lúcilio, diz-nos que “O cúmulo da
felicidade consiste numa perfeita segurança, numa inabalável confiança no seu
valor; ora o que as fazem é arranjar preocupação, é percorrer a traiçoeira
estrada da vida ajoujadas de pesados fardos. Deste modo vão-se sempre
distanciando cada vez mais da meta que procuram alcançar, e quanto mais se
esforçam por atingi-la mais se embaraçam e retrocedem. Sucede-lhes como a
alguém que corra num labirinto: a própria velocidade faz perder o norte.” (Ep.44.7; Cartas a Lucílio, 2ª ed,, trad. J. A.
Segurado e Campos. Lisboa, 2004: Fundação Calouste Gulbenkian). O
destino que, na sua própria urdidura, a astrologia apresenta tão bem obriga, e
essa é agora a lição de Escorpião, a uma reflexão radical e que, em certo
momento, será estruturante. Hermann Broch diz-nos, parafraseando, que o
conhecimento da morte é o conhecimento da vida e que o conhecimento da vida é o
conhecimento da morte, ora esta é a mensagem do eixo Touro-Escorpião cujo
sentido profundo é o do valor.
Para Séneca, “Nenhuma
meditação é tão imprescindível como a meditação da morte”(Cartas a Lucílio,
Ep.70.18).
Segundo uma interpretação astro-mitológica, Escorpião vai radicar o seu sentido
na morte tanto no trabalho de Hércules em que este luta com Hidra de Lerna como
na morte de Órion, picado por um escorpião, e que com este sobe ao céu. No
entanto, tal como já foi referido na reflexão do anterior, a do eclipse lunar,
é o mito da violação de Alcipe que melhor
constrói a natureza primordial de Escorpião (Figueiredo, R.M. de, 2021, Fragmentos Astrológicos, 126). Quer se queira, quer não, o mito é a
raiz de sentido da astrologia, pois, sem a metáfora mitológica do céu, a
linguagem astrológica não existiria.
Na
acrópole de Atenas, perto do templo de Asclépio, onde existia uma fonte, Halirrótico,
filho de Posídon, avançou sobre Alcipe, filha de Ares, e tentou violar a jovem.
Irado e com desejo de vingança, Ares mata Halirrótico. Este é o mito que está
na origem do tribunal do Areópago, pois Posídon exige o julgamento de Ares
diante dos doze deuses. Contudo, Ares é ilibado, pois a sua acção foi
considerada justificada (cf. Pausânias, Descrição
da Grécia, I.21.4 e Apolodoro, Biblioteca,
III,14.2). Séneca, na tragédia Hércules Furioso, resume o mito ao dizer,
no desfecho da peça, o seguinte: “A minha
terra [Atenas] espera por ti. / Ali Gradivus [Ares] libertou as mãos do sangue derramado / e entregou-as de novo às armas.” (1341-3: Nostra
te tellus manet./ illic sohitam caede Gradivus manum/ restituit armis: ilia te,
Alcide, vocat,/ facere innoceutes terra quae superos solet. A tradução é da
minha responsabilidade).
O mito da violação de Alcipe, esta
facilmente identificada com o signo de Touro, oposto a Escorpião (Ares), resume
a posição zodiacal deste signo, pois a deusa da justiça (Virgem), a acção da
justiça (Balança), Posídon (Peixes), aquele que pede ou clama por justiça, e o
outro signo regido por Ares, aquele que recebe as armas de novo, Carneiro, são
como uma síntese simbólica e mimética deste sentido primordial
astro-mitológico. No actual novilúnio, esta dinâmica da acção de Marte que é
própria de Escorpião congrega-se nestes filamentos incandescentes de vingança,
resistência e justiça. Hoje, mais do que nunca, esta teia força o peso do
destino, a gravidade dos acontecimentos. No entanto, todas as potências
planetárias, Marte inclusive, estão sujeitas, na sua expressão humana, à ἐγκράτεια de que se falava. Ao tornarmo-nos
mestres de nós mesmo, colocamos a luz (a sizígia) sobre a morte e sobre o
destino.
