quinta-feira, 20 de abril de 2023
quarta-feira, 19 de abril de 2023
Reflexões Astrológicas 2023: Eclipse Solar Híbrido - Lua Nova em Carneiro
Reflexões Astrológicas
Eclipse Solar Híbrido
(Lua Nova em Carneiro)
Lisboa, 05h16min, 20/04/2022
Sol-Lua
Decanato: Vénus
Termos: Saturno
Monomoiria: Sol
O
Eclipse Solar Híbrido, ou seja, um fenómeno que combina os eclipses anular e
total, de 20 de Abril ocorre no signo de Carneiro, com Peixes a marcar a hora,
no Segmento de Luz (αἵρεσις) da Lua, com os luminares abaixo do
horizonte, na II, designada de lugar do Viver ou Modo de Vida (βιός),
e a cerca de uma hora e meia antes do orto solar (hora de Lisboa), no decanato de
Vénus, termos de Saturno e na monomoiria
do Sol. Ora, estando o Sol na sua exaltação e a Lua desfavorecida, o segmento
de luz dominante firma aqui o carácter de sombra, de ocultação da luz, próprio
de um eclipse. Por outro lado, o facto de acontecer no último grau de Carneiro,
com o corpo do Dragão da Lua estendido já a partir do signo seguinte (eixo
Touro-Escorpião), determina também uma certa debilidade luminar ou distensão de
sentido. Sob o horizonte, a sombra fere a luz.
O
centro do eclipse, onde a escuridão será maior, ocorre em Timor-Leste e na
Indonésia, todavia, a sombra alcança também a Austrália, sobretudo o norte, a
região à volta de Carnarvon, a Papua Nova-Guiné e ligeiramente a Nova Zelândia.
Toda esta área do Pacífico e do Índico encontra-se assim sob um manto de
escuridão. Por a sizígia ocorrer num signo de fogo, em Carneiro, podemos
assistir, nomeadamente em Timor-Leste, a uma séria instabilidade política, sobretudo
a nível do poder executivo ou presidencial. De um outro modo, e em consonância
com o eclipse lunar que se segue, a actividade vulcânica e sísmica pode
agravar-se sobretudo nesta área geográfica, o que, no caso da Indonésia, pode
vir a ser preocupante.
Em termos de regências geográficas,
devemos também considerar as que foram descritas na Antiguidade. Segundo
Vétio Valente (Antologia I, 2), as
seguintes regiões pertencem a Carneiro: a Babilónia, Elymais ou Elamais (Cuzistão, província do Irão), a
Pérsia, a Palestina e as regiões circundantes, a Arménia, a Trácia, a
Capadócia, Susã (cidade antiga, capital do Elão ou Susiana, hoje sudoeste do
Irão), o Mar Vermelho e o Mar Negro, o Egipto e o Oceano Índico. Para Manílio,
rege o Helesponto (Estreito de Dardanelos),
Propontis (Mar de Mármara), a Síria, a Pérsia e o Egipto (Astronomica, IV, 744-817). Por a Caput Draconis se encontrar em
Touro, junto à sizígia do eclipse temos de observar as regências deste signo. Segundo
as lições de Valente (Antologia I, 2), rege as regiões da Média (o actual
noroeste do Irão, o Azerbaijão, o Curdistão Iraniano e o Tabaristão ou
Mazandarão), da Cítia (Irão, mas também uma área que se estendeu da Bulgária às
fronteiras da Rússia, Mongólia e China), do Chipre, da Arábia, da Pérsia e das
montanhas do Cáucaso, da Samártia (junto à Média), de África, de Elymais ou
Elamais (Cuzistão, uma província do Irão), de Cartago, da Arménia, da Índia e
da Germânia.
As
regências antigas continuam a servir ainda hoje para situar muitos dos
acontecimentos que a astrologia tão bem traduz. Os eclipses são, para a astrologia
mundana ou global, um fenómeno em cujos sentidos da Providência electivamente
se enraízam. O jogo primordial e radical de luz e sombra marca, com o gesto das
Meras, não só o momento do eclipse como todo um hiato temporal, fundado num
processo de significação que se agrega como uma teia. Já quanto ao actual, a duração do
eclipse e do período umbral apontam para um período de influência que se
estende de um ano até quase três anos e meio. No entanto, face ao facto da área
central do eclipse ser um pouco circunscrita, a sua influência tenderá a ser
mais próxima de um ano do que dos três anos e meio.
