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quarta-feira, 29 de abril de 2020

As Origens Gregas da Astrologia: Exemplo Textual


Pingree, D., 1997, From Astral Omens to Astrology - From Babylon to Bīkāner, 21-22.

The science of astrology was developed in, most probably, the late 2nd or early 1st century B.C. as a mean to predict, from horoscopic themata draw up for the moment of an individual’s birth (or conception), the fate of that native. This form of astrology, called genethlialogy, is rooted in Aristotelian physics and Hellenistic astronomy, but also borrowed much from Mesopotamia and some elements from Egypt as well as developing many theories of its own. The adaptation of this form of astrology to determine the best time for initiating actions is termed catarchic astrology. These are the two main forms of astrology known in the West; interrogational astrology was developed in India in the 2nd and 3rd centuries A.D. on the basis of Greek catarchic astrology, and historical astrology in Sasanian Iran in perhaps the 5th or 6th century A.D. on the basis of continuous forms of Greek genethlialogy All of these types of astrology depend on the notion that the planets, in their eternal rotations about the earth, transmit motion (change) to the four elements and to the assemblages of elements, animate and inanimate, in the sublunar world. This theory is completely different from that of celestial omens, in which the gods, whose physical manifestations are the constellations and planets, send messages concerning their intentions regarding kings and countries by means of celestial phenomena. That these divine intentions con be altered by the use of propitiatory rituals (namburhis in Mesopotamia, śāntis in India) emphasizes the fundamental conceptual difference between omens and astrology.




Pingree, D., 1997, From Astral Omens to Astrology - From Babylon to Bīkāner. Roma: Istituto Italiano per L'Africa e L'Oriente.

sexta-feira, 11 de maio de 2018

Os 7 Sistemas de Termos da Astrologia Antiga (7): Yavanajātaka



   A tabela de Sphujidhava é, segundo Pingree, a mais simples e, embora não exista registo dela no ocidente, deriva de fontes egípcias e gregas (1976, II: 216). Este defende também que todos os autores indianos seguiram este modelo, indicando-nos as seguintes referências: Mīnarāja, 1, 22-23; Satya, citado por Utpala em Brhajjātaka, 1, 7; Parāśara, Pūrvakhanda, 3, 5; Varāhamihira, Brhajjātaha, 1, 7 e Laghujātaka, 1, 10; Kalyānavarman, 3, 20; Vidyānavarman, 3, 20; Vidyāmādhava, 1, 17; Gunākara, 1, 18; Jyotishprakāśa, citado em Jyotirnibandha, p. 59; Pseudo-Prthuyaśas, 1, 19; Vaidyanātha, 1, 13; e Mantreśvara, 1, 19. Pingree estabelece, desta forma, uma tradição em torno deste sistema de termos. Ora esta ideia está intimamente relacionada com o valor que este atribui ao Yavanajātaka, considerando-o o texto sânscrito da união dos conhecimentos astronómicos e astrológicos da cultura greco-egípcia e indiana-védica mais antigo. 

   Na edição de Pingree, baseando-se sobretudo na informação do cólofon, os últimos três versos do Capítulo 79, denominado Horāvidhih, concluiu-se que o Yavanajātaka, ou seja, A Horoscopia dos Gregos, era uma versificação de Sphujidhvaja de uma tradução em prosa de Yavaneśvara de um texto grego, provavelmente alexandrino. A versão de Sphujidhvaja dataria de 269/270 E.C. e a tradução de Yavaneśvara seria de 149/150 E.C (1976, I: 3). Convém antes de mais referir que o termo Yavana, que está na base do título da obra e do nome do tradutor original, designa grego, num sentido etimológico próximo de iónico. Pingree defende também que Yavaneśvara e Sphujidhvaja, designados pelo título rājā, eram homens que exerceram alguma forma de poder nas colónias gregas nos domínios de Kshatrapas Ocidental. Os Śakas ocidentais, embora tenham uma origem indo-cita, foram contaminados, como aliás foi todo a área geográfica entre a Macedónia e a Índia, pelo império de Alexandre Magno e a cultura grega. Ora essa influência estendeu-se no tempo. Pingree afirma inclusive o Jyotisha deriva dos conhecimentos do império aqueménida e, posteriormente, dos do império de Alexandre (1973: 1-13). 