A união da astrologia ao estoicismo,
tal como existiu na Antiguidade, permite que se adquira essa mestria, daí que
Séneca diga que “Uma alma que contempla a
verdade, que atribui valor às coisas de acordo com a natureza e não com a
opinião comum, que se insere na totalidade do universo e observa
contemplativamente todos os seus movimentos, que dá igual atenção ao pensamento
e à acção, uma alma grande e energética, invicta por igual na desventura e na
felicidade e em caso algum se submetendo à fortuna, uma alma situada acima de
todas as contingências e eventualidades, uma alma sã, íntegra, imperturbável,
intrépida, uma alma que força alguma pode vergar, que circunstância alguma pode
envaidecer ou deprimir – uma tal alma é a própria personificação da virtude.”
(Ep.66.6; Cartas a Lucílio, 2ª ed,, trad. J. A.
Segurado e Campos. Lisboa, 2004: Fundação Calouste Gulbenkian). A
virtude é a luz que serve de candeia, erguida quando tudo aquilo que se vê é
morte. Esse é o verdadeiro livre-arbítrio: a escolha da luz. Tudo o resto é
destino, necessidade e providência.
O
novilúnio de Novembro, no signo de Escorpião, estando Marte sobre os raios da
sizígia, tal como estará também na Lua Nova de Dezembro, em Sagitário, será
determinado por um ímpeto bélico que fará com que a luz passe de fogo a
incêndio. O humano demasiado humano, relembrando Nietzsche, tende a tornar as coisas
humanas pequenas, insignificantes diante da subida da montanha. Marte, neste
momento, podia ser uma força disruptiva de transformação que iria conceder mais
humanidade ao humano, mas isso não está a acontecer. O eixo das portas do trabalho, ou seja, o da VI e
da XII, mantem, à semelhança do anterior eclipse lunar, o seu peso sobre a
realidade.
Se
observarmos o tema do actual novilúnio, podemos constatar que o único astro
acima deste eixo, aquele que é também o astro mais alto, é Vénus em Balança. Na
verdade, o caminho luminar da sizígia estende-se de Mercúrio em Sagitário, já
pós-ascendente, até Vénus em Balança (sextil). Da sabedoria da palavra ao
desejo de harmonia, a luz quer trilhar a senda que, na morte, funda a vida.
Esta é, porém, uma via ascendente com a vontade de alcançar o cume, mas colide
tanto com a força da morte e da destruição (Marte em Escorpião) como com o peso
do destino e da dificuldade de o conciliar com a identidade (Cauda Draconis em
Balança). A ligação entre Mercúrio em Sagitário e o Dragão da Lua (trígono à
Caput em Carneiro e à Cauda em Balança) serve de proposta de sentido, de meio
de integração do destino, na identidade, no reconhecimento de si e do outro.
A
oposição entre a sizígia e Marte em Escorpião e Júpiter e Úrano em Touro adquire
também, nesta Lua Nova, um valor estrutural. Júpiter é o grande benéfico do
tema do novilúnio e que vai determinar as suas bênçãos. No entanto, este olhar
de frente e diametral (oposição) entre a dádiva e a luz, abeirada pela guerra,
tem um valor potenciador, em que o grande benéfico colide com o grande maléfico
do tema (Marte). A relação entre Marte e Júpiter é complexa, pois, por serem de
segmentos de luz diferentes, expressam-se de forma distinta, mas a sua
expressão não deixa de ser activa. Se Marte possuir uma dignificação mais
intensa, então a acção destruidora será maior. O actual posicionamento de
Júpiter serve, porém, de alerta, dado que ali encontraremos a necessidade de
verdade e justiça. Nesta Lua Nova, vamos encontrar ainda muitos dos elementos
interpretativos que foram abordados no Eclipse Lunar de 28 de Outubro.
