domingo, 31 de dezembro de 2023
terça-feira, 7 de março de 2023
Saturno em Peixes: De 7 de Março de 2023 a 25 de Maio de 2025 (1º Ingresso)
segunda-feira, 6 de março de 2023
Reflexões Astrológicas 2023: Saturno em Peixes
Reflexões Astrológicas
Saturno em Peixes
Lisboa, 13h35min, 07/03/2023
Sol-Lua
Decanato: Saturno
Termos: Vénus
Monomoiria: Júpiter
O
primeiro ingresso de Saturno em Peixes ocorre com Caranguejo a marcar a hora,
para o tema de Lisboa e, deste modo, na IX, no Lugar de Deus, no Lugar do Deus
Sol, no decanato de Saturno, nos termos de Vénus e na monomoiria de Júpiter. O ingresso dá-se assim acima do horizonte e
cerca de seis horas após o nascer-do-sol. Saturno encontra-se, deste modo,
favorecido por estar no seu próprio segmento (αἵρεσις) e
no lugar do regente do segmento, o Sol. O estudo deste ingresso e do seu tema é
essencial para a compreensão dos tempos que se avizinham. A chegada de Saturno
a Peixes é o acontecimento astrológico mais importante de 2023, seguido pelo
ingresso de Júpiter em Touro em Maio, criando-se, nesse momento, uma harmonia
entre os planetas e os elementos Água e Terra. No tempo (Saturno) e no espaço
(Júpiter), o Eterno Feminino tornar-se-á a dádiva da transformação.
Primeiramente
é necessário situar, no tempo cronológico, este ingresso de Saturno em Peixes
que acontece em dois momentos. O primeiro ingresso ocorre de 7 de Março de 2023
a 25 de Maio de 2025 e o segundo, mais curto, de 1 de Setembro de 2025 a 14 de
Fevereiro de 2026. Passará por três momentos em que estará retrógrado:
o primeiro, de 17 de Junho a 4 de Novembro de 2023; o segundo, de 29 de Junho a
15 de Novembro de 2024; e o terceiro, de 13 de Julho a 28 de Novembro de 2025 e
que inclui, como é perceptível pelos períodos anteriormente mencionados, o
primeiro ingresso de Saturno em Carneiro e o retorno a Peixes. Neste dois
períodos, convém também assinalar a passagem de Júpiter pelos signos de
Carneiro a Caranguejo e o ingresso de Neptuno em Carneiro (primeiro de 30 de
Fevereiro a 22 de Outubro de 2025 e depois a partir de 26 de Janeiro de 2026),
isto para não falar do ingresso de Plutão em Aquário, a 23 de Março de 2023.
O
ingresso de Saturno, do planeta do Tempo e da Necessidade, em Peixes, no signo
da totalidade, transporta consigo um sentido natural de conclusão, de término
ou fim de ciclo. Segundo a ordem vernal, Peixes é o último signo e, assim sendo,
a chegada de Saturno a este signo tem necessariamente a significação do fim,
mas também a da repetição, da estruturação do mesmo, da criação de uma unidade
de sentido, resultante da assimilação da totalidade em torno do propósito que a
Necessidade estabelece. Ora essa ideia de propósito une tanto a regência de um
deus do tempo como a de um deus agrícola. Esse é também o sentido do aforismo
de Novalis que diz que “o fragmento é
semente”, ou seja, a singularidade de um fragmento de tempo torna-se quer o
potencial, quer a finalidade da proposta que ele próprio apresenta. A
Necessidade é portanto uma totalidade que permeia toda e qualquer parte.
Se
a respeito de Peixes já discutimos o imperativo de refundar a sua significação
(v. Reflexão Astrológica da Lua Nova de Peixes), então, no que a Saturno
concerne, confirma-se o mesmo imperativo. A questão em torno da refundação do
sentido não é exclusiva deste planeta, mas é neste caso mais evidente. A
significação planetária, e também zodiacal, tal como a conhecemos, resulta, de
um modo geral, de um modelo categórico da física aristotélica ou do eclectismo
ptolemaico. Porém, existiam, na Antiguidade, outros modelos interpretativos,
nomeadamente o de Platão e o do platonismo. Segundo Plotino, Saturno
simbolizaria o Intelecto (Νοῦς) e Zeus, a Alma (Enéadas V, I, 4). Existia pois uma glorificação de
Saturno por este não representar os poderes terrenos, mas sim o poder mais puro
do pensamento.