   O Jyotisha (astronomia/astrologia) é um dos seis vedangas, ou seja, das seis disciplinas que auxiliam o estudo e a compreensão dos Vedas, sendo as outras Shiksha (fonética), Chandas (prosódia), Vyākarana (gramática), Nirukta (etimologia) e Kalpa (instruções rituais). Dentro do Jyotisha existem, por sua vez, três ramos (skandhas): horaśkandha, horoscopia; samhitā, astromancia, semelhante à do Enūma Anu Enlil sumério; e ganita, teoria astronómica de origens greco-babilónicas e desenvolvidas pelas obras astronómicas do tempo de al-Bīrūnī (Pingree 1978, I: 5). No entanto, seria errado concluir que o Jyotisha deriva exclusivamente de fontes externas. A cultura indiana exerce, por seu lado, um influência predominante, como aliás o próprio Pingree reconhece. Estas relações são contudo importantes para demonstrar que o conhecimento, neste caso o conhecimento astrológico, não pode ser compartimentado de forma separá-lo do seu todo, pois deve ser sempre considerada a interacção entre os povos e a transmissão cultural. Não podemos portanto concluir que o desenvolvimento da astrologia se deve apenas uma herança ou uma raiz, daí que a integração histórica das doutrinas astrológicas seja tão importante. 

   Desde os anos 70 que a edição de Pingree tem sido a referência para o estudo do Yavanajātaka, todavia, a análise das suas fontes, um microfilme do manuscrito Kathmandu I 1180, conhecido por N, escrito em folhas de palmeira no início do Século XIII, tem levado algumas questões. Bill Mak, através de Michio Yano, tomou conhecimento de um manuscrito alternativo do Yavanajātaka que põe em causa as conclusões de Pingree a partir do cólofon (2013: 4). Segundo Mak, Pingree baseou-se num microfilme de má qualidade de um manuscrito bastante danificado, o que o levou por diversas a extrapolar a interpretação textual. Ora o novo manuscrito nepalês, identificado como Q, permite retirar outras conclusões. No que à datação diz respeito, Mak defende que a composição de Yavanajātaka se situa entre 22 E.C. e o início do século VI, sendo, todavia, provavelmente, dos séculos IV a VI (2014: 1104). Face a esta datação, a progenitura do Yavanajātaka de outras obras posteriores Jyotisha torna-se assim questionável. Mak afirma inclusive que o Vrddhayāvanajātaka de Mīnarāja é anterior ao Yavanajātaka, dado que Pingree, que o colocou no século IV, traduziu o prefixo vrddha como aumentado e não como antigo (2014: 1103). É também de notar que a obra do erudito Varāhamihira, Brihajjātakam, do século VI, não revela qualquer conhecimento do Yavanajātaka, pondendo-se pois especular que a circulação do texto seria muito limitada e que só depois de Varāhamihira é que se expandiu. Por outro lado, Mak duvida da tese dos dois autores e acredita que possam ser apenas um (2013: 16), pois refere que Bhāskara, no seu comentário ao Āryabhatīya, cita duas verso 55 e atribui-o a Sphujidhvajayavaneśvara e que Utpala, em todas as citações do Yavanajātaka, designa Yavaneśra como seu autor (2013: 16, n.43). 

   O aspecto é mais relevante, seja qual for a datação ou qualquer que seja o autor, é que o Yavanajātaka, bem como as outras obras similares, demonstra a influência greco-egípcia na astrologia indiana, particularmente no que concerne aos termos. O sistema descrito pelo Yavanajātaka é também um reflexo dos princípios fundamentais que regem todos os sistemas. No entanto, neste caso, a sua base conceptual ou teórica sustenta-se na distinção entre signos ímpares e pares, masculinos e femininos. A distribuição dos termos é constante, variando apenas segundo essa distinção formal. Naturalmente, não existe neste modelo uma preocupação com os totais planetários. Acerca deste sistema, o Yavanajātaka, na edição de Pingree que é a única de que dispomos e sendo o mais fiel possível à tradução inglesa, diz o seguinte: "Nos signos ímpares, cinco graus (constituem os termos) de Marte, cinco (os) de Saturno, oito (os) de Júpiter, sete (os) de Mercúrio e cinco (os) de Vénus; nos signos pares, a sua ordem é a inversa" (1, 42, Ed. Pingree, Vol. II, p. 4, trad. do inglês). Observa-se portanto uma valorização de Júpiter e do conjunto central de termos, contrariando o imperativo dos primeiros termos. Mercúrio também sai reforçado em número de graus. Por outro lado, Vénus tem aqui a sua qualidade de benéfico algo diminuída. Já os maléficos dominam os primeiros dez graus nos signos masculinos e os últimos dez, nos signos femininos. Em resumo, este modelo, à semelhança daqueles que seguem as triplicidades, apresenta uma grande coerência formal, mas não o potencial do sistema egípcio e do sistema ptolemaico. 