Face
ao tema do eclipse lunar, Saturno em Peixes encontra-se agora directo,
avançando no seu périplo pelo signo da totalidade. A sua acção tornou-se
efectiva. A necessidade pede agora completude, expandindo a sua força, a sua
gravidade, de fim de ciclo. Saturno em Peixes, por este ser o domicílio de
Júpiter e a exaltação de Vénus, ganha necessariamente um certo sentido de
dádiva, de bênção. A conjunção com Neptuno obriga a dar à percepção do destino
e da realidade a imaginação criativa e a compaixão, esta enquanto expressão
universal da empatia, todavia, existe neste processo de união pisciana de
Saturno e Neptuno uma enorme resistência. A humanidade caminhou em sentido
contrário, daí que o trígono entre estes e a sizígia e Marte em Escorpião queira
trazer a luz que vence a morte a este desafio absurdamente humano.
A ὕβρις (desmedida), que é própria do humano,
leva a que Saturno tenha de repor a justa-medida das coisas. O
sextil de Saturno e Neptuno em Peixes a Júpiter e Úrano em Touro e a Plutão em
Capricórnio, e deste último à sizígia e a Marte em Escorpião, vão impor a ordem
natural das coisas, segundo as leis de Gaia, mas também segundo os ditames da
Necessidade e a força de Adrasteia, do Inevitável. Esta é hoje a colheita do
humano, ceifada por uma humanidade ausente. A situação humanitária em Gaza e a incapacidade
de olharmos, como um todo, para a dignidade humana fazem com que, para onde
quer que olhemos, tudo o que vemos é morte, é tudo destruição. A quadratura de
Mercúrio em Sagitário a Saturno e Neptuno em Peixes transporta-nos para a incapacidade
de dar forma à palavra que descreve a alma do mundo, ao discurso primordial que
conduz, de novo, até à Sabedoria, até à Mãe Divina.
No novilúnio de Novembro, no signo de Escorpião, somos inevitavelmente confrontados com o nosso pior inimigo e, numa escala mundial, esse inimigo é o próprio humano. A natureza humana e a sua incapacidade de se congregar numa verdadeira humanidade fazem com que a morte que participa da vida e a destruição que circunda a criação excedam os seus limites. A luz guardada, cingindo numa única chama o feminino e o masculino, surge pois na mestria de nós de mesmos. A ἐγκράτεια de que se falou, bem como os princípios filosóficos do estoicismo, servem a astrologia hoje tal como serviram na Antiguidade. Essa é uma luz sobre o tempo.
segunda-feira, 6 de novembro de 2023
Reflexões Astrológicas 2023: Parte I - Citação 3
sexta-feira, 27 de outubro de 2023
Reflexões Astrológicas 2023: Eclipse Lunar Parcial (Lua Cheia Touro-Escorpião)
Reflexões Astrológicas
Eclipse Lunar Parcial
(Lua Cheia: Escorpião-Touro)
Lisboa, 21h14min, 28/10/2023
Lua
Decanato: Mercúrio
Termos: Vénus
Monomoiria: Marte
Sol
Decanato: Marte
Termos: Marte
Monomoiria: Saturno
O Eclipse Lunar Parcial de dia 28 de
Outubro ocorre com a Lua no signo de Touro e o Sol no de Escorpião, com Gémeos
a marcar a hora e menos de três horas após o pôr-do-sol (hora de Lisboa), logo
no Segmento de Luz (αἵρεσις) da Lua, estando esta acima do
horizonte, na XII, no lugar do Mau Espírito ou do Mau Destino (κάκον δαίμων), já o Sol está abaixo do horizonte,
na VI, no lugar da Má Fortuna (κάκη
τύχη). A Lua encontra-se no decanato de
Mercúrio, nos termos de Vénus e monomoiria
de Marte, enquanto o Sol encontra-se no decanato de Marte, nos termos de Marte
e monomoiria de Saturno. Após o
crepúsculo, caída a noite, o eclipse colocará a sua sombra sobre o horizonte e,
a partir da Pós-Ascensão, trará consigo o peso do destino.