Klibansky, Panofsky e Saxl dizem-nos
que “Saturno possuía a dupla propriedade
de ser o antepassado de todos os outros deuses planetários e de ter o seu trono
no céu superior. Essas duas qualidades, que devem ter estado originalmente
conectadas, garantiram-lhe uma supremacia, sem qualquer contestação, no sistema
neoplatónico, que se esforçou neste caso, como em outros, por reconciliar as
visões platónicas com as aristotélicas. A hierarquia dos princípios metafísicos
que remontava a Platão, segundo a qual o genitor tinha precedência sobre o gerado, estava ligada ao princípio
aristotélico do pensamento "topológico", segundo o qual uma posição mais elevada no espaço significava
maior valor metafísico.” (Saturn and Melancholy,
1979: 152-3. Nendeln/ Liechtenstein: Kraus Reprint). Esta
proeminência de Saturno, a par da atribuição de Plotino, desperta uma outra
questão, visto que normalmente o Intelecto é o Sol.
Existiu uma tradição babilónica, sobretudo num período
de cerca de 750 a 612 AEC, que designava Saturno como “o Sol”, Šamaš, em vez da nomenclatura
astronómica mais comum (cf. van der Sluijs, M. A. & P. James,
2013, “Saturn as the Sun of Night in Ancient Near Eastern Tradition” in Aula Orientalis 31.2, 279-321). Esta
designação torna Saturno o “Sol da Noite”, em oposição ao
próprio Sol, o “Sol do Dia”, e pode ter a sua origem num dos elementos astrológicos
radicalmente babilónico: as exaltações planetárias (as outras são o aspecto de
trígono e as dodecatemoria). O lugar
de exaltação do Sol, Carneiro, opõe-se ao da exaltação de Saturno, Balança.
Esse eixo pode ser assim aquele que une o “Sol do Dia” e o “Sol da Noite” e a tradição deste
sentido de Saturno persiste, mesmo que de forma discreta, na tradição
greco-romana. Ptolomeu, por exemplo, diz que os habitantes do território entre
a Mesopotâmia e a Índia chamavam à estrela de Vénus Ísis e à de Saturno Mitra
Hélios (Apotelesmática II, 3).
Por outro lado, e seguindo também
uma interpretação que é quase oposta ao Saturno aristotélico, temos o Saturno
feminino, algo que já abordei por diversas vezes (Fragmentos Astrológicos, 2020: 167-72; Reflexões Astrológicas
2021: Parte II, 2022: 30-1). Esta é a tradição cuja referência mais antiga
pertence a Doroteu de Sídon (Carmen Astrologicum, I, 10, 18-19) e que pode ter
ainda uma matriz de sentido na proeminência do númen feminino no reinado de
Saturno. A astrologia precisa pois de uma metodologia interdisciplinar para
melhor compreender os seus conceitos. O estudo rigoroso da mitologia pode,
desta forma, contribuir para refundação desses mesmos conceitos.
No tempo de Cronos/Saturno, a sua mãe
Gaia e a sua esposa Reia eram duas deusas poderosas, que não se apresentavam com
uma submissão ao paradigma androcêntrico, como a que encontramos nos deuses
olímpicos. Ora esse factor está presente em Manílio quando coloca a Mãe dos
Deuses (Reia/Cíbele), a par de Júpiter, como regente divino do signo de Leão (Astronomica II, 447). Se pensarmos que, do outro lado do eixo, está Saturno como regente astrológico
de Aquário, encontramos então um elo de ligação com Saturno como o “Sol da
Noite”.
Compreendemos, desta forma, que as
significações não são lineares e que, ao longo dos tempos, transmitem uma
prevalência interpretativa que não é, no entanto, exclusiva. Existem outros
sentidos que podem e devem ser recuperados. De um ponto de vista mitológico ou
astro-mitológico, encontramos ainda uma outra tradição que nos concede um
elemento de passagem entre o próprio Saturno e o Saturno em Peixes. Para além
do facto de Saturno ser o regente da Idade de Ouro, ele é também o rei da Ilhas
dos Bem-Aventurados, ou Ilhas Abençoadas.
