sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

O Daímon de uma Palavra (Poesia)

Rubens, Peter Paul, The Fall of Icarus, 1636.
Bruxelas: Musées Royaux des Beaux-Arts.


O Daímon de uma Palavra


Como podes não ser
Esse ser de passagem
Que sozinho persegue
A sagacidade do bem
E sozinho tenta e recua
Na condescendência
Do mal imenso



18 de Agosto de 2018
RMdF

quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

Revoltada a Rosa (Poesia)

Botticelli, Sandro, Retrato de Dante, c.1495.
Colecção Privada.

Revoltada a Rosa


E não o albo dissidente
Da áurea cidade exilado
O nobre poeta universal
Não cai como corpo morto cai
Cai vivo inteiro na morte sua
Praguejando e pelejando
Revoltado voraz e triste
Consciente do que se perdera
Cai vivo inteiro na morte sua
Para uma cidade em queda
E uma divina amada já caída


8 de Outubro de 2019
RMdF

segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

Astrologia Electiva: Consulta


Astrologia Electiva

A Procura da Hora Certa


CONSULTA



Esteja onde estiver, agende uma consulta de Astrologia Electiva e conheça o momento ideal para uma qualquer acção ou evento. Com recurso às mais antigas técnicas astrológicas, por telefone, video-chamada, e-mail ou presencialmente, pode eleger o tempo certo para os principais acontecimentos da sua vida.

Com o recurso à Astrologia Electiva, pode, por exemplo, marcar a melhor data para um casamento, escolher o período ideal para engravidar, para criar uma empresa no momento mais favorável ou para  lançar um projecto no hora mais propícia.

Numa consulta de Astrologia Electiva, podemos ainda relacionar, se necessário, a procura da hora certa com o seu tema natal (Astrologia Natal ou Genetliacal) ou com o estudo do lugar do em se encontra ou onde um determinado acontecimento vai ocorrer (Astrocartografia).

Basta indicar-nos o que pretende saber, qual o momento ideal que quer conhecer, que nós apresentar-lhe-mos a informação astrológica necessária para um escolha esclarecida.  

Se precisar de alguma informação adicional, estou à vossa disposição. 


#rmdfastrologiaelectiva #rmdfastrologia #rmdfconsultas #rmdfastrologiaetarot

terça-feira, 10 de dezembro de 2019

O Velho que Não Escutava o Riso dos Golfinhos (Um Pequeno Conto)

Raffaello, Sanzio, The Voyage of Galatea, 1511.
Roma: Villa Farnesina.

O Velho que Não Escutava o Riso dos Golfinhos

(Um Pequeno Conto)


  Um velho quase cego, sentado em frente ao mundo, tentava resgatar o sonho da memória. Simplício não procurava rememorar uma outra vida. Queria sim recuperar o riso perdido. Queria deslumbrar-se com aquela inocência singular, com aquele doce despertar. Queria fitar e esconder para si a paleta da realidade, as matizes que se estendiam sem esforço sobre o seu olhar, mas a doença que a fere a vida deixou-lhe apenas vultos e sombras, formas ocultas e memórias disformes. Simplício perdera o horizonte.

  Naquele dia, depois de tentar tornar nítido o fumo espesso, Simplício percebeu, sem necessidade de recorrer aos sentidos, que existia, mesmo diante de si, uma novidade, uma expressão inaugural que colhia o bater de asas de um anjo. Um demiurgo estava de passagem. Porém, o som da origem foi suspenso por um acorde demoníaco. Na harmonia delicada das asas ondulantes, existia agora uma dissonante tensão, um melodioso conflito que surgia porque algo estava para nascer. Simplício que perdera a cor acreditava que nada podia nascer, que não existia nada para criar. Era tudo sombra. Contudo, o homem caíra no seu próprio erro. O nevoeiro era mera ilusão.

  A nuvem tornava-se mar e os vultos ganhavam a forma de ondas. O velho pensou que o Sol brincava com ele, que a sua luz gerava uma desejada fantasia. Foi então que a maré lhe ofertou o perfume da maresia. O aroma tornava-se memória e Simplício regressava a si. O tempo já não se alongava em fio de tecedeira, era um aro num jogo de criança. Tudo regressava à origem. Simplício voltava à casa que nunca conhecera. Aquele areal, aquele mar, aquele vento eram o lugar da memória, pois o que permanece é o que se lembra e o que se imagina. O homem estava sentado, com as mãos apoiadas na bengala, ceifando aqueles raios de luz e, sem que desse conta, uma forma furtou-lhe a imagem. Diante de si, contornado pelo Sol, um menino quebrara-lhe a memória, o sonho e a ilusão.

