Reflexões Astrológicas
Trânsitos e Aspectos
Conjunção Vénus – Júpiter em Caranguejo
Lisboa,06h15min, 12/08/2025
Vénus - Júpiter
Decanato: Mercúrio
Termos: Mercúrio
Monomoiria: Lua
A
conjunção de Vénus e Júpiter em Caranguejo ocorre, no seu momento exacto, com
Leão a marcar a hora para o tema de Lisboa e, deste modo, na XII, no Lugar do Mau
Destino ou Mau Espírito (κακός
δαίμων), no decanato e termos de Mercúrio e
na monomoiria da Lua. O ingresso
dá-se assim acima do horizonte e cerca de meia hora antes do nascer-do-sol. Vénus
encontra-se no seu próprio segmento (αἵρεσις) e Júpiter fora, fazendo de Vénus o
grande benéfico do tema. Podemos estabelecer também uma via ascendente que
começa no Sol, numa posição pré-ascensão, e vai até o Úrano, o astro que mais
se aproxima do Ponto de Culminação.
A conjunção Vénus-Júpiter no signo de Caranguejo é a dádiva
que vem do mar, é o canto de Ariel, mas a Ariel de Caranguejo tem cabelos de
azeviche e olhos de obsidiana. Não é a sereia pisciana da exaltação de Vénus. Na
Pequena Sereia, Ariel para andar na terra perde a voz, para andar por entre os
homens deixa de ser quem é, sujeita-se às suas regras, às suas obrigações, e
para isso deixa de ser a mulher que vem do mar, perde a integridade do próprio
corpo, transformado a pedido, por imposição do mal. O canto de Ariel é encanto
e não é nem um canto de ninguém, nem um canto para ninguém, é um canto que
ilumina o mar profundo e que toca com encanto os seus abismos.
Para quem
tenha visto a versão de animação, mais antiga, da Pequena Sereia da Disney,
lembrar-se-á que na gruta de Ariel encontra-se um quadro de Maria Madalena. A
perda da voz ou a voz roubada é um clássico do feminino agrilhoado. Na actual
conjunção, em pleno mar, Júpiter já se encontra em Caranguejo, o masculino que coexiste
com o Divino Feminino, espera a deusa anunciada, espera o encontro com Vénus.
Este elemento é particularmente importante. Sobretudo se pensarmos que Vénus
está no seu próprio segmento e Júpiter na sua exaltação. A luz espalha-se no
masculino e espalha-se por se encontrar no lugar do feminino, no lugar da Lua,
com a Deusa do Amor. Se existe um exacerbamento da dádiva de Júpiter este nasce
da presença do Divino Feminino.
Existe uma
beleza profunda no encontro dos benéficos, uma que torna qualquer tema especial,
porém, nem sempre as suas dádivas são colhidas, nem as suas bênçãos
reconhecidas. No lugar da Lua (Caranguejo), estes dons podem adquirir um valor
de mistério primordial e, por no tema de Lisboa se encontrar na XII, ganha
também um sentido de aprisionamento. O Mau Espírito ou Mau Destino envolve esta
dádiva, tentando, dada a natureza do lugar, toldar os dons do bem. No entanto,
a persistência do bem resulta daquilo que Séneca descreve do seguinte modo: “O supremo bem não admite qualquer grau
superior a si, desde que nele se contenha a virtude, e desde que a virtude não
seja diminuída pela adversidade e permaneça intacta mesmo que o corpo sofra
alguma amputação: e de facto a virtude mantém-se! É que eu concebo a virtude
como animosa e sublime, e tanto mais ardente quanto mais obstáculos encontra.”
(Ep.71.18;
Cartas a Lucílio, 2ª ed,, trad. J. A. Segurado e Campos. Lisboa, 2004:
Fundação Calouste Gulbenkian). Se o termo virtude
desagradar o leitor contemporâneo, poder-se-á utilizar a tradução do termo grego
ἀρετή, ou seja, a excelência.
A ideia de
supremo bem torna-se, de um ponto de vista astrológico, bastante expressiva na
conjunção dos benéficos. A questão que se coloca é que ele se aplica à
conjunção quando é considerado em si mesma, pois, de um ponto de vista
relativo, a persistência do bem terá de ser sempre colocada em contexto. No
entanto, as lições de Petosíris indicam que, mesmo num aspecto tenso com os
maléficos, a acção profícua dos benéficos supera, ou tende a superar, a dos
maléficos. Ora esta ideia da virtude ou da excelência como bem supremo assume,
na expressão astrológica, uma ponte de sentido entre os benéficos, por um lado,
e os luminares, por outro. É desta união da dádiva à luz que se pode alcançar o
supremo bem. A excelência astrológica terá de nascer desta relação primordial.