Neste mito (e.g. Hesíodo, Os Trabalhos e os
Dias 156 e ss.; Platão, Górgias
525a e ss.), após o seu destronamento e prisão no Tártaro, Cronos/Saturno terá sido
reabilitado e terá encontrado um novo trono nas Ilhas dos Bem-Aventurados que,
segundo alguns, incluiriam os nossos Açores ou toda a Macaronésia. Nestas
ilhas, onde se encontram os Campos Elísios, viveriam aqueles que não têm de
perturbar a terra com o vigor das mãos e que vivem uma existência sem lágrimas
(Píndaro, Ode
Olímpia 2.55 e ss.). Este mito indica, sem grande esforço interpretativo, Saturno em
Peixes, a Necessidade sobre a Totalidade.
O tema do ingresso de Saturno em
Peixes, para a hora de Lisboa, tem uma particularidade deveras interessante,
pois ao fixar a hora em Caranguejo reproduz a disposição de lugares do Thema Mundi. Ora, desta forma, Saturno
vai cair no lugar de Peixes, a IX, o Lugar de Deus. Esta posição torna mais
significativa uma certa diminuição da malignidade de Saturno, uma vez que em Peixes
está no domicílio de Júpiter, aquele mitologicamente ocupou o seu lugar, e está
também fora de seu segmento de luz e num signo feminino. A condição de Saturno
pode assim, se a humanidade permitir, conceder à totalidade a Necessidade, ou
seja, pode conferir a dádiva da aceitação do destino, a sua interiorização. Se
conhecermos o propósito, a finalidade, o sentido do todo, o caminho adquire um
outro valor e transforma toda a acção.
Este tema, considerando-se os eixos
de ascensão e culminação, apresenta uma beleza singular e uma intensa expressão
do feminino que, tendo em conta os sentidos alternativos para Saturno, alcança
uma proposta significativa profunda. Primeiro temos o eixo pós-plenilúnio que
une a Lua em Virgem a Saturno, Mercúrio, ao Sol e a Neptuno em Peixes,
estendendo esta concentração até ao Lugar da Deusa, a III, onde a Lua se
encontra.
De seguida, temos
os dois trígonos: o da Água que une o ponto que marca a Hora em Caranguejo aos
planetas em Peixes e à Cauda Draconis
em Escorpião, em que o Destino se torna a vida e a fé, a sabedoria; e o de
Terra que, por sua vez, une a Lua em Virgem a Úrano e à Cauda Draconis em Touro e a Plutão em Capricórnio, a caminho do
poente, ou seja, um triângulo que faz da Deusa, do Eterno Feminino, o espírito
que se erguerá sobre as cinzas do velho mundo e a aurora de uma Nova Era. Por
fim, face a estes dois trígonos, temos os seis sextis que resultam destas
ligações, destas harmonias.
Existem, no entanto, dois elementos
que divergem desta unidade entre a Água e a Terra. Um diverge, convergindo,
pois afirma a acção do bem sobre esta proposta de sentido. Vénus e Júpiter em
Carneiro permitem que o bem, a beleza e justiça se tornem actividade. Desde que
a humanidade queira, a efectivação da dádiva é uma possibilidade. Os benéficos
são os astros mais altos, raiando de esperança, de luz, mas colidindo com a
morte sobre o Ocaso (Plutão em Capricórnio), sobre o seu poder. A destruição é o
perigo de uma actividade movida pela desmedida. No entanto, uma vez mais, será
Marte em Gémeos a expressar uma pulsão de divergência disruptiva, firmada pelos
raios quadrangulares aos planetas em Peixes e à Lua em Virgem. A malignidade do
pensamento dual que finge querer a mudança, quando o que faz é ferir e separar,
continua a ser uma ameaça real. As teias de desinformação que alimentam o ódio,
a xenofobia, a misoginia, o racismo, a intolerância são o abismo do humano.
Porém, a acção do bem, dos actos que promovem a igualdade, a liberdade e a
fraternidade continuam a ser o outro lado da barricada (sextil de Marte em
Gémeos a Vénus e Júpiter em Carneiro).
Saturno ingressa em Peixes no momento em que, neste signo, se encontram o Sol, Mercúrio e Neptuno. Esta concentração de luz, a partir do Lugar de Deus, apresenta-se como o fogo na câmara interna, no Santo dos Santos. Desse santuário profundo, a luz e a necessidade, a palavra e o amor universal podem alcançar a humanidade, a totalidade. Se considerarmos Saturno como o Intelecto, o que não diverge da ideia estóica de Destino ou a ideia platónica de Necessidade, podemos observar então a sua acção como parte deste princípio que permeia o mundo e que tece uma harmonia, uma simpatia, entre o microcosmos e o macrocosmos. Saturno em Peixes é, em suma, a Necessidade ou o Destino na totalidade.
