Reflexões Astrológicas
Lua Nova em Balança
Lisboa, 22h54min, 25/09/2022
Sol-Lua
Decanato: Lua
Termos: Saturno
Monomoiria: Lua
A Lua Nova de Setembro ocorre no signo de
Balança, com Gémeos a marcar a hora para o tema de Lisboa, com a Marte
co-presente no Leme da Vida (I), e assim na V, no Lugar do Boa Fortuna (ἀγαθή τύχη),
no decanato da Lua, termos de Saturno e na monomoiria
da Lua. A sizígia dá-se, desta forma, abaixo do horizonte e cerca de três horas
e meia após o pôr-do-sol. O Sol encontra-se desfavorecido por estar fora do seu
próprio segmento de luz (αἵρεσις) e
no decanato da Lua, já a Lua colhe as bênçãos da noite, embora esteja no signo masculino.
As qualidades lunares estão assim acentuadas neste novilúnio.
Na
Lua Nova de Virgem, abordámos a atribuição do princípio da Justiça a Virgem e
da sua busca a Balança, ou seja, o primeiro é o templo da Deusa da Astreia e o
segundo o modo de lá chegar. Existe, neste signo, um carácter de busca, de
demanda, o que torna compreensível que seja designado como o lugar do outro.
Existe, neste signo, o fundamento de uma alteridade radical que se efectivar,
ou seja, este não é o lugar onde o eu e o outro se unem numa totalidade, sob a
graça, por exemplo, da compaixão, este é sim o lugar onde a passagem para o
outro se apresenta no caminho, sem que para isso seja atravessada. Esta é uma
proposta, uma sugestão de harmonia e completude. Porém, sendo este o domicílio
diurno de Vénus, um planeta nocturno, o princípio do desejo pode impedir a travessia.
Epitecto,
nas Diatribes, revela-nos essa
dificuldade de ser o eu no outro e o outro em nós, isto é, como ser diferente e
semelhante ao mesmo tempo: “É-te preciso
reflectir como não ser dissemelhante dos outros seres humanos, do mesmo modo
que uma linha não deseja possuir nada de singular em relação às outras linhas.
Mas eu desejo ser a linha púrpura, aquela pequena e brilhante, causa das demais
se mostrarem graciosas e belas.” (I.2, 17-18, trad. Dinucci, 54-5.
Coimbra, 2020: IUC). O
filósofo estóico adverte que, apesar de se ser semelhante, pode-se ser aquilo
que, em comunhão, leva o melhor aos outros, tornando-nos todos essa imagem de
excelência. O semelhante pode atrair o semelhante, mas convém que a semelhança
que une seja a luz e não a sombra, a virtude e não o vício.
Um
novilúnio em Balança coloca, desta forma, a luz numa ponte de harmonia entre a
unidade na diferença e a partilha do
comum. Devemos, porém, colocar a pergunta do porquê de ser tão raro encontrar o
valor da abnegação neste signo. A razão prende-se ao facto de que, quando se
observa uma estrutura axial entre o eu e o outro, o efeito espelho torna-se
mais expressivo, ou seja, o eu que quer chegar ao outro leva consigo as
tendências narcísicas de uma impossibilidade de ser o eu no outro sem o próprio
eu se tornar o si. Sem o processo de ensimesmamento, o eu não se consegue
colocar no lugar do outro e essa é também a razão astrológica de Balança ser o
primeiro signo da segunda parte do caminho zodiacal.
Dante,
nos primeiros versos da Divina Comédia, diz-nos isso mesmo: “No meio do caminho em nossa vida,/eu me encontrei por uma selva escura/ porque a direita via era perdida.” (Inferno, I, 1-3,
trad. V. Graça Moura. Venda Nova, 2000: Bertrand Editora). Ora se associarmos os versos do
Fiorentino ao caminho zodiacal, percebemos que, depois de Virgem, depois de
Beatriz, o caminho sem o outro está perdido. Balança encontra-se nessa selva escura, porque, sem a amada, a via
direita, até Peixes, até ao cume do céu, está perdida. Dante precisa, para
recuperar o caminho perdido e avançar pelo Inferno e pelo Purgatório até ao
Paraíso, do “amor que move o céu e as mais
estrelas” (Paraíso,
XXXIII, 145) e esse é o amor da
totalidade que encontrará quando chegar a Peixes (exaltação de Vénus) e então
renascerá, como um novo humano, de novo, em Carneiro.
