sexta-feira, 9 de julho de 2021

Lua Nova em Caranguejo: Reflexões Astrológicas

Reflexões Astrológicas

Lunações

Lua Nova em Caranguejo

Lisboa, 02h17min, 10/07/2021

 

Sol-Lua

Decanato: Mercúrio

Termos: Mercúrio

Monomoiria: Sol

 

         

   A Lua Nova de Julho ocorre no signo de Caranguejo, de noite e sob o horizonte, no Lugar da Deusa (III) e junto ao Ponto Subterrâneo (IC), nos termos e decanato de Mercúrio e na monomoiria do Sol. É facilmente observável o modo como o carácter primordial desta lunação acentua o Feminino como origem, sentido e transformação. Caranguejo é o signo da origem e tanto o signo como o lugar em que a sizígia se firma expressam uma natureza lunar radical. Por outro lado, ao colocar-se junto ao Ponto Subterrâneo, o encontro dos luminares adquire um valor de base ou fundação, enraizando-se assim no ventre da Terra, no silêncio e na escuridão inaugural. O sistema de casa-signo ou signo inteiro permite que o valor de subterrâneo, de abismo original esteja partilhado entre a III e a IV, ou seja, ambos adquirem o sentido de Lugar Sob a Terra. Desta forma, a Lua Nova reúne em si vários elementos que integram a expressão do Feminino, da Grande Mãe.

   No Lugar sob a Terra (IV), estando o Ponto Subterrâneo na III, Vénus e Marte unem os seus raios. Convém que se note que, para além dos luminares, no que à união dos opostos concerne, estes são os astros mais favorecidos. Vénus e Marte estão no seu próprio segmento de luz (αἵρεσις), lançando, a partir das profundezas da Terra, os seus raios. No signo de Leão, onde a individualidade se torna génese e criação, complementam a mensagem, o sentido profundo, que a união dos luminares projecta para todo o tema. A luz, não desce do céu, nasce no abismo, no útero de Gaia, do Sagrado Feminino. Vénus e Marte afirmam aqui a união dos contrários e, sabendo nós que os benéficos (ἀγαθοποιοί) encerram em si o valor da dádiva, será sobretudo o planeta de Afrodite a atenuar o olhar diametral (oposição) que se tece entre os maléficos (κακοποιοί). Os benéficos (Vénus e Júpiter) têm sempre o poder de abençoar, de trazer em si a luz do bem, e essa dádiva transforma sempre o lugar ou o aspecto, anulando ou atenuando qualquer malefício.

   Por outro lado, Vénus e Marte unem hexagonalmente (sextil) os seus raios com Mercúrio. A fase helíaca destes astros é essencial para compreender a sua expressão neste novilúnio. Vénus e Marte, estando para além dos raios do Sol, são Estrelas da Tarde, adquirindo portanto uma natureza feminina e um carácter emocional e intuitivo. Nesta posição, Vénus é a Afrodite Cipriota, é Inanna e Deméter, é Ísis e Bast. Já Marte como Estrela da Tarde é o Herói que se inicia nos mistérios da Deusa. É Ulisses na ilha de Circe. É Héracles, vencendo os desafios de Hera. É Artur a receber Excalibur da Senhora do Lago. Na constelação de Leão, Marte é o deus ou o herói que, do útero do Feminino (Caranguejo/Lua), emerge para a Luz, não deixando de ser seu filho, irmão e amante. Porém, por ser uma Estrela da Tarde e estar junto a Vénus, Marte em Leão torna-se o herói que se entrega à Deusa, que se submete à sua intensidade sexual e participa na sua fertilidade.

   Mercúrio, pelo contrário, toma a posição dianteira e mostra-se como Estrela da Manhã. Nesta posição, Mercúrio é o mensageiro dos deuses e o arauto do Logos, mas é também Hermes Crióforo, o ardiloso pastor da Arcádia. Mercúrio em Gémeos, no seu domicílio diurno, é tanto a palavra proclamada como a palavra sussurrada, podendo surgir como verdade contada no deserto ou mentira aplaudida na multidão. Essa expressão de Mercúrio é consubstanciada pela presença da Caput Draconis no mesmo signo. Até bem perto do Natal, o Dragão da Lua estenderá o seu corpo no eixo Sagitário-Gémeos, sugerindo uma viagem iniciática da Sabedoria (Sagitário) até à Palavra, ao Conhecimento (Gémeos), dando assim sentido à forma. Depois, seguir-se-á o caminho ou a senda que vai da Morte (Escorpião) à Vida (Touro), que integra o morrer no modo de se viver.