quinta-feira, 2 de março de 2023
domingo, 19 de fevereiro de 2023
Reflexões Astrológicas 2023: Lua Nova em Peixes
Reflexões Astrológicas
Lua Nova em Peixes
Lisboa, 07h06min, 20/02/2023
Sol-Lua
Decanato: Saturno
Termos: Vénus
Monomoiria: Marte
A
Lua Nova de Fevereiro, a última do actual ano astrológico, ocorre no signo de
Peixes, com Aquário a marcar a hora para o tema de Lisboa e, deste modo, na II,
no Lugar do Viver (βίος),
no decanato de Saturno, nos termos de Vénus e na monomoiria de Marte. A sizígia dá-se assim abaixo do horizonte e
cerca de vinte minutos antes do nascer-do-sol. A Lua encontra-se favorecida por
estar no seu próprio segmento e num signo feminino, embora abaixo do horizonte,
já o Sol encontra-se desfavorecido por estar fora do seu próprio segmento de
luz (αἵρεσις) e abaixo do
horizonte. Desta forma, a luz, à semelhança do anterior novilúnio, continua a
apresentar uma qualidade submersa, oculta, embora, nesse reino sob a terra, na
lua nova anterior descesse e no actual suba.
Se
seguirmos a ordem vernal, Peixes é o último signo, daí que o conceito de
totalidade seja aquele que melhor o define. Esta definição está também de
acordo com a ordem do Thema Mundi
que, com Caranguejo a marcar a hora, o coloca na IX, no Lugar de Deus, do deus
Sol. Se pensarmos que, segundo o Thema
Mundi, a III e a IX têm uma natureza de templo do feminino e do masculino,
do Sol e da Lua, do divino, então torna-se compreensível como esta ideia de
totalidade se integra, fundando o seu sentido, no signo de Peixes. Por outro
lado, no que às dignidades concerne, Peixes é o único signo em que o domicílio
e a exaltação estão entregues aos benéficos (domicílio de Júpiter e exaltação
de Vénus). A dádiva do bem adquire assim a mesma ideia de totalidade. Júpiter
estabiliza o bem para que Vénus o eleve no amor divino.
Uma
das grandes falácias da astrologia contemporânea é uma colagem quase absurda
dos signos às casas (ou lugares, na terminologia antiga). Na Antiguidade, que é
o período que me é caro, essa tentativa de simplificação não existe. Os
círculos astrológicos de sentido são estruturas dinâmicas, daí que Peixes não
seja a XII, tal como Carneiro não é a I e assim sucessivamente. Esta tentativa
de unidade significativa resulta, a meu ver, do facto da astrológica moderna
tentar simplificar os conceitos face à astrologia tradicional, considerada por
muitos astrólogos como densa e com muitos conceitos e variantes. Com esta
unidade de sentido, surgem, porém, interpretações bizarras e que alimentaram
muitos livros e cursos, como por exemplo “Sol em Carneiro ou na I quer dizer
isto ou aquilo” ou a “Lua em Touro ou na II quer dizer isto ou aquilo” e assim
por diante. Estas interpretações contrariam, por completo, o sistema tópico de lugares
ou casas, criado pela astrologia antiga de matriz hermética, em Alexandria, por
volta do século I AEC.
Ora
este abuso interpretativo condicionou também o sentido atribuído aos
transaturninos e, por consequência, aos signos por eles regidos, o que
conduziu, directa ou indirectamente, a outra bizarria, à análise pessoal de um
planeta colectivo. O uso destes três planetas na interpretação mundana ou
naquela que relacione o indivíduo à sua realidade social e geracional é
aceitável e compreensível, mas torná-los simplisticamente planetas pessoais é
um erro grosseiro. Plutão, por exemplo, numa vida humana, não avançará muito
além dos seis ou sete signos, o que limita o seu sentido pessoal.
No
entanto, não digo que se rejeite a sua utilização, porque é uma escolha, digo
sim que os conceitos devem ser coerentes. Esta simplificação não serve a
astrologia, serve a mercantilização de cursos que tornam o ensino de um saber
milenar uma extensão de um instituto de formação profissional, onde a
astrologia, em Portugal, não sequer é reconhecida como área de estudo. O
esforço que exige estudar a história, as referências e as variáveis de sentido
é substituído por uma cartilha de diapositivos repleta de lugares-comuns. O
ensino da astrologia, pela sua própria natureza, tem de ser um caminho para a
sabedoria, daí que a astrologia do hoje e do amanhã precise desesperadamente
das humanidades e das suas metodologias. A história da astrologia tem
recuperado, de forma séria e académica, a dignidade da astrologia e refundado
um caminho para uma nova prática.