Acerca do eixo de lugares (XII-VI)
onde este plenilúnio obscurecido se estende, Manílio diz o seguinte: “a porta do trabalho serão: por uma se sobe e pela outra se desce” (Astronomica II, 870: porta laboriis erit:
scandendum est atque cadendum).
O conceito fundamental que se extrai deste verso é o de labor, de trabalho, que tem aqui o sentido de dificuldade, de
esforço, de pena, mas também, inevitavelmente, de desafio. Lembremo-nos, por
exemplo, dos trabalhos de Hércules. Ora Virgílio, na Eneida, refere os eclipses solares como labores solis, os trabalhos ou labores do sol (I, 742). Esta é uma ideia preciosa, pois
diz-nos que a sombra coloca a luz, seja ela directa (Sol) ou reflectida (Lua),
sobre esforço. Desta forma, se o eixo do eclipse lunar cair sobre o eixo da
VI-XII este sentido sai reforçado, sobretudo se se conjuga com o sentido
negativo ou obscurecido dos conceito de τύχη e δαίμων. A fortuna e o destino são colocados
assim, não perante a dualidade dos acontecimentos, mas sob a potencialidade da
acção humana e o modo como esta apreende os acontecimentos. Para ascender ou
descender, como diz Manílio, a luz terá de passar por esse pórtico penoso onde
o seu espectro se sujeita à dificuldade e ao esforço. Os eclipses, face ao
estender da sombra a partir da própria luz, são necessariamente tempos de
angústia e agrura.
Nas Meditações,
Marco Aurélio diz-nos seguinte: “Abandona-te
de boa mente a Cloto; deixa-a tecer a tua vida com os acontecimentos que lhe
aprouver.” (IV, 34, trad. J. Maia. Lisboa: Relógio D’Água, 1995). No que aos
acontecimentos concerne, a acção humana é determinada pela aceitação do fio das
Meras, do destino, todavia, existe liberdade na forma como acolhemos, ou não, a
luz e a sombra. O imperador romano continua, afirmando: “Considera de contínuo que o mundo é como um ser único, contendo uma
substância única e uma única alma; e que tudo vai desaguar à mesma e única percepção
que é a sua; ele tudo realiza por força do mesmo impulso; todas as coisas ao
mesmo tempo concorrem para causar o que acontece e que trama cerrada e
complicada é o que elas produzem” (IV, 40). Esta
causalidade não só é natural como é provida de sentido, de finalidade, contudo,
a sua interiorização exige esforço. Para tudo e para cada um, existe um
trabalho que lhe é devido. As portas do trabalho são portanto os desafios desta
causalidade.
As
raízes desta ideia atravessam, na Antiguidade, o pensamento filosófico e a
astrologia. Já Platão, no Timeu,
afirmava que “Com efeito, o deus,
ao fazer girar em torno do eixo todos os círculos dos astros, como uma espiral,
fazia parecer que o movimento era duplo e em sentidos opostos e que o que se
afastava mais lentamente do que era mais rápido era o que estava mais perto.
Para que houvesse uma medida evidente para a lentidão e para a rapidez com que
se cumprissem as oito órbitas, o deus instalou uma luz na segunda órbita a
contar da Terra, a que agora chamamos Sol, de modo a que o céu brilhasse ainda
mais para todos e que os seres-vivos aos quais isso dissesse respeito
participassem do número de modo a ficarem a conhecer a órbita do Mesmo e do
Semelhante. Deste modo e por estas razões foram gerados a noite e o dia – o
percurso circular uniforme e regular.” (39A-B,
Timeu – Crítias, trad. R. Lopes.
Coimbra, 2011: Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos).
Existe tanto uma diversidade nesta unidade como uma harmonia de opostos que conduz
a essa unicidade. Ora é neste ponto que um eclipse e, em especial, um eclipse
lunar se torna particularmente significativo.
