Reflexões Astro-Filosóficas
Contributos para uma Filosofia da Astrologia
#11.
Epicteto, nas suas Diatribes, diz-nos seguinte: «– Que ordens eu te darei? Zeus já não te deu as ordens? Não te deu as tuas coisas desimpedidas e desembaraçadas? E as que não são tuas não são impedidas e entravadas? Aqui chegaste com certas ordens. (4) De que decreto precisas ainda? “Vela pelas tuas coisas por todos os meios”, “Não almejes as de outrem”, “É tarefa tua ser leal”, “É tarefa tua ser digno”. Quem pode tirar essas coisas de ti? Quem te impedirá de usá-las senão tu mesmo? E como tu impedirás a ti mesmo? Quando te ocupares das coisas que não são tuas, perderás as tuas. (5) Possuindo tais conselhos e ordens da parte de Zeus, quais tu queres ainda da minha parte? Sou melhor que ele? Mais digno de confiança? Se velares por essas ordens, de quais outras precisarás ainda? Mas ele não te ordenou essas coisas? (6) Toma as pré-noções, toma as demonstrações dos filósofos, toma o que ouviste muitas vezes, toma o que disseste para ti mesmo, toma o que leste, toma o que praticaste.» (Diatribe I.25, 3-6). O filósofo estóico do século I EC apresenta-nos um exercício espiritual, um modo de viver. Devemos, segundo esta diatribe, colocar a nossa atenção naquilo que somos, no que nos é próprio e nos convém e devemos, por outro lado, evitar, negando, o que próprio do outro e não nos convém.
Numa perspectiva astrológica, a proposta de Epicteto representa as fundações da astrologia natal ou genetliacal. As ordens de Zeus são os decretos do destino, são as marcas da Providência num tema natal. Desta forma, de acordo com os ditames de uma natividade, cada um deve primeiro aceitar e depois seguir o que ela determina. A astrologia antiga privilegia de tal forma o tema natal que a maior parte da pronoia astrológica, ou seja, do conjunto de técnicas preditivas é calculado a partir dele e não de elementos externos, nomeadamente, os trânsitos. A profecção e a distribuição dos regentes do tempo são disso os melhores exemplo. Esta centralidade do tema natal reforça a necessidade de nos focarmos naquilo que o tema natal oferece e não invejarmos os decretos que os outros receberam. Melhor ou pior, mais tenso ou mais harmonioso, o nosso tema natal é aquilo que nos convém. Devemos assim tomar o que é nosso.
Bibliografia
Epicteto, 2020, As Diatribes de Epicteto, Livro I, trad. A. Dinucci. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra.