Reflexões Astrológicas
Lua Nova em Aquário
Lisboa, 20h53min, 21/01/2023
Sol-Lua
Decanato: Vénus
Termos: Mercúrio
Monomoiria: Júpiter
A
Lua Nova de Janeiro, a primeira do ano civil de 2023, ocorre no signo de
Aquário, com Virgem a marcar a hora para o tema de Lisboa e, deste modo, na VI,
no Lugar do Má Fortuna (κάκη
τύχη), no decanato de Vénus, nos termos de
Mercúrio e na monomoiria de Júpiter.
A sizígia dá-se assim abaixo do horizonte e cerca de três horas e vinte minutos
após o pôr-do-sol. A Lua encontra-se favorecida por estar no seu próprio
segmento, embora abaixo do horizonte e num signo masculino, já o Sol
encontra-se desfavorecido por estar fora do seu próprio segmento de luz (αἵρεσις) e abaixo do horizonte. A luz apresenta-se,
deste modo, submersa, oculta.
O
encontro dos luminares em Aquário firma o seu carácter primordial enquanto
signo da humanidade. Ora esta designação traduz um significado enraizado tanto
na astrologia antiga como na astrologia mitológica. Em primeiro lugar, dos
signos que assumem uma representação humana, Aquário é o único que parte de uma
matriz exclusivamente humana. O signo de Gémeos é representado por dois irmãos,
um de natureza humana, outro de natureza divina, enquanto o que lhe é
diametralmente oposto, Sagitário, assume a forma de um ser parte humano, parte
animal. Já Virgem configura-se sob a imagem da deusa da justiça,
antropomorfizada, mas divina. Aquário é portanto o único que começa como humano.
De
uma perspectiva mitológica, Aquário é representado por Ganimedes, o jovem
“humano” por quem Zeus se enamorou, e cujo amor é referido, por exemplo, por
Platão (Fedro 255).
Etimologicamente, Ganimedes tem a sua raiz na forma verbal γάνυμαι que
designa o “alegrar-se” ou o
“irradiar alegria”, mas também no substantivo μήδων, ou seja, os “genitais”. O sentido é aqui bastante
óbvio, tornando o eixo Leão-Aquário, com esta relação entre Zeus (Leão) e
Ganimedes (Aquário), aquele que melhor descreve a pederastia antiga e a
homossexualidade masculina. Zeus, sob a forma de águia, rapta Ganimedes,
levando-o para o Olimpo, fazendo dele o copeiro dos deuses, o que verte o
néctar (ou o sémen), e torna-o Himeros, o deus do desejo. Existe pois uma
passagem ulterior do humano ao divino.
Para
a astrologia antiga, sobretudo sob a égide do modelo conceptual do Thema Mundi, aquele que coloca
Caranguejo como o Ascendente do Mundo, Aquário assume-se como o oitavo signo,
estabelecendo-se, deste modo, no Lugar da Morte, aquele que define a qualidade
do morrer. Ora é o momento mori, o
conhecimento de que sabemos que vamos morrer que define a nossa humanidade, ou
seja, o conhecimento da morte revela o conhecimento da vida e vice-versa, o que
é particularmente significativo com o ingresso já anunciado de Plutão em
Aquário. A finitude da vida, marcada pelo peso da morte, permite a procura do
valor, do propósito, transformando o humano em humanidade. Saturno, como
regente deste signo e daquele que é o Ocaso do Universo (Capricórnio), vem confirmar
esta unidade conceptual entre o tempo e a morte.
Por
fim, já para a significação da astrologia moderna, também a regência de Úrano
acentua o carácter primordial de Aquário enquanto signo da humanidade, pois a
castração do deus do céu é feita por Cronos (Saturno), não apenas para tomar o
poder de seu pai, mas para libertar os outros deuses, as outras
potencialidades, aprisionadas no ventre de Gaia. Úrano, ao não se separar de
Gaia, impedia que estes nascessem, que chegassem à luz. Assim, a castração de
Úrano confere o dom do nascimento, uma representação por excelência da nossa
humanidade. O absoluto que pertence à terra reside pois em encontrar na
fertilidade de Gaia, nos seus frutos, os dons do nascer e do morrer. Aquário
vem colocar, deste modo, o sentido da humanidade na observação desses dons.
No
actual novilúnio, seguindo a ideia de que o ὀμφαλός, o umbigo do mundo, é o lugar electivo
do tema astrológico, neste caso Lisboa, a via luminar afunda-se após o Ocaso.
Em Aquário, a sizígia segue na frente, acompanhados posteriormente por Vénus e
Saturno que, num sentido mais amplo e em consequência do declínio helíaco, se
tornam Estrelas da Tarde, adquirindo então um carácter feminino e uma qualidade
potencial. No entanto, se estendermos o caminho da luz a toda a senda
descendente, encontramos um trilho celeste que se alonga deste Neptuno, a
descer junto do Ocaso, até Mercúrio, avançando rumo ao Ponto Subterrâneo (IC).