quarta-feira, 2 de maio de 2018

Os 7 Sistemas de Termos da Astrologia Antiga (5): Sistema por Triplicidade Caldaica ou Hermética


   Este é o segundo sistema a estabelecer-se pela ordem das triplicidades e o primeiro a manter uma constância variável dos graus de cada conjunto de termos, pois somente o sistema de Critodemo preserva uma constância invariável, ou seja, todos os conjuntos de termos têm um arco de 5°. No Tetrabiblos, Ptolomeu apresenta este sistema da seguinte forma: "O método caldaico é, de facto, mais simples e bem mais plausível, embora não auto-suficiente no que concerne à regência das triplicidades e à sequência das quantidades, podendo-se, no entanto, compreende-lo facilmente sem o recurso a uma tabela" (I, 21, 1088-1092, Ed. Hübner, trad. do grego). Existe, nesta passagem, um esforço para distinguir este sistema do egípcio, ou seja, Ptolomeu pretende que este modelo esteja, em termos da correcta adequação ao seu propósito formal, entre o egípcio e aquele que ele próprio vai apresentar. Não deixa, todavia, de referir as suas debilidades. Na verdade, este sistema é bem menos consistente que aquele que Vétio Valente apresentou, não só na atribuição do número de graus aos conjuntos de termos, como também ao nível das dignidades e da sua influência na tabulação.

   Ptolomeu confere a autoridade e a autoria deste sistema aos caldeus, sobretudo pela importância da sequência dos planetas. No entanto, como Pingree refere (Yavanajātaka, II: 214), a ordem dos planetas no período selêucida (312-63 A.E.C.) era Júpiter, Vénus, Mercúrio, Saturno e Marte, logo semelhante à utilizada nos termos egípcios. Foi, por outro lado, no período neobabilónico (626-539 A.E.C) que a ordem Júpiter, Vénus, Saturno, Mercúrio e Marte, a sequência da primeira triplicidade deste sistema, foi utilizada. Esta questão da ordem dos planetas serve também para mostrar que a comum ordem caldaica, Saturno, Júpiter, Marte, Sol, Vénus, Mercúrio e Lua, com base nos dados que possuímos, não é nem caldaica, nem de grande antiguidade, será porventura uma criação do século II A.E.C. e uma consequência da troca de conhecimentos resultante do império de Alexandre, o Grande, o que também levanta algumas dúvidas acerca da certeza absoluta de um geocentrismo. No entanto, a questão dos planetas é também levantada por Vétio Valente, quando diz: "Para mim não me parece acertado o que alguns propõem a respeito dos termos das sete esferas enquanto 8, 7, 6, 5 e 4 (e mais não existe harmonia nessa escolha), mas de outro modo seria se fosse de acordo com os domicílios, as exaltações e as triplicidades" (III, 6, 20-22, Ed. Pingree, 1986, tradução do grego). Esta passagem foi a que serviu também para introduzir o sistema de triplicidade por segmento, mas, no sistema em agora em análise, o problema de Valente é a relação das sete zonas (heptázônon) e o número de graus dos conjuntos de termos. Valente critica a artificialidade do modelo 8, 7, 6, 5 e 4, mas, na verdade, também não se aborda aqui a heptázônon, pois o modelo exclui o Sol e a Lua, coisa que o sistema expresso por ele, em alternativa, não fazia.