  - Saí da frente, fedelho! Não vês que me tiras o Sol.
  - Como lhe posso tirar o Sol se o Sol é todos?
  - Criatura insolente! Já não há educação. Os pais não educam as crianças. No meu tempo, levava uma galheta que ficava logo em sentido.
  - Desculpe, não o queria ofender, só lhe tentei dizer que não lhe posso tirar o que não é seu, mas não se zangue que eu desvio-me. O senhor estava a ver o quê?
  - Nada que te diga respeito.
  - É que o senhor olhava em frente quando estão todos a olhar para a sua esquerda. Toda a gente quer ver os golfinhos.
  - Miúdo, tu não vês que eu sou cego.
  - Não tem de ver, basta ouvir o riso dos golfinhos.
  - Eu não oiço nada.
  - Esteja atento. Parecem gargalhadas.
  - Não oiço nada. Ora esta, não é que o raio do miúdo não me deixa em paz. Vai para ao pé dos teus pais. O teu lugar não é aqui.
  - Eu gosto deste lugar. É tão bom ouvir o riso dos golfinhos. Eles falam a rir.

  Simplício estava incomodado com a presença da criança. O velho sabia que só via sombras, mas sempre ouvira bem. Diziam-lhe até que tinha ouvidos de tísico. Como podia não ouvir o riso golfinhos? A questão inquietava o homem.

  - Ó miúdo, diz-me para onde me devo virar. Onde estão os tais golfinhos?
  - Para este lado, eu ajudo-o – menino, levando o velho pela mão, sentou-o em frente aos golfinhos.
  - Aqui estou bem?
  - Sim, está. Oiça agora. Os golfinhos estão a gargalhar. Riem como se ouvissem uma piada. Sabe como aquelas que nos fazem chorar de tanto rir.
  - Não oiço nada. Estás a enganar-me. Estás a gozar comigo. Sai, sai já daqui ou dou-te umas bengaladas!

  A criança desapareceu, deixando o velho na sua própria angústia. Simplício não conseguia escutar o riso dos golfinhos. A ausência condenara-lhe a possibilidade. A audição sempre lhe compensara o limiar da cegueira, todavia a dúvida cercara-lhe a certeza. Se não podia confiar no que ouvia, tinha de se firmar nos vultos e deixar-se assombrar pela confusão das coisas. No entanto, não se dera por derrotado. Simplício, já que não conseguia ouvir o riso dos golfinhos, queria afastar a poeira do olhar e deter-se nas suas próprias sombras. Focava-se no horizonte perdido e procurava aqueles seres de passagem, todavia, nenhuma forma esfumada cavalgava as ondas da sua imaginação. O seu mar era apenas o tempo que avança e recua, o perfume de sal espesso que lhe tocava o sopro e o desalento. Nada existia naquele oceano revolto. O Sol sulcava-lhe as rugas e a penumbra de luz ferida vertia-se numa única lágrima. Nos vultos serpentinos, os golfinhos permaneciam indeterminados. Simplício desistiu. Deixou que o rosto cobrisse a escuridão. Colocou as mãos na bengala e baixou a cabeça.

  Passados alguns minutos, que se assemelhavam a horas de mergulho profundo, o homem ergueu a face tombada. Não havia nem mar, nem ondas. Simplício estava num banco de jardim, observando as sombras de passagem, gente que corria, gente que, sem mar, se afogava. Aquele era o seu lugar. Numa quietude sem espanto, o velho observava a vida dos outros. Porém, aquela outra viagem esvaziara-lhe o interesse. Simplício levantou-se e, apoiado na sua bengala, caminhou até casa. Subiu as escadas estreitas, baixou a cabeça para entrar e suspirou. Sem qualquer alento, deu desprezo ao Sol do crepúsculo e correu as cortinas. Puxou as orelhas da cama, para lá do seu próprio rosto, e dormiu. Nessa noite, Simplício sonhou com golfinhos. 


RMdF

terça-feira, 3 de dezembro de 2019

Previsões Astrológicas 2020 - Consultas



Esteja onde estiver, agende uma consulta e conheça o seu ano de 2020. Com recurso às mais antigas técnicas astrológicas, por telefone, video-chamada, e-mail ou presencialmente, pode compreender melhor o ano que se aproxima. 

Se necessitar de alguma informação adicional, estou à vossa disposição. 


Wherever you are, bookmark a counselling session and know your year of 2020. Using the oldest astrological techniques, by phone, videocall, e-mail ou in person, you can have a better understanding  of the coming year.

Please feel free to contact me if you need any further information



#RMdFPrevisões2020 #RMdFAstrologia #AstroWebCounselling #RodolfoMigueldeFigueiredo

O Sentido do Céu (Poesia)

Gogh, Vincent van, Starry Night, June 1889.
Nova Iorque: Museum of Modern Art.