Este
preâmbulo serve para reafirmar que o sentido dos signos não pode, de um modo
fixo e descontextualizado, estar vinculado às casas. Desta forma, um novilúnio
em Peixes, como o actual, vai-nos trazer, exacerbando, essa harmonia de sentido
entre o domicílio de Júpiter e a exaltação Vénus, e não os sentidos atribuídos
à décima segunda casa. Na verdade, é a exaltação de Vénus, que acontece nesta
Lua Nova, embora não no grau exacto (27º), que melhor descreve o signo Peixes. De
um ponto de vista mitológico, a constelação de Peixes representa
primordialmente os Ikhthyokentauroi,
os dois peixes que trouxeram Afrodite para a costa (cf. Rodolfo Miguel
de Figueiredo, 2021, Fragmentos
Astrológicos: 155-6). Este
mito recupera a Afrodite cipriota, uma Grande Deusa, e não a deusa olímpica,
limitada e reduzida a uma versão erótica e lúbrica. Afrodite é uma deusa das
origens, uma expressão do eterno feminino. A exaltação de Vénus, no fim do
Zodíaco, celebra um tempo novo, a era do Espírito Santo, do Sagrado Feminino. A
pomba da deusa ergue-se no fim do tempo.
O
novilúnio de Fevereiro traz, deste modo, essa ponte entre a humanidade e a
totalidade, entre Aquário e Peixes. No entanto, a totalidade proposta surge sob
a forma de contemplação, de integração na luz. Manílio, na Astronomica:, diz-nos: “sacrificado
é o humano, para que deus nele possa existir” (Astronomica IV, 407, Goold 1985: 94: impendendus homo
est, deus esse ut possit in ipso).
A humanidade só alcançará essa proposta de totalidade se encontrar uma forma de
sacrifício, de despojamento e liberdade. Aquele que
recebe, que se entrega, cria, só assim o ciclo se renovará, renascendo do fim a
origem. É o desapego da totalidade, da imersão na luz, que permite um novo
ciclo, ou seja, a acção promovida por Carneiro nasce desta totalidade
contemplativa.
Na Hermetica
de Estobeu, encontramos um sentido para a dissolução do humano na totalidade. O
texto afirma o seguinte: “A
decadência segue todo o nascimento, para que se possa nascer de novo. Isto
porque aquilo que nasce surge daquilo que é decadente. O que nasce deve decair,
para que o nascimento das entidades não pare. Para o nascimento dos seres, a
decadência é o primeiro artesão.” (SH
2A16).
E, logo a seguir, conserva uma verdadeira pérola de sabedoria quando diz: “O humano é a aparência da humanidade” (SH 2A1, Litwa, M. D.,
Hermetica II -The Excerpts of Stobaeus, Papyrus, and Ancient Testimonies in an English Translation with Notes and Introduction. Cambridge, 2018: Cambridge University Press, 34). A aceitação da
decadência é uma visão da totalidade e o modo como o humano se sacrifica nessa
totalidade define a própria humanidade.
Com o novilúnio a fixar-se na II,
isto para o tema de Lisboa, o valor do viver refunda-se na luz da totalidade. Trasilo diz que o segundo lugar é um “indicador de esperanças”, ἐλπίδων σημαντικήν (CCAG VIII/3: 101.20).
A promessa do fim surge pois como uma esperança de renascimento. Existe uma
refundação do tempo cíclico, de eterno retorno, na unidade do instante, na simplicidade
do agora. A união entre os luminares e Vénus e Neptuno potencia a união da luz
ao princípio do amor, do amor universal, aquele que permeia o mundo e une, no
divino, todas as criaturas. A luz da solidariedade imite raios de esperança. A
humanidade só se perderá se se afastar desses raios, pois a empatia, o amor ao
próximo tem a capacidade extraordinária de transformar o humano.
