sábado, 22 de setembro de 2018

A Luz que o Eremita guarda

O Eremita
Tarot Rider-Waite


O Eremita é aquele que resume em si a gestação do espírito e que multiplica, na consciência, o mistério da Trindade.

O Eremita é a candeia da sabedoria, ignorada e rejeitada, e a voz do exílio que, na solidão, contempla a hora de ressurgir. 

O Eremita é aquele que guarda a chama sob o manto como se fosse a síntese da realidade, a inteligência que impera sobre as coisas.

O Eremita é o mestre dos sonhos e peregrino da imaginação que,  despojado, só com a força interior, oferece uma estrela à escuridão. 

O Eremita é aquele que transforma o som das gentes e o desespero da multidão no silêncio da alma e na paz do espírito.

O Eremita é um louco renascido, um caminhante que seguirá a via da noite, guiado pela luz Lua.

O Eremita é aquele que é um pastor da verdade sem rebanho e um senhor da vontade que é poder, pois ao amar domina a Sabedoria.

segunda-feira, 10 de setembro de 2018

O Fado do Velho Príamo (Poesia)

Ivanov, Alexander, Príamo a pedir a devolução do Corpo de Heitor, 1824.
Moscovo: Galeria Tretyakov.

O Fado do Velho Príamo

Despojado de si
Crente em Apolo
Indiferente e ledo
Segue suplicante
De Tróia o rei Príamo

Roga ao meio deus
O corpo do filho morto
Ao belicoso carrasco
Implora o recto juízo 
Clama só a justa morte

Na noite da negra Nyx
Espera sem sorte ou arte
Uma prudente luz
Da luminar razão 
E sem nada almejar
Além da morte certa
Suplica a benevolência
De um cruel algoz

Áquiles surpreso decide
Sem puder recusar
Dar o corpo morto
Aos lúgubres lumes
Nem sempre a espada
Move a ilustre coragem
E pode a superna alma
Ter força de falange

Príamo o suplicante
Fez de glória vã
A vitória de Aquiles
E deu ao morto Heitor
A sombra da dignidade

E na noite avançou
Como vazio vulto 
Para a morte próxima
Pras perdidas ruínas 
Da sua nobre cidade

Assim seguiu despojado
De Tróia o rei Príamo

Assim pela morte vai
E à morte regressa

18/08/2018 RMdF

sexta-feira, 7 de setembro de 2018

Desenhar o Corpo Humano (Poesia)

Da Vinci, Leonardo, Estudo das Mãos, c. 1474.
Windsor: Royal Library.
Desenhar o Corpo Humano

Não nem lápis ou carvão
Nem pincel ou pigmento
Nem martelo ou cinzel
Virgem a tela despida
Frio o mármore casto
E apenas com o aparo
E aquele fluído índigo
Se cria a forma informe
Sugerida por símbolos
E conformados sinais
Com traços de alfabeto
E sombras de metáfora
Seguindo sós e textuantes
Esses sulcos de tinta
Na folha alba plantados
Sem rosto ou corpo
Da mão poética gerado
O desenho do corpo humano

08/07/2018 RMdF