quinta-feira, 18 de novembro de 2021

Eclipse Lunar Parcial (Lua Cheia: Eixo Touro – Escorpião): Reflexões Astrológicas

Reflexões Astrológicas

Eclipses



Eclipse Lunar Parcial

 (Lua Cheia: Eixo Touro – Escorpião)

Lisboa, 08h 57min 26s, 19/11/2021

 

Lua

Decanato: Saturno

Termos: Marte

Monomoiria: Júpiter

 

Sol

Decanato: Vénus

Termos: Saturno

Monomoiria: Sol

 

            O eclipse lunar parcial de 4 de Novembro é o último eclipse lunar de 2021, o último eclipse lunar parcial de eixo nodal Gémeos-Sagitário, tendo o eclipse de 25 de Maio sido o último eclipse lunar total. Por outro lado, o eclipse de dia 4 de Novembro é o primeiro de um conjunto de eclipses no eixo Touro-Escorpião. Este eclipse pertence à série Saros 126 e nesta é o primeiro eclipse parcial da segunda fase, ou seja, daquela que se segue aos eclipses totais. Na série Saros 126, os eclipses principais, aqueles que marcam o início ou o fim de uma fase, indicam uma posição lunar que ocorre essencialmente em signos de Ar, Terra e Fogo. Existe uma ausência significativa da Água nas posições lunares dos principais eclipses desta série, revelando como o potencial criativo, imaginativo e artístico é menor. O princípio de vida encontra-se comprometido, porque a Água é condição de vida, daí que a fome e a guerra marquem esta série Saros.

            O primeiro eclipse da série ocorreu a 18 de Julho de 1228 (CJ), com a Lua em Aquário. Ora o último eclipse da série dá-se a 19 de Agosto de 2472, novamente com a Lua em Aquário. O signo do humano e da humanidade surge com uma luz eclipsada, ou seja, não colhe a luz solar, o espírito do intelecto agente. E, com a Lua em Aquário, não consegue colher a excelência (ἀρετή) da individualidade leonina. Se considerarmos o exemplo do primeiro eclipse da série Saros 126, compreendemos que, nesse momento, o mundo e, em especial, a Ásia passava por grandes transformações. Genghis Khan morrera no ano anterior (18/08/1227) e, no período que se segue, o império mongol será dividido em quatro canatos. Por outro lado, dois dias antes do eclipse de 1228, São Francisco de Assis é canonizado pelo Papa Gregório IX. Ora no tema deste eclipse, Neptuno em Touro está em trígono a Vénus e Plutão em Virgem. O voto de pobreza e a ligação à natureza e aos animais marcam a vida de São Francisco, bem como este aspecto. Convém também salientar-se, a respeito deste eclipse, que, em 1228, Saturno encontrava-se em Aquário tal como hoje se encontra, o que, juntamente com a posição lunar que fixa o início e o fim da série Saros, concede um sentido profundo ao potencial humano do aguadeiro.

            O fim da primeira fase penumbral da série Saros 126 ocorre com o eclipse de 13 de Março de 1607. Este eclipse, tal como o primeiro da primeira fase parcial, a 24 de Março de 1625, serve para mostrar como existe um denominador geográfico, que se estende até hoje, na extensão da sombra, ou seja, na visibilidade do eclipse. Em 1607, é criada, na Virgínia, a colónia britânica de Jamestown e, em 1625, é fundada a Nova Amesterdão, também na América do Norte, pela Companhia Holandesa das Índias Ocidentais. De outro modo, na península malaia, em 1607, Iskandar Muda torna-se sultão de Achém e lança uma ofensiva naval pelo território indonésio, hostilizando, por exemplo, Malaca, controlada pelos portugueses. Já em 1625, o sultão Anyakrakusuma, conhecido por Agung, conquista Surabaya, a sua maior rival na Java Oriental. Existe portanto nestes eclipses um espírito invasor e de domínio da terra. 