O Sentido do Céu


Astro mudo
Ideia falante
É profunda
A divindade
Das estrelas


1 de Fevereiro de 2019
RMdF

segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

Acreditar (Poesia)

Friedrich, Caspar David, Woman before the Rising Sun (Woman before the Setting Sun), 1818-20.
Essen: Museum Folkwang.
https://www.wga.hu/

Acreditar 


Crepitava na alma a incandescência de cada oração 
E abandonada às preces do amanhã fúlgida esperava


11 de Agosto de 2019
RMdF

terça-feira, 26 de novembro de 2019

O Mundo ou a Dança Primordial do Feminino

O Mundo
Tarot Rider-Waite

O Mundo é a dança do feminino sobre os elementos, o movimento rítmico e primordial que reúne em si a multiplicidade das coisas num ponto de síntese. 

O Mundo é aquela forma última de realização das ideais, de consolidação dos arquétipos que transfere a realidade para o ser humano. 

O Mundo é o propósito divino em acção, é a obra de arte, o primeiro acto criativo, o que transforma o caos da origem numa ordem original. 

O Mundo é aquele lugar mágico, o espaço sugestivo que se alcança no fim de uma peregrinação, o termo do caminho do Louco. 

O Mundo é a transformação da vida em símbolo, a permissão de sentido, de ver a unidade que se esconde na multiplicidade que se mostra. 

O Mundo é aquele estado de júbilo, de frenesim primordial, elevado na completude, na unidade mística dos primeiros elementos.

O Mundo é a consciência da bênção, a dádiva da totalidade que, inundada de sabedoria e fé, pelo Eterno Feminino se renova. 

quinta-feira, 7 de novembro de 2019

Voar (Poesia)

Troy, Jean-François de, An Allegory of Time Unveiling Truth, 1733.
Londres: National Gallery.
Voar

Se rasante
Voas
Sobre as coisas
Pairando
Vendo
Desconhecendo
Em nada encontrarás
A profundidade
Íntima
E electiva
Voa antes a pique
Falcão peregrino
Rasgando
Conhecendo
O abismo
Da realidade

27 de Setembro de 2019
RMdF

terça-feira, 5 de novembro de 2019

O Julgamento ou a Ressurreição da Alma

O Julgamento
Tarot Rider-Waite

O Julgamento é o arcano que estabelece a finalidade como lei da Providência e a Ressurreição como processo de ressurgimento da dádiva.  

O Julgamento é aquele convite à alma que a torna um instrumento consciente e participante do milagre cósmico, da divina reunião.

O Julgamento é o despertar do espírito e o acordar da consciência para a sua totalidade, concentrando o si mesmo num eterno presente.

O Julgamento é aquele divino regresso do amor que une a Mãe Sabedoria ao Pai Vontade, restaurando assim o mistério da criação. 

O Julgamento é a memória do cosmos enquanto mestria de um permanente rememorar, de uma activação constante de conceitos e imagens.

O Julgamento é aquela forma de equilíbrio que submete o bem e o mal ao juízo transformador da Justiça, da Necessidade e da Providência.

O Julgamento é a história do mundo, o registo causal que une a acção e a reacção, o justo decreto da Necessidade, aquela que sobre tudo impera. 

quinta-feira, 24 de outubro de 2019

Consultas de Tarot - Três Questões Concretas



A consulta de Tarot - Três Questões Concretas é a ideal para quem tem um problema específico ou se algum aspecto da sua vida precisa de orientação, pois é mais económica que uma consulta completa e não implica nenhuma deslocação. É uma consulta de Tarot, com um tarólogo profissional e com grande experiência, à distância de um telefonema


#RMdFTarot3Questões  #RMdFConsultas  #RMdFAstrologiaeTarot

terça-feira, 15 de outubro de 2019

A Sombra da Vida (Poesia)

Caravaggio, Narciso, 1598-99.
Roma: Galleria Nazionale d'Arte Antica.
A Sombra da Vida


Como setas e dardos
                                     O vento nas folhas

Como espada e gume
                                     A onda no areal

Como sangue e ferida
                                     O fogo no madeiro

Como guerra e morte
                                     A ignorância no humano

Essa é a sombra da vida
                                     A sabedoria ausente


3 de Setembro de 2019
RMdF

segunda-feira, 14 de outubro de 2019

O Sol e o Mistério da Luz

O Sol
Tarot Rider-Waite

O Sol é o arcano luminoso que, pela intuição íntima e radical, reúne em si a sabedoria e a inteligência.

O Sol é aquele princípio cooperante que coloca em harmonia os elementos distintos, permitindo a evolução na criação.

O Sol é o encontro com o centro, com o ponto intermédio que une e equilibra a luz e a sombra, o céu e o abismo.

O Sol é aquele caminho misterioso que concilia a morte na vida e a vida na morte, transformando a destruição em eternidade.