A
luz, nesta via de Eterno Retorno, agora caminhando até ao abismo, seja ela de
Neptuno em Peixes até Mercúrio em Capricórnio, da totalidade da imaginação ao
poder da palavra, ou de Saturno e Vénus ao Sol e à Lua em Aquário, da
necessidade e do amor à luz da humanidade, terá de enfrentar a sombra que,
avançando à sua frente, tenta extinguir a sua presença. Ora, no signo da
humanidade, a sombra é a ignorância. Para o humano, este é o maior dos males, o
seu verdadeiro abismo. No Corpus
Hermeticum, Hermes diz-nos o seguinte: “Olhai
com os olhos do coração – se não todos, sejais capazes pelo menos alguns entre
vós. O mal da ignorância inunda toda a terra e corrompe a alma, encerrada no
corpo, impedindo-a de lançar a âncora no porto da salvação.” (VII, 1: ἡ γὰρ τῆς ἀγωσίας κακία ἐπικλύζει πᾶσαν τὴν γῆν καὶ συμφθείρει τὴν ἐν τῷ σώματι κατακεκλεισμένην ψυχήν, μὴ έῶσα ἐνορμίζεσθαι τοῖς τῆς σωτηρίας λιμέσι. Texto grego de La Rivelazione Segreta di Ermete Trismegisto,
vol. I, a cura di Paolo Scapi. Turim, 2009: Fond Lorenzo Valla / Arnoldo
Mondadori Editore, 108-9. A tradução é da minha responsabilidade).
Tudo
se concilia nesta ideia da ignorância como maior dos males. Marte em Gémeos, agora
directo, é o astro mais alto e quase alcança a culminação. Nesta posição,
encontramos nomeadamente a forma nefasta como a ignorância, como a sua força
vil, corrompe a palavra e a razão. No entanto, a palavra é magia e o que
destrói convive com o que cria. Marte em Gémeos vai cortar o laço entre o
humano e o divino, semeando a guerra em nosso redor, não aquela que alguns
forjam, entre países e movendo interesses, mas sim aquela que se ergue dentro
de nós, aquela que coloca uma pequena chama diante de uma sombra imensa. Ora
essa sombra é a ignorância.
O
facto de Marte estar no seu próprio segmento de luz e acima do horizonte não o
torna o grande maléfico. Esse papel cabe a Saturno que segue na retaguarda da
luz subterrânea. Desta forma, e por estar em trígono com a sizígia, com Vénus e
Saturno, e em sextil com Júpiter, Marte guarda, no meio da discórdia que é a
ignorância, a derradeira esperança que é a sabedoria. Esta não será, porém,
seguida por muitos. A quadratura da sizígia ao Dragão da Lua aponta para a
dificuldade de se encontrar o seu valor. A palavra que nos leva à sabedoria é
ceifada pela nossa própria rejeição e a realidade divina torna-se cada vez mais
distante. A quadratura de Marte e Neptuno fundamenta essa adversidade.
Se
Marte avança para o Ponto de Culminação, Mercúrio segue para o Subterrâneo e é assim
o astro que mais se afunda. A palavra (Mercúrio) e a morte (Plutão) unem-se num
único poder (Capricórnio), adquirindo a revelação do abismo. São os timoneiros
da sizígia, da luz do novilúnio, aqueles que seguem na frente. A razão está pois
nas escarpas da existência e a palavra adquire a graça da semente da
abundância, oculta sob a terra. Esta proposta une-se naturalmente à mensagem do
Dragão da Lua (trígono à Caput e
sextil à Cauda), ao valor que traz o
conhecimento da morte ao modo de vida.
O
sextil de Júpiter em Carneiro à sizígia e aos seus companheiros (Vénus e
Saturno), sob o peso, sob a gravidade das nossas escolhas, coloca a acção do
bem na luz que viaja pelo abismo. A humanidade pode portanto colher a acção do
bem como uma chama que vence a escuridão. O bem, como sentido profundo de
Júpiter, tem o poder de transformar o humano e construir uma nova humanidade. A
acção que se efectiva no bem e na justiça, ou seja, a proposta de Júpiter em
Carneiro, assume esse potencial. No entanto, no tema em análise, Júpiter
encontra-se na VIII, no Lugar da Morte, caminhando para a sua ocultação, o que
faz sobressair o significado da quadratura deste a Mercúrio e Plutão em
Capricórnio.
Existe,
desta forma, uma colisão entre a acção e o poder e a palavra submersa,
cristalizando a ignorância e a malícia, tenderá a assombrar a missão do bem e
da justiça. A humanidade está no fio da navalha e terá inevitavelmente de
escolher o seu lado. O sextil de Mercúrio e Plutão em Capricórnio a Neptuno em
Peixes pede ao humano a sua refundação, elevando-se num discurso de
solidariedade e promovendo um verdadeiro amor ao próximo. A empatia está no
ocaso da humanidade e não será uma tarefa fácil conservar a sua luz. O caminho
entre o actual novilúnio e o próximo sugere essa via árdua entre a humanidade e
a totalidade.
Neste
mês lunar entre a Lua Nova em Aquário e a Lua Nova em Peixes, convém
assinalar-se que Mercúrio avançará de Capricórnio para Aquário, Vénus de
Aquário para Peixes, Júpiter manter-se-á em Carneiro e Saturno em Aquário. Já os
transaturninos vão permanecer também nos seus signos: Úrano em Touro, Neptuno
em Peixes e Plutão em Capricórnio. No actual novilúnio, o único planeta
retrógrado é Úrano e que, aquando do próximo novilúnio, já estará directo. Da
Lua Nova em Peixes até à segunda Lua Nova em Carneiro (20/04/2023) nenhum
planeta estará retrógrado, activando-se assim todas as potências planetárias.
O
encontro dos luminares, no signo de Aquário, encerra o sentido profundo da
passagem do humano, daquele que se encontrou a si mesmo, para a realidade
agregadora que é a humanidade. No entanto, a ignorância é a verdadeira ameaça,
o inimigo que nos espera. E, perante esse mal imenso, essa sombra que se estende
sobre nós, só existe uma luz. A sabedoria é a luz no caminho.
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