Essa concentração do valor do amor
na mensagem da sizígia (luminares, Vénus e Neptuno) espalha-se benevolamente
para a Úrano em Touro e Plutão em Capricórnio, que dão a estrutura da vontade a
essa mensagem, mas também ao Dragão da Lua que reúne, neste sentido, o valor
axial da vida e da morte. O grande obstáculo continua a ser a Marte em Gémeos
que se une quadrangularmente à sizígia. No tema, Marte é o planeta mais
ocidental e que escapa à identidade, ao leme do sentido proposto. O planeta do
deus da guerra é um aqui um outro, não um que se possa conhecer, mas um
estranho. Marte, face ao sentido da sizígia, fende a realidade, cria separação
e discórdia. No entanto, por se unir em trígono a Mercúrio e a Saturno em
Aquário e em sextil a Júpiter em Carneiro, existem elos de possibilidade, ou
seja, entre a desarmonia e a dissonância podem ser criados elementos de
concórdia, sobretudo se não se perder o leme de sentido desta sizígia, a luz
que emana da totalidade, trazendo solidariedade ao mundo.
De um outro ponto de vista, o
caminho da luz é, no interior do signo de Peixes, uma via ascendente que se
inicia em Vénus, uma Estrela da Tarde, passa por Neptuno até alcançar, na
dianteira, os luminares. Este caminho, como já o referimos, contém em si a
esperança da luz, da sua transformação. Se considerarmos, todavia, um caminho
mais extenso, então esta via ascendente, embora submersa, pode se iniciar tanto
em Úrano em Touro como em Júpiter em Carneiro e expandir-se até Saturno em
Aquário, fazendo deste o timoneiro desta barca luminar. Ora Saturno conserva
aqui um sentido profundo, pois até ao próximo novilúnio Saturno transitará de Aquário
para Peixes.
Com o
senhor da Necessidade na dianteira, a sua mensagem reafirma-se, até porque se encontra em conjunção a
Mercúrio e em sextil a Júpiter. A razão e a acção do destino, a força dos
ditames da Providência, colhem, com a foice da realidade, o sentido de
totalidade. É como diz Epicteto: “Pois
isto é teu: interpretar belamente o papel que te é dado – mas escolhê-lo, cabe
a outro” (Encheiridion 17,
trad. A. Dinucci & A. Julien, 2014: 46.
Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra).
Somos actores no teatro do real e é o destino ou a necessidade o verdadeiro
autor do texto interpretado. Contudo, o poder da palavra pode trazer consigo a
luz ou a sombra, o bem ou mal (sextil de Mercúrio e Júpiter). A qualidade da
nossa representação depende pois apenas de nós.
Convém
também referir-se que Plutão é o astro mais alto, revelando como o Senhor do
Hades reina sobre a realidade, impondo o poder da morte e a efemeridade da
vida. A quadratura entre Júpiter em Carneiro e Plutão em Capricórnio coloca em
tensão a acção do bem sobre o poder da morte. Algo que está sintonia com a
quadratura de Saturno em Aquário ao Dragão da Lua no eixo Touro-Escorpião, ou
seja, o destino da humanidade a colidir com o valor da vida e da morte. O
devastador sismo na Turquia e na Síria, que estava infelizmente previsto no
eclipse lunar de 8 de Novembro, coloca na clepsidra do humano a escolha do bem
e será sobre a humanidade que se criará a solidariedade e a compaixão, pois é
essa a proposta de sentido do novilúnio de Peixes
Entre
a Lua Nova em Peixes e a Lua Nova em Carneiro, Mercúrio avançará de Aquário
para Carneiro, Vénus de Peixes para Touro, Júpiter manter-se-á em Carneiro e
Saturno chegará a Peixes. Já os transaturninos vão permanecer também nos seus
signos: Úrano em Touro, Neptuno em Peixes e Plutão em Capricórnio. No período
que medeia as duas luas novas, não existirá nenhuma retrogradação planetária, o
que promove a acção dos planetas e os seus efeitos.
Em suma, a actual Lua Nova exorta a totalidade e clama por uma luz que reúne, no amor universal, a dádiva do Eterno Feminino.