Na análise astrológica de qualquer
eclipse, este aforismo deve servir toda e qualquer interpretação: o primeiro eclipse de uma série Saros e
o seu tema astrológico servem de matriz para toda a série, é o seu tema
genetlíaco. O eclipse de dia 20 pertence à série Saros 129 que se iniciou a 10
de Outubro de 1103. Este eclipse, no signo de Balança, torna-se particularmente
significativo para o nosso eclipse, dado que a sizígia original se encontra em
oposição à actual. No eclipse de 1103, o Sol, a Lua, Mercúrio, Vénus e Júpiter
encontravam-se em Balança. Existia, nesse momento, uma clara proposta de
sentido que apontava, como se a dádiva do bem indicasse o caminho, para a
harmonia dos contrários, para a criação de uma concórdia no seio da dualidade.
Este sentido opõe-se, como que olhando de frente com um semblante desafiador, ao
eclipse de dia 20.
Os
maléficos, na análise comparada dos dois eclipses, também se opõem. Saturno
hoje em Peixes fita Marte outrora em Virgem. Se pensarmos que muitos dos
eclipses dos últimos anos pertencem a séries Saros que começaram em eclipses
coincidentes com a época das Cruzadas, compreendemos então a actualidade deste
eixo dos maléficos. Os falsos ideais que se mascaram das mais piedosas demandas
atendem, na verdade, os vícios do poder. Ontem ou hoje, a guerra só se serve a
si própria. Por outro lado, Plutão que agora se encontra em Aquário, aquando do
início da série Saros 129, encontrava-se em Carneiro, no lugar do actual
eclipse. O militarismo que domina hoje as narrativas internacionais, tal como
dominava no tempo das Cruzadas, protege os interesses de alguns, mas não os da
humanidade, mas, para nos opormos aos perigos dessa narrativa comum, precisamos
de espírito crítico. Séneca diz-nos o seguinte: “Procuremos, pois, aquilo que é o melhor e não o que é mais comum,
aquilo que nos colocará na posse de uma felicidade eterna e não o tem a
aprovação do vulgar, que é o pior intérprete da verdade” (Da Vida Feliz, 2;
Carta sobre a Felicidade de Epicuro e Da Vida Feliz de Séneca, trad. J.
Forte, 43. Lisboa: Relógio D’Água, 1994).
Essa é a lição dos tempos e de como humano pode encarar a realidade.
No
eclipse de 1103, Raimundo IV, conde de Toulouse, com os cruzados, lançou uma
ofensiva no vale de Beca (ou Beqaa), capturando Tortosa (Tartans), e para fortalecer
o cerco de Tripoli, constrói o imponente castelo de Mons Peregrinus (em árabe,
Quala’at Sangil). Os esforços de Raimundo de Saint-Gilles foram auxiliados pelo
imperador Aleixo I Comneno, com o envio da frota bizantina. Mais tarde, os
cruzados, liderados por Boemundo I de Antioquia e por Juscelino I de Edessa (e
II de Courtenay), avançam no território de Alepo e, com as suas ofensivas e
conquistas, forçam o sultão Fakr al-Mulk Radwan ao pagamento de um tributo. No
ano seguinte, a 26 de Maio, o rei Balduíno I captura Acre. O porto havia sido
cercado pelas frotas de Génova e Pisa. Balduíno promete, porém, conceder passagem
a quem queira seguir para Ascalão, mas os italianos pilham os migrantes muçulmanos
ricos e matam muitos deles. Por outro lado, os seljúcidas fixam-se em Damasco,
na Síria. Podemos facilmente observar a actualidade de todos estes movimentos
e, mesmo que se diga a história não se repete, o humano repete-se sem sombra de
dúvida.
Na
série Saros 129, o último eclipse penumbral (26/041446) e o primeiro eclipse
anular (06/05/1464) ocorrem no signo de Touro. Este elemento torna-se
significativo se pensarmos que o eixo nodal actual ainda se encontra neste
signo e o próximo eclipse lunar também aí ocorrerá. Cerca de dois meses após o
eclipse, a 16 de Julho de 1464, dá-se a batalha de Montlhéry, onde as forças de
rei Luís XI de França defrontam a Ligue du Bien Public, que reunia um conjunto
nobres que se opunha ao poder centralizado do rei. O conflito termina com o
regente a assinar três tratados de paz. Por outro lado, dois dias depois, o rei
deposto Henrique VI de Inglaterra é capturado pelas forças de York e colocado
na Torre de Londres. A rainha Margarida de Anjou e o príncipe Eduardo fogem
para França. A Guerra das Rosas opôs as dinastias de York e de Lancaster. O
caso francês lembra-nos hoje a forma como o presidente Macron tenta
implementar, de forma contrária à vontade popular, uma nova idade da reforma.