A harmonia dos opostos funda-se,
numa perspectiva divina, na união da Mãe Divina ao Pai Divino, ou seja, por
amor o mundo se criou e por separação assim permaneceu, daí que Tábua de Esmeralda diga que “Todas as coisas provêem
de uma, por mediação de uma única, assim todas as coisas nasceram desta única
realidade por um único processo de adaptação. O seu pai é o Sol; a sua mãe é a
Lua.” (TH 30, in Hermetica II -The Excerpts of
Stobaeus, Papyrus, and Ancient Testimonies in an
English Translation with Notes and Introduction., ed. M. D. Litwa, 2018: 315. Cambridge: Cambridge University Press. A
tradução é da minha responsabilidade). Na astrologia, o Sol é o Pai Divino e a Lua a Mãe
Divina, são Osíris/Serápis e Ísis. Os antigos astrólogos conservaram sempre
esta matriz de sentido. Os eclipses são a sombra que estende junto ao casal.
Essa sombra é Set que, embora seja um inimigo, não deixa de ser seu irmão.
Existe uma afinidade
natural entre a luz e a sombra. Ora, para a significação do actual eclipse
lunar, esta harmonia dos opostos vai para além do Sol e da Lua, pois a regência
domiciliar dos signos do eixo luminar e do Dragão da Lua alimentam esta
dicotomia. De um lado, temos a Lua em Touro (Vénus) e a Caput Draconis em
Carneiro (Marte) e, do outro, temos o Sol em Escorpião (Marte) e a Cauda
Draconis em Balança (Vénus). Sob a égide da luz e da sombra, existe pois uma
força cósmica de união e separação, criando e destruindo.
A influência do eclipse
lunar de dia 28 não é das temporalmente mais longas, mas é espacialmente
expressiva. Segundo o método ptolemaico, podemos fixar a influência entre um
mês e nove dias e quatro meses e catorze dias, isto se considerarmos primeiro a
duração do manto umbral e depois a do manto penumbral. Já a técnica que
concilia a duração da escuridão do eclipse com o tempo de ascensão dos signos
coloca a influência entre um dia e meio e um mês e oito dias. É significativo
que duas técnicas com pressupostos diferentes tenham, neste caso, um período de
influência tão aproximado. Já a influência espacial coloca o centro do eclipse
ao largo do Iémen, entre a costa mais próxima da fronteira com Omã e a ilha de
Socotorá (Suqutrah), um paraíso
natural pertencente ao Iémen. No entanto, o eclipse tem um manto extenso que
cobre o continente africano, europeu e asiático.
Quanto às regências
espaciais antigas, temos de observar primeiramente as do signo de Touro, pois é
onde se encontra a Lua. Segundo Vétio
Valente (Antologia I, 2), Touro vai reger as regiões da Média
(o actual noroeste do Irão, o Azerbaijão, o Curdistão Iraniano e o Tabaristão
ou Mazandarão), da Cítia (Irão, mas também uma área que se estendeu da Bulgária
às fronteiras da Rússia, Mongólia e China), do Chipre, da Arábia, da Pérsia e
das montanhas do Cáucaso, da Samártia (junto à Média), de África, de Elymais ou
Elamais (Cuzistão, província do Irão), de Cartago, da Arménia, da Índia e da
Germânia. Para Manílio, Touro rege Cítia, a Ásia (por causa dos Montes Tauro) e
a Arábia. (Astronomica, IV, 744-817).
De seguida, por a Caput Draconis se
encontrar num signo diferente, temos de considerar as regências de Carneiro. Vétio
Valente (Antologia I, 2) diz-nos que as seguintes regiões pertencem a
Carneiro: a Babilónia, Elymais ou Elamais (Cuzistão,
província do Irão), a Pérsia, a Palestina e as regiões
circundantes, a Arménia, a Trácia, a Capadócia, Susã (cidade antiga, capital do
Elão ou Susiana, hoje sudoeste do Irão), o Mar Vermelho e o Mar Negro, o Egipto
e o Oceano Índico. Para Manílio, rege o Helesponto
(Estreito de Dardanelos), Propontis (Mar de Mármara), a Síria, a Pérsia e o
Egipto (Astronomica, IV, 744-817). Embora com menor influência, o lugar
do Sol também é significativo e Valente diz-nos que Escorpião rege a Metagonitis
ou Numídia (Norte de África, Argélia e Tunísia), a Mauritânia, a Getúlia (Norte
de África, Argélia e Tunísia), a Síria, Comagena (Ásia Menor), a Capadócia,
Itália, Cartago, Líbia, Amom (Jordânia), Sicília, Espanha e Roma. Já para Manílio
Escorpião rege Cartago, a Líbia, o Egipto, Cirene, a Itália e a Sardenha (Astronomica IV, 777-82).