   Vétio Valente usa, por outro lado, a fórmula 8, 7, 6, 5 e 4 para legitimar a origem deste sistema, pelo menos esta é a tese de Pingree (Yavanajātaka, II: 214). O excerto em causa refere o seguinte: "Se elaborares a profecção (perípaton), deves consultar as unidades horárias (hôriaíois) [8, 7, 6, 5 e 4] ou se recorreres ao ano ou mês solar, então deves contar do Sol em trânsito até à Lua natal e igual distância a partir do horóscopo, assim como eu próprio retive de Hermeias" (IV, 29, 14-17, Ed. Pingree, trad. do grego). Nesta passagem, a atribuição de Pingree não é imediata, pois relacionar a palavra hôriaíois com o sistema de termos pode parecer forçado. Por um lado, o termo em causa, devido ao facto de uma hora, uma unidade, ser também convertível em um grau, pode indicar qualquer sistema de divisão da eclíptica, da monomoiria aos decanatos, passando pelos termos e a dodecatemoria, mas, por outro lado, a relação entre a soma planetária dos termos e os anos e os ciclos planetários pode, de facto, indicar o sistema de termos. A certeza sobre esta tese é frágil, todavia, é preciso salientar que Valente é dos autores que melhor preservou as tradições anteriores e, tendo em conta que a autoridade sobre a doutrina das profecções é claramente atribuída a Hermes, podemos extrapolar, sem prejuízo e com base nos indícios textuais, para o sistema de termos. 

   A comparação entre os dois sistemas de termos baseados nas triplicidades permite que se conclua que este sistema revela um maior número de inconsistências. As debilidades que se destacam, até mais que a constância dos graus, são sobretudo a regência das triplicidades e o recurso aos segmentos. A exclusão do Sol e da Lua obrigou este sistema a eleger uma regência das triplicidades sustentada nos domicílios, em vez de uma regência que conjuga exaltações e domicílios. A inclusão, por outro lado, de uma regência por segmento para a terceira triplicidade resulta das próprias debilidades do sistema. Na primeira triplicidade, na ausência do Sol (domicílio de Leão e exaltação em Carneiro), Júpiter é apresentado como regente por ser o domicílio de Sagitário. Na segunda triplicidade, na ausência da Lua (domicílio de Caranguejo e exaltação em Touro), Vénus é o regente por ser o domicílio de Touro, embora nesta triplicidade a Lua, por razões óbvias, teria sempre de ser o regente nocturno. Na terceira triplicidade, Saturno é o regente diurno por ser o domicílio de Aquário e estar exaltado em Balança e Mercúrio é o regente nocturno por ser o domicílio de Gémeos, o que torna as inversões de regência um pouco artificiais, embora coerentes. Na quarta triplicidade, por exclusão de partes e por ser o domicílio de Escorpião, Marte é o regente diurno e nocturno. É a soma de todos estes aspectos que permite distinguir as intenções de Ptolomeu e Vétio Valente ao apresentar este sistema. O primeiro pretender introduzir o seu sistema de termos, apontando as incongruências dos outros sistemas, e o segundo pretende, por um lado, referir a superioridade formal do sistema de termos por triplicidade por si enunciado e, por outro lado, legitimar como hermética a sua doutrina das profecções. Independentemente da razão, este é um sistema que merece sobretudo uma avaliação comparativa.

sexta-feira, 27 de abril de 2018

Os 7 Sistemas de Termos da Astrologia Antiga (4): Sistema por Triplicidade e Segmento


   Este sistema é descrito por Vétio Valente (III, 6) e, embora a tabela não conste no capítulo, a reconstrução a partir dos dados por ele enunciados permitiu a avaliação de um modelo que tenta ser o mais abrangente possível. Apesar de revelar algumas inconsistências, procura reunir diversas tradições, algumas das quais já enunciadas aquando dos outros sistemas. Esta formulação é a única que apresenta os termos por segmento, haíresis, (o Sistema Caldaico ou Hermético apresenta apenas para a terceira triplicidade um regente diurno e nocturno) e que inclui os dois luminares, permitindo assim a divisão em sete conjuntos de termos por signo.

   A apresentação deste modelo por Vétio Valente tem levantado algumas dúvidas aos comentadores da sua obra, pois o sistema não surge indicado em nenhum horóscopo. No entanto, é um modelo completo e coerente na sua própria dinâmica, concluindo-se, desse modo, que possa resultar de um esforço teórico do próprio Valente ou de outro astrólogo em quem se tenha baseado. A estrutura base deste sistema consiste na atribuição do regente da triplicidade ao primeiro conjunto de termos, tanto no segmento diurno como no nocturno. Ora é a partir dessa primeira atribuição que as outras se constituem. Porém, existe um processo anterior de atribuições, que, na verdade, está base de toda a estrutura.