No Reino Unido, vemos claramente a queda de primeiros-ministros e o extremar de
posições, bem como alguma resistência republicana à coroação de Carlos III.
O
último eclipse anular da série ocorre no signo de Peixes, a 18 de Março de
1969. Lembremo-nos que a série Saros 129 termina com um eclipse também em
Peixes, a 21 de Fevereiro de 2528. É muito curiosa uma série que se inicia em
Balança e termina em Peixes e cujos principais eclipses ocorrem em Carneiro e
Touro. Existe um choque notório entre individualismo e comunidade. A proposta
de início e fim colide com os acontecimentos que, sobre esta linha de luz e
sombra, se estendem. Ora, aquando do eclipse de 1969 e no período de sua
influência, encontramos, por exemplo, os sismos na China e no Peru e a forte
tempestade tropical na Índia e no Bangladesh. Por outro lado, temos os
movimentos de independência em África e a Guerra Colonial Portuguesa, bem como
a Guerra do Vietname, a crise do petróleo de 1973 e um conjunto de intensas
alterações políticas e ideológicas, e das consequentes transformações sociais.
Ao
eclipse de 1969, em Peixes, seguem-se três eclipses híbridos em Carneiro, dos
quais o actual é o terceiro. O primeiro destes eclipses ocorreu a 29 de Março
de 1987. Uns dias depois, a 13 de Abril, celebra-se o acordo entre Portugal e a
China para a entrega de Macau. No final do ano, dá-se a Primeira Intifada e o agudizar
do conflito israelo-palestino e, no dia 30 de Dezembro, o Papa João Paulo II
publica a encíclica Sollicitudo rei
socialis, onde é desenvolvida a doutrina social da igreja. O segundo
eclipse dá-se a 8 de Abril de 2005 em pleno conclave, depois da morte de Papa
João Paulo II, a 2 de Abril. Bento XVI tornar-se-á papa a 19 de Abril. O eclipse
de dia 20 de Abril será também determinante para os destinos da igreja
católica. Todos estes factos, desde o início da série Saros, permitem que se
observe uma visão de conjunto e se alcance uma totalidade simbólica de
sentido.
Cícero, acerca da velhice, diz-nos algo
que é particularmente importante para esta análise: “Nisto assemelham-se aos que acusam o timoneiro de nada fazer durante a
viagem, enquanto uns trepam pelos mastros, outros correm por entre os bancos, e
outros esvaziam a sentina, segurando, porém, aquele o leme, sentado à popa
tranquilamente. Não faz ele aquilo que os mais jovens fazem, mas, o que faz
fá-lo com maior exigência e melhor. Não se realizam grandes feitos recorrendo à
força, à agilidade ou destreza físicas, antes, pelo conselho, pela autoridade,
pelo prestígio, dos quais a velhice não só não se encontra privada como ainda
os engrandece.” (Catão-o-Velho ou Da
Velhice,
6.17, trad. C. H. Gomes, 23. Lisboa: Biblioteca Independente, 2009). A experiência íntima do tempo
histórico, que aliás é própria da representação astrológica, faz do astrólogo
um timoneiro da demanda do sentido, da consciência plena de que tudo se une,
segundo os ditames da Providência, numa simpatia universal, numa harmonia dos
opostos.
Sob
o horizonte, na Porta do Hades (II), o Sol, a Lua e Júpiter vêm a sua acção
detida sob a sombra do eclipse. O manto de escuridão conduz a acção da luz aos
portões do submundo. Esta é uma posição significativa, pois Plutão (Hades), o
deus que rege o submundo, é o astro mais alto e Saturno apresenta-se como
lanceiro da sizígia e como Estrela da Manhã, com uma visibilidade pós-ascensão
(sextil de Plutão em Aquário ao Sol, Lua e Júpiter em Carneiro). A morte e a
necessidade são a acção que culmina, aqueles que ascende primeiramente até ao
Meio do Céu. Plutão em Aquário e Saturno Peixes marcam determinantemente os
acontecimentos actuais. A morte visita o humano e a justa retribuição será um
sinal do tempo. Porém, a empatia, a compaixão e a solidariedade ressurgem como
vias de ascensão. As lutas pelos direitos sociais e a necessidade de um Estado
Social reafirmam-se hoje, lamentavelmente para um certo pensamento astrológico,
mais por Saturno e Neptuno em Peixes do que por Plutão em Aquário. Lembremo-nos
sempre da máxima de que é o planeta que faz o lugar e não vice-versa. Essa
ideia evitaria muitas simplificações.