O Sol é a reintegração da consciência na alma do mundo, a via eleita da presença divina, da chama eterna.

O Sol é aquele limiar radiante da união mística do masculino e do feminino que transporta o divino para o humano.

O Sol é o mistério da luz e o milagre da criação, é a palavra inaugural e a origem do amor.

domingo, 22 de setembro de 2019

A Lua ou o Segredo da Imaginação

A Lua
Tarot Rider-Waite



A Lua é o arquétipo, não do Divino Feminino, mas sim das profundezas da imaginação e do abismo da memória.

A Lua é aquele eclipse da evolução que contraria ou inverte o movimento natural, permitindo assim a contemplação.

A Lua é tanto o impulso primário da vontade e do desejo como a revelação simbólica do enigma, do sentido da vida.

A Lua é aquele princípio de diminuição, de movimento retrógrado e de luz reflectida que dá profundidade à consciência.

A Lua é a condição da vida que, pela repetição e pelo retorno cíclico do tempo, permite que tudo nasça, viva e morra.

A Lua é aquele estado demiúrgico do humano entre o divino e a natureza e da alma entre o corpo e o espírito.

A Lua é a intuição, a possibilidade radical de, a partir da parte, alcançar o todo, de tornar a inteligência uma visão da totalidade.

quarta-feira, 4 de setembro de 2019

Alguns Elementos Textuais para o Estudo do Thema Mundi: Fírmico Materno, Paulo de Alexandria e Porfírio





Porfírio, Sobre a Caverna das Ninfas na Odisseia, 22.


Kaˆ œcous… ge ™fexÁj aƒ qšseij tîn zJd…wn: ¢pÕ mn Kark…nou e„j A„gÒkerwn prîta mn Lšonta oŒkon `Hl…ou, eŒta Parqšnon `Ermoà, ZugÕn d 'Afrod…thj, Skorp…on d ”Areoj, ToxÒthn DiÒj, A„gÒkerwn KrÒnou: ¢pÕ d/ A„gÒkerw œmpalin `UdrocÒon KrÒnou, 'IcqÚaj DiÒj, ”Areoj KriÒn, Taàron 'Afrod…thj, DidÚmouj `Ermoà, kaˆ Sel»nhj loipÕn Kark…non. DÚo oân taÚtaj œqento pÚlaj Kark…non kaˆ A„gÒkerwn oƒ qeolÒgoi, Pl£twn ddÚo stÒmia œfh: toÚtwn d Kark…non mn enai di/ oá kat…asin aƒ yuca…, AƒgÒkerwn ddi/ oá ¢n…asin. 'All¦ Kark…noj mn bÒreioj kaˆ katabatikÒj, A„gÒkerwj dnÒtioj kaˆ ¢nabatikÒj.


As posições dos signos do Zodíaco têm a seguinte ordem, desde Caranguejo até Capricórnio: em primeiro Leão, o domicílio do Sol, a seguir Virgem, o de Mercúrio, Balança, o de Vénus, Escorpião, o de Marte, Sagitário, o de Júpiter, Capricórnio, o de Saturno; em sentido inverso, desde Capricórnio, Aquário a Saturno, Peixes a Júpiter, Carneiro a Marte, Touro a Vénus, Gémeos a Mercúrio e, por fim, Caranguejo à Lua. Os antigos cosmólogos estabeleceram assim estas duas portas, Caranguejo e Capricórnio, já Platão referia duas bocas. Delas, Caranguejo é por onde as almas descendem, Capricórnio por onde ascendem. Caranguejo é pois ainda setentrional e apropriado para se descender, já Capricórnio é meridional e apropriado para se ascender. 


Porfírio, Sobre a Caverna das Ninfas na Odisseia:
Seminar Classics 609 (J. M. Duffy, P. F. Sheridan, L. G. Westerink & J. A. White), 1969, Porphyry, The Cave of the Nymphs in the Odyssey. Buffalo (N.I.): Arethusa Monograph 1, Department of Classics, State University of New York at Buffalo.

Nota: As Traduções do Grego e do Latim são minha responsabilidade.


segunda-feira, 12 de agosto de 2019

Uma Ferida no Ar (Poesia)

Gérard, François, Cupido e Psyche, 1798.
Paris:Museu do Louvre.
Uma Ferida no Ar


Não Não ______________
Nem o mar é rude e crespo
Nem as ondas ferem o ar
Violentos são os rochedos
Os cumes em alta escarpa
E os promontórios afiados

Não Não ______________
Nem a terra é mansa e triste
Nem as árvores ferem o ar
Belicosas são as montanhas
E ainda as pedras do ocaso
Do destino firmes contendas