            A significação histórico-geográfica destes eclipses estende-se até ao primeiro eclipse total da série Saros, a 19 de Junho de 1769. Neste ano, os missionários espanhóis estabelecem vinte e uma missões na Califórnia e, em Bengala, inicia-se um período de fome que se estenderá até 1773 e matará um terço da população. Já os eclipses que na fase total merecem maior atenção, tanto em magnitude como extensão espacial, são os 1805, 1823, 1841 e 1859. Nestes devem ser assinalados os eventos ligados às guerras napoleónicas (a criação da Terceira Coligação e a Batalha de Austerlitz), às lutas liberais (rebelião do Conde de Amarante e a Vilafrancada), à independência do Brasil (tensão entre D. Pedro I do Brasil e a Assembleia Constituinte e a coroação de D. Pedro II como imperador do Brasil). Só o eclipse de 1859 é que revela uma tendência que não é tão político-militar, pois na véspera do eclipse é criada a Igreja Presbiteriana do Brasil e, nesse ano, é publicada a Origem das Espécies de Darwin e iniciada a construção do Canal do Suez. No entanto, a componente de tensão política e bélica é reforçada no último eclipse total da série, a 9 de Novembro de 2003. Nesse ano, o facto de maior relevo é a invasão do Iraque (19 de Março), iniciada na Cimeira das Lajes (16 de Março), e que culminará com a captura de Saddam Hussein a 13 de Dezembro.

            A Lua em Touro, segundo as lições de Vétio Valente (Antologia I, 2), vai reger as regiões da Média (o actual noroeste do Irão, o Azerbaijão, o Curdistão Iraniano e o Tabaristão ou Mazandarão), da Cítia (Irão, mas também uma área que se estendeu da Bulgária às fronteiras da Rússia, Mongólia e China), do Chipre, da Arábia, da Pérsia e das montanhas do Cáucaso, da Samártia (junto à Média), de África, de Elymais ou Elamais (Cuzistão, província do Irão), de Cartago, da Arménia, da Índia e da Germânia. Já no que concerne ao Sol em Escorpião, Valente diz-nos que este rege Metagonitis ou Numídia (Norte de África, Argélia e Tunísia), a Mauritânia, a Getúlia (Norte de África, Argélia e Tunísia), a Síria, Comagena (Ásia Menor), a Capadócia, Itália, Cartago, Líbia, Amom (Jordânia), Sicília, Espanha e Roma. Finalmente, com um olhar a partir de Lisboa - elegido aqui como ὁμφαλός, umbigo do mundo -, Sagitário marca a hora e rege a Etrúria (Itália), Gália (França), Espanha, Arabia Felix (Iémen e Omã), Cilícia, Creta, Sicília, Itália, Chipre, o Mar Vermelho, Casperia, as nações junto ao Eufrates, Mesopotâmia, Cartago, Mar da Líbia, o Adriático, o Atlântico, os Tribálios (povo ilírio ou trácio), a Báctria (Afeganistão, Tajiquistão, Uzbequistão, Paquistão e China), o Egipto e as regiões circundantes. Estas áreas, juntamente com o mapa da visibilidade do eclipse, mostram-nos as regiões onde o eclipse exercerá uma maior influência.

            O eixo do eclipse lunar coloca a Lua sob o horizonte, fora do Segmento de Luz (αἵρεσις) dominante, no Lugar da Má Fortuna (κάκη τύχη), a VI, no decanato de Saturno, termos de Marte e monomoiria de Júpiter. Já o Sol, renascido após a hora de alba, surge no seu próprio Segmento de Luz, no Lugar do Mau Espírito (κακός δαίμων), a XII, no decanato de Vénus, termos de Saturno e monomoiria do Sol. Convém ainda, a respeito dos luminares, destacar o facto de a Lua estar em conjunção com a estrela Algol. Ora esta é a estrela que os antigos consideravam a mais maléfica. Ptolomeu, na Syntaxis ou Almagesto (VII, 5), diz-nos que, na constelação de Perseu, esta é a estrela mais brilhante da cabeça da Górgona. Curiosamente, a estrela Algol que passou a representar o lado demoníaco do feminino – infelizmente não com raiz original do termo δαίμων – surge aqui, não no grau, mas no signo de exaltação da Lua (Touro).  