Um outro aspecto que marca o tempo
do eclipse e aquele que rege a sua influência é o que liga o Sol, a Lua e
Júpiter em Carneiro, em sextil, a Vénus (e ao Ponto Subterrâneo) em Gémeos e,
em quadratura, a Marte em Caranguejo. Esta conjugação de aspectos, potenciada
pela própria posição de Marte, vai revelar o medo do feminino e um aumento da
misoginia, da violência contra as mulheres e um retrocesso nos seus direitos.
Veja-se, por exemplo, a tentativa de um tribunal norte-americano proibir a
pílula abortiva, disponível e certificado pela FDA há cerca de vinte anos. De
um outro modo, a quadratura de Vénus em Gémeos a Saturno e Neptuno em Peixes e
o trígono de Vénus a Plutão em Aquário transmite-nos a dificuldade de levar ao
outro a mensagem do amor do que move o sol e as estrelas, como diria Dante,
aquele que conduz o herói até à casa da Grande Mãe, da Deusa que é a vida na
morte e a morte na vida. Quando a morte visita o humano (Plutão em Aquário), o
rosto que surge é o de Perséfone, a rainha do submundo que é também a donzela
da Primavera. As estruturas vigentes e as ilusões de um patriarcalismo que
teima em persistir resistem a esta mensagem, mas a palavra do amor terá de ser
a acção do bem (sextil de Vénus a Júpiter).
A posição de Mercúrio, de Úrano e da
Caput Draconis em Touro é especialmente significativa: primeiro, porque Úrano
também se encontrava em Touro no tema do eclipse de 1103, o que iniciou a série
Saros 129; depois, devido à quadratura destes a Plutão em Aquário e deste à
Cauda Draconis em Escorpião. O eixo do valor, ou seja, do viver ao morrer, onde
se estende o Dragão da Lua, a par destas ligações, é um notório sinal dos
tempos. Aqui encontramos o resultado da negação da mensagem que a Mãe Terra nos
transmitia, durante décadas, e que, por teimosia e indiferença, preferimos
rejeitar. O planeta está mudar, quer queiramos, quer não. O deus da morte (Plutão)
não vai espalhar a superficialidade de uma espiritualidade líquida, aquela que
nas últimas décadas do século XX permitiu mudar mentalidades, mas que hoje é
insuficiente. A mensagem anuncia a iminência de uma nova extinção: a extinção
do humano. Ora a forma dessa extinção oculta-se na Natureza e é sibilada pela
Providência. Nós estamos assim perante o enigma esfíngico de renovar o
viver.
Os sextis de Mercúrio e Úrano em
Touro a Marte em Caranguejo e a Saturno e Neptuno em Peixes concedem a
liberdade de agir que pode, se assim o quisermos, ser tanto o leme da vida como
a dádiva da fortuna. Podemos, se encontrarmos o lugar da Deusa, se acolhermos
os dons da Terra, transformar a realidade e aprender a viver conscientemente o
planeta que é a nossa casa. Contrariamente, Marte em Caranguejo une-se
quadrangularmente a Júpiter em Carneiro e triangularmente a Saturno em Peixes.
O medo do feminino contamina, ferindo e dilacerando, o espaço e o tempo. A Era
do Espírito Santo, do Sagrado Feminino, anuncia-se, o tambor na noite marca a
dança e o ritual, mas a maioria teima em renegar esse tempo que se proclama.
Existe uma resistência persistente em aceitar a Deusa que se ergue no céu
estrelado.
Neste eclipse solar, a sombra vai-se
estender sobre a acção, obrigando a redefinir o sentido e o valor. A luz e o
bem terão assim de se firmar e restabelecer a harmonia dos contrários. Com o
eixo nodal a avançar para o eixo Carneiro-Balança, a escuridão cairá sobre a
identidade, obrigando ao esforço de concórdia entre a unidade e a dualidade. A
luz e a sombra são enigma da morte sobre o humano e, perante a inquietação
radical de saber quem somos, é preciso escolher e marcar o caminho.