   A razão pela qual Vénus se assume, neste novilúnio, como a expressão maior da dádiva dos benéficos prende-se sobretudo ao facto de Júpiter estar fora do seu segmento, mas também por formar um aspecto de tensão (quadratura) com Mercúrio e com o Dragão da Lua, dificultando a sua expressão. No entanto, apesar do benéfico diurno estar assombrado pelo peso da noite, não deixa de contribuir com a luz da sua dádiva. O Senhor do Espaço, da Verdade e da Justiça une-se triangularmente aos luminares, hexagonalmente com Úrano e Plutão e por presença com Neptuno. Júpiter em Peixes, conjunto a Neptuno, e partir do Bom Espírito (ἀγαθόν δαίμων), da XI, concede e partilha a dádiva da compaixão e o dom da contemplação. Exorta assim a uma outra forma de se estar colectivamente. O tempo pós-pandemia ou de cansaço da pandemia não deve ser um regresso à falsa normalidade, nem à ilusão de uma sociedade líquida, construída sobre a vaidade e o egocentrismo. A integração na luz pede sempre uma imersão desapegada na totalidade.

   Do cume do céu (MC), Plutão, o Senhor da Morte, é o astro que está mais perto da culminação, embora cadente. No Lugar de Deus (IX), a morte é aquela que ressuscita, que purifica e que traz o infinito à solidão do eu. Sem a presença da morte, seria impossível fixar um valor, conferir uma qualidade axiológica, daí que a lembrança constante - marcada com o ritmo de um tambor – de que também nós vamos morrer seja uma condição de possibilidade para a construção de um novo modo de vida. Ora a dificuldade de integrar na vida esse tambor iniciático da melodia da ceifeira é observável pela oposição de Plutão (e do MC) aos luminares, ou seja, tem de se saber acolher essa via de transformação. Por outro lado, Plutão une-se em trígono a Úrano, que está em conjunção ao Ascendente, e em sextil a Neptuno (e a Júpiter) que, por sua vez, se une também em sextil a Úrano. Esta união que une a Morte (Plutão), a Compaixão ou o Amor Universal (Neptuno) e a Revolução (Úrano), concedendo as bênçãos e os dons a um processo interno e colectivo de transformação, irá equilibrar, beneficamente, aquela que une a Força/Amor (Marte/Vénus), o Tempo (Saturno) e a Revolução (Úrano).

   A oposição de Vénus e Marte a Saturno e a quadratura destes a Úrano são, por excelência, o principal elemento de tensão neste novilúnio. No entanto, o que de uma forma empírica surge como tensão – os acidentes, os desastres naturais e os crimes de sangue, em particular contra as mulheres, são disso exemplo – será apreendido, mais tarde, já com um olhar distante, como um elemento estruturante. Estes aspectos surgem no tema da Lua Nova junto aos seus pólos ou pontos cardeais (κέντρα): Úrano no Horóscopo (Asc.), unindo a revolução do humano ao leme da vida; Vénus e Marte no Lugar sob a Terra (perto do Ponto Subterrâneo) onde a relação dos opostos se torna a fundação da realidade; e Saturno no Lugar de Culminação (perto do Meio do Céu) onde o tempo se apresenta como cume da realidade e daquilo que se faz. A dupla quadratura a Úrano em Touro torna a ideia de revolução um princípio formal, tanto no concerne à consciência íntima do tempo (Saturno em Aquário) como no que diz respeito à religação da polaridade na individualidade (Vénus e Marte em Leão). O trígono de Saturno a Mercúrio mostra ainda, sobretudo nestes tempos difíceis, como a apreensão da consciência do tempo, enquanto conhecimento da vida e da morte, é um dom de transformação.

   Neste novilúnio, um aspecto que serve de síntese da lunação é o sextil de Úrano aos luminares. O significado profundo do Sagrado Feminino enquanto origem, sentido e transformação, expresso aqui pela Lua Nova em Caranguejo, une-se ou reúne-se à revolução do humano como expressão de uma necessidade de ligação à Terra, a Gaia (Úrano em Touro). Uma das lições que devemos colher destes tempos sombrios é que quanto menor é a nossa presença abusiva no planeta maior é a sua vida, a sua renovação. Nos confinamentos, vimos veados a descer a cidade, vimos os efeitos de décadas de poluição recuarem, sem a circulação desenfreada de aviões, barcos e automóveis. A natureza não clama pelo humano, mas o humano precisa da natureza e quem precisa cuida. Da Lua Nova em Caranguejo até à Lua Cheia, acentuar-se-á uma passagem de sentido entre a origem e o fim, entre a matriz que gera e o poder que culmina, ou seja, será firmado o caminho entre Caranguejo e Capricórnio.

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