Neste
novilúnio, por a sizígia se encontrar, para o tema de Lisboa, abaixo do
horizonte, a luz ganha uma dimensão obscura e esta proposta de harmonia e
concórdia torna-se mais difícil. No entanto, por se encontrar no lugar da Boa
Fortuna (V), o Corno de Amalteia verte sobre a luz a dádiva da Fortuna. O
destino opera na luz, na luz oculta sob o horizonte, esse potencial de graça.
No
entanto, por ser uma luz que não se vê, uma candeia escondida sob o manto do
sábio, as obras do destino tendem a escapar à espuma dos dias. E, como já
observámos na reflexão do Equinócio de Outono, o trígono de Ar que une a
sizígia dos luminares em Balança a Saturno Retrógrado em Aquário e a Marte em
Gémeos coloca, agora com a luz do Pai e da Mãe reunidas, o peso dos maléficos e
a gravidade da destruição sobre o númen da realidade, sobre o seu potencial.
Esta
dinâmica estruturante do elemento Ar, embora disruptiva, concilia-se, de um
modo que transforma pela destruição, com a oposição da sizígia a Júpiter em
Carneiro e com a quadratura deste a Plutão em Capricórnio. A luz e a harmonia,
o espaço e a justiça e a morte e a transformação reúnem, num sentido profundo,
uma destruturação da realidade que conhecemos e que precisamos de mudar,
fixando sobre ela uma nova representação.
Lembremo-nos,
porém, do braço da cruz que se encontra vazio, pois é nele que se firma a parte
significativa do que falta estruturar. Caranguejo, o signo da origem, converge estas
relações diametrais e angulares na Grande Mãe, no Divino Feminino. Neste caso,
a sua restauração sobre a realidade espiritual nasce da angústia da ausência e
da urgência do renascimento. A verdade levanta o seu véu com uma afinidade
electiva da origem.
No submundo, naquilo que não se véu,
estabelece-se, por outro lado, um caminho que vai da Cauda Draconis até ao Ponto Subterrâneo (IC) e nessa serpente
ctónica estende-se a luz da sizígia em Balança e, como porta-estandartes da
aurora esperada, Mercúrio e Vénus em Virgem. Estes são agora o vértice
fundamental do outro trígono estruturante. No elemento Terra, unem-se Mercúrio
e Vénus em Balança, Úrano e a Caput
Draconis em Touro e Plutão em Capricórnio.
Este
é o triângulo que reforma as estruturas de valor, que revela o pior das obras
humanas e que conduz, sob a égide do Destino, ao desapego e à importância do
essencial, relembrando que nada está adquirido e que o direito a uma vida digna
continua a ser algo pelo qual temos de lutar. A quadratura de Saturno em
Aquário, o grande maléfico do tema, a Úrano em Touro e ao Dragão da Lua (eixo
Escorpião-Touro) serve assim de aviso para o peso da Necessidade sobre as
estruturas humanas de valor. Algo que é compensado pelo sextil de Saturno em
Aquário a Carneiro em Júpiter. A retrogradação de ambos torna a liberdade
reflexiva e potencia a possibilidade de servir a verdade e a necessidade, a
justiça e o tempo. O sextil de Júpiter e Marte pode trazer também o impulso da
justiça e a força da verdade.
De
uma outra forma, a Palavra (Mercúrio) e o Amor (Vénus, o grande benéfico)
assumem-se como baluartes da Deusa Astreia (Virgem) que é violentamente
renegada em pensamentos e discursos (quadratura de Marte em Gémeos) e numa
total ausência de solidariedade e compaixão (oposição de Neptuno em Peixes). A Justiça
– ou a Sabedoria – continua a caminhar pelo mundo, mas não é vista, e quando é
reconhecida, é rejeitada e vilipendiada, insultada e violentada.
Neste
novilúnio em Balança, esta é a Harmonia da Verdade que os egos, cheios do seu próprio
reflexo e crentes naquilo que julgam conhecer, cismam em negar, como Pedro
negando Jesus, sobretudo porque o medo habita os seus corações. Aqueles que
rejeitam a Sabedoria temem que, ao reconhecê-la, se tornem eles próprios
desconhecidos. É o medo de sair de si e tornar-se silêncio, de esvaziar-se e imergir
num todo que está muito para além de uma reunião das partes.
A passagem do eu para o outro, cruzando a impossibilidade e criando, na via do ensimesmamento, uma integração na totalidade, contribui, neste novilúnio, com o alimento da concórdia, da unidade do comum. Será necessário trazer para a luz, dando claridade ao pensamento, uma mensagem que pede por equilíbrio e paz, por uma humanidade que seja também o reconhecimento do outro. Esta a luz da Lua Nova em Balança.
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