Não Não ______________
Nem o vento é revoltado e só
Nem as aves do céu ferem o ar
Cortante é o grito de uma brisa
A ira dançarina de um tornado
E o vendaval numa madrugada

Não Não ______________
Nem o Sol é solitário e ardente
Nem os seus lumes ferem o ar
Cruel é o céu sem luz ou estrela
O astro errante do olhar ocultado
É a vida que sobrevivente recua

_____________ perdida a alma
Da sabedoria é uma ferida no ar


6 de Julho de 2019
RMdF

sexta-feira, 9 de agosto de 2019

Missão (Poesia)

Coli, Giovanni, The Triumph of Wisdom, 1671.
Veneza: Convento de San Giorgio Maggiore.
Missão


Se para a tua vida
queres uma missão
Outra não terás tu
Que tudo aprender
E no fim nada saber
Não te prendas pois
Em doces ilusões
De vã grandeza
Pois no mundo
És somente
Uma partícula
De estelar
Poeira


4 de Fevereiro de 2019
RMdF


quinta-feira, 8 de agosto de 2019

Orar ao Inevitável (Poesia)

Mantegna, Andrea, Introdução do Culto de Cibele em Roma, 1505-06.
Londres: National Gallery.

Orar ao Inevitável


Ó Adrasteia ninfa
Arcaica deusa
Do Inevitável fado
Para Reia, Cibele
Ou a Necessidade
Do númen o nome
De epíteto sagrado
Segue ó deusa antiga
O moderno humano
Concede à memória
Da vida e da morte
A feliz fortuna e a sorte
De um bom demiurgo


28 de Outubro de 2018
RMdF

quarta-feira, 26 de junho de 2019

O Mapa Astrológico de Fernando Pessoa

Fernando Pessoa nasceu a 13 de Junho de 1888, pelas 15 horas, em Lisboa. A hora exacta do nascimento é um elemento sobre o qual Pessoa se debruçou. Encontramos, no seu espólio, mapas astrológicos e  textos que variam entre as 15 horas exactas e as 15 horas e 20 minutos, porém Pessoa aponta, numa primeira instância, para as 15 horas e 15 minutos. Primeiro faz ele próprio a rectificação do Ascendente, apontando para antes das 15 horas e 15 minutos, cerca do minuto 12; depois irá encomendar o mesmo procedimento a um astrólogo do British Journal of Astrology, que responde como sendo às 15 horas, 11 minutos e 49 segundos (cf. Paulo Cardoso, Fernando Pessoa - Cartas Astrológicas, pp. 41-3. Lisboa: Bertrand Editora, 2011). 



Mapa Astrológico Rectificado 

segunda-feira, 24 de junho de 2019

Obra ao Negro (Poesia)

Holbein, Hans o Jovem, Estudo das Mãos de 
Erasmo de Roterdão, c.1523. 
Paris: Museu do Louvre.

Obra ao Negro


De cinzel
A tinta
Núbia
A marca
Que fere
O papel
Texto
Escrito
Lavrado
No alvor
Solitário
Traçado


26 de Maio de 2019
RMdF




Fonte da Imagem: https://www.wga.hu/cgi-bin/highlight.cgi?file=html/h/holbein/hans_y/2drawing/1530/07studie.html&find=writing

quinta-feira, 30 de maio de 2019

Entre a Vida e a Morte (Poesia)

Baldung Grien, Hans, Death and the Maiden, 1518-20.
Basel: Öffentliche Kunstsammlung.


Entre a Vida e a Morte


Se viúva a vida chora
Só à morte dizeis vós
Esta não é a tua hora
Recua já ó cruel algoz


Se leda se nega a vida
Sombria a morte vem
E dizeis A toda a brida
Dai o corcel a alguém


Se em fio vai a gadanha
Escapar é célere gesto
Dizeis vós Se ela ganha
Nada vale o passo lesto


6 de Maio de 2019
RMdF










terça-feira, 28 de maio de 2019

Crepúsculo do Feminino (Poesia)

Botticelli, Sandro, Pallas, c.1490.
Florença: Galleria degli Uffizi.

Crepúsculo do Feminino


De sangue e leite Reia cretense
Ou do eterno fluxo Magna Mãe
A placenta de um deus menino
Na Figália corrente rio se torna
Onde na rude e silvestre Arcádia
Outra divina destronada deusa
Num templo perdido permanece
Dando apenas o dia ao ano todo
Eclipsada está a antiga deidade
Esquecida está a materna rainha
Da terra e do ar da água e do fogo
Perdemos pois o divino feminino
E do novo homem tudo se tornou
Sombra e imagem representação


29 de Janeiro de 2019
RMdF

quinta-feira, 23 de maio de 2019

Uma Outra Teologia ou Tealogia (Teosofia)

Del Sarto, Andrea, Disputation on the Trinity, 1517.
Florença: Galleria Palatina (Palazzo Pitti).