segunda-feira, 20 de março de 2023
sábado, 18 de fevereiro de 2023
sexta-feira, 20 de janeiro de 2023
Sol em Aquário: De 20 de Janeiro a 18 de Fevereiro de 2023
quarta-feira, 21 de dezembro de 2022
Sol em Capricórnio: De 21 de Dezembro 2022 a 20 de Janeiro de 2023
terça-feira, 22 de novembro de 2022
segunda-feira, 24 de outubro de 2022
Reflexões Astrológicas 2022: Eclipse Solar Parcial - Lua Nova em Escorpião
Reflexões Astrológicas
Eclipse Solar Parcial
(Lua Nova em Escorpião)
Lisboa, 12h00min, 25/10/2022
Sol-Lua
Decanato: Marte
Termos: Marte
Monomoiria: Vénus
O
Eclipse Solar Parcial de 25 de Outubro ocorre no signo de Escorpião, com Sagitário
a marcar a hora, no Segmento de Luz (αἵρεσις) do Sol, com os luminares acima do horizonte, embora na XII,
também designada de Pós-Ascensão, o lugar da Má Fortuna (κάκη τύχη),
e a cerca de quatro horas após o orto solar (hora de Lisboa), no decanato e
termos de Marte e na monomoiria da Vénus.
Os eclipses, no eixo nodal Escorpião-Touro, serão particularmente expressivos
até ao eclipse total de 20 de Abril de 2023, já em Carneiro, embora a
influência de alguns destes eclipses, como o actual, se estenderá pelos
próximos anos, marcando assim essa ponte entre a morte a vida, entre as
estruturas de valor que constroem a realidade e alimentam a nossa actividade.
A
distribuição planetária pelo tema consolida a ideia – e que aliás será demonstrada
pela matriz da série Saros em que este eclipse se insere – de que os elementos
estruturantes (Terra e Ar) actuam agora de forma mais activa do que os
elementos dinâmicos (Água e Fogo). Em primeiro lugar, deve-se estabelecer as
fundações da uma nova realidade para depois colocar em movimento as novas
forças criativas. Porém, metade dos astros, se considerarmos os transaturninos,
encontram-se abaixo da linha do horizonte, o que potencia, no elemento Água, o princípio
de sombra uterina do próprio eclipse.
Mercúrio
é a luz mais alta e a Estrela da Manhã, mas o eclipse ocultará a sua luz, bem
como a de Vénus, a Estrela da Tarde, e, junto ao Poente, caindo para o reino
sob a Terra, a de Marte. O número pode assim encobrir o sentido preciso e
profundo deste eclipse, ou seja, Escorpião, qual timoneiro da morte, encerra em
si, como um nevoeiro denso e temível, as chaves do abismo, e sem se descer ao
abismo não se sobe à montanha. Essa é a dureza da verdade e do caminho da
sabedoria, é como uma via iniciática que se trilha com esforço desapegado e
despido de toda a vaidade.
Um
eclipse tem o potencial extraordinário de colocar a sombra e a luz sobre o
tempo e espaço, ocultando e revelando a sua dádiva. Ora, em termos geográficos
e segundo as lições da astrologia antiga, Manílio refere primeiramente que
Escorpião governa Cartago, a Líbia, o Egipto, Cirene, a Itália e a Sardenha (Astronomica IV, 777-82), enquanto Vétio Valente (Antologia I,2)
diz-nos que Escorpião rege a Mesopotâmia, a Babilónia, a Grécia, a Acaia,
Creta, as ilhas Cíclades, o Peloponeso, a Arcádia, Cirene, a Dória, a Sicília, a
Pérsia, Metagonitis ou a Numídia (Norte
de África, Argélia e Tunísia), a Mauritânia, a Getúlia (Norte de África,
Argélia e Tunísia), a Síria, Comagena (Ásia Menor), a Capadócia, Itália,
Cartago, a Líbia, Amom (Jordânia),
Espanha e Roma.
A sombra do actual eclipse cobre de
facto muitas destas áreas, estendendo-se desde a Islândia até ao norte da
Mongólia, entre o norte de África e o Médio Oriente e as regiões árcticas. No
entanto, o centro do eclipse ocorre entre as cidades russas de Surgut e de Nizhnevartovsk,
na planície siberiana ocidental. Estas são duas cidades cuja riqueza resulta especialmente
do gás natural e do petróleo, alertando-nos para um agravamento da crise dos bens
de primeira necessidade. Aquilo que tem valor está sob julgamento. De uma forma
simplista e animada pela propaganda ocidental, dir-se-ia que a sombra da morte recairá
sobre a Rússia e que a Ucrânia inverterá o ónus bélico, mas o lugar da morte
pode também ser o sítio a partir do qual ela se expande, o seu actual
domicílio. A guerra é sempre guerra e a humanidade perde sempre.