   Vétio Valente apresenta este sistema como um contraponto de um outro. No início do capítulo afirma o seguinte: "Para mim não me parece certo o que alguns propõem a respeito dos termos (hória) das sete zonas (heptázônon) enquanto 8, 7, 6, 5 e 4 (e mais não existe harmonia nessa escolha), mas de outro modo seria se fosse de acordo com os domicílios (oíkos), as exaltações (hypsómata) e as triplicidades (trígônos)" (III, 6, 20-22, Ed. Pingree, 1986, tradução do grego). O primeiro modelo é aquele que Ptolomeu designa como Caldaico (I, 21, 12-19) e que Valente, pelo menos segundo Pingree (Yavanajātaka, II: 214), designa como Hermético ou pertencente a Hermeias (IV, 29). É face a esse sistema que Valente apresenta este outro como alternativa e para o sustentar indica as seguintes atribuições:
  • Sol - O seu domicílio é Leão, está exaltado em Carneiro e está na sua triplicidade em Sagitário, o que representa 3 termos por signo.
  • Lua - O seu domicílio é Caranguejo, está exaltado em Touro e está na sua triplicidade em Virgem e Capricórnio, o que representa 4 termos por signo.
  • Saturno - O seu domicílio é Capricórnio e Aquário, está exaltado em Balança e está na sua triplicidade em Gémeos, o que representa 4 termos por signo.
  • Júpiter - O seu domicílio é Sagitário e Peixes, está exaltado em Caranguejo e está na sua triplicidade em Carneiro e Leão, o que representa 5 termos por signo.
  • Marte - O seu domicílio é Carneiro e Escorpião, está exaltado em Capricórnio e está na sua triplicidade em Peixes e Caranguejo, o que representa 5 termos por signo.
  • Vénus - O seu domicílio é Touro e Balança, está exaltado em Peixes e está na sua triplicidade em Virgem e Capricórnio, o que representa 5 termos por signo.
  • Mercúrio - O seu domicílio é Gémeos, está exaltado em Virgem e está na sua triplicidade em Aquário e Balança, o que representa 4 termos por signo.
Nota: O texto, aquando da atribuição de triplicidade, refere apenas os signos que não estão nem no domicílio, nem em exaltação. Por outro lado, convém ressalvar que uso do plural termos conduz a uma associação com os graus.

   O número de cada conjunto de termos é assim estabelecido, bem como o regente de cada grupo. Na primeira triplicidade, o regente diurno é o Sol, devido à exaltação de Carneiro, e o regente nocturno é Júpiter, por ser o domicílio de Sagitário. O primeiro grupo de termos obedece a esta regra de regência: a maior dignidade estabelece o regente diurno e a que se segue, o nocturno. Se o primeiro grupo fixa a regência, o segundo é uma inversão do primeiro, à excepção da quarta triplicidade, pois regente o diurno e nocturno é o mesmo. Os grupos seguintes vão então construir uma sequência de triplicidades, por exemplo, os grupos de termos 3 e 4, da primeira triplicidade, reproduzem os grupos 1 e 2 da segunda triplicidade, e assim sucessivamente. Ora, desta forma, este é um sistema que se mostra coerente e dinâmico e, apesar de não existirem registos da sua utilização prática, não deixa de ser um modelo astrologicamente viável.

segunda-feira, 23 de abril de 2018

Os 7 Sistemas de Termos da Astrologia Antiga (3): Sistema Egípcio


   O sistema egípcio de termos, contrariando uma ideia errónea que se estendeu do final da era de ouro da astrologia árabe até William Lilly, foi o mais consensual, não só pelas suas origens tradicionais como também pela sua profundidade na doutrina astrológica. Este é o sistema defendido por Doroteu de Sidon, quiçá o astrólogo mais influente de toda a antiguidade. Um outro factor que impera na sua opção é que se a Babilónia foi o berço da astronomia e da astromancia, o Egipto foi a casa da astrologia. Alexandria é por excelência a cidade dos astrólogos. Porém, é um erro assumir-se que as civilizações e as culturas se cingem ao seu pedaço de terra, pois, por exemplo, após o fim do império caldeu, em 539 A.E.C., o termo caldeu passou a ser utilizado como sinónimo de astrólogo, independentemente da sua origem geográfica, daí a persistência de alguma confusão. As tabuletas babilónicas estudadas por Jones e Steele seguem essa ideia de interculturalidade astrológica e lançam um outro olhar sob os termos.

