quarta-feira, 2 de março de 2022

Reflexões Astrológicas 2022: Lua Nova em Peixes

 Reflexões Astrológicas


Lunações


Lua Nova em Peixes


Lisboa, 17h35min, 02/03/2022

 

Sol-Lua

Decanato: Júpiter

Termos: Júpiter

Monomoiria: Lua

 


            A Lua Nova de Março, a última do actual ano astrológico, ocorre no signo de Peixes, com Virgem a marcar a hora, no Segmento de Luz (αἵρεσις) do Sol, com os luminares acima do horizonte, mas perto do Ponto Poente (VII) e a menos de uma hora do ocaso (hora de Lisboa), no decanato de Júpiter, nos termos de Júpiter e na monomoiria da Lua. O tema deste novilúnio, tal como referimos na Lua Nova de Fevereiro, é um espelho da anterior. No mês passado, a luz subia em fila na aurora com Marte na dianteira, mas agora afunda-se no ocaso com Vénus na vanguarda da viagem ao submundo, e tanto numa como na outra apenas Úrano escapa à formação linear.

            No último signo zodiacal, onde a individualidade se desagrega na totalidade, na imensidão do Indeterminado, o caminho da luz será agora uma candeia que alumiará a Noite Escura da Alma. No mito sumério da descida de Inana ao submundo, diz-se a certa altura no texto cuneiforme: “Ela tomou os sete poderes. Ela reuniu os poderes divinos e tomou-os na sua mão. Com os bons poderes divinos, ela seguiu o seu caminho.(linhas 14-16, Cuneiform Digital Library Initiative, University of California at Los Angeles). Este é o sentido do caminho astrológico liderado por Vénus neste novilúnio. É a catábase do Divino Feminino. E, na aurora dos tempos futuros, a Pomba da Grande Mãe, do Espírito Santo, renascerá e trará a luz ao mundo.

            Os luminares que aqui caminham para a sua ocultação deixam no céu e na alma a luz do fim, do crepúsculo anunciado. É a morte do visível, do exterior que tanto lutou para se afirmar. A anulação de si exige esforço. A imersão na totalidade obriga à morte do eu, pois estar todo em si é uma forma de unidade mística que traz a origem ao fim e o fim à origem. Para se acolher a luz do todo, é necessário um esvaziamento do eu. Ora a luz do ocaso une-se aqui, e ainda sob os raios abrasivos do Sol, à luz conjunta de Júpiter e Neptuno. A mística do consenso surge da união dos luminares, de Júpiter e de Neptuno no signo de Peixes, todavia, neste novilúnio, os raios poentes do Sol ainda são abrasivos podendo queimar a tão necessária potencialidade do Bem e da Justiça (Júpiter) e da Solidariedade e da Compaixão (Neptuno).  

            A relação entre Júpiter e Neptuno em Peixes e a luz da totalidade inicia nesta sizígia um caminho de revelação que se acentuará, primeiro, quando Júpiter entrar no Coração do Sol a 4 de Março, depois, quando Neptuno passar também o pórtico electivo desse Coração a 12 de Março e, por fim, quando Júpiter e Neptuno se unirem em co-presença no mesmo grau no dia 12 de Abril. Se, por um lado, esta é uma via de iniciação difícil de trilhar, pois a visão do alto da montanha obriga a deixar para trás todas as vaidades, por outro lado, essa visão da montanha pode trazer consigo um efeito de Cassandra, em que a profecia é revelação, mas a voz do profeta na vibra no marasmo e superficialidade em que a maioria caiu. A sabedoria alcançada torna-se então a voz do silêncio. Porém, o aprendiz, agora adepto, não está só, pois, para além do véu de Ísis, a Senhora surge diante si.

            A luz da sizígia, como caminho do meio, lança hexagonalmente os seus raios tanto para à frente, para Vénus, Marte e Plutão, como para trás, para Úrano e para a Caput Draconis. Na proa dessa barca fulgente, Vénus cinge em Capricórnio o poder do amor e o amor pelo poder. A deusa leva a luz a uma terra sem retorno e, acompanhada pela Força (Marte) e pela Morte (Plutão), desce até origem, à fundação da realidade, passando por todos os perigos. Este é o momento em que, quando Zeus luta com Tífon e todos os deuses fugiram, é a Cabra-Pan (Αἰγίπαν) que enfrenta o monstro e recupera os tendões de Zeus, permitindo assim a sua vitória (Figueiredo, R.M. de, 2021, Fragmentos Astrológicos, 151-2). Sob o véu de destruição, sugerido aqui pela conjunção de Marte e de Plutão, Vénus é também Perséfone e, como senhora do submundo, é a guerreira que vence a sombra, que depois do Inverno se torna Primavera.