sábado, 18 de fevereiro de 2023
sexta-feira, 27 de janeiro de 2023
quarta-feira, 23 de novembro de 2022
sexta-feira, 28 de outubro de 2022
Júpiter em Peixes: De 28 de Outubro a 20 de Dezembro de 2022 (3º e Último Ingresso)
quinta-feira, 28 de julho de 2022
Júpiter Retrógrado: De 28 de Julho a 23 de Novembro de 2022
sábado, 16 de julho de 2022
domingo, 19 de junho de 2022
domingo, 22 de maio de 2022
segunda-feira, 25 de abril de 2022
sexta-feira, 15 de abril de 2022
terça-feira, 5 de abril de 2022
terça-feira, 29 de março de 2022
quinta-feira, 10 de março de 2022
quarta-feira, 2 de março de 2022
Reflexões Astrológicas 2022: Lua Nova em Peixes
Reflexões Astrológicas
Lua Nova em Peixes
Lisboa, 17h35min, 02/03/2022
Sol-Lua
Decanato: Júpiter
Termos: Júpiter
Monomoiria: Lua
A
Lua Nova de Março, a última do actual ano astrológico, ocorre no signo de
Peixes, com Virgem a marcar a hora, no Segmento de Luz (αἵρεσις) do Sol, com os luminares acima do
horizonte, mas perto do Ponto Poente (VII) e a menos de uma hora do ocaso (hora
de Lisboa), no decanato de Júpiter, nos termos de Júpiter e na monomoiria da Lua. O tema deste
novilúnio, tal como referimos na Lua Nova de Fevereiro, é um espelho da anterior.
No mês passado, a luz subia em fila na aurora com Marte na dianteira, mas agora
afunda-se no ocaso com Vénus na vanguarda da viagem ao submundo, e tanto numa
como na outra apenas Úrano escapa à formação linear.
No
último signo zodiacal, onde a individualidade se desagrega na totalidade, na
imensidão do Indeterminado, o caminho da luz será agora uma candeia que
alumiará a Noite Escura da Alma. No mito sumério da descida de Inana ao
submundo, diz-se a certa altura no texto cuneiforme: “Ela tomou os sete poderes. Ela reuniu os poderes divinos e tomou-os na
sua mão. Com os bons poderes divinos, ela seguiu o seu caminho.” (linhas 14-16, Cuneiform Digital Library Initiative,
University of California at Los Angeles). Este é o sentido do caminho astrológico
liderado por Vénus neste novilúnio. É a catábase do Divino Feminino. E, na
aurora dos tempos futuros, a Pomba da Grande Mãe, do Espírito Santo, renascerá
e trará a luz ao mundo.
Os
luminares que aqui caminham para a sua ocultação deixam no céu e na alma a luz
do fim, do crepúsculo anunciado. É a morte do visível, do exterior que tanto
lutou para se afirmar. A anulação de si exige esforço. A imersão na totalidade
obriga à morte do eu, pois estar todo em si é uma forma de unidade mística que
traz a origem ao fim e o fim à origem. Para se acolher a luz do todo, é
necessário um esvaziamento do eu. Ora a luz do ocaso une-se aqui, e ainda sob
os raios abrasivos do Sol, à luz conjunta de Júpiter e Neptuno. A mística do consenso
surge da união dos luminares, de Júpiter e de Neptuno no signo de Peixes,
todavia, neste novilúnio, os raios poentes do Sol ainda são abrasivos podendo
queimar a tão necessária potencialidade do Bem e da Justiça (Júpiter) e da Solidariedade
e da Compaixão (Neptuno).
A
relação entre Júpiter e Neptuno em Peixes e a luz da totalidade inicia nesta
sizígia um caminho de revelação que se acentuará, primeiro, quando Júpiter
entrar no Coração do Sol a 4 de Março, depois, quando Neptuno passar também o
pórtico electivo desse Coração a 12 de Março e, por fim, quando Júpiter e
Neptuno se unirem em co-presença no mesmo grau no dia 12 de Abril. Se, por um
lado, esta é uma via de iniciação difícil de trilhar, pois a visão do alto da
montanha obriga a deixar para trás todas as vaidades, por outro lado, essa
visão da montanha pode trazer consigo um efeito de Cassandra, em que a profecia
é revelação, mas a voz do profeta na vibra no marasmo e superficialidade em que
a maioria caiu. A sabedoria alcançada torna-se então a voz do silêncio. Porém,
o aprendiz, agora adepto, não está só, pois, para além do véu de Ísis, a
Senhora surge diante si.
A
luz da sizígia, como caminho do meio, lança hexagonalmente os seus raios tanto
para à frente, para Vénus, Marte e Plutão, como para trás, para Úrano e para a Caput Draconis. Na proa dessa barca
fulgente, Vénus cinge em Capricórnio o poder do amor e o amor pelo poder. A
deusa leva a luz a uma terra sem retorno e, acompanhada pela Força (Marte) e
pela Morte (Plutão), desce até origem, à fundação da realidade, passando por
todos os perigos. Este é o momento em que, quando Zeus luta com Tífon e todos
os deuses fugiram, é a Cabra-Pan (Αἰγίπαν)
que enfrenta o monstro e recupera os tendões de Zeus, permitindo assim a sua
vitória (Figueiredo,
R.M. de, 2021, Fragmentos Astrológicos,
151-2). Sob o véu de destruição, sugerido
aqui pela conjunção de Marte e de Plutão, Vénus é também Perséfone e, como
senhora do submundo, é a guerreira que vence a sombra, que depois do Inverno se
torna Primavera.