   A tradição tende a atribuir a génese deste sistema a Nechepso e a Petosíris. O fragmento 3 da edição de Riess aponta para esse sentido: E, dessa forma, Apolinário está entre os que discordam da disposição dos termos de Ptolomeu, de tanto Trasilo como Petosíris e dos outros antigos (trad. do grego). Neste fragmento, encontra-se também uma pista para o esclarecimento de algumas das dúvidas de Ptolomeu em relação a este sistema. O texto quando diz kaì amphóteroi pròs Thrásyllon kaì Petósiron, esforça-se por mostrar que ambos seguiam a mesma disposição de termos. Ptolomeu critica este sistema por não seguir nenhuma ordem para as planetas, como a versão caldaica mais comum (I, 20), todavia a sequência inaugural de termos, ou seja, os que definem Carneiro já é por si o princípio conceptual de uma ordem. A formulação Júpiter-Vénus-Mercúrio-Marte-Saturno revela uma clara distinção entre os benéficos e os maléficos, tendo Mercúrio como intermediário. Ora o sumário da obra Pínax de Trasilo (CCAG VIII, 3: 99-101), aquando da descrição do dodekatópos, expressa um princípio idêntico, pois coloca Mercúrio no Ascendente, na linha do horizonte, Vénus e Júpiter no eixo das Casas V e XI e Marte e Saturno no eixo das casas VI e XII, ou seja, separa os benéficos e os maléficos. No entanto, o sumário de Trasilo, e provavelmente a concepção original dos termos de Nechepso e Petosíris, firma-se no princípio da haíresis, na divisão por segmento ou condição, a qual pressupõe uma natural harmonia dos opostos e uma regra de complementaridade. É nesse sentido, embora com um predomínio dos benefícios, que a soma dos graus perfaz o total do círculo e se associa com os anos planetários.

Júpiter - 79
Vénus - 82
Mercúrio - 76
Marte - 66
Saturno - 57

   Esta verificação de pressupostos leva também a que se compreenda a intenção de Critodemo no seu sistema de termos, ou seja, o esforço de conciliar este com outro método de divisão da eclíptica. A concepção, enraizada nos fundamentos da astrologia, de dividir e atribuir um sentido aos graus do círculo da eclíptica, de dar um carácter, um sentido ao destino, visto que a palavra grega para grau é moira, é uma criação de génese egípcia e desenvolvimento grego-egípcio. Esse é o espírito dos termos egípcios, algo que Ptolomeu não compreendeu, pois o seu aristotelismo impediu-o de ir para além das suas categorias. É porventura por essa razão que os seus termos não foram acolhidos pelos astrólogos do seu tempo, à excepção de Heféstion de Tebas e mais de dois séculos após a sua morte. O neoplatonismo e o estoicismo serviram melhor a construção de um sistema astrológico. O sistema egípcio, apesar de algumas inconsistências, é o mais comum, encontramo-lo parcialmente nas tabuletas babilónicas e em papiros demóticos (P. CtYBR inv. 1132 B), bem como em quase todos os astrólogos da antiguidade.

sábado, 21 de abril de 2018

Os 7 Sistemas de Termos da Astrologia Antiga (2): Critodemo


   Critodemo, de quem pouco se sabe, pode contudo ser colocado entre os últimas décadas do Século I A.E.C e as primeiras do Século I da Era Comum. No entanto, o esforço de datação não é nem simples, nem unânime. Plínio, que completou a sua História Natural em 77 E.C., designa a sua influência nos Livros II e III e, no Livro VII, menciona-o, juntamente com Beroso, em relação a uma fictícia cronologia da Babilónia, a qual consagra aos seus sacerdotes 490 000 anos de observação astronómica. O esforço de o aproximar à astrologia babilónia pode porém resultar mais de um reflexo de uma tradição que de uma influência de facto. Naturalmente, até por razões históricas, militares e políticas, existiu uma miscigenação de conhecimentos, mas os fragmentos de Critodemo apontam mais para a influência egípcia. O seu sistema de termos é uma estrutura conceptual de passagem entre os termos e os decanatos egípcios. A reconstrução que Pingree faz deste sistema alude também a uma relação com o P. Oxy 3, 465, onde, na esteira dos decanos egípcios, existem seres demiúrgicos que presidem a cada arco de 5° (Yavanajātaka, II: 212). 