A Vontade, enquanto primeiro aspecto, Pessoa, da Divindade (não Deus) apresenta-se como Deus em acto. O Silêncio que é a Mãe da Trindade é Deus em potência, pois é do Silêncio que nasce o Pai e a Mãe, ou seja, a Vontade e a Sabedoria. O Pai representa Deus em movimento, uma vez que é pela Vontade que a obra divina que se realiza. Já a Mãe representa Deus enquanto conhecimento de si mesmo, pois é pela consciência do Bem, da Justiça e da Beleza que a obra divina que se realiza, ou seja, a Sabedoria atribui uma finalidade ao propósito divino. O Pai e a Mãe geram a síntese da sua natureza, o Filho torna-se o Logos da Criação, o Amor que em tudo está presente. Sobre o Divino, só não se falar do Indeterminado que é a Origem do Silêncio, a verdadeira divindade. A palavra fica portanto aquém do entendimento. A mente humana, enquanto imagem da mente divina, vislumbra apenas o Silêncio, a Deusa Sige, e a Trindade que é o Pai, a Mãe e o Filho - a Vontade, a Sabedoria e o Amor.



segunda-feira, 20 de maio de 2019

A Estrela é a Sabedoria da Fé e a Fé na Sabedoria

A Estrela
Tarot Rider-Waite

A Estrela é o arcano da sabedoria da fé e da fé na sabedoria, é o divino culminar do eterno feminino, do seu esperado regresso.

A Estrela é aquela nossa humana árvore que, entre a terra e o céu, cresce, que sábia flui e pacientemente evolui. 

A Estrela é o agente primordial de transformação que permite a passagem do ideal ao real, do divino ao humano.

A Estrela é aquele elemento mágico que torna algo numa outra coisa, é portanto uma viagem da imaginação à realidade.

A Estrela é a dádiva divina que impregna o oceano primevo, a água abençoada que confere continuidade à criação.

A Estrela é aquela derradeira promessa, o anúncio proferido na origem, que diz que todos os opostos se irão reunir. 

A Estrela é a eterna esperança, o dom divino e materno de dar a luz ao mundo, de ser tanto a causa como a finalidade.

terça-feira, 14 de maio de 2019

Morrente o Tempo (Poesia)

Vouet, Simon, Saturn, Conquered by Amor,
Venus and Hope
, 1645-46. Burges: Musée du Berry.

Morrente o Tempo


Moribundo clama o tempo
Esse agora sempre perdido
O oportuno momento seu
Que não é nem o passado
Funesto saudoso e iludido
Nem do futuro a sombra
Estendida fiel e prometida
Severa saturnina é a lição
Do tempo fiado ora tecido
Ora cortado das sapientes
Rubras deusas de outrora
Moribundo clama o Tempo
Divino eterno mas morrente


21 de Março de 2019

RMdF

quinta-feira, 9 de maio de 2019

A Torre ou a Experiência da Queda

A Torre
Tarot Rider-Waite


A Torre é um arquétipo, não de um mal radical, mas do mal enquanto queda, enquanto experiência profunda do abismo.

A Torre é aquela projecção do eu que corrompe o conhecimento de si, como Imagem de Deus, numa promessa de destruição.

A Torre é o arcano que representa a corrupção da vontade humana e a ignorância activa enquanto expressão do mal.

A Torre é aquela forma de destruição, tanto interna como externa, que invade o eu e o outro, tornando a queda em ausência.

A Torre é a negação do processo transformativo que a sabedoria e a fé concedem, logo é uma rejeição da dádiva.

A Torre é aquele relâmpago fulgente que relembra que são as leis do destino, os decretos da mente divina, que unem todas as coisas.

A Torre é a revelação de que também nas ruínas, no seio da maior destruição e discórdia, se pode encontrar ou guardar um tesouro.

quinta-feira, 25 de abril de 2019

Esse elástico em pés de menina (Poesia)

Gauguin, Paul, Breton Girls Dancing, 1888. Washington: National Gallery of Art.


