sábado, 24 de setembro de 2022

Reflexões Astrológicas 2022: Lua Nova em Balança

 Reflexões Astrológicas


Lunações 



Lua Nova em Balança

Lisboa, 22h54min, 25/09/2022

 

Sol-Lua

Decanato: Lua

Termos: Saturno

Monomoiria: Lua 

 


   A Lua Nova de Setembro ocorre no signo de Balança, com Gémeos a marcar a hora para o tema de Lisboa, com a Marte co-presente no Leme da Vida (I), e assim na V, no Lugar do Boa Fortuna (ἀγαθή τύχη), no decanato da Lua, termos de Saturno e na monomoiria da Lua. A sizígia dá-se, desta forma, abaixo do horizonte e cerca de três horas e meia após o pôr-do-sol. O Sol encontra-se desfavorecido por estar fora do seu próprio segmento de luz (αἵρεσις) e no decanato da Lua, já a Lua colhe as bênçãos da noite, embora esteja no signo masculino. As qualidades lunares estão assim acentuadas neste novilúnio.

   Na Lua Nova de Virgem, abordámos a atribuição do princípio da Justiça a Virgem e da sua busca a Balança, ou seja, o primeiro é o templo da Deusa da Astreia e o segundo o modo de lá chegar. Existe, neste signo, um carácter de busca, de demanda, o que torna compreensível que seja designado como o lugar do outro. Existe, neste signo, o fundamento de uma alteridade radical que se efectivar, ou seja, este não é o lugar onde o eu e o outro se unem numa totalidade, sob a graça, por exemplo, da compaixão, este é sim o lugar onde a passagem para o outro se apresenta no caminho, sem que para isso seja atravessada. Esta é uma proposta, uma sugestão de harmonia e completude. Porém, sendo este o domicílio diurno de Vénus, um planeta nocturno, o princípio do desejo pode impedir a travessia. 

   Epitecto, nas Diatribes, revela-nos essa dificuldade de ser o eu no outro e o outro em nós, isto é, como ser diferente e semelhante ao mesmo tempo: “É-te preciso reflectir como não ser dissemelhante dos outros seres humanos, do mesmo modo que uma linha não deseja possuir nada de singular em relação às outras linhas. Mas eu desejo ser a linha púrpura, aquela pequena e brilhante, causa das demais se mostrarem graciosas e belas.” (I.2, 17-18, trad. Dinucci, 54-5. Coimbra, 2020: IUC). O filósofo estóico adverte que, apesar de se ser semelhante, pode-se ser aquilo que, em comunhão, leva o melhor aos outros, tornando-nos todos essa imagem de excelência. O semelhante pode atrair o semelhante, mas convém que a semelhança que une seja a luz e não a sombra, a virtude e não o vício.    

   Um novilúnio em Balança coloca, desta forma, a luz numa ponte de harmonia entre a unidade na diferença e a partilha do comum. Devemos, porém, colocar a pergunta do porquê de ser tão raro encontrar o valor da abnegação neste signo. A razão prende-se ao facto de que, quando se observa uma estrutura axial entre o eu e o outro, o efeito espelho torna-se mais expressivo, ou seja, o eu que quer chegar ao outro leva consigo as tendências narcísicas de uma impossibilidade de ser o eu no outro sem o próprio eu se tornar o si. Sem o processo de ensimesmamento, o eu não se consegue colocar no lugar do outro e essa é também a razão astrológica de Balança ser o primeiro signo da segunda parte do caminho zodiacal.

   Dante, nos primeiros versos da Divina Comédia, diz-nos isso mesmo: “No meio do caminho em nossa vida,/eu me encontrei por uma selva escura/ porque a direita via era perdida.” (Inferno, I, 1-3, trad. V. Graça Moura. Venda Nova, 2000: Bertrand Editora). Ora se associarmos os versos do Fiorentino ao caminho zodiacal, percebemos que, depois de Virgem, depois de Beatriz, o caminho sem o outro está perdido. Balança encontra-se nessa selva escura, porque, sem a amada, a via direita, até Peixes, até ao cume do céu, está perdida. Dante precisa, para recuperar o caminho perdido e avançar pelo Inferno e pelo Purgatório até ao Paraíso, do “amor que move o céu e as mais estrelas” (Paraíso, XXXIII, 145) e esse é o amor da totalidade que encontrará quando chegar a Peixes (exaltação de Vénus) e então renascerá, como um novo humano, de novo, em Carneiro.