Independentemente da perspectiva, a
realidade diz-nos que será a partir deste território, seja qual for o lado das
barricadas, que as hordas de falsos valores conduzirão a humanidade até às suas
ruínas. A lição de uma sizígia sob corpo do Dragão da Lua e no signo de
Escorpião remete-nos para uma concentração de luz e sombra num elemento
destrutivo e este não é apenas a guerra, vai muito para além dela, pois coloca-nos
no limiar do abismo, sem a segurança do fio de Ariadne, e obrigando-nos a centrar,
ou recentrar, no essencial. Joseph Campbell, em O Poder do Mito, diz-nos: “Ama os teus inimigos porque eles são os
instrumentos do teu destino.” (trad.
J. F. Moisés, 174. São Paulo, 1990: Palas Athena).
E, para aquele que se firma somente na vida (Touro) não existe maior inimigo que
a morte (Escorpião), mas a vida e a morte, seja pela aceitação ou pelo temor,
são os instrumentos originais do nosso destino.
O
tempo, face ao destino, surge assim como a cruz que se carrega por amor. O Amor
de Deus vive na totalidade do tempo, na eternidade, todavia, o humano teme o
instante e a eternidade, pois estes são, na verdade, um e o mesmo. A
Necessidade, neste eclipse, traça os seus ditames de forma oculta. Se, de uma forma
um pouco diferente do método ptolemaico, considerarmos três factores antigos, ou
seja, o avanço de 10º do eixo nodal a cada eclipse de uma série Saros, a
magnitude do eclipse e os tempos de ascensão para o centro do eclipse,
constatámos então que a influência deste eclipse poder-se-á estender dos seis
meses até aos quatro anos e meio. Este efeito funda-se num sentido que se
encontra profundamente enraizado nas transferências de luz e sombra da presente
série Saros.
Bernadette Brady, em Predictive Astrology, acerca do conceito
de série Saros, afirma o seguinte: “Imagine-se
todo o conceito como uma floresta. Cada série Saros é uma árvore na floresta e
cada eclipse é uma folha dessa árvore em particular.” (2022: 196.
Newburyport: Weiser Books. Originalmente: The
Eagle and the Lark, 1992).
Cada série Saros produz um eclipse solar a cada 18 anos e 9 ou 11 dias,
consoante os anos são bissextos, e estender-se-á por cerca de 650 anos. À
medida que a série avança, cerca de 10 graus a cada eclipse, o eclipse acontece
mais perto do eixo nodal, reduzindo-se a orbe entre o eixo e eclipse. Se a
série começou no Pólo Norte, ela terminará no Pólo Sul, e vice-versa. Existe
neste conceito não só um sentido profundo, riquíssimo para a Astrologia Mundana
ou Global, mas também uma enorme beleza.
O
primeiro eclipse de uma série e o seu tema astrológico servem de matriz para
toda a série, é o seu tema genetlíaco. A
série Saros 124 começou com o eclipse de 3 de Março de 1049. Ora, a 12 de
Fevereiro, Leão IX tornou-se papa e este será o pontífice que marcou, até 1054,
o período que conduziu ao Grande Cisma, à separação entre a igreja católica e a
igreja ortodoxa. Pode parecer, à primeira vista, apenas um acontecimento ou
fenómeno espiritual, todavia, este cisma estabeleceu um conjunto de alterações
políticas que subsistem até aos nossos dias. Por outro lado, o último eclipse
da primeira fase, isto é, da primeira fase eclipses parciais, deu-se a 1 de
Junho de 1193. Uma data que consolidou o desfecho da terceira cruzada: morre
Saladino e o rei Ricardo I, no seu regresso, é capturado por Leopoldo V, duque
da Áustria, e entregue ao imperador Henrique VI, por suspeita de envolvimento
no assassinato de Conrado de Monferrato, eleito rei de Jerusalém.
O Sol, a Lua, Vénus e Mercúrio em Peixes, no eclipse
matriz (06/03/1049), em sextil a Saturno em Capricórnio e também Neptuno em
Carneiro em sextil a Júpiter e Plutão em Aquário favorecem estes acontecimentos
e determinam uma tendência que está presente em toda a série. De facto, no
primeiro eclipse total que assinala o início da segunda fase (12/06/1229), os
factos históricos prosseguem em sentido similar, pois, nesse ano, termina a
sexta cruzada na Terra Santa e é assinado o Tratado de Paris que impõe o fim da
cruzada albigense que, por consequência, leva a igreja católica a estabelecer
permanentemente o Santo Ofício da Inquisição em Roma, chefiado pela ordem
dominicana.
