terça-feira, 18 de dezembro de 2018

A Humanidade em Tempos Sombrios (Poesia)

Yáñez de La Almedina, Fernando, Santa Catarina, 1505-10. 
Madrid: Museu do Prado.
A Humanidade em Tempos Sombrios

À minha filha Maria Madalena.

Quando o ódio galgar o humano
Pratica a nobre arte da contenção
Mede a palavra cultiva o pensar
Não dês lume ao fogo ignorante

Quando a ética for apenas nome
Palavra perdida num livro morto
Sê somente o melhor de ti mesma
E não deixes nunca que a sombra
Do passado te devore o amanhã

Quando tudo for líquido superficial
Efémero como a espuma da vaidade
Firma a gravidade no que é eterno
E acredita que sozinha serás o humano

Quando a sombra se estender em ti
Ergue a candeia no obscurantismo
E diante do mal comum ou universal
Sê o colosso da nossa humanidade
Um baluarte de bondade e concórdia

Quando a ignorância semear caminho
Concede o sal à terra e sê a fertilidade
De uma sábia via deixando à história
Às páginas revisitadas a lição do futuro

Quando os tempos forem sombrios
Permite ao Sol a luz da humanidade
E se tudo estiver perdido tombado
Sobre a profundidade do seu abismo
Não te percas tu permanece sempre
Humanamente humana e acredita

RMdF 15/11/2018

quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

O Mistério da Morte

A Morte
Tarot Rider-Waite

A Morte é aquele elemento de passagem que parece destruição, mas, na verdade, é apenas desaparecer do olhar.

A Morte é o dom do esquecimento, o processo de purgar o superficial e de chamar a si o que dá profundidade à alma.

A Morte é aquela presença que, no universo, se funda na dualidade e que, com o Amor, reunida e separada, cria e destrói.

A Morte é a mudança, o eterno fluxo de um rio que corre, que, com a Vida, alternadamente governa e é governada.

A Morte é aquela sábia lição que nos adverte que o amanhã pode ser seu, devemos portanto colher os frutos do agora.

A Morte é o aviso constante que relembra que na dança da morte todos vão participar, relativizando pois todas as acções.

A Morte é a representação do reinado do Senhor do Tempo, aquele que num momento dá e noutro tira, levando consigo reis e plebeus.

terça-feira, 20 de novembro de 2018

Coração Divinamente Inquieto (Poesia)


Coração Divinamente Inquieto
Bartolomeo, Fra, God the Father with
Sts Catherine of Siena and Mary Magdalena, 1509.
Lucca: Museo Nazionale di Palazzo Mansi.



Como podes ser um estranho
E ser um mistério também
Porque se és um estranho
Não podes ser um mistério
Todo o mistério traz consigo
A intimidade que transcende
Os limites de um pensamento
E se és estranho és o outro
Um outro que nem o amor
Que une em si a terra e o céu
Ou aquela primeva harmonia
Dos opostos dos contrários
Pode na sua solidão enlaçar
É o tempo esse tempo meu
Que é memória e afinidade
Que me conta sussurrando
Que não podes ser estranho
Porque vives firme em mim
Como o fogo da minha alma
O sopro eterno do meu espírito
Mas sendo esse tempo vivente
És também um eterno mistério


RMdF 30/10/2018