O eclipse lunar actual pertence à
série Saros 146 que se iniciou a 11 de Julho de 1843 e que terminará a 29 de
Agosto de 3123. É portanto uma série recente que se estende a partir do eixo
Capricórnio-Caranguejo até ao eixo Peixes-Virgem. O seu eclipse inaugural, que
serve de matriz genetlíaca de sentido, ocorreu com a Lua, a Caput Draconis e
Saturno em Capricórnio, o Sol e a Cauda Draconis em Caranguejo, Mercúrio e
Vénus em Gémeos, Marte em Sagitário, Júpiter e Neptuno em Aquário e Úrano e
Plutão em Carneiro. A conjunção da Lua e Saturno e a quadratura destes a Úrano
e Plutão em Carneiro, bem como a conjunção de Júpiter e Neptuno, levou por
exemplo à erupção do Monte Etna a 25 de Novembro.
No mesmo período, destaca-se também
o terramoto na ilha Terceira, nos Açores. Por outro lado, a posição de Mercúrio
e Vénus favoreceu, por exemplo, a publicação das obras de Charles Dickens,
Edgar Allan Poe e Ada Lovelace. Kierkegaard publicou, pouco meses após o
eclipse, a obra Temor e Tremor. Os
eclipses, face à sua tensão uterina de luz e sombra, tendem a provocar elementos
disruptivos. O pensamento e a arte são, por excelências, vectores de
transformação, pois nascem do que transcende o comum.
A relação do eclipse inicial da
série Saros 146 com o actual eclipse é particularmente significativa, sobretudo
se considerarmos a quadratura entre o eixo nodal do primeiro eclipse e a
posição actual dos luminares. Entre os dois temas, a par da quadratura
dragontina, os trígonos do Sol e da Lua tornam-se um intenso potencial de
sentido. Existe nestes dois eixos zodiacais (Capricórnio-Caranguejo e
Touro-Escorpião) uma qualidade, sob os desígnios eclipsais do destino e da
necessidade, que é tanto dinâmica como estruturante, conciliando o tempo e o
valor. Estendido entre a vida (Touro) e a morte (Escorpião), o valor encontra o
seu sentido, mas hoje, coberto pelo manto umbral, o sentido daquilo que tem
valor encontra-se difuso, obscurecido pelo peso do erro, da ilusão e do engano,
por esta prole que a ignorância humana criou.
Os tempos que vivemos com guerra,
com inflação e especulação, com interesses e corrupção, com populismos e
extremismos, ameaçando as democracias e os cidadãos, pervertem o valor da
dignidade humana. A ideia de que existem humanos de primeira e de segunda e de
que existem povos e terras eleitas são uma clara ameaça a nossa civilização e
ao futuro da humanidade. A sombra sobre a Lua, Júpiter e Úrano em Touro
pede-nos para repensar o planeta que habitamos e diz-nos que o direito à
propriedade não pode pesar mais que o direito à dignidade. O planeta não pode ser
um propriedade tem de ser um lar. É preciso repensar os valores do elemento
Terra. O grande trígono de Terra, entre os planetas em Touro, já indicados,
Plutão em Capricórnio e Vénus em Virgem, convida-nos a essa reflexão, não
apenas como exercício espiritual, mas também base de uma nova práxis.
Por outro lado, o facto de Saturno
em Peixes, conjunto a Neptuno, ser o astro mais alto adensa a gravidade do
destino sobre o momento. A concórdia conceptual e espiritual entre as ideias de
tempo e de totalidade fazem de Saturno em Peixes, segundo a matriz mitológica
do deus romano da agricultura, o mestre do acto de semear, esperar e colher.
Caído o manto da sombra, este é o tempo das colheitas, não das trazem os frutos
da terra, mas sim das cumprem a consequência da desmedida. O trígono de Saturno
e Neptuno em Peixes ao Sol, a Mercúrio e Marte em Escorpião, seguindo a lição
de Petosíris de que nem todos os trígonos são bons, nem todas as quadraturas
são más, consubstancia a gravidade didáctica do destino enquanto disrupção
causal da Providência.
A ὕβρις representa
uma quebra na justa medida das coisas, naquilo que ocorre como é suposto que
aconteça. A guerra representa um corte na ordem natural das coisas, pois conduz
a uma destruição que não é própria da natureza cíclica de Gaia, mas sim da
natureza humana, das suas franquezas. O terrorismo é uma outra face desta
desmedida, levando o mal que nos consome ao outro. No entanto, o mito da
violação de Alcipe, filha de Ares, por Halirrótico, filho de Posídon, mostra o
outro lado de Escorpião, ou seja, a vingança como forma de resistência e
reposição da justiça (Figueiredo, R.M. de, 2021, Fragmentos Astrológicos, 126).
Este é o mito que está na origem do Areópago. Pela ofensa cometida, Ares mata
Halirrótico. Posídon exige o julgamento e a respectiva condenação. No entanto,
Ares é absolvido, pois o seu acto foi considerado legítimo. Os tempos que
vivemos revelam esse fio ténue entre a vingança e a justiça, entre opressão e
resistência.
Neste eclipse lunar, a tensão que
ocorre no eixo Touro-Escorpião fundamenta o sentido profundo do actual manto
umbral, fazendo deste choque entre a vida e a morte, entre criação e
destruição, um elemento estruturante. Se considerarmos a relação de aspectos
nos elementos Terra e Água (trígono), aqueles que fortalecem este fenómeno
astrológico, observamos que, como um pentagrama imperfeito, existe um signo que
não é habitado por nenhum planeta. Caranguejo, como signo da origem, torna-se
agora um sinal de incompletude e isso é bastante significativo. Falta-nos hoje,
por ocultação luminar, uma matriz feminina, lunar, de sentido. O mundo, a
humanidade, devido às suas próprias escolhas, vive sem a Mãe Divina e, com o
signo de Touro obscurecido, exaltando-se a Lua na sombra, a Terra não consegue
ser Mãe.
A grande maioria das posições e
aspectos astrológicos presentes no tema do eclipse lunar já foram analisadas na
reflexão do eclipse solar, todavia, é necessário destacar a posição dos
maléficos e os seus movimentos futuros, pois, dentro do período de influência
do eclipse lunar, Saturno iniciará, a 4 de Novembro o seu movimento directo e
Marte ingressará em Sagitário a 24 do mesmo mês. A ligação entre os dois
planetas passará do trígono à quadratura, agravando assim o seu carácter
maléfico e a sua acção disruptiva. Os próximos meses vão indicar um desafio, um
trabalho severo, para a humanidade. As nossas palavras e as nossas acções, mais
do que nunca, vão determinar quem somos e para onde vamos. Estamos à beira do
abismo.
O eclipse lunar de dia 18 é o último neste ciclo nodal actual, no eixo de Touro-Escorpião. Passaremos definitivamente para o eixo Carneiro-Balança, deixando o sentido de valor para encontrar-se o sentido de identidade. No entanto, até à primeira época de eclipses de 2024, os eclipses no eixo Touro-Escorpião ainda estarão presentes, perdendo progressivamente a sua influência. O actual eclipse pela sua área geográfica de influência e pelas significações que o tema astrológico introduz vai, por força do destino e da necessidade, mas também pelo efeito da desmedida, trará desastres naturais e humanos. Sem amor e sem sabedoria, a humanidade perder-se-á.