   Neste novilúnio, por a sizígia se encontrar, para o tema de Lisboa, abaixo do horizonte, a luz ganha uma dimensão obscura e esta proposta de harmonia e concórdia torna-se mais difícil. No entanto, por se encontrar no lugar da Boa Fortuna (V), o Corno de Amalteia verte sobre a luz a dádiva da Fortuna. O destino opera na luz, na luz oculta sob o horizonte, esse potencial de graça.

   No entanto, por ser uma luz que não se vê, uma candeia escondida sob o manto do sábio, as obras do destino tendem a escapar à espuma dos dias. E, como já observámos na reflexão do Equinócio de Outono, o trígono de Ar que une a sizígia dos luminares em Balança a Saturno Retrógrado em Aquário e a Marte em Gémeos coloca, agora com a luz do Pai e da Mãe reunidas, o peso dos maléficos e a gravidade da destruição sobre o númen da realidade, sobre o seu potencial.

   Esta dinâmica estruturante do elemento Ar, embora disruptiva, concilia-se, de um modo que transforma pela destruição, com a oposição da sizígia a Júpiter em Carneiro e com a quadratura deste a Plutão em Capricórnio. A luz e a harmonia, o espaço e a justiça e a morte e a transformação reúnem, num sentido profundo, uma destruturação da realidade que conhecemos e que precisamos de mudar, fixando sobre ela uma nova representação.

   Lembremo-nos, porém, do braço da cruz que se encontra vazio, pois é nele que se firma a parte significativa do que falta estruturar. Caranguejo, o signo da origem, converge estas relações diametrais e angulares na Grande Mãe, no Divino Feminino. Neste caso, a sua restauração sobre a realidade espiritual nasce da angústia da ausência e da urgência do renascimento. A verdade levanta o seu véu com uma afinidade electiva da origem.   

   No submundo, naquilo que não se véu, estabelece-se, por outro lado, um caminho que vai da Cauda Draconis até ao Ponto Subterrâneo (IC) e nessa serpente ctónica estende-se a luz da sizígia em Balança e, como porta-estandartes da aurora esperada, Mercúrio e Vénus em Virgem. Estes são agora o vértice fundamental do outro trígono estruturante. No elemento Terra, unem-se Mercúrio e Vénus em Balança, Úrano e a Caput Draconis em Touro e Plutão em Capricórnio.

   Este é o triângulo que reforma as estruturas de valor, que revela o pior das obras humanas e que conduz, sob a égide do Destino, ao desapego e à importância do essencial, relembrando que nada está adquirido e que o direito a uma vida digna continua a ser algo pelo qual temos de lutar. A quadratura de Saturno em Aquário, o grande maléfico do tema, a Úrano em Touro e ao Dragão da Lua (eixo Escorpião-Touro) serve assim de aviso para o peso da Necessidade sobre as estruturas humanas de valor. Algo que é compensado pelo sextil de Saturno em Aquário a Carneiro em Júpiter. A retrogradação de ambos torna a liberdade reflexiva e potencia a possibilidade de servir a verdade e a necessidade, a justiça e o tempo. O sextil de Júpiter e Marte pode trazer também o impulso da justiça e a força da verdade.      

   De uma outra forma, a Palavra (Mercúrio) e o Amor (Vénus, o grande benéfico) assumem-se como baluartes da Deusa Astreia (Virgem) que é violentamente renegada em pensamentos e discursos (quadratura de Marte em Gémeos) e numa total ausência de solidariedade e compaixão (oposição de Neptuno em Peixes). A Justiça – ou a Sabedoria – continua a caminhar pelo mundo, mas não é vista, e quando é reconhecida, é rejeitada e vilipendiada, insultada e violentada.

   Neste novilúnio em Balança, esta é a Harmonia da Verdade que os egos, cheios do seu próprio reflexo e crentes naquilo que julgam conhecer, cismam em negar, como Pedro negando Jesus, sobretudo porque o medo habita os seus corações. Aqueles que rejeitam a Sabedoria temem que, ao reconhecê-la, se tornem eles próprios desconhecidos. É o medo de sair de si e tornar-se silêncio, de esvaziar-se e imergir num todo que está muito para além de uma reunião das partes.

   A passagem do eu para o outro, cruzando a impossibilidade e criando, na via do ensimesmamento, uma integração na totalidade, contribui, neste novilúnio, com o alimento da concórdia, da unidade do comum. Será necessário trazer para a luz, dando claridade ao pensamento, uma mensagem que pede por equilíbrio e paz, por uma humanidade que seja também o reconhecimento do outro. Esta a luz da Lua Nova em Balança. 

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