A segunda fase da série Saros 124, aquela em que
ocorreram os eclipses totais, estendeu-se até ao eclipse total de 22 de
Setembro de 1950 ou até ao eclipse híbrido de 3 de Outubro de 1986. No
primeiro, a Guerra da Coreia domina o panorama geoestratégico mundial, mas
também ideológico. Deve-se destacar que, na data do próprio eclipse, começou a
Segunda Batalha de Seul e, no dia seguinte, a Batalha da Colina 282. Já na data
do eclipse híbrido, convém salientar o sismo de San Salvador (10/10/1986) e o encontro
de Reagan e Gorbatchev, em Reiquiavique, para se discutir a redução do arsenal
bélico. Este encontro falhou o seu propósito. Porém, do ponto vista
astrológico, o centro do eclipse ocorreu na costa da Islândia, confirmando o
seu sentido.
A terceira e última fase da série iniciou-se com o
eclipse parcial de 14 de Outubro de 2004 e terminará a 11 de Maio de 2347. No
eclipse de 2004, menos de duas semanas após o mesmo, assinou-se o Tratado de
Roma, a primeira constituição europeia. É assim bastante evidente que esta
série está profundamente enraizada em valores espirituais e políticos, todavia,
quando são colocados em acção, assumem-se, com frequência, quer como promotores
de concórdia, quer como fontes de intolerância e até de totalitarismo. A
intensidade maléfica do actual trígono de Ar, ou seja, Mercúrio em Balança, Marte
em Gémeos e Saturno em Aquário, possui muitos dos elementos que corromperam o
pensamento, as ideias e a comunicação. A superficialidade com são abordados
muitos dos temas é exemplo disso mesmo, bem como o poder disruptivo da
propaganda e da desinformação.
A aversão entre o eclipse, entre a posição dos luminares
e de Vénus em Escorpião, e Marte em Gémeos estabelece-se com profundidade, pois
não se funda apenas na posição geométrica e na respectiva ausência de aspecto
ptolemaico, mas também no facto de o regente domiciliar do eclipse se encontrar
neste lugar disfuncional, onde a morte da sombra e da luz, sugerida pelo
eclipse, é de facto anunciada. Existe aqui, nesta aversão, uma destruição que
não é explícita, mas que se oculta no prenúncio de Hades, na sua sombra sob a
terra, sob o reino de Deméter. A relação do eclipse com Júpiter em Carneiro
fundamenta-se também numa aversão, contudo, quer por ser um benéfico, quer por
não ter a mesmo dignidade em Escorpião ou ainda pelo trânsito futuro por Peixes
e depois por Touro, não assume o mesmo carácter que Marte em Gémeos.
O segmento de luz intensifica também o carácter maligno
de Marte, fazendo deste o grande maléfico do eclipse. Já Saturno em Aquário,
apesar de atenuado pelo segmento de luz diurno, une-se quadrangularmente com os
luminares e com Vénus. Este traz consigo a morte de Penteu, o rei de Tebas que
casou com Harmonia, filha de Afrodite e Ares. As bacantes, adoradoras de
Dioniso, confundem, no seu frenesim, Penteu com um javali e matam-no. É Dioniso
quem leva as bacantes a cometer o acto, porque Penteu renegava o deus e
desrespeitava o seu culto. O carácter apolíneo de Penteu, enraizado aqui em
Touro, opõe-se ao dionisíaco, à expressão de Escorpião e este é o eixo nodal, o
corpo do Dragão da Lua, que rege este eclipse. Saturno em Aquário concede
quadrangularmente, com peso, com gravidade, a este eixo e a esta oposição entre
Apolo e Dioniso, entre Touro e Escorpião, a ὕβρις,
a desmedida. Existe, deste modo, uma nova tensão nas fundações da Natureza.
A relação do eclipse com os transaturninos pode encontrar
também aqui uma matriz de sentido que é mitológica e astrológica. Se Escorpião
é Dioniso, então a sombra do eclipse vai levar a estes planetas o êxtase da
destruição, o frenesim da separação, aquele em que o indivíduo se perde,
emergindo num delírio espiritual e místico. As profundezas reservam para si
esse poder. Tem de existir uma renovação pela morte. Esta é a condição necessária
para o renascimento, para a chegada de uma nova luz. A sabedoria voltará a
brilhar, pois morto o velho humano, o novo nascerá.