Se,
por um lado, Vénus avança, neste novilúnio, pelo submundo, preparando-se para
renascer, para alcançar a sua exaltação quando alcançar o grau 27 de Peixes a
30 de Abril, por outro lado, a união de Úrano em Touro, Neptuno em Peixes e
Plutão em Capricórnio (sextis e trígono) define algo que já referimos de uma
outra forma e que Dane Rudhyar designa da seguinte forma: “Se Úrano e Neptuno não são bem-sucedidos a
iniciar o processo de transformação, Plutão pode ser verdadeiramente cruel e
implacável. Se, por outro lado, as forças de Úrano e de Neptuno realizam seu
trabalho transformador e o indivíduo aceita a mensagem de ambos, preparando-se
para a "descida ao inferno" final — a Noite Escura da Alma —, poderá
encontrar, com calma e força, o processo plutoniano de total desnudamento e o
vácuo consequente.” (1991, A Dimensão Galática da Astrologia: 66). Ora, por exemplo,
a situação na Ucrânia e a ameaça de guerra global dão forma exterior a algo que
não foi conseguido interiormente. Uma coisa é certa a humanidade está à prova e
o humano, perdendo-se, continua focado no que é supérfluo, na soma das suas
vaidades.
Na
cauda do feixe de luz deste novilúnio, encontramos Úrano em Touro junto ao
Ponto de Culminação (MC) e à Caput Draconis.
A Natureza habita o Lugar de Deus (IX), tornando evidente a imanência divina.
Úrano, embora cadente, é o astro mais alto e, estando junto ao Ponto de
Culminação na IX – o que decorre do sistema de casas escolhido, o mais antigo
dos sistemas, o de casa-signo ou signo inteiro –, a efectivação da
potencialidade de Úrano e do Dragão do Lua torna-se mais forte. Esta condição
sai fortalecida pelo facto de Úrano e a Caput
se unirem hexagonalmente ao Sol, à Lua, a Júpiter e a Neptuno e triangularmente
a Vénus, a Marte e Plutão. A catabáse da Deusa e a entrada da luz no submundo
nascem no Lugar de Deus, com a Natureza no trono divino. Esse é um sinal dos
tempos, uma revelação há muito anunciada.
Úrano
em Touro, trazendo consigo o choque do movimento com a imobilidade,
transmite-nos uma mensagem lapidar: a
natureza encontra sempre caminho. Lembremo-nos, por exemplo, dos veados que
descem à cidade aquando dos confinamentos. O problema essencial da natureza é o
humano e estamos muito enganados se acreditarmos que somos os mais fortes. A
humanidade corre, mais do nunca, o risco de extinção e pode não ser no agora,
mas o futuro já está à espreita. Nós, face à natureza, tornámo-nos a sombra no
abismo, daí que o Dragão da Lua, fiel guardião da luz e da sombra, se estenda
entre a morte (Escorpião) e o viver (Touro).
Neste
novilúnio, Mercúrio e Saturno em Aquário, presos entre a potencialidade e a
acção, entre a imersão na totalidade (Peixes) e o poder do fim (Capricórnio),
lançam quadrangularmente, a partir do Lugar da Má Fortuna (κάκη τύχη),
da VI, até Úrano e à Caput Draconis a
hostilidade que o humano em remissão pode levar à humanidade. Este é o tempo
dos novos fascismos, dos novos totalitarismos, da propaganda concertada,
digital e superficial. A palavra aproveita-se da ignorância, do carácter
líquido dos nossos tempos. Face ao poder da Necessidade, a liberdade esfuma-se,
dispersa-se no imediatismo da realidade que criámos. Saturno em Aquário é a colheita
daquilo que o humano semeou e daquilo que a humanidade não quis plantar. O agora
é sempre a lição do Tempo e da Necessidade.
Nesta
Lua Nova em Peixes, com a proposta de sentido da deusa a descer ao submundo, a bênção
da deusa Pistis-Sophia, da Fé e da Sabedoria, determinará a existência ou a ausência
do fogo do Intelecto de um Carneiro renascido ou repetido.