Esse elástico em pés de menina

Se escapares da rotina
Da autocarro atrasado
Do dinheiro que não estica
Das pessoas malignas
Que sem autorização 
Te invadem a vida
E pensares em Deus e no Tempo
Não com o cálculo do físico
Nem com a razão do filósofo 
Mas com o espírito livre de um poeta
Compreenderás não como metáfora
Mas como realidade vibrante
Visão primordial da totalidade 
Que Deus e o Tempo
São três meninas a jogar ao elástico
Qual feminina trindade
Deusa tríplice e fiandeira
Nesse jogo de criança
Ouvirás as meninas a cantar
Batendo as palmas
Dando som ao universo
E as três trauteando dirão
Salta pisa e cruza
Pisa cruza e salta
E a gravidade o espaço e o tempo
Comprimindo-se e estendendo-se
Tornar-se-ão a unidade
De uma relativa verdade
E tu do quotidiano liberto humano
Observarás o elástico sob os pés da menina
Aquela que dança entre as irmãs
E então o tempo 
Esse elástico em pés de criança
Saltado será a oportunidade 
Pisado o momento 
E cruzado e estendido 
Toda uma vida
Agora longe da rotina 
Da autocarro atrasado
Do dinheiro que não estica
Das pessoas malignas
Que sem autorização 
Te invadem a vida
Quando procurares 
A divina imagem
Não vejas pois o velho barbudo 
Vê antes três meninas a brincar
Três mulheres que voltam a jogar


25 de Março de 2019
RMdF

terça-feira, 2 de abril de 2019

Do Amor-Próprio à Vida Eterna: João 12:25

Antolinez, José, Assunção de Maria Madalena, s/d.
 Madrid: Museu do Prado.


Do Amor-Próprio à Vida Eterna
João 12:25


            Quando entregamos à alma a disponibilidade de ler, de nos deixarmos deslumbrar, por uma passagem de um qualquer texto sagrado, sem dogmatismo, sem os grilhões de uma leitura condicionada, podemos encontrar uma luz textuante que nos eleva para uma realidade onde o divino se torna palavra. Essa disponibilidade adquire um profundo carácter de transformação se o espectro textual se tornar universal, ou seja, todos os textos, de todos os tempos, de todas as religiões ou civilizações, adquirem um elemento de gravidade existencial.

            O versículo 25 do capítulo 12 do Evangelho de São João é um bom exemplo dessa leitura. Uma visão crítica, focada apenas na letra do texto, permite uma vasta apreensão da palavra sagrada. Se compararmos o texto grego com a vulgata e com algumas das principais traduções portuguesas, percebemos que as variantes, em vez de adulterarem o sentido primordial, aprofundam esse sentido. Ora o texto grego diz:

̉Ο φιλῶν τὴν ψυχὴν αὐτοῦ, ἀπολλύει αὐτήν, καὶ ὁ μισῶν τὴν ψυχὴν αὐτοῦ ἐν τῷ κόσμῳ τούτῳ, εἰς ζωὴν αἰώνιον φυλάξει αὐτήν.

E, por seu lado, a vulgata de São Jerónimo diz:

Ipsum solum manet si autem mortuum fuerit multum fructum adfert qui amat animam suam perdet eam et qui odit animam suam in hoc mundo in vitam aeternam custodit eam.

Nas traduções portuguesas, destacamos três: a de João Ferreira de Almeida; a Nova Bíblia dos Capuchinhos e a Bíblia de Jerusalém. Na tradução de Ferreira de Almeida, encontramos a seguinte versão:

Quem ama a sua vida, perdê-la-á; e quem neste mundo odeia a sua vida, guardá-la-á para a vida eterna.

A Bíblia dos Capuchinhos, que é aquela que mais difere das restantes, diz:

Quem se ama a si mesmo, perde-se; quem se despreza a si mesmo, neste mundo, assegura para si a vida eterna.

E, por fim, a Bíblia de Jerusalém diz:

Quem ama sua vida a perde e quem odeia sua vida neste mundo guardá-la-á para a vida eterna.
Quando abordamos as traduções da Bíblia é impossível não cotejar também a King James, que, neste caso, não difere da maioria das traduções portuguesas:

He that loveth his life shall lose it; and he that hateth his life in this world shall keep it unto life eternal.

            Estes périplos textuais não procuram, de modo algum, a erudição exegética, mas sim a compreensão do texto enquanto matéria viva, criatura vivente e em contínuo processo transformativo. Contrariamente ao que se possa pensar, só o texto que não é lido é que permanece morto, fechado em si mesmo. A palavra possui um carácter de passagem. É um demiurgo que, de corpo em corpo, de leitor em leitor, se transforma.

            O versículo de João permite diferentes leituras, sem que por isso sejam dissonantes. As questões interpretativas resultam essencialmente da polissemia textual. A primeira delas, e que surge logo no texto grego, é a de como devemos ler a palavra ψυχή. A tradução mais comum, aquela que encontramos em Ferreira de Almeida, na Bíblia de Jerusalém e na King James, opta pelo termo vida. Na vulgata, encontramos o termo anima, que, apesar de conservar a dimensão de sopro de vida, não tem o alcance de ψυχή. No entanto, é na vulgata que encontramos uma pista para a tradução da Bíblia dos Capuchinhos. O texto diz: ipsum solum manet. Ora o acto de permanecer apenas em si é o amor-próprio dessa tradução e está em total harmonia com a ψυχή grega, que tem também a acepção de si mesmo ou de consciência de si.