A forma como, no entanto, este princípio leva os seus
raios aos planetas transaturninos obriga-nos a rever a estrutura conceptual que
lhes outorgarmos, pois se analisarmos com cuidado a mitologia de Úrano, de
Neptuno e de Plutão, percebemos que podemos estar a cair numa falácia. Quando,
para facilitar a interpretação, a astrologia contemporânea colou o significado
dos signos primeiro ao significado das casas na ordem vernal e depois destas
aos seus regentes, criou-se um sentido que pode ser desadequado e exagerado. Algo
que, pelo peso da tradição, não aconteceu com os restantes planetas. Contrariou-se,
por exemplo, o valor conceptual do thema
mundi e o significado tópico do sistema de casas, ambos criados pela matriz
hermética da astrologia antiga. A mitologia pode refundar estes conceitos e
trazer outros sentidos aos transaturninos.
A
oposição entre os luminares e Vénus em Escorpião, sob o manto do eclipse, e
Úrano em Touro tem, neste binómio nietzschiano de apolíneo e dionisíaco, uma
hegemonia do tirso, qual deus itifálico, sobre o deus castrado emasculado. A
castração de Úrano não é, de um ponto de vista astrológico, a consequência
directa de uma certa androgenia de Hermes/Mercúrio. Úrano é castrado por
Cronos/Saturno por se recusar a separar-se de Gaia, impedindo os seus filhos de
sair do seu ventre. Na verdade, a posição de Úrano em Touro reforça este
aspecto. Este é também o céu agressor e o símbolo da terra abusada, subjugada.
A actual quadratura de Saturno e Úrano traduz, neste cenário mitológico, a
libertação da Terra do seu jugo. Hoje o abusador é o humano e a Terra clama por
liberdade.
De
uma outra forma, o trígono com Neptuno em Peixes mostra como o deus Posídon não
representa de todo a ilusão ou a evasão. É um deus dominante, misógino como
Zeus, que tomou o trono de Eurínome, a deusa do mar e da origem, e que sob a
forma de cavalo é sexualmente prolífico, daí que represente aqui a teogamia e a
fertilização divina. Já o sextil com Plutão em Capricórnio introduz, por
exemplo, como o deus romano Plutão representa a abundância, pois as riquezas
nascem sob a terra, no seu domínio. Ora, indicando Capricórnio o corno de Amalteia,
a cornucópia da abundância, esta posição adquire assim um outro sentido. Este é
o poder da semente. Os planetas transaturninos devem pois passar por uma
refundada exegese que os liberte do pensamento único.
Neste
eclipse, o grande benéfico, devido ao segmento de luz, é Júpiter em Carneiro.
No signo que é fogo em acto, exacerbará a dinâmica criativa, mas aquilo que
cria também destrói. Essa é a regência domiciliar de Marte sobre Carneiro. A
actual oposição de Júpiter e Mercúrio, estando em Balança, mas ainda sobre os
raios sombrios do eclipse (15º), estende diametralmente a dádiva e a palavra.
Existe uma separação entre a justiça e o pensamento. A ilusão da propaganda
populista e belicista serve essa cisão. O sextil, símbolo do livre-arbítrio,
entre Júpiter em Carneiro e Marte em Gémeos, entre o grande benéfico e o grande
maléfico do tema do eclipse, consolida aqui, de forma negativa, esta tendência
para a corrupção da justiça e do pensamento.
Já,
por outro lado, o sextil entre Júpiter em Carneiro e Saturno em Aquário pede à
liberdade humana uma integração do destino na dádiva, criando uma outra
justiça. A nova era, o tempo do Espírito Santo, do Divino Feminino, cria, sob
os auspícios de Júpiter e Saturno, o espaço e o tempo para a Sabedoria. Porém,
existem agora três quadraturas que minam os passos que hoje temos de dar nesse
sentido. São elas a quadratura de Mercúrio em Balança e Plutão em Capricórnio,
a de Marte em Gémeos e Neptuno em Peixes e a de Júpiter em Carneiro e Plutão em
Capricórnio. Todas revelam, tal como a mensagem do Dragão da Lua indica, os
falsos valores que estão demasiados enraizados e que a humanidade teima em
defender. O falso sentido de universalidade, a obstinação do pensamento único e
a parcialidade da injustiça impedem a mudança necessária.
Um
eclipse solar em Escorpião, mais do que em qualquer outro signo, coloca-nos
perante a Sombra, não aquela que tudo escurece, mas aquela que oculta a Luz.