            A Medusa, bem como Lilith, é a persona mitológica que rege esta estrela, trazendo necessariamente consigo – e sem ser ainda um fenómeno psíquico, embora acabe por o ser – o medo do feminino. Aqui não estamos diante da Grande-Mãe, encontramos sim o feminino selvagem, guerreiro, independente, sexual. Note-se que a Medusa, a única das três Górgonas que era mortal, reconhecida pela sua beleza e o seu cabelo, é castigada por Atena, por ter copulado com Poseídon no templo da deusa. Contudo, o que nem sempre se diz é que a união sexual não foi consensual. Medusa foi violada pelo deus. E insultada pela cópula, Atena, a deusa sem mãe, torna Medusa num ser horrifico, com um cabelo serpentino e um olhar petrificante. Desta forma, quando Perseu vence o monstro feminino, decapitando-o, saem dele o cavalo alado Pégaso e Crisaor, o gigante de espada de ouro, ambos filhos de Posídon e Medusa. Este mito, aliás como aquele que descreve a primeira mulher de Adão, aquela que rejeita a submissão sexual, impõe, por força do paradigma dominante, uma certa hostilidade para com o feminino. A astrologia não se pode pois fixar no arquétipo dominante, negando ou ignorando a realidade que se oculta. As significações têm de evoluir e aceitar que muitos dos conceitos estão excessivamente masculinizados.

            O medo do feminino, resultante aqui da conjunção da Lua em Touro eclipsada com a estrela Algol, mas também pela oposição de Mercúrio, Marte e naturalmente do Sol, todos no signo de Escorpião, firma um fenómeno que se expressa tanto no inconsciente pessoal como colectivo, e ainda nas relações pessoais, sociais, políticas e empresariais. A mulher e a Terra-Mãe continuarão a ser assim um alvo da brutalidade humana. A morte fixa assim o seu olhar sobre a vida. Num eclipse lunar, com Marte em Escorpião e a Lua em Touro, conjunta a Algol, o feminino selvagem, a feiticeira e a sedutora, bem como o lado mais violento da natureza, estarão potenciados e vão marcar um período de influência que vai dominar os próximos meses. Acerca do período da influência de um eclipse devemos relembrar a lição de Ptolomeu na sua Apotelesmática ou Tetrabiblos (II, 6), ou seja, até ao limite Abril ou Maio de próximo ano, variante consoante o lugar, este eclipse tornar-se-á presente e afectará assim lugares e gentes.

            Um outro aspecto que sobressai na análise do tema é o facto de não existir uma luz a culminar. Com a excepção do Sol, de Mercúrio e de Marte em Escorpião, na XII, todos os astros estão abaixo do horizonte, submersos na luz oculta. Ora esta situação faz de Marte a primeira luz a ascender. No entanto, pelo Segmento de Luz dominante ser o do Sol, Marte torna-se o maléfico fora de segmento, aquele cujo potencial maligno se encontra potenciado. Este, juntamente com o Sol e Mercúrio, une-se em quadratura a Júpiter e Saturno em Aquário, na III, no Lugar da Deusa. A discórdia ou tensão deste encontro leva a morte ao humano, corrompe a palavra e a comunicação. Mercúrio e Marte que são Estrelas da Manhã, tocados pelos raios do Sol, não conseguem colher o espírito ascendente do seu raiar na aurora, porque Júpiter e Saturno não lhes dão matéria e forma, espaço e tempo. O velho e o novo senhor do Olimpo criam uma tensão com o eixo do plenilúnio, com o eclipse lunar. No signo da humanidade, o humano não vê, nem com os olhos, nem com o espírito, a luz do Sol e da Lua.  