            O texto grego pode não incluir literalmente o ipsum solum manet da vulgata, todavia o elemento vivo que anima o texto é o mesmo. A tradução da Bíblia dos Capuchinhos da primeira parte do versículo é portanto a que melhor traduz o espírito de  ̉Ο φιλῶν τὴν ψυχὴν αὐτοῦ, ἀπολλύει αὐτήν. Nos dias de hoje, com uma desenfreada propaganda a um individualismo solipsista, que na maior parte vezes se aproxima de um narcisismo patológico, este Quem se ama a si mesmo, perde-se pode parecer estranho, mas, na verdade, deveria servir de fundação a toda psicologia futura. O amor-próprio pode, e deve, cimentar uma vida psicologicamente saudável, contudo quando a justa medida é excedida, transforma-se numa forma de alienação. Nesse sentido, aquele que apenas se ama a si mesmo perde tanto o amor por si como a própria vida - conjugando-se aqui as duas acepções de ψυχή -, pois não existe valor numa vida apenas centrada em si.
 
            O versículo pode ter, porém, uma outra leitura. A chave dessa leitura encontra-se na relação entre as várias formas verbais. Os verbos φιλόω, ἀπολλύμι, μισέω e φυλάσσω vão indicar a presença ou a ausência de um elemento passagem, de um princípio de transformação. Ora aquele que se ama, perde-se e aquele que se odeia, guarda-se. Esta pode parecer uma equação algo bizarra, todavia, é a presença ou a ausência de um elemento de passagem que clarifica a formulação. E esse elemento é Jesus. A passagem do amor-próprio, centrado em si mesmo, para um amor universal, liberto das amarras do excesso de si, é mediada por Jesus. Nesse sentido, a vida eterna que se ganha, mantém ou defende (φυλάσσω), e que é expressa pela palavra ζωή, que indica sobretudo a vida biológica, resulta não de um acto de se amar a si mesmo (φιλόω) que conduz ao processo de perda, destruição ou morte (ἀπολλύμι), mas sim de um acto de negação, recusa ou rejeição (μισέω).

            O verbo μισέω, cuja raiz etimológica encontramos hoje em palavras como misantropia ou misoginia, surge aqui como indicador da acção que permite ou concede a vida eterna. Ao abandonarmos o amor-próprio e ao entregarmo-nos ao amor universal, estamos a aceitar o sacrifício como dádiva. O acto de odiar (μισέω) a própria vida ou essa desmedida de um amor voltado para si apresenta-se sob a forma de renúncia, de negação. Embora uma interpretação mais condicionada possa conduzir a alma a uma disponibilidade para o sacrifício, para o martírio, a proposta de Jesus assenta sobretudo na necessidade de se renunciar ao excesso de si, ao eu que não quer ver a dádiva da vida eterna, nem amar o outro como a si mesmo. Jesus concede neste versículo a possibilidade de darmos ao mundo, não o amor-próprio, fechado em si mesmo, mas o amor de Deus. A máxima de Deus é Amor torna-se assim, não um mote espiritual, mas a própria vida e esse Amor transforma a consciência de si, a ψυχή, e dá-lhe o dom da totalidade.

           João 12:25 é um bom exemplo da importância de uma leitura crítica, pois a leitura de uma única tradução levar-nos-ia a perder todo um leque de sentidos. A vitalidade do texto transcende aqui o original, embora este seja a matéria-prima de toda análise, uma vez que encontramos também nas traduções uma paleta interpretativa que potencia o seu valor textual. Por outro lado, uma leitura crítica sustentada na palavra revela igualmente a actualidade de um texto. Desta forma, depois de cotejadas as palavras, João 12:25 manifesta uma profundidade que é tanto espiritual como existencial.   



Bibliografia

Bíblia Português, Edição em linha com texto interlinear grego-português e várias traduções. Acedida em 30 de Março de 2019: https://bibliaportugues.com/john/12-25.htm

Novo Testamento Interlinear – Grego-Português, Ed. V. Scholz e R. G. Bratcher. Barueri (SP, Brasil): Sociedade Biblíca do Brasil, 2007.

Vulgata Latina, Edição em linha. Acedida em 30 de Março de 2019: https://www.bibliacatolica.com.br/vulgata-latina/evangelium-secundum-ioannem/12/ .

Bíblia Sagrada, Ed. João Ferreira de Almeida. Lisboa: Sociedade Bíblica, 1994.

Bíblia de Jerusalém, G. da Silva Gorgulho, I. Storniolo & A. F. Andersen. São Paulo (Brasil): Paulus, 2003.

Nova Bíblia dos Capuchinhos, Edição em linha. Acedida em 30 de Março de 2019: http://capuchinhos.org/biblia/index.php/Jo_12 .