Contudo, a simples presença da conjunção dos benéficos torna-se um indicador,
por um lado, da dádiva e, por outro, da persistência do bem. Na distribuição de
raios a sua força, estará sempre reforçada.
Nesta
conjunção, as duas energias do bem fundem-se numa única expressão. Cada uma
contribui com a sua própria natureza e de acordo com o lugar que ocupa. Neste
caso, Caranguejo, o lugar da Lua, recebe os benéficos com os dons que lhe são
próprios. O lado materno de Caranguejo é diferente do lado materno, por
exemplo, de Touro que representa a Mãe Terra. Caranguejo é a Lua como mãe, é a
Mãe Divina, a luz do feminino iluminando o céu em cada um das suas faces.
Quando os planetas ocupam um lugar, os deuses estão ali, estão de passagem e
fixam-se nessa morada. Afrodite e Zeus ou Vénus e Júpiter estão no lugar da Lua,
da Mãe Divina. Ora isto remete-nos para Séneca quando diz que “Os deuses não nos desprezam nem invejam,
antes nos admitem à sua presença e nos estendem a mão para ajudar-nos a subir!
Admiras-te que um homem possa ascender à presença dos deuses? A divindade é que
vem até junto dos homens e mesmo, para lhes ficar mais próxima, penetra até ao
interior dos homens, pois sem a presença divina não é possível existir a
virtude! As sementes divinas existem dispersas no corpo humano: se forem
tratadas por quem as saiba cultivar, elas crescerão à semelhança da sua origem,
desenvolver-se-ão em plano idêntico ao da divindade de que provieram; mas se
caírem nas mãos de um mau cultivador então este, tal como um terreno estéril e
pantanoso, matá-las-á, produzindo ervas daninhas em vez de searas.” (Ep.73.15-6; Cartas a Lucílio, 2ª ed,,
trad. J. A. Segurado e Campos. Lisboa, 2004: Fundação Calouste Gulbenkian).
Se considerarmos um tema astrológico, onde os deuses se
encontram é lá que se encontram as suas sementes. Um tema que receba a
conjunção dos benéficos, seja ele natal ou mundano, será sempre um com uma dimensão
especial de dádivas. Quem quer que conheça alguém nascido com esta conjunção,
verá que se encontra ali alguém que tem algo para dar. As bênçãos do bem não se
guardam para si. Vénus e Júpiter, unidos num tema, pedem uma distribuição do
bem, ou seja, a luz recebida deve ser devolvida de acordo com os dons que
receberam. O bem recebido não se esgota em si mesmo. Pelo contrário, cresce
como semente e torna-se uma árvore robusta, uma que entregará ao mundo os
frutos e as futuras sementes. Segue o caminho do bem e lá encontrarás as suas
dádivas. Nesse caminho, encontrarás o tesouro.
Ora na actual conjunção Vénus-Júpiter firma-se e
evidencia, de forma facilmente observável, uma predominância do númen feminino.
O Divino Feminino é, neste momento, uma luz que se vê, que surge erguida sob o
horizonte, anunciada, como proposta de transformação da humanidade. Pelo facto,
da conjunção se fixar em Caranguejo, o lugar da Lua, esse já seria por si só um
anúncio, mas os elementos não se reduzem a essa determinação. Vénus e Júpiter
em Caranguejo unem-se triangularmente à Lua e à Caput Draconis em Peixes. Do lugar da exaltação de Vénus e do domicílio
de Júpiter, a Lua e o Dragão da Lua vão contribuir e consubstanciar a expressão
do Divino Feminino nesta efeméride. Porém, não nos devemos esquecer que para o
tema de Lisboa os lugares não favorecem nem a conjunção, nem a união
triangular, pois a conjunção cai na XII e a Lua e Caput Draconis encontra-se na VIII, no lugar da Morte.
Existem também outros dois elementos de tensão que atacam
este prenúncio escatológico do Divino Feminino. Os maléficos fixam
quadrangularmente o seu olhar na conjunção dos benéficos. Marte em Balança e
Saturno (e Neptuno) em Carneiro criam dois aspectos de tensão a Vénus e Júpiter
em Caranguejo. O eixo da identidade (Carneiro-Balança) revela a dificuldade de
receber a transformação que representa o númen do Divino Feminino. Existe uma
resistência, uma oposição declarada ao elemento transformativa, ou seja, a
humano teme a desintegração da identidade e a imersão na origem. É como se a
humanidade revelasse colectivamente o medo do útero divino, o que não é difícil
de apreender dada a misoginia em que estamos envolvidos. O númen feminino tem
sido sempre alvo de oposição, de resistência. No entanto, relembrando Séneca e
Petosíris, existe, por um lado, a prevalência do bem supremo e, por outro, a
persistência dos benéficos, daí resulta a conclusão de que; apesar destes
elementos restritivos, o Divino Feminino fará o seu caminho pelo menos até
aqueles que o queiram receber.