   A principal fonte de Critodemo é Vétio Valente. Por outro lado, Neugebauer e Van Hoesen dizem que Critodemo "parece ser uma das suas (Valente) mais importantes fontes depois de Nechepso-Petosíris" (Greek Horoscopes: 185). Valente aborda o legado de Critodemo de duas formas: em primeiro lugar, apresenta um sumário da sua obra Hórasis (Visão), a qual atribui um estilo obscuro e artificial (III, 12, surge também pela mão de um autor anónimo no cod. Paris 2425, CCAG VIII, 3: 102) e, em segundo lugar, inclui fragmentos de doutrinas astrológicas específicas, destas pode-se destacar, por exemplo, o fragmento que explora a morte violenta, pois este inclui onze horóscopos, datados entre 65 e 123 da Era Comum, contribuindo assim para a sua fixação temporal (II, 41, este surge também em Retório, CCAG VIII, 4: 199, 15 - 202,10). A influência de Critodemo alcança o Liber Hermetis, sendo o seu Capítulo 25, respeitante aos termos, um desenvolvimento em latim de um excerto em grego (CCAG VIII, 1: 257, 21 - 261,2). Ora esta referência aos termos pode indicar uma confusão entre o sistema de termos de Critodemo, referido em Valente (VII, 8) e reconstruído por Pingree (Yavanajātaka, II: 212-13) e a abordagem do próprio Critodemo aos termos egípcios, daí que, por exemplo, Schmidt e Hand traduzam os termos egípcios atribuídos a Critodemo e presentes no compêndio de Achmet, o Persa, como sendo o seu sistema de termos (The Astrological Records of the Early Sages: 53-57).

   O sistema de termos de Critodemo é acima de tudo, e como já foi referido, uma estrutura conceptual de passagem entre os termos e os decanatos egípcios.

segunda-feira, 10 de abril de 2017

O Número de Casamentos segundo Doroteu de Sidon

Doroteu de Sidon
(Século I da E.C.)
Pentateuco 
Ou
Carmen Astrologicum
Livro II, 5
Acerca do Número de Casamentos

Pingree, David (Ed.),
Dorothei Sidonii Carmen Astrologicum, p. 50.

Se se desejar saber com quantas mulheres vai um homem casar, então deve-se marcar do Meio do Céu até Vénus, o número de planetas que estiver entre os dois indica o número de mulheres com quem irá casar, porém, sempre que se encontrar Saturno, deve-se esperar frieza e tensão, e se se encontrar Marte, deve-se esperar a morte, a menos que sobre ele existam aspectos benéficos. Nas natividades das mulheres, se se desejar saber com quantos homens vai casar, então deve-se contar do Meio do Céu até Marte, mas se Marte estiver no Meio do Céu, deve-se contar do Meio do Céu até Júpiter, o número de planetas que estiver entre os dois indica o número de homens com quem vai casar. Se, a partir do Meio do Céu, Vénus estiver cadente, pode-se dizer que existirá pouca constância do homem para com as mulheres, o mesmo se pode afirmar em relação às mulheres se Marte estiver na sétima.

(...)

Doroteu de Sidon, Carmen Astrologicum, II, 5.  Tradução RMdF.


Versão Utilizada:
Pingree, David (Ed.), Dorothei Sidonii Carmen Astrologicum. Leipzig: Teubner, 1976, p. 50 e 204.


 Comentário

   Em teoria, o método apresentado por Doroteu de Sidon sustenta-se num modelo formal e material válido e plausível, todavia a verificação dos seus pressupostos permite que se estabeleçam algumas inconsistências. Em primeiro lugar, deve-se ter em consideração que o modelo é  constituído apenas por sete astros (Sol, Lua, Mercúrio, Vénus, Marte, Júpiter e Saturno, isso se o Sol e a Lua forem incluídos na designação de planeta), pois Úrano, Neptuno e Plutão ainda não haviam sido descobertos e, uma vez que a astrologia tradicional se fundamenta no que é observável pelo olhar humano, também não devem  ser considerados. Dos sete astros, ainda temos de reduzir um, Vénus para os homens e Marte ou Júpiter para as mulheres. Desta forma, só existem seis astros disponíveis e, como a probabilidade de estarem todos ou quase todos entre o Meio do Céu e o respectivo planeta é limitada, então o número de casamentos possíveis está restringido a um valor pequeno. 

