segunda-feira, 30 de maio de 2022

Reflexões Astrológicas 2022: Lua Nova em Gémeos

  Reflexões Astrológicas


Lunações


Lua Nova em Gémeos

Lisboa, 12h30min, 30/05/2022

 

Sol-Lua

Decanato: Júpiter

Termos: Júpiter

Monomoiria: Saturno 

 

            A Lua Nova de Maio, depois dos eclipses solar e lunar no eixo Touro-Escorpião, ocorre no signo de Gémeos, com Leão a marcar a hora, no Segmento de Luz (αἵρεσις) do Sol, com os luminares acima do horizonte, no Lugar do Bom Espírito, ἀγαθόν δαίμων (XI), e a caminho da culminação, no decanato e termos de Júpiter e na monomoiria de Saturno. Mercúrio Retrógrado, regente de Gémeos, marchando à frente do Sol, longe dos seus raios, é uma Estrela da Manhã e o astro mais alto. Em Touro e recuando, ou dando a ilusão que recua, Hermes serve o silêncio e guarda o mistério. O Trismegisto torna-se o mestre da iniciação, do caminho interior, e sob a Mãe Terra constrói o templo da palavra criadora, do que Logos que é um fogo sempre vivo.   

            O masculino surge, neste tema do novilúnio, com uma expressão dominante e com uma acção dinâmica. No entanto, a retrogradação de Mercúrio, que terminará um dia antes de Saturno começar a sua, apela ao acto pensado e à palavra medida. A justa medida actua, nesta lua nova, como elemento estruturante e estruturado de passagem, ou seja, o sentido de viagem é consolidado pela harmonia entre aquilo que se pensa, diz e faz. Essa é a lição de Mercúrio, o regente do novilúnio, Retrógrado e em Touro. O movimento do silêncio à palavra serve aqui a necessidade de concedermos a verdade às nossas ideais e ao nosso discurso. A dúvida metódica continua a ser uma metodologia de rigor.

            O carácter de mediação polar, de integração do diâmetro na unidade do círculo, é particularmente expressivo no novilúnio de Gémeos, especialmente pelo facto de neste signo não existir uma verdadeira integração. O processo de integração de uma dualidade expressa surge em Gémeos, alcança o princípio ou potencial de harmonia em Balança e é concluído em Peixes, onde o Amor (união dos opostos) se exalta. Estes últimos, contrariamente ao que se possa pensar, não nadam em direcções opostos: Afrodite e Cupido, transformados em peixes, fogem juntos de Tífon e os dois peixes que trazem Afrodite para a costa, nascida da espuma do mar ou de um ovo, nadam no mesmo sentido. Em Gémeos, pelo contrário, existe polaridade por ausência ou distinção, mas também por procura ou demanda.

            A tradição astro-mitológica, enunciada no meu livro, diz-nos o seguinte: “O mito que, porém, melhor descreve o signo de Gémeos é dos Dióscoros (Castor e Pólux). Nasceram de Zeus e Leda e são irmãos de Helena e Clitemnestra. Porém, Leda era casada com o rei da Lacedemónia, Tíndaro. Na noite em que Zeus se uniu a Leda, sob a forma de Cisne, ela uniu-se também ao marido. Destas uniões, nasceram dois pares de gémeos ou dois ovos: de Zeus, Pólux e Helena e, de Tíndaro, Castor e Clitemnestra.” (Fragmentos Astrológicos 2021: 138). Este é o gérmen da polaridade geminiana, ou seja, da passagem entre o humano e o divino, entre mortalidade e imortalidade, porque após a morte de Castor (mortal), em combate, Pólux (imortal) clama a Zeus (Júpiter): “(…) Ouvi a palavra, pai,/ Divide em dois, o céu que a mim concedeste,/ De toda a oferenda, a metade maior será.” (Ovídio, Fastos V, 716-8: “(…)‘percipe verba, pater: / quod mihi das uni caelum, partire duobus: /dimidium toto munere maius erit’). Zeus concede o pedido e Pólux e Castor brilham no céu em dias alternados.

            Ora esta polaridade natural e criadora que, no novilúnio se une à conjunção da luz solar e lunar, procura um elemento de força e expansão no sextil a Marte e Júpiter em Carneiro. A partir do Lugar de Deus (IX), estes retribuem com outra dicotomia. Segundo o Segmento de Luz, Júpiter é o maior dos benéficos e Marte o maior dos maléficos, e aguçados por estarem em Carneiro, lançando a oposição radical entre o Eu e o Mundo (o Outro), outorgam activamente o Bem e a Justiça, mas também o Conflito e a Destruição. Pela natureza do sextil, esta relação coloca reflexivamente a acção no próprio e não no exterior, na Providência. Marco Aurélio diz-nos o seguinte: “Como anda o teu guia interior? Isso é que importa. O resto cai fora do teu livre arbítrio; é cinza dos mortos e fumo.” (Pensamentos XII, 33: Πῶς ἑαυτῷ χρῆται τὸ ἡγεμονικόν; ἐν γὰρ τούτῳ τὸ πᾶν ἐστι. τὰ δὲ λοιπὰ προαιρετικά ἐστιν ἀπροαίρετα, νεκρὰ καὶ καπνός, trad. J. Maia, Lisboa, Relógio D’Água, 1995).