            Se, por um lado, Vénus avança, neste novilúnio, pelo submundo, preparando-se para renascer, para alcançar a sua exaltação quando alcançar o grau 27 de Peixes a 30 de Abril, por outro lado, a união de Úrano em Touro, Neptuno em Peixes e Plutão em Capricórnio (sextis e trígono) define algo que já referimos de uma outra forma e que Dane Rudhyar designa da seguinte forma: Se Úrano e Neptuno não são bem-sucedidos a iniciar o processo de transformação, Plutão pode ser verdadeiramente cruel e implacável. Se, por outro lado, as forças de Úrano e de Neptuno realizam seu trabalho transformador e o indivíduo aceita a mensagem de ambos, preparando-se para a "descida ao inferno" final — a Noite Escura da Alma —, poderá encontrar, com calma e força, o processo plutoniano de total desnudamento e o vácuo consequente.” (1991, A Dimensão Galática da Astrologia: 66). Ora, por exemplo, a situação na Ucrânia e a ameaça de guerra global dão forma exterior a algo que não foi conseguido interiormente. Uma coisa é certa a humanidade está à prova e o humano, perdendo-se, continua focado no que é supérfluo, na soma das suas vaidades.            

            Na cauda do feixe de luz deste novilúnio, encontramos Úrano em Touro junto ao Ponto de Culminação (MC) e à Caput Draconis. A Natureza habita o Lugar de Deus (IX), tornando evidente a imanência divina. Úrano, embora cadente, é o astro mais alto e, estando junto ao Ponto de Culminação na IX – o que decorre do sistema de casas escolhido, o mais antigo dos sistemas, o de casa-signo ou signo inteiro –, a efectivação da potencialidade de Úrano e do Dragão do Lua torna-se mais forte. Esta condição sai fortalecida pelo facto de Úrano e a Caput se unirem hexagonalmente ao Sol, à Lua, a Júpiter e a Neptuno e triangularmente a Vénus, a Marte e Plutão. A catabáse da Deusa e a entrada da luz no submundo nascem no Lugar de Deus, com a Natureza no trono divino. Esse é um sinal dos tempos, uma revelação há muito anunciada.

            Úrano em Touro, trazendo consigo o choque do movimento com a imobilidade, transmite-nos uma mensagem lapidar: a natureza encontra sempre caminho. Lembremo-nos, por exemplo, dos veados que descem à cidade aquando dos confinamentos. O problema essencial da natureza é o humano e estamos muito enganados se acreditarmos que somos os mais fortes. A humanidade corre, mais do nunca, o risco de extinção e pode não ser no agora, mas o futuro já está à espreita. Nós, face à natureza, tornámo-nos a sombra no abismo, daí que o Dragão da Lua, fiel guardião da luz e da sombra, se estenda entre a morte (Escorpião) e o viver (Touro). 

            Neste novilúnio, Mercúrio e Saturno em Aquário, presos entre a potencialidade e a acção, entre a imersão na totalidade (Peixes) e o poder do fim (Capricórnio), lançam quadrangularmente, a partir do Lugar da Má Fortuna (κάκη τύχη), da VI, até Úrano e à Caput Draconis a hostilidade que o humano em remissão pode levar à humanidade. Este é o tempo dos novos fascismos, dos novos totalitarismos, da propaganda concertada, digital e superficial. A palavra aproveita-se da ignorância, do carácter líquido dos nossos tempos. Face ao poder da Necessidade, a liberdade esfuma-se, dispersa-se no imediatismo da realidade que criámos. Saturno em Aquário é a colheita daquilo que o humano semeou e daquilo que a humanidade não quis plantar. O agora é sempre a lição do Tempo e da Necessidade.

            Nesta Lua Nova em Peixes, com a proposta de sentido da deusa a descer ao submundo, a bênção da deusa Pistis-Sophia, da Fé e da Sabedoria, determinará a existência ou a ausência do fogo do Intelecto de um Carneiro renascido ou repetido.