Os elementos de tensão devem ser assim considerados de
forma distinta e específica. Saturno e Neptuno em Carneiro revelam como a práxis de uma identidade, enraizada em
estruturadas patriarcais cristalizadas e em elementos espirituais
preconceituosos que ainda persistem, tende a rejeitar a integração do númen
feminino. Saturno e Neptuno em Carneiro são uma oportunidade humana de
transformação, por meio da acção, de estruturas caducas, porém, a natureza humana
tende a resistência. Esta quadratura à conjunção dos benéficos apresenta-nos a
base dessa fortaleza dogmática. Por outro lado, mas consequentemente, a
quadratura de Marte em Balança à conjunção é bom exemplo da força debilitada,
uma força (Marte) erguida a partir das deficientes estruturas relacionais do
humano (Balança), como promotora de uma violência estrutural contra o feminino
e contra a mulher. Os nossos tempos, a realidade sombria que vivemos, continua
a ser absurdamente perigosa para uma mulher. A transformação a partir do Divino
Feminino vem contrariar a continuidade desse padrão destrutivo.
Aos raios quadrangulares, lançados a partir de Carneiro e
Balança até à conjunção dos benéficos, podemos juntar também a quadratura entre
a Lua e a Caput Draconis em Peixes e
Úrano em Gémeos. Neste elemento de tensão, face à proposta considerada pela
conjunção, vai encontrar-se uma dificuldade de conciliar as estruturais
comunicacionais da sociedade contemporânea, baseadas numa expressão líquida e
informe, e a profundidade espiritual de integração na totalidade imersiva de
uma deusa sob a água e que dá à costa. A racionalidade dedutiva, por um lado, e
a ausência de profundidade, por outro, apresenta-se como um sério obstáculo
aquilo que é proposto pela conjunção e pela sua relação com a Lua e com o seu Dragão.
Existe assim uma barreira de discurso ou de entendimento desse discurso à
proposta de transformação desta co-presença dos benéficos.
Paralelamente, sob um traço astrológico da aversão, Sol e
Mercúrio em Leão apresenta uma outra mensagem que, na verdade, se relaciona com
aquela que a conjunção quer transmitir. Quando o Sol em Leão alcança o melhor
de si, ultrapassando as pulsões narcísicas que lhe são inatas, chega àquilo que
se pode designar de nobreza da alma e com Mercúrio promove a nobreza do
discurso. Existe, porém, uma raridade neste estágio leonino, uma que não
chegará a todos por determinação geral, e que também não se limita ao Sol ou a
Mercúrio, abrangendo também outros planetas ou pontos astrológicos. A proposta
do melhor de Leão servirá, por exemplo, para atenuar a acção deletéria dos
maléficos. A união em trígono a Saturno (e Neptuno) e em sextil a Marte, os
dois em separação, faz do Sol e de Mercúrio os arautos de uma transformação
através do carácter.
A oposição do Sol e Mercúrio em Leão a Plutão vai adensar
esta proposta transformativa. Plutão traz o Memento
Mori à nobreza da alma. Alguém com uma alma nobre trará sempre si a
sabedoria de que se vai morrer. A presença tangível da morte permite que se dê
valor à vida. Os tolos que pensam que não vão morrer não dão valor a nada. O Memento Mori como semente plutoniana vai
contrariar a acção dos maléficos, relativizando a sua influência e mostrando-nos
que devemos colocar as nossas preocupações naquilo que controlamos e não em
eventos externos. A morte como lição tem o poder de exercer um processo de reductio, ou seja, devemos estabelecer
como lição essa redução ao essencial, àquilo que contribui para o
estabelecimento de uma via transformativa.
Em 2025, a conjunção entre Vénus e Júpiter em Caranguejo
vai trazer aquele que pode ser entendido como o dom ou a dádiva que neste ano
se anuncia. O Divino Feminino surge acima do horizonte, como estrela que guia,
como luz no caminho. Se utilizarmos como unidade simbólica o tema de lisboa,
vemos que o Sol ainda não nasceu e que Vénus e Júpiter ascendem acima do
horizonte. Nesse amanhecer olissiponense, os benéficos são Estrelas da Manhã,
guias de uma luz que rompe a escuridão. A permanência e persistência do bem é
algo que deve estar sempre presente, lembrando-nos que onde está o tesouro,
está a transformação. Na subida para o templo, é o amor que nos salvará e a
deusa do amor indicar-nos-á o caminho.

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