            É quando tudo parece escuro, indeterminando e incerto que temos de encontrar a dádiva, a bênção do céu e da terra. Júpiter, o benéfico potenciado pelo Segmento de Luz, embora esteja sobre tensão luminar, colhe a bênção de estar em conjunção com Sadalsuud, uma estrela fixa que, para a astrologia árabe, é um sinal de ventura e fortuna. Quando uma sombra se alonga, existe sempre no humano uma candeia que se ergue. O trígono de Júpiter à Caput Draconis e o sextil à Cauda une esse potencial de luz ao sentido profundo do Dragão da Lua, aquele que no eixo Gémeos-Sagitário leva, como se fosse uma mensagem, a Sabedoria à Palavra. Por outro lado, Vénus, fora do seu Segmento de Luz, constrói o seu poder no signo que lhe dá forma. A deusa do amor fixa-se em Capricórnio durante um longo período, até 6 de Março, passando por uma retrogradação de 19 de Dezembro até 29 de Janeiro de 2021. Vénus pedirá uma estruturação do desejo e um amor pela finalidade, algo que neste eclipse se une, primeiramente, à morte e à transformação, pela conjunção a Plutão, mas também à força do renascer (sextil a Marte em Escorpião) e à Revolução da Terra (trígono a Úrano em Touro). A dádiva de ver o outro leva-nos, por exemplo, para a fronteira da Bielorrússia com a Polónia e para uma percepção de mudança na consciência do que é a humanidade.

            A posição de Vénus em Capricórnio, no Lugar do Viver, onde se encontra o valor e o seu sentido, permite que se una em sextil ao Sol, a Mercúrio e Marte e em trígono à Lua, concedendo-lhe uma bênção, uma dádiva, que pede paciência na construção de um novo modo de vida que terá, por força da Necessidade, de destruir a matriz anterior. Ora, a partir do Lugar do Sob a Terra, onde se criam as fundações da realidade, Neptuno em Peixes faz brotar o Amor Universal como uma visão da totalidade, lançando os seus raios de empatia e compaixão sobre o Sol, Mercúrio e Marte (trígono) e a Lua (sextil) e levando à luz eclipsada e à luz ascendente o dom de ver o próximo, de levar a compaixão a quem sofre. A crise dos migrantes e dos refugiados desafia o valor da vida e do humano, daí que Vénus e Neptuno se unam em sextil, oferecendo o amor como finalidade. Esse terá, porém, de acolher o Poder da Morte e seu potencial de transformação (sextil de Plutão ao Sol, a Mercúrio e a Marte e trígono à Lua).

            Por fim, e depois do fracasso COP26 em Glasgow, é preciso destacar a posição de Úrano em Touro, que pede uma Revolução da Terra e uma desestruturação dos valores e dos modos de vida. Ora Úrano está em conjunção com a Lua eclipsada, em oposição ao Sol, a Mercúrio e Marte e em quadratura a Júpiter e Saturno. É portanto impossível não concluir aqui uma tensão profunda, uma raiz disruptiva. Úrano vai romper com tudo aquilo que se encontra cristalizado, mas pode também trazer consigo, devida à sua posição, uma resistência à mudança e uma persistência nos preconceitos e nos falsos valores. Sob o véu do patriotismo e do nacionalismo exercer-se-á violência. Sob a égide do conforto capitalista e consumista negar-se-á a mudança que o planeta precisa. E sob o falso poder dos medos e da vaidade, sob o medo do feminino, continuar-se-á a agredir, abusar e menosprezar a mulher. Se pensarmos no sentido imediato do eclipse lunar, na lua obscurecida, vemos o feminino oculto, a Sabedoria que anda entre nós, mas não é vista, que é denegrida e insultada. A ignorância, como expressão radical do mal, estende-se nesse manto escuro, na sombra que ameaça o humano e humanidade.


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