            A luz que brilha em nós, indicada aqui pela união dos luminares, é τὸ ἡγεμονικόν do estoicismo, esse “guia interior” de que fala Marco Aurélio, a parte dominante da alma, a razão ou intelecto. Do Bom Espírito, do demiurgo de passagem entre o humano e o divino, o Sol e a Lua une-se ao Leme da Vida (I) em Leão (sextil), a nobreza do espírito, e a Saturno em Aquário (trígono) no Poente (VII). Saturno representa tudo o escapa ao livre arbítrio, tudo o que está sob a alçada do destino e da necessidade. O sentido do Destino sobre a Humanidade, de Saturno em Aquário, observa, concedendo a sua lição, a capacidade que se adquire de colocar o valor nesse “guia interior”, na partilha da Razão (Sol e Lua em Gémeos).

            Saturno, por seu lado, une-se em sextil a Marte e Júpiter em Carneiro, revelando o potencial de a Necessidade se tornar Justiça e Equilíbrio, o Bem em Acto, ou Castigo e Retribuição, a Desmedida como Reacção. De um outro modo, Saturno, com esse olhar vindo do Lugar de Deus, coloca o tempo sob o Poente, trazendo consigo a imagem da mudança de um era, dos tempos que se põem e da hora que espera nascer. O tempo do Espírito Santo, da Mãe Eterna espera a sua hora.

            No entanto, a quadratura de Saturno em Aquário a Vénus, Úrano e Mercúrio e também à Caput Draconis e ao Ponto de Culminação, todos em Touro, impõe, como é próprio do fim de um tempo, o peso da destruturação de uma realidade e da construção de novos valores. Não é portanto um tempo de júbilo, de um simples hedonismo taurino, mas sim um tempo que exige gravidade naquilo que se pensa e diz, naquilo que se deseja, naquilo que queremos mudar, mesmo entre o caos e o ideal, em suma, naquilo a que atribuímos valor.

            A mensagem do Dragão da Lua, estendendo o seu corpo entre Escorpião e Touro, entre a Morte e o Viver, obriga necessariamente a que se coloque a destruição do valor anterior como condição para se criar um novo. Essa exegese da morte traduz-se num sentido de origem (Cauda Draconis na IV, no Lugar sob a Terra), o que sugere aliás a próxima viagem da Serpente da Luz e da Sombra pelo eixo Caranguejo-Capricórnio, mas traduz-se também no poder de finalidade da própria morte, ou seja, Plutão em Capricórnio, onde o culminar da morte, da transformação, firma o seu próprio poder.

            O Senhor do Submundo olha triangularmente para Vénus, Úrano e Mercúrio e para à Caput Draconis e para a Culminação e quadrangularmente para Marte e Júpiter. A visão da montanha confunde-se aqui com a visão do abismo e de um lado e do outro, a dádiva tem o sabor da retribuição e a punição tem o aroma, o perfume, de uma bênção. A bipolaridade da consciência que se eleva e se afunda ou se transforma ou se destrói. Esta é esfinge no caminho. Os dois eixos através dos quais o olhar da Morte se fixa separam também duas realidades inconciliáveis: o poder e guerra, de um lado, e a vida e a Mãe-Terra, do outro. O militarismo imergente não salvará o planeta da sua ruína, bem pelo contrário, arrastá-lo-á mais rapidamente para a destruição. A conjugação de forças em Touro é também esse sinal de alerta.

            Tocado pelo grito da Mãe-Terra (sextil a Vénus, Úrano e Mercúrio), Neptuno em Peixes, representando a imaginação activa e uma energia tantas vezes incompreendida, traz-nos, a partir do Lugar da Morte (VII), o Amor de Deus e a Compaixão como Totalidade, mas também o véu de Maya, tecendo a ilusão necessária que serve o caminho, a morte e a revelação. No entanto, a quadratura de Neptuno aos luminares aponta para a dificuldade radical de conciliar a polaridade, de fazer nascer o Amor entre os opostos. A ponte entre Gémeos e Peixes é, de um ponto de vista hermético, o caminho iniciático da Palavra à Solidão, conduzindo pelo trilho agreste a voz da multidão até ao silêncio divino.

            O novilúnio de Maio tem, neste tempos difíceis, de guerra, de propaganda, de ilusão e enganos, de falsos ideais, de juízo fácil, um enorme potencial, pois possibilita a beleza da palavra que recua, da palavra pensada, mas também da voz no deserto, do sermão aos peixes. A exigência do pensar, mesmo quando tudo o que se vê é ignorância, carrega consigo o verbo da salvação.

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