   Este aspecto levanta alguns problemas, sobretudo em casos como, por exemplo, o de Elizabeth Taylor, que casou oito vezes, embora duas delas com Richard Burton. Ora Elizabeth Taylor  tem o Meio do Céu a 14° de Balança e Marte a 1° de Peixes e entre eles estão apenas a Lua e Saturno. Apesar do elemento quantitativo, descrito por Doroteu de Sidon, não se verificar neste caso, o valor do sentido não deixa de ser relevante, pois, por um lado, a presença da Lua e de Saturno aponta para instabilidade emocional e relacional na vida de Elizabeth Taylor como, por outro lado, permite que se estabeleçam interpretações que vinculam, por exemplo, a Lua em Escorpião com a morte de Michael Todd, seu terceiro marido, e a dor dessa perda, bem o peso das dívidas herdadas, e, noutro exemplo, o Saturno em Aquário com a relação tempestuosa com Richard Burton, onde a liberdade emocional de Taylor foi restringida, de tal modo que iniciou uma relacionamento extraconjugal com o Embaixador Iraniano Ardeshir Zahedi. Desta forma, embora o elemento quantitativo produza inconsistências, o valor material e significativo permite que o contributo de Doroteu de Sidon continue actual.

   Um outro aspecto que também deve ser considerado é a natureza do conceito de casamento, que evoluiu ao longo dos tempos. Neste quadro interpretativo de Doroteu de Sidon, deve-se estabelecer como premissa a natureza dos relacionamentos a considerar, onde um mero pressuposto legal pode não ser suficiente. Por exemplo, até ao Sinodo de Whitbey, em 664 E.C., os povos da antiga Bretanha praticavam um casamento, Handfasting, que era celebrado por um ano e um dia, após esse período os esposos decidiam se este continuava ou não. A consumação também pode ser um requisito prévio para constar no número estabelecido por Doroteu de Sidon, bem como qualquer forma de relacionamento íntimo que implique a vida em comum. Ou, por outro lado, deve-se enumerar apenas aqueles que se estabeleceram numa base afectiva genuína?  Esta questão é de suma importância, pois é a sua resposta que permite atestar a veracidade do método proposto.

   Por fim, a questão textual e acerca das fontes também merece alguma atenção. Doroteu de Sidon terá escrito a sua obra entre os anos 25 e 75 da nossa era e, embora fosse originário de Sidon, uma parte significativa da sua vida terá sido passada em Alexandria. O Carmen Astrologicum ou Pentateuco é um texto sobre astrologia, escrito em verso, e que se destaca por ter sido o primeiro texto de que se conhece a incluir as katarchai, as Interrogações ou Eleições, as quais se tornaram em importantes indicadores da actividade dos astrólogos e dos motivos que levavam as pessoas a procurá-los. Doroteu distinguiu-se também de Ptolomeu por incluir as Partes na sua obra. O Carmen Astrologicum tornou-se num texto importante que serviu de fonte para, por exemplo, Heféstion de Tebas e Firmicus Maternus. No Catalogus Codicum Astrologorum Graecgrum (CCAG), podemos encontrar cerca de trezentos fragmentos da obra de Doroteu de Sidon, que serviram de fonte directa para os seus textos, mas foi a partir da edição de David Pingree que pudemos aceder à maioria do Carmen Astrologicum. Essa edição sustenta-se em primeiro lugar nas versões de Abû Hafs 'Umar ibn Farrukhân Tabarî, conhecido no ocidente como Omar Tiberiades, que datam de 800 E.C. e baseiam-se numa tradução pahlavi, ou seja, persa, do século III. Existe também uma outra versão árabe, de cerca de 770 E.C., com um carácter  fragmentário e atribuída a Māshā'allāh, onde encontramos textos que não estão na versão de al Tabarî, mas que estão, em parte nos fragmentos do CCAG. Foi esta concórdia de fontes que permitiu que hoje seja possível aceder à maior parte do Carmen Astrologicum.

   Em suma, a obra de Doroteu de Sidon merece ser lida e pode contribuir para uma fundamentação da linguagem astrológica, que hoje tem uma natureza líquida, dispersa e sem um sistema de sentido que lhe dê forma. A astrologia clássica permite um rigor que na astrologia contemporânea nem sempre existe e a análise ao número de casamentos de Doroteu de Sidon fornece-nos um indicador de estudo que não deve ser desprezado. A sabedoria está em quem procura.